Lectio Divina na 3ª Semana Comum ano 2020

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DOMINGO,26 de janeiro de 2020

Mateus 4,12-23 (O retorno à Galiléia; Jesus chama seus quatro primeiros discípulos) O texto litúrgico está tecido com quatro pequenas unidades, a saber:    o sentido teológico do regresso de Jesus a Galileia (vv.12-16); o inicio e o conteúdo essencial de sua pregação; o chamado dos primeiros quatro discípulos (vv.18-22); e o resumo da pregação, que está acompanhado de sinais prodigiosos. Texto comum com Marcos e Lucas, a indicação geo­gráfica “estamos na Galileia” encontra ampla ressonância em Mateus: associa com uma preciosa citação e lhe outorga uma orientação particular (vv.15ss). Com a citação de Isaías, algo adaptado (cf.1ª leitura), o evan­gelista destaca que Jesus fixa sua residência em Cafarnaum. A luz brilha na «Galileia dos pagãos», quer dizer, entre os gentios, superando um mesquinho nacionalis­mo que pretendia confinar os benefícios de Deus aos estreitos limites de Israel. O primeiro anuncio de Jesus é parco, porém essencial: «Arrependei-vos, porque está chegando o Reino dos Céus». A conversão, entendida como adaptação contínua à vontade de Deus, é condição e requisito para divisar o Reino dos Céus. Antes de anunciar o programa detalhado da pregação (cf.5,1ss) e antes de fazer milagres, Jesus elege algumas pessoas para que o sigam. A prioridade de tal ação se entende: é necessária a presença de testemunhas que experimentem tudo quanto Jesus tem dito e feito, para que um dia possam comunicar a outros e entrem esses também em comunhão com Jesus. Galileia, território de pagãos, é terreno fértil de vocações. O v.23 encerra o presente texto litúrgico e recolhe, de modo sintético, a atividade de Jesus: palavras e fatos milagrosos. Palavras e fatos portentosos, de fato, são a sustentação do evangelho. A pregação se desenrola nas sinagogas. Está dirigida aos judeus que necessitam de ajuda para compreender a situação de absoluta novidade que estão vivendo: Jesus se apresenta não só como o enviado de Deus, anunciado pelos profetas, mas, ainda mais: como o próprio Deus. Todo o evangelho se ocupará em desvelar a identidade de Jesus.

 

Isaias 8,23b–9,3 (Marcha durante a noite; a libertação) O presente anuncio de libertação se lê no contexto histórico da vitoriosa campanha militar de Teglatfalasar, rei assírio. O texto projeta uma luz de esperança. Abre-se com um forte contraste entre um passado humilhante e um futuro glorioso. «Zabulón e Neftalí» (8,23) são duas tribos do norte com uma fronteira comum, o monte Tabor. O território foi conquistado em 732 por Teglatfalasar. Sua elite, deportada e «humilhada» (cf. Sl 136,23, onde «humilhação» co­rresponde a «exílio»), agora é resgatada mediante um anuncio triunfal. A gloria vem representada com duas imagens: a luz que ilumina o caminho do povo em marcha e o gozo que se experimenta, como durante a ceifa ou ao repartir-se os despojos (9,2). Ao final se dá o verdadeiro motivo da gloria futura: uma experiência liberadora, a raiz concreta de tal ale­gria. Alude-se à libertação do pesado jugo dos assírios, ainda mais insuportável devido a uma atitude persecutória (“o bastão opressor», 9,3). A vitoria remonta diretamente a Deus (“tu rompeste»), que intervém de modo inesperado e esplêndido, igual que em outras ocasiões; como no caso de Gedeão, que com a aju­da de Deus venceu os Madianitas (cf Jz 7,15-25). Um acontecimento que fez historia (cf. Sl 83,10; 1s 10,26) e simboliza os prodígios realizados por Deus em favor de seu povo. A gloria de Deus se revela, convertendo-se em gloria para seu povo. O profeta é o gozoso arauto de uma primavera de vida que tem sua origem em Deus. O texto prepara a compreensão do Evangelho, onde Jesus anuncia a irrupção da soberania de Deus (seu Reino) na historia dos homens.

 

1 Cor 1,10-13.17 (As divisões entre fieis) Paulo exorta à unidade pois a vê ameaçada. Após passa a expor a situação, tal como a conhece por alguns servos da família de Cloe: na comunidade surgiram vários grupos religiosos que estão minando a comunhão. E a seguir expõe o pensamento teológico dominante: Cristo é o único que congrega, pois que só Ele deu a vida pelos homens. O discurso se enlaça com o v.17, onde Paulo refere que seu ministério é, principalmente, o da Palavra, e não um anuncio qualquer, mas essencial: apresentar a Cristo crucificado. O tom de Paulo é pesaroso (“rogo-vos») pois a comunhão está seriamente ameaçada por uma comunidade beligerante, lacerada por quatro grupos: o de Paulo, o de Apolo, o de Pedro e o de Cristo. Não é que estas pessoas tenham criado a divisão; trata-se da utilização instrumental de seu nome por parte de alguns cristãos de Corinto. A intervenção do apóstolo é séria, sem chegar a ser áspera. Dirige-se aos «irmãos» e exorta-os «no nome de nosso Senhor Jesus Cristo». Paulo reivindica sua missão de apóstolo do Evangelho. Diz com força, referindo-se ao próprio Cristo: «Cristo não me enviou a batizar, mas a evangelizar (=anunciar o Evangelho)». Paulo aponta diretamente a Cristo: dele procede totalmente a nova realidade. Nele convergem todos os homens, porque, com sua morte reuniu os que estavam dispersos. Confusões pseudo teológicas e reclamações de per­tença que prejudicam a unidade são um atentado contra Cristo, antes de ser contra a concórdia da comunidade.

 

Salmo 26/27 (Junto a Deus não há temor) Este Salmo é uma “pérola” de todo o saltério. Não deixe de lê-lo e meditá-lo muitas vezes sozinho, principalmente nos momentos em que a noite avança e a tristeza nos visita, quando nos sentimos sozinhos e parece que o mal nos vence, e estamos prestes a cair debaixo da cruz. Esta leitura nos faz descobrir a intimidade da oração e da contemplação, por isso ocupa na vida dos místicos e dos santos um lugar todo especial. Deus nos ama e nos esconde no interior de sua fenda.

Senhor, que eu possa experimentar nos momentos difíceis da minha caminhada a certeza do salmista: confiar no teu amor, esconder-me na tua tenda e contemplar a vitória do bem sobre o mal. Que eu, Senhor, possa em cada momento experimentar a suavidade do teu amor. Que este Salmo possa ser o meu forte alimento e o pão da caminhada da minha vida. Amém.

 

 

MEDITATIO: As leituras atuais facilitam uma reflexão profunda sobre a Igreja, pois apresentam seus elementos constitu­tivos: una, santa, católica e apostólica: A Igreja é una porque tem em Cristo o seu Senhor. Todas as comunidades cristãs se reconhecem como parte da única Igreja fundada por Jesus. Há um só batismo, uma só fé, que une os cren­tes a Cristo. Assim Paulo combate vigorosamente aos espíritos sectários e as manipulações grupais. É uma tentação reiterada pensar que um grupo seja a me­diação exclusiva ou privativa da salvação. Os grupos são instrumentos, meios, não mais, e devem resistir ao sutil engano da monopolização. A Igreja ou comunidade é santa porque «está batizada» em Cristo. A santidade é ante tudo dom gra­cioso, absolutamente gratuito. Depois, é resposta ge­nerosa que toma o nome de conversão, em continua har­monia com a vontade do Pai, como Cristo a tem dado a conhecer e como o Espírito continuamente a propõe. A Igreja é católica. O chamado às tribos do norte, Zabulon e Neftali; o incessante chamado a Galiléia, zona povoada ou transitada por pagãos, recorda à Igreja sua vocação de estar aberta ao mundo. Jesus elegeu vi­ver e iniciar sua vida pública na Galileia para evidenciar a proximidade geográfica com os últimos e os excluídos, prelúdio de uma moral para que todos se reconheçam como irmãos. «Na Igreja, nenhum homem é estrangeiro», recordava João Paulo II no dia do imi­grante, em setembro de 1995. A Igreja é apostólica. Com efeito, o seu único fundamento, Cristo, toma forma histórica nos apóstolos e em seus sucessores (os bispos), em comunhão com o bispo de Roma, o papa. O explícito chamado dos apóstolos, os quatro primeiros do evangelho de hoje, expressa a vontade concreta de Jesus de organizar a Igreja deste modo. Chamados a segui-lo para dar testemunho da Palavra e dos sinais e milagres do Mestre. Enfim, a “apostolicidade” da Igreja está em estreita relação com sua “catolicidade”. Entre as tarefas principais dos apóstolos e seus sucessores destaca-se a de anunciar Cristo a todos os povos.

 

ORATIO: Ó Senhor, resplandece teu rosto sobre nós para que gozemos do bem estar na paz e para que sejamos protegidos com tua mão poderosa. Teu braço estendido nos livre de todo pecado e de todos os que nos aborrecem sem motivo. Dá-nos a concórdia e a paz, a nós e a todos os habitantes do mundo, como a deste aos nossos pais, que, piedosamente, te invocaram com fé e em verdade. A ti, o único que pode conceder-nos estes bens e muito mais, te oferecemos nosso louvor por Jesus Cristo, pontífice e advogado de nossas almas, por quem sejam dadas a ti a gloria e a majestade, agora e por todas as gerações, pelos séculos dos séculos. Amém (são Clemente de Roma)

 

CONTEMPLATIO:  A Igreja, presente no mundo inteiro, até os confins da terra, recebeu, dos apóstolos e de seus discípulos a fé em um só Deus, Pai todo poderoso, que fez o céu, a terra, o mar e tudo o que contém (cf. At 4,24); e em um só Jesus Cristo, Filho de Deus, que se encarnou por nossa salvação; e no Espírito Santo que, pelos profetas, anunciou os planos de Deus e o advento de Cristo, nosso Senhor. […] A Igreja, pois, presente, como dissemos, no mundo in­teiro, guarda, diligentemente, a pregação e a fé rece­bida, habitando como em uma única casa, e sua fé é igual em todas as partes, como se tivesse uma só alma e um só coração, e tudo quanto prega, ensina e transmite, o faz em uníssono, como se tivesse uma só boca. […] Pois, ainda que no mundo haja muitas línguas dis­tintas, o conteúdo da tradição é uno e idêntico para todos. As Igrejas da Germania crêem e transmitem o mesmo que as outras dos iberos ou celtas, do Oriente, Egito, Líbia ou do centro do mundo. Igual que o sol, criatura de Deus, é uno e o mesmo em todo o mundo, assim também a pregação da verdade resplandece por todos os lados e ilumina a todos aqueles que querem chegar ao conhecimento da verdade. Nas Igrejas não dirão coisas distintas os que são bons orado­res, entre os dirigentes da comunidade (pois ninguém está acima do Mestre), nem a escassa oratória de outros debilitará a força da tradição, pois sendo a fé una e a mesma, nem engrandece o que fala muito, nem diminui o que fala pouco (Santo lreneu).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

 «O Senhor é a defensa de minha vida, quem me fará tremer?» (Sl 26)

 

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL Tem que conseguir desarmar-se. Eu me afanei nessa guerra. Durante anos e anos. Tem sido terrível. Porém agora estou desarmado. Já não o tenho medo de nada, porque «o amor afugenta o medo». Aplaquei a pretensão de impor-me, de justificar-me a custa dos demais. Já não estou em alerta, ciosamente aferrado a minhas riquezas. Acolho e partilho. Não me aferro a meus ideais, a meus projetos. Se me propõem outros melhores, os aceito com bom ânimo. O sabeis, tenho renunciado ao comparativo… O que é bom, verdadeiro, real, aonde quer que seja, é o melhor para mim. Por isso, já não tenho medo. Quando não se possui nada, já não se tem medo. «Quem nos separará do amor de Cristo?» […] Porém, se nos desarmamos, se nos despojamos, se nos abrimos ao Deus-homem que faz novas todas as coisas, então Ele transforma nosso passado ruim e nos restitui a um tempo novo onde tudo é possível. (Atenágoras, Chiesa artodossa e futuro ecumenico).

 

 

SEGUNDA-FEIRA, 27 de janeiro de 2020

Marcos 3,22-30 (Calúnias dos escribas) Jesus, desde o começo de sua vida pública, «passou fazendo o bem e curando os oprimidos pelo demônio» (At 10,38). Isto, sem dúvida, suscita a inveja dos mestres da Lei e dos fariseus que buscam, a todo custo, algum pretexto para acusar-lhe. A acusação referida na passagem de hoje é gravíssima: o Filho de Deus, reconhecido e testemunhado por João Batista como Cordeiro inocente que leva sobre si o pecado do mundo, é acusado de estar possuído por um espírito i­mundo. A incompreensão é absoluta. Jesus toma, então, a palavra e, seguindo o méto­do dos rabinos, faz uma pergunta, como se dissesse: “Estais seguros de ter falado com retidão de con­sciência e não movidos por outros fins que vos incapacitam para ver o bem e aderir-vos a ele?». Está em questão a liberdade humana e se há deixado um amplo espaço para considerar quem é, verdadeiramente, este Filho do homem que não quer a morte do pecador, mas sua conversão para que viva. A conversão, esta é a segunda mensagem, sempre é possível, contanto que não nos fechemos à ação do Espírito Santo, ou seja, de que não «blasfememos» contra Ele. Talvez uma imagem nos ajude a compreender melhor. Ponhamos em um dos pratos de uma balança todos os pecados cometidos pelos homens ao longo de toda a história – e é preciso que nos detenhamos um momento a considerar bem o que estamos dizendo – e no outro o sacrifício de Cristo, sumo sacerdote: pois bem, o peso deste último prato é decididamente superior, porque é o peso de um amor infinito. Contudo, pode acontecer uma coisa: que voluntariamente se bloqueie a haste da balança; então, o peso do pecado se torne esmagador. A salvação é um dom, porém pode dar-se a quem tem desejos de ser salvo.

 

Hb 9,15.24-28 (Cristo sela a nova Aliança pelo seu sangue) Em continuidade com as precedentes afirmações sobre a “novidade” trazida por Cristo à história, o autor da carta aos Hebreus considera agora um ulterior aspecto da doutrina cristã, referindo-se sempre à lei antiga. Assim como o sumo sacerdote, em nome de todo o povo, entrava em relação direta com Deus mediante os sacrifícios de vítimas animais, lhe apresentava as oferendas e levava à assembleia a benção divina em sinal de reconciliação, assim também Cristo é mediador entre Deus e a humanidade. Sem dúvida, tudo isso termina aqui e começa a novidade. Com efeito, Jesus é, ao mesmo tempo, sacerdote e vítima. Ele, puro de toda mancha de pecado, entrega-se, em sua paixão, a Deus, pelos pecadores; não oferece um sangue alheio, mas o seu próprio. Da perfeição do sacrifício deriva sua uni­cidade e a unicidade da aliança que, mediante Ele, se estabelece. Com sua morte na cruz, Jesus consuma sua atividade sacerdotal; com sua ascensão entra não no «Santo dos santos», não em um templo construído por mão de homens, mas no próprio céu, e ali permanece como Cordeiro erguido ante Deus para interceder em nosso favor (cf Ap 5,6). Agora foi arrebatada toda a força do pecado e foi aberto a cada um o «caminho novo» (cf Hb 10,20) para voltar ao Pai.

 

Sl 97/98 (O juiz da terra) Os hinos de louvor à grandeza de Deus são um tema recorrente no Livro dos Salmos. Com sua leitura, somos convidados a nos unir ao canto à sua glória e beleza. Deus se faz presente em todos os detalhes, basta olharmos ao nosso redor: Ele está nas flores, nos frutos, no soprar do vento e dentro de cada um de nós. Devemos seguir o exemplo dos santos, que souberam reconhecer a presença do Senhor no dia a dia, como São Francisco, que cantava a grandeza e a misericórdia de Deus nas flores e no canto dos pássaros, e São João da Cruz, que glorificava com rara beleza e força poética a beleza da criação como o Cântico Espiritual 4: Ó bosques e espessura, Plantados pela mão do meu Amado! Ó prado de verduras, De flores esmaltado, Dizei-me se por vós ele há passado!Assim também somos chamados a despertar do sono e entrar plenamente em comunhão com o Senhor, que está sempre entre nós. Deus fala hoje como ontem e falará como amanhã, cabe a cada um saber ouvir a sua voz e reconhecer o seu rosto encoberto por trás dos acontecimentos e das criaturas.

Senhor, nós somos festivos. Qualquer coisa entra em nossa vida e nos faz dançar de alegria. O nosso povo é festivo… tudo é ocasião para cantar e dançar: festa de aniversário, celebrações litúrgicas, encontros. O sabor da festa está conosco, por isso queremos ser ainda mais festivos para ti, sabendo que tu estás presente entre nós e andas conosco pelos caminhos da vida. Tu és vida, a vida merece ser celebrada e cantada. Deixe que meu coração cante em todas as circunstâncias, mas que não cante sozinho, que se una a todos os meus irmãos de comunidade, de caminhada. Com o canto o caminho se faz mais breve e mais doce, com o canto somos todos animados. Que animemos uns aos outros, como fazia o povo de Israel. Amém.

 

 

 

MEDITATIO: Qual é o destino do homem? Este é o tema fundamental que unifica as duas leituras, as quais nos põem ante a única grande alternativa de eternidade: a salvação ou a condenação. O homem, aparente­mente frágil como a erva do campo, não foi cria­do, em realidade, para um breve tempo sobre a terra, mas para sempre. Sempre: uma palavra extraor­dinariamente comprometedora e, por isso, tão temida, assim como pisoteada, violada e desprezada de muitos modos. Basta pensar, breve inciso de vastas ressonâncias, na extrema facilidade com a qual se rompem os vínculos mais sagrados: matrimônio, sacerdócio, consagração religiosa… A desproporção entre nossa pequenez e a grandeza de nosso destino é tal que espanta, e por isso a redimensionamos de um modo mesquinho. Um bom trabalho, relações honestas com os demais…, isto parece bastar-nos. Sem dúvida, não é assim. Ainda que sufocado, nosso coração geme no desejo de infinito: o Espírito que habita em nós grita que fomos feitos para um amor sem medida. O homem é verdadeiramente um condena­do: tem que optar entre a santidade ou o desespero. E que é a santidade, se estamos chamados a ela? O Evangelho nos diz a este respeito algo muito simples e formoso: a santidade é comunhão com Jesus. Então tudo se transfigura: quando rezo, estou com Jesus ante o Pai para adorar, interceder, dar graças; quando tra­balho, estou com Jesus a serviço de meu próximo; quando sofro, participo na paixão de Jesus para a salvação do mundo; quando chegar a hora da morte, es­tarei unido à sua morte redentora, entrarei em sua páscoa e provarei a alegria de ver, sem véus, o rosto daquele que me amou e se deu a si mesmo por mim.

 

ORATIO: Pai santo, que nos chamas a ser santos porque nos fizeste a tua imagem, tu sabes que como es­trangeiros sobre a terra, nós levaremos sobre nós o peso do pecado e nos ofuscará a fuligem do mundo. La­va-nos, continuamente, com o sangue precioso de teu Filho, sem defeito, nem mancha. Olha-nos nele, santo e obediente, visto que, unicamente, por meio dele nos atrevemos a dirigir a ti nosso olhar através da fé e da esperança. Só nele podemos amar-nos uns aos outros de coração verdadeiro, reconhecendo-nos irmãos. E nós, que somos frágeis como a erva e a flor do campo, desapareceríamos no rápido decorrer do tempo, se tua Palavra viva e eterna não nos regenerasse, constantemente, a nova vida. Concede-nos um coração humilde e dócil, que saiba escutar, para que tua graça possa renovar-nos e fazer-nos santos ícones de tua prese­nça. Amém.

 

CONTEMPLATIO: Iniciou-se o reino da vida e acabou-se o império da morte. Surgiu outro nascimento, outra vida, outro modo de viver, a transformação de nossa própria natureza. De que nascimento se fala? Do nascimento daqueles que não nasceram do sangue, nem do amor car­nal, nem do amor humano, mas de Deus. Perguntas-me como é possível? Explicarei em poucas palavras. Este novo ser o gera a fé; a re­generação do batismo, o dá a luz; a Igreja, qual ama de leite, o amamenta com sua doutrina e instituições e com seu pão celestial o alimenta; chega à idade madura com a santidade de vida; seu matrimonio é a união com a sabedoria; seus filhos, a esperança; sua casa, o reino; sua herança e suas riquezas, as delícias do paraíso; seu de­senlace não é a morte, mas a vida eterna e feliz na mansão dos santos. Este é o dia em que agiu o Senhor, dia totalmente diferente daqueles outros estabelecidos desde o começo dos séculos e que são medidos pelo passar do tempo. Este dia é o princípio de uma nova criação, pois, como diz o profeta, neste dia Deus criou um novo céu e uma nova terra. Que céu? O firmamento da fé em Cristo. Que terra? O coração bom que, como diz o Senhor, é semelhante àquela terra que se impregna com a chuva que desce sobre ela e pro­duz abundantes espigas. Nesta nova criação, o sol é a vida pura; as estrelas são as virtudes; o ar, uma conduta sem mancha; o mar, o abismo de generosidade, sabedoria e conheci­mento de Deus; as ervas e sementes, a boa doutrina e os ensinamentos divinos, nos quais o rebanho, quer dizer, o povo de Deus, encontra seu pasto; as árvores que levam fruto são a observância dos preceitos divinos. Neste dia é criado o verdadeiro homem; esse feito a imagem e semelhança de Deus. Acaso, não é um novo mundo que inicia para ti neste dia em que agiu o Senhor? Não fala deste dia o profeta ao dizer que será um dia e uma noite que não tem semelhante? Mas ainda não falamos do maior dos privilé­gios deste dia de graça: o mais importante deste dia é que ele destruiu a dor da morte e deu a luz ao primogênito dentre os mortos, àquele que fez este admirável anúncio: Subo a meu Pai e vosso Pai, a meu Deus e vosso Deus (Jo 20,17). Ó mensagem cheia de felicidade e formosura! O que por nós se fez homem como nós, sendo o Unigênito do Pai, quer converter-nos em seus irmãos e, ao levar sua humanidade ao Pai, arras­ta atrás de si todos os que agora são já de sua raça (Gregório de Nisa, sobre a ressurreição).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Toda língua proclame que Jesus Cristo é Senhor, para a glória de Deus Pai» (Fl 2,11)

PARA A LEITURA ESPIRITUAL A alegria não é um estado espontâneo do homem, senão o resultado duma concepção da vida e uma fatigosa conquista feita possível pela graça de Deus. Os inimigos da alegria são mais numerosos do que a primeira vista poderia parecer. O caminho para a alegria requer com frequência que abdiquemos de nossos próprios direitos, com a firme certeza de que acima há alguém que se preocupa com eles e que os fará valer, mas do modo e no momento que considere mais oportuno. A fé não elimina os obstáculos que o homem encontra em seu caminho, porém ajuda a superá-los à luz da paternidade de Deus. Não se trata tanto de ter uma simples visão superior da realidade como de conseguir uma profunda comunhão com Deus, deixando-nos ¡luminar pela força penetrante de seu Espírito. A alegria cristã é sempre uma participação na alegria de Deus. Em meio das sombras e das obscuridades da vida presente, o ânimo se eleva sobre as asas da alegria para superá-las. O dom da vida, a aliança, a promessa, as bênçãos, a salvação, são «acontecimentos» que inundam o ânimo do crente. A segurança da alegria cristã se fundamenta no abandono em Deus-Pai, na certeza de que Deus nos ama. Se qualquer «boa notícia vigoriza o corpo» (Pv 15,30), o Evangelho faz estremecer-se ao ânimo com uma alegria inefável e inenarrável, porque anuncia não uma simples doutrina consoladora, mas um acontecimento real de salvação, que tem seu início na aliança e conclui na encarnação, na ressurreição e, finalmente, no Reino. A alegria não é, para um cristão, um simples sentimento, mas uma pessoa: Jesus. Ele morreu e ressuscitou por todos os homens. Jesus, ao remover a pedra do sepulcro, dissipava para sempre as trevas do mal e da morte e abria a todos as portas da bem-aventurança eterna (F. Gioia, il libro della gioia).

 

 

 

 

 

 

TERÇA-FEIRA, 28 de janeiro de 2020

Marcos 3,31-35(Os verdadeiros parentes de Jesus) A passagem da carta aos Hebreus sublinha que a encarnação de Jesus marca o final da antiga lei e inaugura o novo culto em espírito e em verdade, a obediência amorosa ao desígnio do Pai. O texto nos oferece o mesmo ensinamento, pondo inclusive mais de relevo seu radicalismo. Enquanto Jesus está ensinando, alguém vem a dizer-lhe que sua mãe e seus irmãos lhe buscam. É uma boa ocasião para perfilar os traços do verdadeiro cristão, do autêntico discípulo. «O que cumpre a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe», disse Jesus. Outros evangelistas referem uma afirmação ainda mais incisiva: «Quem não abandona a seu pai e a sua mãe, não é digno de mim». É a carta magna que funda a família sobrenatural. O cristão deve ser capaz de pôr Cristo no centro de sua própria vida e antepô-lo a tudo e a todos, exatamente como fez Maria, Mãe de Cristo segundo a carne, porém ainda mais discípula de Cristo no espírito. Ela não se limitou a dizer seu sim decisivo para a história da humanidade – esse sim que abriu a Jesus a entrada no mundo – no momento da anunciação, mas que viveu depois esta obediência momento a momento, até a entrega suprema do Filho ao Pai, enquanto por obediência de amor estava junto à cruz e seu coração era traspassado por uma espada. Então se converteu Maria em Mãe da Igreja: misteriosa fecundidade de uma vida totalmente abandonada à vontade de Deus.

 

 

Hb 10,1-10 (Ineficácia dos sacrifícios antigos) Em virtude da queda original, a natureza do homem está inclinada ao mau e, de fato, a inclinação se converte em pecado realizado, que, a sua vez, faz ainda mais fácil o afundamento. Daí vem o estado de escravidão permanente. Por isso a lei antiga prescrevia complicados ritos de purificação, exigia oferenda repetida de vítimas sacrificais: sangue de touros e cabritos. Estes mantinham viva a consciência do pecado, mas eram absolutamente insuficientes para extirpá-lo pela raiz e devolver a autêntica liberdade. Um rito exterior não pode pôr remédio de modo automático a uma ferida interior que tem sua origem num ato de desobediência a Deus, em uma soberba rebelião contra sua vontade. O verdadeiro antídoto está, pois, na humilde obediência ao desígnio divino de salvação. Jesus veio ao mundo construir pela primeira vez este caminho de retorno, abrindo assim aos homens a única via que pode conduzir à salvação. Ainda que Filho de Deus rebaixou-se à condição humana e se fez obediente até morrer na cruz. Toda sua vida terrena encontra uma síntese perfeita nesta afirmação: «Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou» (Jo 4,34). Nesta obediência consiste o culto perfeito em espírito e em verdade, o qual não se esgota em práticas exteriores, mas se converte em comunhão com Deus e salvação para todos.

 

Sl 39/40 (Ação de graças. Pedido de socorro) A oração que mais admiro é a de ação de graças e louvor. No entanto, é difícil agradecer e perceber a beleza ao nosso redor, e ter consciência de todas as graças que Deus nos tem dado ao longo de toda a nossa vida.Diante de Deus não temos nenhum direito, a não ser o de sermos amados. Ele tudo nos dá de graça, por isso é nosso dever cantar as suas maravilhas. O salmista, por ser pobre, faz a experiência do cuidado de Deus. Em meio a tanta pobreza material, só o Senhor vem em nossa ajuda, com pleno amor e gratuidade. Devemos dizer a todos, e de todas as formas, os benefícios recebidos por intermédio dele.

Senhor, desculpa-me se sou cego e insensível à tua graça e teu amor. Dá-me um coração de pobre para acolher tudo como dom, desde a luz do sol até a saudade, os amigos e a família, o amor e o sofrimento. Que possa repetir com Santa Teresinha do Menino Jesus: “Tudo é graça… Não posso confiar em mim mesmo, mas devo pedir a toda hora uma só coisa: o amor, Senhor, para que te possa amar e fazer-te amado”. Amém.

 

 

MEDITATIO: «Aqui estou, oh! Deus, para fazer tua vontade.» «O que cumpre a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.» Só dois versículos, porém contém todo o mistério de nossa salvação. A liturgia da Palavra de hoje apresenta duas leituras que têm que ver com o ponto mais profundo da vida cristã; duas leituras que, unidas deste modo, parecem escolhidas para libertar o coração do homem de uma visão estreita da obediência e de estranhos preconceitos sobre a vontade de Deus, entendida, com excessiva frequência, quase como o capricho de um tirano ou como uma lei férrea e anônima. Para descobrir o verdadeiro significado destas duas luminosas afirmações, perguntemos, ainda que só seja por meio de brevíssimas alusões, à Sagrada Escritura. No salmo 17 lemos: «O dia de minha desgraça me assaltaram, porém o Senhor foi meu apoio. Libertou-me, deu-me respiro, salvou-me, porque me amava», e a versão latina – fiel ao original hebreu – disse simplesmente: quia me voluit, «porque me quis»: a vontade de Deus é seu querer-me. Na plenitude de sua revelação, Jesus declarará: «E sua vontade é que eu não perca a nenhum dos que ele me deu, mas que os ressuscite no último dia» (Jo 6,39). Se a vontade de Deus consiste no desejo de nosso bem, que será, então, a obediência? Desde o aqui estou de Abraão (cf. Gn 22,2) até o aqui estou de Maria, desde o aqui estou de Jesus ao aqui estou de todos os que hão seguido suas pegadas, a obediência se revela como um canto nupcial que brota de um coração desejoso de cooperar com o desígnio divino de salvação. A obediência não é a fria execução de umas ordens severas, mas um apaixonado compromisso de toda a pessoa em um confiado abandono àquele que é, seguramente, onipotente, porém também Pai; Altíssimo, porém também Emanuel, Deus-conosco.            O homem e a mulher obedientes encontrarão momentos de cansaço em seu caminho, porém sempre sentirão junto a eles os passos daquele que nos precede levando por amor a nós nossa cruz.

 

ORATIO: Ó Jesus, Filho obediente do Pai, atraídos pela misteriosa fascinação de tua pessoa e cativados pela força penetrante de tua Palavra, nos apertamos a teu redor, míseros e pobres, mendigando a paz e o perdão. Somos muitos, mas nos sentimos sós; quiséramos olhar-te na cara, porém a vergonha nos faz baixar a cabeça. Estamos aqui com o peso de nosso nada, com a esperança de uma vida nova. Pousando teu olhar sobre nós, nos dizes: «Quem faz a vontade de meu Pai é para mim irmão, irmã, mãe…». Estávamos sós, agora somos tua família; sentimo-nos unidos entre nós com uma doce e forte solidariedade. Que teu amor nos sustente e nos impulsione sempre a viver contigo para todos.

 

CONTEMPLATIO: Se me perguntas onde podes encontrar a obediência, qual é a causa que te a tira e qual o sinal de que a tens ou não, te responderei que a encontras de uma maneira consumada no doce e amoroso Verbo unigênito, meu Filho. Esteve tão disposta esta virtude n’Ele que, para cumpri-la, correu à vergonhosa morte de cruz. Quem te a pode tirar? Considera ao primeiro homem e verás qual é a causa que lhe tirou a obediência: a soberba gerada pelo amor próprio. O sinal para saber si tens ou não esta virtude é a paciência. Não há nenhum homem que possa chegar à vida eterna se não é obediente. Obrigado por minha infinita bondade, posto que via que o homem, a quem eu tanto amava, não podia voltar a mim, que sou seu fim, colhi as chaves da obediência e as pus nas mãos do doce e amoroso Verbo, e ele, como porteiro, abriu esta porta do céu. Quando voltou a mim, deixou-os esta doce chave da obediência. Qual a razão da grandíssima obediência deste Verbo? A razão foi o amor que consagrou a minha honra e a vossa salvação. O amor nunca está só, mas que acompanha a todas as virtudes. Por isso, sua mãe, que é a caridade, lhe deu por irmã à obediência a virtude da paciência. Esta virtude tem uma ama de leite que a alimenta; a saber, a verdadeira humildade, pelo qual a alma é tão obediente como humilde, e tão humilde como obediente (Obras de Santa Catarina de Sena).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Correrei após teus mandatos, pois me enches de gozo» (Sl 118,32)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL Dirá alguém: a obediência a Deus é fácil, a Deus não vemos, não ouvimos; podemos fazer-lhe dizer o que queiramos […]. É verdade […]. Sem dúvida, a Escritura nos oferece o critério para discernir entre a verdadeira e a falsa obediência a Deus. Falando de Jesus, disse que «aprendeu a obedecer através do sofrimento» (Hb 5,8). A medida e o critério da obediência a Deus é o sofrimento. Quando dentro de ti tudo grita: «Deus não pode querer isto de mim» e, sem dúvida, te dás conta de que quer precisamente isto… e te encontras ante sua vontade como ante uma cruz na qual deves estender-te, então descobres o seria, concreta e cotidiana que é esta obediência. Para obedecer a Deus, fazendo nossos seus pensamentos e suas vontades, é preciso morrer um pouco cada vez. Em efeito, nossos pensamentos começam sendo diferentes aos de Deus não algumas vezes, como por casualidade, mas sempre, por definição. A obediência a Deus requer, em cada ocasião, uma autêntica conversão. Ponhamos um pequeno exemplo que vale tanto para a vida de comunidade como para a de família. Alguém tomou para si, mudou ou violou um objeto que te pertencia: uma peça do vestuário ou alguma outra coisa que pertencia a teu uso particular. Estás firmemente decidido a ressaltar o assunto e a reclamar o teu. Nenhum superior intervém para proibir. Porém eis que, sem tê-la buscado, te sai ao encontro com força a Palavra de Jesus, ou a encontras sem mais adiante, por casualidade, ao abrir a Bíblia: «Dá a quem te peça, e a quem te tira o teu não o reclames» (Lc 6,30). Compreendes com claridade que essa afirmação não valerá sempre e para todos, porém que vale certamente para ti nessa precisa circunstância; te encontras frente a uma obediência bela e boa que realizar; se não o fazes, sentes que hás deixado perder uma ocasião de obedecer a Deus. A obediência a Deus é uma obediência que sempre podemos realizar. Quanto mais obedecemos, mais se multiplicam as ordens de Deus, porque ele sabe que este é o dom mais belo que pode fazer-nos, o que fez a seu amado Filho Jesus Cristo (R. Catalamessa, La obediencia, Valencia).

 

 

 

 

Quarta e quinta somente reflexão do evangelho

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

QUARTA-FEIRA

Marcos 4,1-20

“A Palavra de Deus é a semente”

Meditando mais uma vez com a Parábola do Semeador, ressalta aos nossos olhos o verbo imperativo que Jesus usou para chamar a atenção da multidão, “Escutai”, assim como também a afirmação que fez quando terminou de contar a Parábola: “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça!” 

Chegamos, então, à conclusão de que o entendimento à Palavra do Senhor depende muito do modo como nós a escutamos e de como concentramos a nossa atenção e o  nosso zelo, colocando ou não o nosso coração à disposição de Deus e em intimidade com Ele.  Jesus usa figuras simples da vida corriqueira do homem para explicar o reino dos céus. O semeador é Ele mesmo! O terreno é o nosso coração! A semente é a Sua Palavra! É o próprio Jesus quem, por meio de um ou de outro, sai espalhando a semente da Sua Palavra.  Há os que “escutam” a Palavra de modo muito superficial e, por isso, facilmente ela é arrancada da sua mente.  Por causa da falta de atenção e concentração, ela é esquecida

– “é a semente plantada à beira do caminho”. Outros há que “escutam” a Palavra com mais aplicação e ela encontra guarida no coração, porém, lhes faltam perseverança e determinação. Desse modo, por qualquer coisa e diante da primeira dificuldade, desistem e começam a desconfiar das promessas de Deus. Sucumbem diante dos desafios que a Palavra lhes propõe

– “é a semente que cai em terreno pedregoso”. Acontece também que existem aqueles que “ouvem” a palavra e a assimilam dando demonstração de que ela fecundará, no entanto, o trabalho, a família, os planos, os bens, o amor à riqueza intervêm e eles entram na rotina da vida consentindo que as preocupações os sufoquem e deixem de lado a mensagem da Palavra de Deus e os Seus ensinamentos – “é a semente que caiu no meio dos espinhos”. Há outros, no entanto, a quem a mesma Palavra foi lançada, porém, ao contrário dos demais, escutaram-na com decisão e com consciência de acolher os ensinamentos de Deus. Não opõem resistência, despojam-se dos seus conceitos e dão a devida importância ao que “escutam”, assim, colhem frutos de uma vida fecunda. – “é a parte que caiu em terra boa e deu fruto” como o próprio Jesus conta no Evangelho. Jesus também nos dá a chave do mistério do reino de Deus quando diz

Para os que estão fora, tudo acontece em parábolas”! 

 

A multidão que acompanhava Jesus fazia-o de longe, às margens, na praia, e, por isso, não compreendia o que Ele lhe falava. Os seus discípulos, porém, subiam com Ele na barca, estavam perto Dele, O escutavam e tinham a chance de apreender melhor porque Jesus lhes explicava. Quem está longe das coisas de Deus, longe da Igreja, vê, mas não enxerga, escuta, mas não compreende, por isso, não se converte e permanece na escuridão. Tanto na Igreja como em comunidade nós temos a oportunidade de escutar melhor para entender os ensinamentos de Jesus.

 

Assim sendo, nós temos a chance de sondar o terreno do nosso coração e perceber se a Palavra está ou não dando frutos na nossa vida ou se estamos apenas ouvindo falar, porém, sem escutar e pôr em prática. Esta avaliação, nós a fazemos nas horas em que enfrentamos a tribulação, nos momentos de preocupações, diante da ilusão das riquezas e outros empecilhos que nos desafiam. O nosso coração é um terreno fértil quando a Palavra se faz vida na nossa vida e, mesmo no meio das provocações nós damos testemunho da nossa fé. –  Como está o terreno do seu coração? – Você tem colocado zelo em escutar a Palavra do Senhor?  –  Aonde você tem buscado o entendimento das coisas de Deus? – Quando “escuta” a Palavra de Deus você tem o propósito de vivenciá-la?  – Você tem acolhido a semente da Palavra ou tem desistido Dela por qualquer motivo?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

QUINTA-FEIRA

Marcos 4,21-25

 Reflexão – “somos lâmpadas a serviço da Luz de Deus”

Por meio da Sua Palavra Jesus ilumina os nossos passos e orienta as nossas ações, pois Ele é o Verbo de Deus e a Luz do Mundo!  Nós somos como lâmpadas que refletem para o mundo o fulgor que Dele recebemos. Portanto, as nossas ações mostram ao mundo se, estamos ou não recebendo e refletindo esta luz ou se, pelo contrário a estamos camuflando, escondendo-a debaixo das nossas concepções humanas. Somos chamados a revelar com transparência tudo o que ouvimos e percebemos da Palavra de Jesus. As nossas ações devem ser como lâmpadas que refletem a mentalidade evangélica e não as nossas ideias humanas que encobrem a verdade e desvirtuam as sugestões de Deus. Por isso, não podemos nos esconder debaixo das nossas máscaras, personalidades, fingimentos. Precisamos ser fiéis e transparentes para revelar ao mundo a verdade de Cristo. No entanto, a primeira pessoa com quem devemos ser sinceros é conosco mesmos. Precisamos ser lâmpadas que apossadas da luz do Espírito Santo iluminam o nosso interior e nos ajudam descobrir e perceber toda a obra que o Senhor quer fazer em nós e por nosso intermédio. Por isso, mais uma vez Jesus nos ordena a que prestemos atenção ao que ouvimos a fim de que possamos ser fiéis a tudo quanto nos é manifesto e assim usar a medida certa nas coisas que fazemos. Quando nos auto conhecemos percebemos que as nossas ações revelam conscientemente o que  cultivamos dentro de nós mesmos (as). Por isso, é mais fácil distinguir o nosso potencial e a nossa limitação. Assim, portanto, podemos usar com os outros, a mesma medida que nos é adequada e, assim fazer justiça sendo coerentes com o que o Senhor nos dá. Quanto mais usarmos bem os dons que recebemos de Deus e com humildade admitirmos as nossas restrições, mais o Senhor nos abençoará e nos cumulará de graças. As nossas ações devem ser, portanto, produtos dos nossos pensamentos e também dos nossos sentimentos.  Se cultivarmos em nós bons pensamentos e regarmos os nossos bons sentimentos poderemos também realizar boas obras as quais serão como lâmpadas acesas que poderão ser vistas por todas as pessoas. – Você se considera uma lâmpada a serviço da Luz de Deus para o mundo? – Você é uma pessoa transparente e sincera? – As suas ações acompanham os seus sentimentos e pensamentos ou você consegue camuflá-las? – Você é muito rigoroso (a) com os erros das pessoas? – E com os seus?  – A  medida que você usa para as outras pessoas é a mesma que você usa para medir as suas ações?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SEXTA-FEIRA, 31de janeiro de 2020

 

Marcos 4,26-34 (Parábola da semente que germina por si só; Parábola do grão de mostarda; Conclusão sobre as parábolas) Com duas breves parábolas tomadas do mundo agrícola, Jesus ilustra o processo de crescimento do Rei­no no mundo. Este é como uma semente que, semeada na terra, necessita de um longo período de ma­turação em meio do silêncio e da paciência. Após a semeadura o lavrador volta às suas ocupações habitua­is, sem ter que preocupar-se com a semente. É a terra que, espontaneamente, por sua própria força, leva a transformação. O evangelista se detém a descrever, uma a uma, as fases da germinação, para su­blinhar que tudo que de fora parece «tempo morto», no silêncio de Deus, é, na realidade, um tempo fecundo de graça. Quando chegar sua hora, expressão que usará, muitas vezes, Jesus, referindo-se ao seu destino, a semente, convertida agora em fruto maduro, entregar-se-á à foice para a ceifa. Também aqui surge espontânea a referência a Jesus, que, livremente oferece-se a si mesmo por nossa salvação. A surpresa do lavrador, depois da longa espera, será grande, como mostra a segunda parábola. Depositou na terra um grão de mostarda, a menor de todas as sementes, algo insignificante, mas, ao final, se fez maior que todas as hortaliças, quase como uma árvore em cuja sombra, imagem bíblica que indica a consumação do Reino de Deus (cf Jz 9,8-15; Ez 17,22-24; 31,4; Dn 4,10-12.17-23), podem repousar os pássaros. Toda a Sagrada Escritura testemunha que Deus escolhe o que é pequeno: os instrumentos mais pobres parecem ser os mais aptos para cooperar em seu desígnio de salvação. Os caminhos de Deus não são os nossos; seu Reino leva em si mesmo um princípio de desenvolvimento, uma força secreta que o conduzirá à sua plena consumação, mais além do que poderia supor qualquer humana imaginação. Não necessita mais que esperá-lo com firme esperança e humilde colaboração.

 

 

Hb 10,32-39 (Motivos de perseverança; A fé perseverante; A espera escatológica) Já desde as origens se propagou na Igreja o perigo da tibieza, um perigo que degenerou, com frequência, em aberta apostasia ou em vida pecaminosa, contrárias a fé. São várias as passagens dos escritos apostólicos que atestam esta situação (cf.Gl 3,2; 2Cor 2;Ap 2-3). Consciente do delicado momento que está atrave­ssando a comunidade judeu-cristã, a qual se dirige o autor da carta aos Hebreus enfrenta o mal em suas raízes. Revelando-se como um profundo conhecedor do coração humano e repleto de discernimento na condução das almas, oferece-nos uma página que continua sendo um precioso documento de sabedoria pastoral. Ainda que denuncie o mal, não usa palavras de aberta condenação, nem de dura recriminação, mas segue a via da exortação. «Recordai-vos»: imperativo preciso que remete ao tempo do primitivo fervor e pretende criar uma separação clara com o presente, para voltar ao frescor original. Em dois breves versículos se representa, ao vivo, ante nossos olhos, uma comunidade que deu provas de grande fortaleza e de grande caridade: uma comunidade capaz de fazer frente a toda perseguição e às mais graves humilhações, sem voltar atrás; mas, isso não basta: mostrou, do mesmo modo, ser solidária com os que estão submetidos à prova. Uma comunidade, pois, plenamente cristã, animada por um autêntico amor fraterno. Qual a fonte de tal impulso? A fé firme nos bens futuros. Precisamente essa fé tem que ser reavivada agora. E é a Palavra de Deus a única que pode alimentá-la. O autor desta carta, citando passagens do Antigo Testamento que encontraram seu pleno cumprimento em Cristo, quer sustentar nos cristãos, a esperança e a tensão para os bens futuros.

 

Sl 36/37,3-6.23-24.39-40 (A sorte do justo e do ímpio) Este Salmo é uma longa reflexão sapiencial sobre o destino dos justos e dos injustos. O justo sabe que toda sua ação será lembrada por Deus e que receberá a sua recompensa de amor, paz e vida eterna. O Salmo nos convida a não cobiçar nem buscar as riquezas, que hoje são valiosas, mas que amanhã não terão valor, lembrando-nos que tudo é vaidade e que só o amor permanece para sempre em nossos corações. Na verdade, a terra, o mundo não pertence aos poderosos, nem tampouco aos ricos e prepotentes, mas sim aos pobres, que sabem contentar-se com pouco. O caminho da felicidade é voltar ao essencial, ao mínimo necessário, e eliminar da vida o supérfluo e o luxo.

Senhor, sei que a vaidade me ataca e que às vezes sinto rugir dentro de mim a fera do ódio, do rancor, da raiva. Sinto-me marginalizado ao lutar para ser bom e fazer o bem. Tudo isso me torna triste e temo sucumbir diante das dificuldades, mas confio na tua graça. Que nos momentos de tentação eu volte a meditar este Salmo de autêntica e verdadeira sabedoria. Amém.

 

 

 

MEDITATIO: Só fazendo nosso o desejo de Deus expresso em tantas páginas do Antigo Testamento, e de modo absolutamente particular nos salmos, é possível intuir que grande devia de ser a alegria dos primeiros judeus cristãos quando, iluminados pela graça, reconheceram em Jesus ao Messias, ao Esperado por todos os povos, o Salvador prometido. Este descobrimento suscitou um grande fervor; os novos cristãos seguiram com entusiasmo pelo «caminho novo e vivo». Porém se deram conta de que o caminho era longo e fatigoso; a exaltação inicial cedeu o passo ao desalento. É a hora da prova, na qual é preciso resistir com paciência. O autor da carta aos Hebreus exorta, portanto, a seus interlocutores a perseverar com bom ânimo. Ainda que a paisagem pareça estar desolada, cada passo lhes aproxima à meta. Há períodos na vida de cada pessoa nos quais se torna necessário aferrar-nos com todas nossas forças à virtude da esperança. Esta é, por assim dizer, o bastão do peregrino que se dirige para o Reino dos Céus. Também as duas pequenas parábolas do Evangelho aludem a esta virtude. Não é acaso sua presença a que nos faz suportável o tempo que discorre entre a semente e a ceifa? É preciso estar fortemente motivados para perseverar quando o desânimo, como um ladrão, vem a roubar-nos as poucas coisas das quais dispomos. Só a esperança as pode restituir. Contudo, também ela deve ter um sólido fundamento. Não basta manter fixo o olhar nas realidades futuras, no Reino que parece inalcançável. Então, em que se pode apoiar a esperança cristã? Na experiência dos peregrinos de Emaús, na certeza de que aquele que nos chama à meta é também nosso silencioso companheiro de viagem, e quanto mais duro se torne o caminho, mais presente se faz.

 

ORATIO: Senhor Jesus, eterno Vivente, tu és nossa única es­perança. Por nós te escondeste como semente em nossa humana debilidade; experimentaste a perseguição, o peso da solidão e a aflição da pobreza; por nós aceitaste, voluntariamente, a morte; por nós te fizeste Pão de vida que nos sustenta ao longo do caminho. Tu nos conheces no íntimo e vês no­ssas tribulações e a fatiga que nos produz o com­promisso de conservar a fé. Perdoa-nos, se temos deixado envelhecer nosso coração, perdendo o ardor e o entusiasmo de nosso primeiro amor. Desperta em nós a formosa recordação de nossa enamorada juventude, para que nunca, nada, nem ninguém, possa apartar-nos de bus­car teu rosto. Fica conosco na hora da prova e concede-nos a força de teu Espírito para sermos fieis a ti até a morte. Contigo, nem sequer nossa po­breza já nos espanta: ao oferecê-la a ti, converte-se no pequeno sinal de nosso infinito desejo de colaborar na realização de teu Reino.

 

CONTEMPLATIO: Ninguém ama verdadeiramente a outro com autêntico fo­go de amor se não sente um intenso desejo de lhe ver. Por essa razão, quando o ser amado está longe, aumenta o desejo, e o atraso do Amado, ainda que seja breve, parece longo. Por isso, “ai de mim, que vivo como imigrante!” (cf. Sl 119,5) e «estou enfermo de amor» (Ct 2,5). Como hóspede de passagem neste mundo, suspiro pelas moradas celestes. Porém que é que espero? Não é ao Senhor Jesus? Não está nele toda nossa esperança? Sinto nostalgia de contemplar a vida invisível que morreria com alegria. Sem dúvida, se a espero com sereni­dade de ânimo é porque interiormente se me inspira que seja paciente. Meu espírito, embebido por completo do admirável dom de Deus, me convence para que me santifique diariamente no amor. Por isso me comprometo a não seguir minha vontade, mas espero com alegria que Deus me manifeste a sua. Que a sombra do Es­pírito Santo me sirva aqui embaixo de consolo e que meu desejo de gozar da felicidade futura faça desaparecer todo o lixo de meus vícios. Não possuo nenhuma morada neste mundo de miséria; golpeado por tantas adversidades, não vou em busca de ·tolos consolos, pois não tenho mais que um consolo: o amor eterno. Os eleitos de Cristo, aonde quer que forem, não cessam de guardar em seu espírito a alegria dos bens celestiais. Sobre o infalível fundamento posto, isto é, o Senhor Jesus, constroem e se preparam para a recompensa eterna. Assim, os trabalhos que realizam em vis­tas ao amor divino ou a violência que se fazem para custodiar a paz do coração incrementam seu mérito. Quando o corpo está cansado, os olhos se elevam para a estância celestial, para o olhar do Amigo onipotente e nos sentimos protegidos por todas as partes à sombra de seus dons (R. Rolle, II canto d’amore IV, 11ss).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«A esperança não engana, porque Deus derramou seu amor em nossos corações» (Rm 5,5)

 

PARA A Leitura Espiritual Geralmente, pensamos que a paciência é uma espécie de resignação fatalista frente ao que se nos opõe e, portanto, uma confissão de derrota. Sem dúvida, de fato, a paciência cristã não é resignação, submissão. Para compreender a atitude espiritual que chamamos paciência é preciso olhar a Jesus paciente. Basta ler o Evangelho para ver que o Senhor Jesus experimentou o incômodo físico, o cansaço, a monotonia do trabalho, a opressão da multidão. Alcançaram-lhes as contestações, o ódio, a incredulidade. Experimentou a dor física mais aguda e o sofrimento do espírito, a agonia, o abandono dos discípulos e até do Pai. Porém não foi um derrotado: se ofereceu porque quis. Levou sobre si tudo com uma paciência que não é nem inércia nem passividade, mas oferenda de si mesmo a tudo o que quer o Pai. O amor ao Pai e aos homens lhe impulsiona a entregar-se até o extremo. «Se o grão de trigo não morre, não dá fruto», diz o Evangelho. Assim, com seu sacrifício glorificou ao Pai e realizou nossa salvação. Esta é a vitória do amor, da paciência. A partir do exemplo vivo de Jesus, compreendemos que a paciência é a perfeição da caridade. Observa São João da Cruz: «O amor nem cansa nem se cansa». É a paciência silenciosa, perseverante, que se torna dom, como Cristo, pão partido pelos irmãos. Agora bem, esta disponibilidade de amor não pode ser sustentada mais que por uma fé viva e por uma intensa esperança. Muitas de nossas impaciências e muitos abatimentos procedem de uma fé e de uma esperança demasiado débeis, que não nos orientam plenamente ao amor (A. Ballestrero, Parlare d¡ cose veríssime, Cásale Monf. Roma).

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SÁBADO, 01 DE FEVEREIRO DE 2020

Marcos 4,35-41 (A tempestade acalmada) Após os fatigosos trabalhos de uma jornada de pregação, Jesus, que não deixou a barca de onde dava seu ensinamento, pede aos discípulos que o levassem à orla oriental do lago. De imediato começam a navegar, enquanto Jesus adormece no assento posterior, reservado aos passageiros importantes; atrás dele, o piloto governa o leme. De repente, vem uma violenta tempestade e a barca corre o risco de afundar. Cheios de pânico, os discípulos despertam Jesus com um chamado mesclado com uma velada recriminação: “Mestre, não te importa que pereçamos?”. Este se levanta e ordena ao vento: «Cala-te! Emudece!». Não se trata de duas ordens iguais, mas de um incre­mento na força, visto que o segundo termo sig­nifica ao pé da letra: «amordaçado». «E sobreveio uma grande calma». Um só versículo para narrar um acontecimento tão prodigioso: a propria sobriedade do relato é um dos indícios mais seguros da his­toricidade do fato. Agora que os discípulos se sentem seguros, pode di­rigir-lhes Jesus uma pergunta: «Por que tanto medo, por que esta falta de confiança?». Os ensinamentos que ha­viam recebido durante a jornada deveriam con­vencer-lhes de que, inclusive durante o sonho, permanece vigilante o Senhor (cf. a parábola da semente). A continuação, o evangelista anota com uma grande preci­são o sentimento que surge nos apóstolos: não tan­to a alegria por ter sido salvos, mas um temor sa­grado, uma admiração surpreendente. Já haviam assistido a milagres de cura, porém era a primeira vez que se encontravam frente a uma tamanha manifestação de po­der: Jesus se revela como Senhor, como dono do criado. E o estupor se converte em pergunta: «Quem é este?». Todo o evangelho segundo são Marcos está compassado por perguntas como esta, perguntas que desembocarão na profissão de fé do centurião no Calvário: «Verdadeiramente, este homem era Filho de Deus» (15,39).

 

 

Hb 11,1-2.8-19 (A fé exemplar dos antepassados) Uma vez concluído o discurso doutrinal, abre-se, agora, um capítulo totalmente dedicado à fé: o autor, empregando um procedimento tipo sapiencial (cf. Sb 10-12; Eclo 44-50; Sl 68;105;106;135; At 7), passa revista à historia sagrada propondo uma serie de exemplos, com a intenção de suscitar, nos leitores, o desejo de segui-los. Antes de iniciar o excursus, resume em um versículo todo o ensino e dá a chave de leitura de toda a passagem: a fé é o apoio indispensável para o caminho da vida; a fé garante a existência dos bens desejados e dá a certeza de pode-los alcançar, pois se fundamenta nas promessas de um Deus fiel. Com Abraão encontramos o «modelo» do crente. No inicio de seu caminho necessitou da fé para obedecer ao chamado de Deus que o ordenava sair de sua terra para outra misteriosa; ao longo deste caminho, a fé, acompanhada da esperança, permitiu-lhe aceitar, serenamente, uma vida errante e precária: vivendo na esperança, Abraão fazia frente à fatiga da vida nômade e esperava, com absoluta certeza, a Jerusalém do céu. Sua fé foi evidente, sobretudo, no sacrifício de Isaac, o filho da promessa. Esta foi a «grande prova» do patriarca: nela, Deus mesmo parecia contradizer-se ao tirar-lhe, precisamente, o que era dom seu e prenda dos bens futuros. «Esperando contra toda esperança», Abraão ofereceu a Deus o sacrifício de uma obediência heróica, não debilitada pela “noite escura” da fé, antes mesmo de ter Ele lhe pedido Isaac. Por isso recebeu uma dupla recompensa: voltou a ter seu filho e lhe foi revelado, em parábola, que esse fato escondia um ensinamento sobre à futura economia da salvação.

 

Cântico Lc 1,69-75 (O Benedictus) O Evangelista São Lucas apresenta esse hino como profecia inspirada. Alguns sacerdotes foram profetas de profissão, como Jeremias e Ezequiel. Zacarias o é numa só ocasião (…). O cântico é composto em puro estilo bíblico repleto de citações e reminiscências, como síntese teológica: No princípio houve a promessa feita com juramento a Abraão: Deus se compromete com ele, e a história vai tendo cumprimento progressivo. Depois, a promessa se materializa na forma jurídica de um pacto mútuo “com nossos pais”; pela lealdade ao Senhor, o povo não foi aniquilado por seus inimigos. Um dia essa promessa se concretiza na promessa feita a Davi de fundar-lhe uma dinastia ou “casa”; A dinastia, aparentemente, interrompida, renasce, porque Deus “suscita” nela uma força salvadora. O Messias restaura a dinastia davídica, renova a aliança sinaítica, cumpre a promessa patriarcal. (…) O Senhor vem “resgatar” novamente o seu povo, segundo sua função tradicional. Tratando-se de homens, é resgate de alguma escravidão… Sem dar nomes, supõe que vários profetas anunciaram o Messias. Deus se “recorda” leva em conta a sua aliança, é coerente com seu compromisso. Promessa com juramento, aliança em forma de compromisso unilateral. Traduz as promessas patriarcais em termos de serviço autêntico. Livrará do “temor” e do pecado para uma vida “a serviço”, também cultual, do Senhor.

Bendito seja o Senhor Deus de Israel, porque a seu povo visitou e libertou e fez surgir um poderoso Salvador na casa de Davi seu servidor, como falara pela boca de seus santos, os profetas desde os tempos mais antigos, para salvar-nos do poder dos inimigos e da mão de todos quantos nos odeiam. Amém

 

 

MEDITATIO: Abraão «saiu»: a partir desse momento já não se pertence, mas que procede segundo o sinal de Deus, sem vaci­lar. Leva uma vida de nômade, porém, não de abandonado: finca suas raízes no céu. De fato, se não se sente no coração saudade do mundo futuro, algo falta a nossa fé. O chamado de Deus: «Sai de tua te­rra…» atravessar os séculos e dirige-se, hoje, diretamente, a cada um de nós. É preciso saber estar em silencio para perceber, através dos acontecimentos da vida cotidiana, o chamado do Senhor para que lhe sigamos por caminhos inesperados. Com freqüência, sentimos a tentação de projetá-lo todo; nada tem que escapar-nos, temos que definir os de­talhes: e deste modo nos encontramos encerrados em estreitas prisões, talvez com paredes de ouro, porém, apesar de tudo, prisões. Ser capazes de confiar em alguém é o caminho da liberdade. Em muitos casos não se trata de abandonar, geograficamente, nossa própria pátria, nossa pró­pria família, mas de fazer outra «saída», a mais radical e fundamental de todas: a saída de nós mesmos; talvez se trate só de voltar a entrar cada manhã na cozinha para desenvolver os costumeiros trabalhos domésticos, ou de voltar a percorrer a rua que conduz à oficina, ou de permanecer imóvel em nosso próprio leito de enfermo oferecendo cada ins­tante ao Senhor, para que disponha dele como melhor lhe pareça. Abraão saiu comprometendo toda sua vida e se converteu em pai dos crentes. Todo consenti­mento generoso a Deus é fecundo em bens para mu­itos; toda resistência ou rejeição atrasa o caminho para a consumação da historia para todos. Abraão é elogiado por sua fé, ainda que só visse de longe. No evangelho, os apóstolos são objeto de recriminação por sua falta de fé, mesmo que Jesus esteja junto a eles: incrível paradoxo que nos faz refletir. A fé não necessita de condições particulares; é capaz de dirigir o olhar para as profundezas do coração, onde a terra prometida está escondida e ai se chega através desse ato de obediência e de entrega que o Espírito nos sugerirá a cada instante.

ORATIO: Com o coração de peregrinos cansados, ao longo dos caminhos do mundo, nós caminhamos, Senhor, impulsionados pelo desejo de ver, sem véus, teu rosto de Pai e de sermos recebidos, como pecadores humilhados e arrependidos, em teu abraço de misericórdia. Vamos passo a passo e as tempestades da vida são muitas, dentro e fora de nós; basta com pouca coisa, uma palavra inoportuna, um pensamento que não seja bom, uma suspeita imprevista, e, imediatamente, nosso ânimo se torna como um mar em tempestade; o porto da paz parece uma longínqua miragem, a tentação de dete­r-se é cada vez mais penetrante… Concede-nos a força para perseverar na fé, guia nossos passos como já acompanhaste, com presença invisível, mas forte, o caminho de nossos anti­gos pais, dos que te viram só de longe e dos que te seguiram de perto: os apóstolos, os mártires, os confessores. Faz que em meio às trevas do mundo, ainda que estejamos em ventos con­trários, nunca se apague a tocha de nossa fé, mas arda sempre para nós e ilumine aos demais, a fim de que entremos todos em teu Reino.

 

CONTEMPLATIO: A Bíblia, o evangelho, Cristo, a Igreja, a fé, são um grito de guerra contra o medo. O medo é o inimigo original. Instala-se no coração do homem; cava-o até que de repente este se encontra privado de resistência, sem força e se afunda. De um modo furtivo, corrói todos os fios que unem o homem a Deus e aos outros. Sem dúvida, o homem não deve ter medo. Isto é o que distingue o homem de todas as demais criaturas: quando toda saída nos faltar, em meio da confusão e da culpa resta sempre uma esperança. E essa esperança podemos expressar com estas palavras: “Que se faça tua vontade»; mais ainda: «Tua vontade se cumpriu». «Tudo passa, só Deus permanece e não vaci­la; seus pensamentos, sua Palavra e sua vontade, têm fundamento para a eternidade». E perguntareis: como o sabes? E então pronunciaremos o Nome daquele que é o grito de vitoria da humanidade libertada do medo: Jesus Cristo, o Crucificado, o Vivente.  Assim pois, quando tiveres medo, olhai para Ele, pensai nele, ponde-o diante de vossos olhos, invocai-o, re­zai, crede que ele está agora ao vosso lado e vos ajuda. Então empalidecerá o medo e retrocederá, e vós  sereis livres na fé em Jesus Cristo, o redentor forte e vivo (D. Bonhoeffer, Memória e fedeltà, Magnano 1995).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Sustenta-me, Senhor, segundo tua promessa e viverei» (Sl 118,116)

                                 

PARA A Leitura Espiritual O amor irradia, é a origem primeira e sempre nova de todo viver. Por amor temos nascido; por amor vivemos; ser amados é a alegria da vida; não sê-lo e não ser capaz de amar é infinita tristeza. A comunidade é a casa do amor: ela traduz na ordem concreta dos dias, a verdade da história do amor. Não é uma, mas muitas as gratuidades que se requerem para fazer um caminho comum; a cada um o incumbe a urgência de começar a amar. Quem pense que não tem necessidade dos outros ficará na solidão de uma vida sem amor; quem se põe a aprender do outro e se faz mendigo de amor constrói vínculos de paz e faz crescer ao seu redor a comunhão com todos. Isto expressa já de algum modo que grande é a fatiga que supõe amar: se tivéssemos que ter em conta o vasto mundo das relações humanas, a evidência do fracasso do amor apareceria até inquietante. Ainda que tenha sido feito para amar, parece ser que o homem não é capaz de fazê-lo; ainda que tenha sido originado pelo amor, parece ser que já não é capaz de suscitar amor. Quem fará o homem capaz de amar? Nos tornamos capazes de amar quando nos descobrimos amados previamente, envolvidos e conduzidos pela ternura do Amor para um futuro, um futuro que o amor constrói em nós e para nós: fazer este descobrimento é crer e confessar a Trindade do Deus cristão. A fé vem a perscrutar nas profundidades do mistério, na escola do santo relato da cruz e da ressurreição do Senhor, o eterno manar do Amor na figura do Pai, princípio sem princípio, gratuidade pura e absoluta, que dá começo a tudo no amor e não se detém, nem sequer diante da dolorosa rejeição da infidelidade e do pecado. E junto ao eterno Amante, conta a fé do Filho, o eternamente Amado, que com sua vida na carne, vivida em obediência filial, nos faz capazes de pronunciar o «sim» da fé à iniciativa da caridade de Deus. Junto com o Amante e com o Amado contempla a fé a figura do Espírito Santo, que une a ambos com o vínculo do Amor eterno e, ao mesmo tempo, abre-os ao dom de si, ao generoso êxodo da criação e da salvação: oel Espírito Santo, êxtase de Deus, vem para libertar o amor, à fazê-lo sempre novo e radiante (B. Forte, Nella memoria del Salvatore, Cinisello).

 

 

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