ESTUDO BÍBLICO SEMANAL: 1ª semana do advento ano A
ESTUDO BÍBLICO –COMUNIDADE PAZ E BEM
1ª Semana do Tempo do Advento ANO 2019
SEGUNDA-FEIRA
Isaias 2, 1-5 – Mateus 8, 5-11
UM POVO CONGREGADO QUE INAUGURA UM NOVO TEMPO
“Casa de Jacó, andando e avançando, caminhemos à luz de Yahveh”
Iniciamos o tempo do Advento com o propósito de dedicar um pouco mais de espaço à escuta da Palavra de Deus, como o canta o povo que sobe alegre a montanha do templo: “Vinde, subamos…para que Ele nos ensine seus caminhos e assim andemos em suas veredas” (Is 2,3).
A voz do profeta Isaías, pregador da esperança no século VIII a.C, ressoa para renovar as consciências e dar uma nova visão do projeto de Deus no mundo.
Suas profecias nos educarão durante o advento para viver o itinerário que vai da escuridão à luz, isto é, das trevas do medo, sofrimentos e angústias que causa o mal na humanidade, à revelação luminosa da obra poderosa que Deus realiza com a chegada do Messias.
Um rápido olhar ao meio em que vivemos, nos faz ver que um dos grandes anseios da humanidade é a paz. O mundo no qual vivemos é cheio de conflitos.
Sobre esta obscuridade da guerra, da divisão, da violência, da destruição de pessoas e do meio ambiente, a palavra profética de hoje lança toda sua luz de esperança: “Vem povo de Jacó, caminhemos à luz do Senhor!” (v.5).
Vejamos alguns aspectos destacados desta profecia isaiânica:
- Uma nova convocação da humanidade para pensar a história de outro ponto de vista (v.2-3a)
A profecia isaiânica abre ante nós uma formosa paisagem: a de um monte firme que domina todo o panorama, onde, de repente, ser notam rios humanos que o escalam em procissão por todos os lados (v.2).
Os peregrinos não são unicamente israelitas (ver o v.5), mas a humanidade inteira “Confluirão a ele todas as nações e vinham povos numerosos” (vv.2c.3a).
O ponto de convergência de todo este movimento é Sião, coroado pelo Templo do Senhor. Desde esta altura geográfica e espiritual se vê o mundo com os olhos de Deus e não a partir dos interesses humanos egoístas.
- O canto dos peregrinos: o desejo de aprender a Palavra de Deus (v.3)
Inicia então a canção, com a qual os peregrinos se animam uns aos outros no caminhar: “Venham, subamos…” (v.3). A frase expressa o propósito da viagem, ou melhor, o sentido da irresistível atração que este monte exerce sobre eles.
O caminho de subida está impulsionado pelo desejo de ser educado por Deus e de iniciar uma nova vida segundo seus critérios, escutando e vivendo sua Palavra. Isto é o que o profeta chama “seguir seus caminhos”.
- As divergências se tornam convergência no projeto comum do crescimento de todos em fraternidade (v.4)
Chegamos ao momento sublime em que se vê o efeito da subida para aprender a Palavra de Deus: os rios humanos se convertem então em um só povo que reconcilia suas divergências.
Há um duplo movimento: A atração para Deus, expressada na subida à montanha, se transforma logo em irradiação para o mundo; e as pessoas que descem a montanha passaram por uma mudança que projetam por onde quer que vão. Agora se sente povo em comunhão, que à diferença da antiga Babel (Gn 11,1-9), está unido:
- pela experiência de Deus, vivida na obediência à sua palavra, e não pela soberba humana, que exclui a Deus do projeto de vida;
- pela compreensão entre si e não pela fragmentação dos que obstinadamente defendem seus próprios projetos;
- pela paz e não pelas alianças para a guerra; e
- pelo crescimento de todos por igual e não pela competência que gera dominações.
No monte se tornam comunidade. Para eles, a história se converte, então, em um caminho para a plenitude de vida, que supera as contradições históricas do extermínio entre os adversários. É o caminho de uma comunidade que trabalha, conjuntamente, para produzir os recursos que necessita para o seu bem-estar.
Este povo, unido pela experiência da Palavra caminha, como em uma grande marcha da vida para uma nova ascensão que já não é geográfica, mas espiritual. Sob o juízo de Deus, fazem alianças entre si (v.4a), já que encontram motivos para entender-se e gerar projetos comunitários que promovem a vida e o desenvolvimento de todos (v.4bc). A justiça de Deus gera a paz.
O profeta descreve firme a nova realidade da comunidade, apontando duas grandes ações:
(1) “Espadas” se tornam “arados” e “lanças” “foices”. Isto é, os instrumentos de extermínio, de morte, se transfornam em instrumentos de trabalho comunitário da terra que geram o alimento que sustenta a vida. Os arados são úteis para os trigais e as podadeiras para as vinhas, de onde vem pão e vinho, alimentos básicos para a vida e a comunhão familiar;
(2) “Não se levantarão contra… Não se exercitarão na guerra”. Isto é, concordam em não destruir-se mais entre si mesmos, nem de dar espaço aos campos de treinamento militar.
Este é o novo povo que já desde o Antigo Testamento, começou a cantar: “Caminhemos à luz do Senhor” (v.5). Um povo que não caminha à luz dos interesses mesquinhos que estão na base de todas as confrontações, mas, à luz do projeto de Deus que é o crescimento comunitário baseado na irmandade.
E esta profecia se realiza em Jesus (Mateus 8,5-11).
A comunidade, que só é verdadeira quando se constrói sobre a base da Palavra e os projetos comuns de vida, é um dom que Deus quer fazer-nos hoje em Jesus, o Messias. Ao redor de Jesus e da sua Palavra é possível tal comunidade.
O Evangelho que lemos em Mt 8,5-11, nos apresenta a busca de Jesus por um centurião romano, primeiro passo firme de alguém que inicia a subir o monte da justiça e da paz. Trata-se de alguém que vem de longe em todos os sentidos, afeito ao jogo, à guerra e ao jugo imperial dos povos, aproveitando-se dos outros. O centurião é um peregrino que vem em busca da palavra de Jesus que cura. Diante de Jesus, inclusive, supera a divergência entre patrão e empregado. Com o passo da fé peregrinou até o centro de convergência que é o Reino dos Céus, que irrompeu na pessoa e no ministério de Jesus.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:
PRIMEIRA REALIDADE MESSIÂNICA: um povo que se volta a escutar à Palavra para deixar-se congregar e guiar pelo projeto de Deus; um povo onde cabe todos os povos e reúnem-se todas as diversidades; aprende a linguagem comum da fraternidade e da solidariedade.
- Como é minha vida comunitária na família, no trabalho, na comunidade? Posso dizer que o ambiente no qual vivo meus relacionamentos é o de uma comunidade messiânica?
- O Advento prepara para a acolhida da “Palavra” que se “fez carne” em Jesus. Relendo o texto, que busco em Deus e em particular em Jesus? Que sucede se todos os buscam?
- Em nossa sociedade há gente que morre de fome, porém, ao mesmo tempo se investe grandes somas de dinheiro em armas. Que ensina a profecia de hoje a respeito?
- Que me corresponde ofertar para que orientemos este mundo globalizado e neoliberal a uma comunhão das economias e uma transformação do serviço social, das tecnologias, de modo que haja recursos para o crescimento de todos e ninguém morra de fome?
TERÇA-FEIRA
Isaias 11,1-10 – Lucas 10,21-24
Segunda realidade messiânica: o Messias que vem
“Sairá uma rama do tronco de Jessé e um rebento de suas raízes brotará”
Imagine você o formoso espetáculo de uma vaca e uma onça que se tornam comadres ou do lobo e o cordeiro que, depois de longa inimizade, chegam a serem amigos?
A visão profética de Isaias que lemos hoje tem a ousadia de ver o mundo assim: os velhos inimigos, dos quais, alguma vez, pensamos que jamais chegariam a mudar de atitude, de repente, os vemos fazerem-se amigos, buscando uma sã e frutífera convivência. É o sonho da reconciliação, da paz definitiva, da humanidade querida por Deus.
Este sonho o realiza o Messias: “Sairá uma rama do tronco de Jessé” (v.1). Nele renasce – depois de longo tempo de aridez, pelo inverno ou talvez por uma tremenda seca – como uma árvore, uma nova humanidade. No Messias, Deus retoma, desde a raiz, seu projeto sobre o mundo. Sua vinda nos devolve a esperança do fim das guerras e inaugura um novo projeto de humanidade!
Como podemos contemplar sua vinda? Sigamos o fio da profecia de Isaias.
O v.9 nos dá uma pista que se liga muito bem com o convite que recebemos ontem para subir o Monte Sião: “Nada fará dano, ninguém fará mal em todo meu monte” (v.9). Do monte consagrado pela presença de Deus, em comunhão com Ele, se vê como faz surgir o mundo novo que, às vezes, não conseguimos vislumbrar.
Subindo junto com o profeta Isaías contemplamos, extasiados, este espetáculo:
- sobre a terra semiárida da Palestina a paisagem vegetal, cósmica e humana se transforma: primeiro um tronco brota (v.1);
- Logo sopram os ventos dos quatro pontos cardeais; estes já não passam direto sobre a árvore, mas pousam sobre o rebento comunicando-lhe sua vitalidade (v.2);
- com esta força o rebento se levanta e faz justiça aos pobres da terra (vv.3-5);
- Então, a justiça gera paz e reconciliação entre os irreconciliáveis da terra (vv.6-9); e
- finalmente, o rebento (que é o Messias), e não só o monte Sião, se torna estandarte que responde a busca de todos os homens da terra (v.10).
Detenhamo-nos em cada um desses quadros:
- Do tronco de Jessé brota um rebento (v.1)
A promessa de Deus vivifica a cepa da história da salvação. As origens do Messias descendente de Davi são humildes, porém, tem que ver nele a obra de Deus. A velha árvore não morreu, a seiva, que é a fonte da vida, é perene, ainda quando não se note, ela sempre tem estado ai e Deus a faz tornar a manifestar-se.
- Os quatro ventos da terra pousam sobre o rebento de Davi (v.2)
Os ventos simbolizam o Espírito de Deus que unge o Messias. Trata-se do Espírito que fez possível a criação (Gn 1,1-2) e que suscitou líderes para Israel (Nm 11).
Seu dom é quádruplo, número que se refere a uma realidade completa:
- É o próprio Espírito do Senhor.
- É Espírito de sabedoria e inteligência: este o dá o Messias capacidade de ver a realidade como Deus a vê, com olhar de justiça e verdade; é o primeiro que necessita um líder;
- É Espírito de prudência e valentia. Trata-se do critério para o bom governo e do valor para empreender grandes ações, que implica sua alta responsabilidade, já que não é suficiente ver o que tem de fazer, mas, que é necessário, sobretudo, pôr-se em ação levando adiante os projetos;
- É Espírito de conhecimento e temor do Senhor. O líder age com uma atitude de humildade profunda ante Deus, pois é o Senhor que, realmente, sabe e tudo pode.
- Surge no meio do povo um líder íntegro e justo (vv.3-5)
Quando entra em ação, o Messias se põe do lado do desprotegido, daquele a quem lhes são negados seus direitos. Seu critério de juízo não são as tagarelices. Ele, com a força de sua palavra, porá em evidência o culpável e fará justiça, pondo em seu devido lugar os que tornam impossível a paz, os que sempre estão gerando divisão e discriminação, pois atuam segundo seus interesses. Uma vez que vence, reveste-se solenemente com as insígnias reais de justiça e verdade: “A Justiça será o cinto de seus rins e a Verdade será o cinturão de seus ombros”.
- A não violência se converte em um estilo de vida dinâmico no qual se tecem relações construtivas entre os antigos e ancestrais inimigos (vv.6-9):
Este novo modo de vida que já não se prende a impulso natural, ou domínio sobre o outro, mas de uma força interna que leva a respeitar e amar, promovendo a vida, é simbolizado na reconciliação dos animais selvagens e domésticos:
- Os animais predadores estão dispostos a mudar de dieta para não causar dano; e
- No meio deles, o homem, cuja vida está sempre ameaçada pelos animais selvagens, aparece como criança débil e indefesa, ante quem as feras e, inclusive, a mais indomesticável de todas, a serpente, se tornam mansas e partilham confiantes seus espaços como num jogo infantil.
Sem mudar-se da montanha, ao fim, a profecia amplia, progressivamente, a visão, como quando se contempla a amplitude do oceano, para anunciar a reconciliação do mundo: entre os animais selvagens; entre, os não menos selvagens, os homens; e, finalmente, entre os homens e Deus: “Ninguém fará dano, ninguém fará mal… porque terra a estará cheia do conhecimento de Yahweh”
- No centro de tudo está glorioso o Messias, bandeira que buscam os povos (v.10)
A profecia não perde de vista a pessoa do Messias, a “raiz de Jessé”. Ele aparece visível como uma “bandeira”. Em uma bela transposição de símbolos, a “raiz” aparece como “bandeira” militar, expressão do vigor e anúncio de sua vitória sobre o mal. Junto ao Messias, os povos não combatem entre si, mas se unem à única batalha que vale a pena levar unidos: a promoção da vida e a fraternidade.
Também, ao fim, a profecia nos faz ver como os pagãos que buscam a Deus no alto do monte Sião (ver a leitura de ontem), agora o buscam, de modo concreto, na “raiz de Jessé”, o sucessor de Davi. A “morada gloriosa” do Messias é o ponto de encontro de todas as nações que buscam Deus e sua justiça. Nesta “morada” há paz e descanso, pois só n’Ele encontram repouso e realização e plenitude todos os projetos humanos.
E a profecia se realiza em Jesus (Lucas 10,21-24)
Jesus é o Messias que realiza esta profecia. Reconhecemos isso num detalhe do Evangelho: sobre Ele repousa o Espírito: com o dom do gozo (10,21); e do conhecimento de Deus (10,22) Os pequenos, em sua simplicidade, se abrem à Palavra que traz o “conhecimento” de “quem é o Pai” e “quem é o Filho”, a qual lhes chega pela boca dos pregadores. Na Boa Nova de Jesus se realiza o que Isaías anunciou mas não viu, o que os governantes da terra desejaram e desejarão gozar, porém, não conseguiram e jamais conseguirão.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:
A SEGUNDA REALIDADE MESSIÂNICA: a pessoa do Messias. Nele tudo renasce desde a raiz e todas as realidades humanas se ordenam em função de seu projeto em um âmbito de irmandade proposto por Deus. O caminho da reconciliação que devolve ao mundo sua vitalidade para crescer juntos inicia com o “conhecimento do Senhor” que traz o Messias.
- Que me dizem os cinco passos da profecia de Isaías? Como se relacionam com o despertar, no mais profundo de mim, das esperanças muitas?
- Que retrato faz a profecia da realidade que estamos vivendo a nível nacional e internacional? Que relações estão rotas em minha vida?
- Interesso-me por restabelecer as relações difíceis neste Advento e Natal? Qual o ponto de partida que propõe a profecia? Nesta árvore do mundo que ramas têm murchado?
- Qual a boa noticia que anuncia a promessa profética e de que maneira Jesus a realiza?
“A fidelidade cristã, nossa fidelidade, consiste simplesmente em proteger nossa pequenez, para que possa dialogar com o Senhor. Custodiar nossa pequenez. Para isto, a humildade, a mansidão, são importantes na vida do cristão, pois é uma proteção da pequenez, à qual o Senhor se agrada em mirar. E será sempre o diálogo entre nossa pequenez e a grandeza do Senhor” (Papa Francisco, homilía 21.01.14
QUARTA-FEIRA
Isaias 25,6-10a – Mateus 15,29-37
A terceira realidade messiânica: Os sinais do Messias
“Este é Yahweh em que esperávamos; regozijamos e alegramo-nos por sua salvação”
O monte Sião é o lugar das visões e dos amplos horizontes, onde se capta o que Deus faz e quer fazer por seu povo, para o qual converge todas as nações em busca do projeto de “comunidade” (profecia de antes de ontem) e no qual o Messias faz brotar uma nova vida na justiça e na fraternidade (profecia de ontem), se converte hoje no cenário de um grande banquete no qual:
- Deus, apresentado como rei, reparte seus melhores dons (25,6-8);
- A comunidade salva entoa um cântico de vitória ao Senhor (25,9-10ª).
A obra salvífica de Deus e a liturgia da comunidade se unem em uma nova e maravilhosa cena bíblica. O tema: os sinais dos novos tempos que traz o Messias.
Vejamos na leitura profética de hoje.
- O convite à festa (v.6)
Deus se apresenta com a grandeza de um rei, que em sua magnificência, durante a festa de sua entronizarão, faz gala de sua generosidade:
- a lista dos convidados não tem limites: “todos os povos”; e
- o menu é variado, abundante e da mais alta qualidade: os manjares são “frescos” e “suculentos”, os vinhos são “velhos” e “selecionados”.
A citação, como já dissemos, é no monte do Senhor, ali onde o povo se fez comunidade e onde, no conhecimento do Senhor, se começou a tecer a paz.
Agora está se dando um passo para diante: Deus convida a todos os homens a fazer da vida uma festa e para isso oferece seus dons em qualidade e abundancia. Deus responde às necessidades humanas e não de qualquer forma. Como o mostram os detalhes desta cena de banquete, todos ficarão satisfeitos.
- Os presentes da festa (vv.7-8)
É como antigamente: uma vez iniciada a festa, o anfitrião passa entre os convidados repartindo seus presentes. Assim também é Deus. As imagens da comida que não é racionada, junto com o fato que tem em abundância para todos, contrasta com o espetáculo habitual de uma humanidade que passa fome e os bens se repartem desigual.
Deus vem ao encontro das esperanças humanas e já muito mais longe do que em um primeiro momento se poderia aguardar. Ele não só oferece bens, mas seus dons estão relacionados consigo mesmo e estes eliminam as necessidades mais profundas do homem.
É tão profunda a ação de Deus que a profecia apresenta o efeito de seus dons com a repetição do verbo “aniquilará”. Será aniquilada: (1) “o véu que cobre a todos os povos”; e (2) a “morte definitiva”.
Os presentes de Deus têm valor incalculável e são:
- O dom de sua própria presença e manifestação (v.7).
Com a imagem de um “véu” que se tira, se quer dizer que se descubra o “rosto” de Deus de maneira que possa ser conhecido. O gesto representa um convite à amizade baseada no conhecimento e ao gozo da contemplação. Nada pode ser maior que a relação, em permanente proximidade, com Deus, fonte de todo bem.
- O dom da vida eterna (v.8).
Do “véu” de Deus se passa ao “véu” do homem. Este segundo “véu” representa o vestido de luto que cobre os que estão duelando. Pois bem, Deus o arranca porque ao conceder-lhe a vida plena por meio da comunhão com Ele, o homem já não tem motivos para chorar: “Enxugará o Senhor Yahweh as lágrimas de todos os rostos”. E não se trata de consolos passageiros, porque a morte, a primitiva maldição (ver Gn 3), a maior contradição na história do homem, se aniquilará para sempre.
- Os cânticos da festa (25,9-10ª)
Uma vez feita a refeição e recebidos os dons, a comunidade festiva irrompe, efusivamente, em canções alegres. Uns e outros se convidam a cantar.
Celebra-se a vitória de Deus sobre os inimigos num difícil combate, representados, simbolicamente, no povo de Moab (v.10b). Neste inimigo, real na historia de Israel, se simboliza tudo o que causa tristeza, dor e luto no povo. É sobre estas realidades que se proclama a vitória de Deus e de seu povo.
A letra da primeira canção tem como tema “a salvação” e diz em poucas palavras, que quem era a esperança há sido por fim a salvação de seu povo (25,9). A comunidade tem clara consciência do que é a salvação.
Uma nova imagem reponta ao final da letra da canção e dá um novo colorido: “a mão de Yahweh” (25,10ª). Trata-se da “mão” poderosa do Deus dos exércitos (“Yahweh Sebaot”) que combate contra mil na batalha.
Os fatores geradores da fome, da dor, da morte e da tristeza do povo são muitos, mas não são maiores que Deus. Curiosamente a ambivalência do símbolo mostra, ao mesmo tempo, que a mão que castiga o inimigo é também a mão terna, paterna e protetora de Deus que cuida com amor de seu povo.
Esta profecia se realiza em Jesus, o Messias (Mateus 15,29-37)
O relato da multiplicação dos pães e dos peixes, ocorre também em um monte (v.29). Jesus preside a festa da vida que muda o destino de uma humanidade que sofre (“coxos, aleijados, cegos, mudos e muitos outros”, v.30), entre os quais estão os que passam fome (vv.32-37). A quantidade e a qualidade dos dons de Jesus são evidentes.
Frente a esta realidade humana, Jesus dá passos concretos: (1) cura e alivia a dor do povo; (2) alimenta “uma multidão muito grande” no deserto; e (3) faz recolher as sobras da ceia para que tenha sempre comida para todos, inclusive paraos que não estiveram na ceia.
Tanto na profecia como em sua realização em Cristo, prima o que Deus “faz” por nós. Jesus transforma a vida humana a fundo, curando as penas de cada um e formando comunidade, como um pastor que cuida e congrega seu rebanho.
Quando pomos a vida sob o cuidado de Jesus fazemos possível o dom maior de toda Bíblia, profetizado por Isaías (Is 25,8): “Consumirá à Morte definitivamente. Enxugará o Senhor Yahweh as lágrimas de todos os rostos, e tirará o opróbrio de seu povo de sobre toda a terra”. Deste modo a vinda do Senhor tem sabor de Páscoa.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:
Primeiramente vimos a comunidade messiânica, em seguida se fez uma apresentação do messias e hoje nos colocamos frente aos sinais do messias. Em anúncio profético revive nossa esperança, resgata nossos ideais mais altos, nossos desejos mais profundos: uma vida sem dor e sem lágrimas, um mundo no qual ninguém passa fome nem falta o essencial, uma humanidade que permite celebrar a festa da vida. Esta esperança começa
a fazer-se concreta no compromisso: Sejamos como Ele, façamos amigos e partilhemos,
de maneira que não falte o pão em nenhuma mesa!
- Minha vida é uma continua festa? Tenho motivos para celebrar? Há lutos em minha vida?
Qual é meu canto de festa?
- Que me que convida a viver o Senhor graças a sua vinda? Pareço-me com Senhor no compartir
com os demais?
- Que acontece com as sobras das mesas abundantes?
“Nossa felicidade hoje parecia ser de pressentimento que Deus tem que mudar. É preciso dar a Deus, não o rosto do faraó, de um patrão que reprova os filhos da história, mas que é necessário reencontrar, o melhor ainda, redescobrir, a Deus como um Amor que está escondido dentro de nós, como um Amor frágil, um amor desarmado” (Maurice Zundel).
QUINTA-FEIRA
Isaias 26,1-6 – Mateus 7,21.24-27
Atitudes ante a vinda do Senhor (I): Construir nosso projeto com base no projeto de Deus
“Confiai sempre em Yahweh, porque em Yahweh tens uma Rocha eterna”
Os três primeiros dias desta semana nos conduziram neste itinerário: o povo messiânico, a pessoa e os sinais do Messias em meio a seu povo. Nestes três dias que vêm, as leituras nos levam a um novo itinerário que enfatiza as atitudes a tomar ante a vinda do Senhor.
A profecia de hoje nos introduz numa nova série de três lições de “Advento” e nos inculca as atitudes que devemos adotar ante a vinda do Senhor a nossas vidas. Todas elas estão relacionadas com a fé e nos exigem compromissos concretos.
Só assim poderemos fazer do “Advento” o exercício da espera ativa de um Deus salvador que vem a nossos encontro.O ensino de hoje é apresentado pelo profeta Isaías mediante a didática de um canto que há que se aprender. O interessante é a dinâmica interna que nos apresenta.
- Aprender a segunda canção
“Naquele dia se cantará este cântico na terra de Judá” (v.1ª)
Partamos desta realidade humana: o problema não é tanto o alcançar uma meta, mas conseguir que os ganhos não se desperdicem. Com este propósito o profeta Isaías, depois da canção da vitória que celebrava as primeiras emoções, ensina, agora, uma segunda canção ao povo.
Os assuntos de Deus, a espiritualidade, não são questões de emoções passageiras, mas de solidez de vida. A primeira canção celebrava a obra salvífica de Deus e expressava a felicidade porque as coisas saíram bem. De outro lado, a segunda canção trata de inculcar no povo o compromisso que lhe corresponde. É preciso aprendê-la de memória e praticá-la no exercício cotidiano da fé.
- Da mão poderosa e misericordiosa de Deus aos pés do peregrino:
“Ele abateu a cidade inacessível… a pisam os pés de pobres e de débeis” (v.5-6).
A descrição da cidade (v.2) e o convite a abrir as portas (v.3), indica que se trata de uma canção de caminhantes que chegam a sua cidade.
O profeta se inspira na cena dos peregrinos, talvez antigos exilados, deslocados de suas terras e casas, despojados de seus bens básicos, que regressam contentes ao seu espaço vital.
A volta não foi fácil, para conseguir tiveram que enfrentar e superar adversidades. O primeiro coro alegre, entoado ontem, não deixa de ressoar e pauta a nova composição:
- Virtualmente se traça uma espécie de eixo vertical que inicia na mão poderosa de Deus (25,10) e culmina na terra, nos pés desnudos, de humildes peregrinos, pobres mendigos que participam da vitória operada por Deus (26,6); e
- Ao deslocamento horizontal do caminhante se justapõe o deslocamento vertical que expressa a ação de Deus (26,5).
A ação de Deus (“derrota”, “faz cair”, “abaixa”, “faz tocar”) se conjuga com a ação do homem (“a pisam os pés de pobres”). Na medida que caminham, com seus passos firmes os humildes vão afirmando a vitória. Mas, contra o que ou a quem é a confrontação?
- Dois projetos em conflito: a cidade do homem e a cidade de Deus
O canto está sendo entoado por um solista e é ele quem faz a descrição. O julgar expõe ante tudo o que capta no fundo espiritual do cenário. Para isso se vale da comparação entre duas cidades: a cidade santa (26,1-4); e a cidade rebelde (26,5-6).
O cantor inverte a ordem: primeiro exalta a vitória da cidade de Deus e logo conta o fracasso da cidade pérfida. A segunda cidade vem ao chão, enquanto que a primeira tem garantida sua firmeza.Em ambas as cidades se destaca a “muralha”. Na Antiguidade uma muralha dava identidade à cidade, não só externa, mas também internamente, ou seja, garantia a unidade e a defesa da mesma, a muralha é o símbolo do projeto de sociedade que ali se quer construir.
Por isso, com a repetida referência às muralhas, todo o canto aponta à exaltação da solidez do projeto de Deus acolhido pelos humildes, enquanto que em um segundo plano se nota a inconsistência do projeto dos orgulhosos que creem poder fazer tudo exclusivamente com seus próprios esforços.
- Características da cidade de Deus: “Temos uma cidade forte” (v.1b-4)
A cidade santa não é qualquer aglomerado, mas uma construção unificada, idealizada por um único arquiteto que para sua proteção: “pôs muro e antemuro” (26,1b). O mais extraordinário é que, de repente, se vê uma transposição metafórica que faz do coral de pedra e baluartes de defesa militar, uma imagem do próprio Deus como salvador de seu povo.
Num dado momento, a construção, refúgio é o de menos e o que sobressai é a comunidade reunida por Deus, que se identifica com Ele e seu projeto. O canto segue: o rio humano de peregrinos chega então às portas do Templo, coração da cidade, e a procissão inicia seu rito de entrada. Nele o povo declara seus compromissos. Trata-se, sobretudo, de três atitudes a se viver no cotidiano (26,2b-3a):
- “Gente que guarda a fidelidade”: trata-se da constância no caminho do Senhor;
- “Gente de ânimo firme”: trata-se da “força de vontade”, para manter a fidelidade; e
- “Gente que conserva a paz”: trata-se dos esforços por manter o sempre difícil equilíbrio nas relações.
Põe de relevo o esforço que realiza o homem. Porém não se trata de algo que provem somente das próprias forças, mas que está baseado na confiança em Deus.
- A chave de tudo é a confiança em Deus: “Confiai em Yahweh…” (v.4)
A confiança em Deus, que é um modo de expressar a experiência da fé, o mais importante e é garantia das três características de um povo justo. Por isso se fala nestes termos: “Porque em ti confio” (v.3b). Não percamos de vista que este povo, humilde, porém reto, que redescobre seu projeto na historia à luz de sua fé, é o que logo exalta Maria em seu Magnificat (ver Lc 1,50-53).
A comunidade dos humildes não está só, seu alicerce é Deus mesmo, que é Rocha forte e irremovível, não muda de idéia, pois é sempre fiel. A firmeza do projeto de justiça e fraternidade vem da solidez de Deus. Não há maior nem mais seguro apoio. A atitude de base está clara: a esta cidade-comunidade, onde se realiza o sonho de Deus para seu povo, só se entra mediante a prática fiel de seus ensinos e a confiança total n’Ele. Só os que estão dispostos a ser justos podem atravessar o umbral de suas portas.
E esta profecia se realiza em Jesus (Mt 7,21.24-27)
A parábola que contrapõe a casa construída sobre a rocha com a construída sobre a areia (Mt 7,24-27), traslada para a pessoa de Jesus, o MESSIAS, a profecia isaiânica. Como ensina Jesus em Mt 7,21, não basta a oração vocal, é preciso o compromisso de viver segundo o querer de Deus (fidelidade). É no seguimento do Mestre, isto é, pela escuta e a prática de seus ensinamentos, que se forma a nova e definitiva comunidade, o povo justo que inaugura o mundo novo. Esta é a verdadeira Rocha que sempre se sustentará.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:
A vinda do Senhor exige atitude da fé: acolher sua Palavra e fazê-la parte de nossos projetos, pois só n’Ele nossa vida tem sentido. A motivação mais profunda de nossos esforços deve ser permanecer fieis aos projetos de Deus, fundados na fé-confiança nele. Esta confiança se concretiza em compromissos.
- Qual é meu projeto de vida? Está identificado com o projeto que Deus tem para mim?
- Qual o grau de solidez de meu caminho com o Senhor? Sobre que se apóiam meus esforços na vida? Que busco com eles?
- Nestes dias em que a paisagem urbana brilha com enfeites de Natal, como relaciono esta realidade com a profecia sobre a cidade dos pobres de Deus? Que compromissos me pede o Senhor para eu poder contribuir na construção de seu projeto de cidade?
SEXTA-FEIRA
Isaias 29,17-24 – Mateus 9,27-31
Atitudes ante a vinda do Senhor (II): Aprender a “ver” com os olhos da fé
“Aquele dia os surdos ouvirão palavras de um livro, e desde a treva e desde…”
Nestes dias o panorama urbano se transforma com os arranjos natalinos das ruas e casas; um ambiente delicioso se começa a sentir.
O natal que se aproxima nos presenteia um formoso espetáculo para a vista e nos alegra o coração.
O profeta Isaías nos oferece uma pista para que todos nós busquemos, compreendamos e participemos em uma transformação mais profunda realizada por Deus. Para isso nos ensina a ver o mundo com os próprios olhos de Deus.
- O sinal da transformação externa da natureza (v.17)
O profeta observa a lenta, porém irresistível transformação da natureza: “Dentro de muito pouco tempo a seiva do Líbano se converterá em horto e o vergel serão como bosques” (29,17).
A anotação “dentro de muito pouco tempo” aponta um tríplice ensino:
- que Deus tem uma pedagogia para salvar o homem e sua historia.
- que a demora dos tempos da espera da realização das promessas não deve matar os sonhos, mas acrescentar o desejo: Já vem!
- que há que observar as etapas da ação de Deus e acompanhá-las. Notemos no texto de hoje um crescimento progressivo que o profeta observa paciente e cuidadosamente: a estepe, o horto, a seiva; isto é, uma imensa terra improdutiva se transforma pouco a pouco em uma grande explanada fértil, expressão de vida em abundancia.
Com frequência tendemos a desesperar-nos porque não vemos ainda realizados nossos sonhos. Pois bem, o profeta inculca em seu povo a certeza de Deus e o ensina a alimentar sua esperança com a observação dos sinais que há na historia, aos quais as vezes não pomos atenção.
- Brota uma nova sociedade que inclui a todos e que promove a vida (vv.28-21)
Passando da observação da natureza ao mundo das pessoas, Isaías transpõe o milagre da criação e passa ao ressurgimento de uma nova sociedade.
Nota-se como a vida se restaura em suas diversas dimensões:
- Cura de deficiências físicas e espirituais, sinalizadas na cegueira e surdez (v.18)
Se voltarmos atrás algumas páginas do livro de Isaías, veremos que em 6,9-10 (texto citado por todos os evangelhos) o Senhor havia castigado o povo por sua má vontade em seguir seus caminhos, com a incapacidade de captar a revelação divina.
Nesta profecia que estamos lendo, o castigo é revogado: “Aquele dia os que estiverem surdos ouvirâo quando se lê a Escritura, e verão os cegos…”. Quer dizer que, nestes novos tempos, todo o povo, começando pelos mais simples, começará a entender e a pôr em prática os projetos de Deus e os critérios de vida que Deus propõe. Ou seja: todo o povo será capaz de ler, compreender e de viver os ensinamentos da Bíblia.
- Superação da pobreza (v.19)
Uma vez que o povo assuma seu projeto comunitário no projeto de Deus começará a superar penalidades causadas pela falta de recursos econômicos, a desigualdade social e a exclusão. A felicidade será imensa: “Os que sofrem voltarão a alegrar-se com o Senhor, os pobres gozarão com o Deus Santo de Israel”.
- Restabelecer-se-á a justiça (vv.20-21)
Neste novo tempo da história humana já não haverá espaço para a tirania nem abuso de poder, pois os causadores das desgraças e do desequilíbrio social serão julgados: “foram eliminados os que se desvelavam por fazer o mal, os que faziam falsas denuncias e no tribunal impediam a defesa e afundavam sem motivo o inocente”.
- Dignidade, oração e evangelização dum povo que se fez comunidade (vv.22-24)
Ante o quadro espetacular da nova humanidade, apresentada nos versículos anteriores, aparece um povo que recobra o ânimo e fortalece sua fé:
- Eleva a auto-estima. Sentem-se fortes ante os demais povos, pois o opróbrio a nível espiritual (contradição interna de não entender seu próprio Deus) e social (pobreza e tirania) foram superados definitivamente: “Não se envergonhará Jacó, nem seu rosto empalidecerá” (v.22).
- Proclama o poder do Deus da vida. Agora, ao contrário, o povo se sente forte para confessar que Deus é poderoso (v.23). E o profeta Isaías tem uma prova. Como o Senhor numa ocasião lhe havia dado um filho, em sinal de seu amor e sua glória (8,3), todos os israelitas, ao ver seus filhos entenderão a obra do Deus da vida e da história. De fato, a história da salvação, desde os patriarcas até agora, é obra das mãos de Deus. Quem passa a ver a vida a partir desta profecia isaiânica saberá reconhecer, precisamente nesta história às vezes tão obscura, a santidade de Deus, sua transcendência e o rumor discreto de seus passos em todos os aspectos de nosso cotidiano.
- Evangeliza os que duvidam do projeto de Deus. Finalmente, o profeta vai mais longe: inclusive a gente incrédula – recordemos o povo que criticava a Deus durante o caminhar pelo deserto no êxodo – ao ver tudo isto saberá tirar boas conclusões: “E por fim compreenderão os desorientados, e os que protestam aprenderão a lição” (29,24).
Jesus é o MESSIAS que realiza esta profecia (Mt 9,27-31)
Jesus realiza as palavras de Isaías quando abre os olhos aos cegos. Ele leva o homem a ver a obra de Deus na historia com os olhos da fé. Para isso, o primeiro que cura é a fé, por isso pergunta: “Crês que posso fazer isso?” (v.28); e em seguida agrega: “Faça-se em vós segundo vossa fé” (v.29).
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração
Nestes dias cantamos “Vem Senhor não tardeis!”. Mas, a que vem o Senhor? A cegueira que descrevem as leituras de hoje tem tudo a ver com a incompreensão do projeto de Deus que está na Bíblia. A “lectio divina” deve levar-nos a aprender a caminhar, aos poucos, em sintonia com Deus para que sua obra no mundo, cujo objetivo é a vida, se realize plenamente com nossa colaboração. Fazer isto é aprender a ver com os olhos da fé, para poder seguir na direção que, de fato, constrói a historia e a sociedade.
- Há sinais de vida em minha historia pessoal, em minha comunidade, em minha nação?
- Olhando tudo que falta por fazer para que esta sociedade seja a que Deus e nós sonhamos, tenho a paciência do que sabe esperar e a fé do que sabe ver a fundo? Que me pede o Senhor para que se realize seu projeto?
- A partir da profecia de Isaías, de que necessitamos ser curados neste Advento para que o Natal seja realmente celebração da vida?
“Deus nos ama na medida em que temos necessidade dele. Nos ama por causa de nossos sofrimentos, de nossa pobreza, de nossa fé e sede dele, de nossa ânsia por ser melhores” (P. Monier)
SÁBADO
Isaías 30,19-21.23-26 – Mateus 9,35-10,1.6-8
Atitudes ante a vinda do Senhor (III): BUSCAR O PERDÃO
“Será a luz da lua como a luz do sol… o dia que Yahweh sarar a ferida de seu povo”
Todas as profecias anteriores nos tem falado da transformação que Deus operou, está operando e seguirá realizando até sua plenitude na história humana. Hoje aparece na profecia de Isaías o que podemos considerar como a raiz de toda a força transformadora do mundo: o perdão.
O núcleo deste anúncio está nas palavras finais: “Será a luz da lua como a luz do sol meridiano, e a luz do sol meridiano sete vezes maior, com luz de sete dias, dia em que Yahweh pensar a ferida de seu povo e curar a contusão de seu golpe” (v.26).
O profeta Isaías compara o pecador perdoado com uma lua que irradia com a intensidade do sol e com um sol cuja luminosidade é sete vezes maior que o normal.
Assim é como emerge a partir de dentro, com novas energias, o homem curado desde o fundo de sua obscuridade, por meio da experiência do perdão de Deus. Que maravilha quando o descobrimos e o experimentamos! Vejamos o itinerário da profecia de hoje:
- O fim do tempo das lágrimas (vv.19-21)
Se alguém está em pecado fecham-se os horizontes para ele; com suas decisões equivocadas, cada um atrai seus próprios males. O perdão é à base de uma nova vida, como havia profetizado Isaías: “Pela conversão e calma sereis libertados, no sossego e na segurança estará vossa força” (v.15).
Porém o povo não levou a sério estas palavras, por isso o profeta recrimina: (30,15b). Com sua atitude, o povo lança a si as consequências de sua errada decisão, que a profecia descreve em termos de castigo e cujo dano não é distinto do que o homem provocou a si mesmo (vv.16b-17).
Deus não suporta ver o homem nessa situação: “Sem dúvida aguardará Yahweh para fazer-nos graça e assim se levantará para mostrar compaixão” (v.18).
A Deus dói o sofrimento de seu povo (ver Ex 3,7). Por isso, misericordiosamente, Deus se inclina, ante o homem para dar-lhe a mão. Assim o profeta volta a levantar sua voz para anunciar que o tempo do castigo vai acabar, que vem o tempo do perdão, onde o povo ressurge renovado.
No perdão há duas atitudes: a de Deus e a do homem:
- Da parte de Deus Enfatiza-se sua prontidão.
É suficiente o clamor de seu povo que geme sob o peso de seu pecado: “Já não vão chorar mais, o Senhor se apiedará de ti ao ouvir teu clamor; apenas te ouça, te responderá” (v.19);
- Da parte do homem Enfatiza-se a abertura e docilidade.
Para dar um giro à vida, deixando-se orientar pelo apelo de Deus, “Mestre” de vida: “Com teus próprios olhos verás teu Mestre e ouvirão teus ouvidos um chamado atrás de ti, que te dirá qual o caminho…” (vv.20b-21).
Uma imagem sugestiva aparece: Deus vai à frente e se coloca nas encruzilhadas indicando ao caminhante a rota que deve seguir (v.21b).
Chama a atenção o fato de que se tire proveito da experiência negativa, porque no meio do sofrimento se aprende a descobrir um sentido, isto é, se “escuta” e se “capta” como o Senhor está presente em nosso caminhar guiando nosso projeto de vida, revelando-se a si mesmo do fundo obscuro de nossa fé.
Contudo, o profeta não perde o realismo, porque apesar de se ter descoberto o rosto e os caminhos de Deus, todavia há sofrimentos que acompanham o homem. Por isso disse: “Ainda que o Senhor vos dê a água racionada e o pão da angústia, já não se esconderá teu Mestre”.
- O começo de um novo tempo de benção (vv.23-26ª)
O homem se encontra agora em uma nova situação, sua base é a comunhão com Deus. Mas para o profeta não é suficiente dizer que se entrou em uma vida nova na qual se vive segundo Deus, também é importante anunciar que ela traz de novo e de bom ao homem.
Em síntese, na vivência do perdão-cura se renovam as bênçãos de Deus. O profeta o descreve com imagens fortes que evocam a potência da vida. Os vv.23-26 cuidadosamente observam a potência da vida desde sua menor expressão, que é numa semente que brota, até o homem, cume da pirâmide da criação, a desenvolver todas as suas potencialidades.
A dinâmica da leitura, nesta parte, consiste em visualizar o processo:
- Primeiro aparecem os campos. Sobre eles Deus faz chover e cada grão que se encontra na sementeira ávida para dar o melhor de si (30,23a). O grão se torna trigo e o trigo se torna pão de boa qualidade.
- Logo vemos aparecer os animais sobre eles. As ovelhas (rebanho menor) estão pastando a erva que acaba de germinar; os bois e os asnos (rebanho maior) já estão recolhidos no estábulo comendo sua forragem (30,23b-24). Também aqui se destaca a quantidade e a boa qualidade do alimento.
- Por fim aparece o que gera vida: a água e a luz. Sobre os campos cheios de animais escrutamos um pouco mais a paisagem e vemos o alto dos montes convertendo-se em estanques de água (“águas perenes”, v.25ª), garantindo-se assim a água por muito tempo.
E, ainda mais acima, no cosmos vemos a lua e o sol dilatando sua capacidade luminosa para que surja a vida e se mantenha por muito tempo (“a luz do sol sete vezes maior”, v.26ª). Mas não se trata de uma simples descrição da natureza, mas de toda a potência de vida que traz o tempo de perdão: a transformação do homem é a do mundo inteiro.
- A raiz de tudo é o perdão (v.26b)
Encontramos uma imagem forte ao final: o tempo que caem as torres inimigas (v.25b); é curada a ferida de seu povo (v.26). O caminho de crescimento nos caminhos do Senhor é, ao mesmo tempo, um caminho onde se somam todas suas bênçãos. O perdão é uma cura que dá uma nova força de vida.
E esta profecia se realiza em Jesus (Mateus 9,35-10, 1.6-8)
O Evangelho nos anuncia Jesus como o Messias misericordioso que realiza esta obra de cura de seu povo “envergonhados e abatidos como ovelhas sem pastor” (v.36). Com a vinda de Jesus acaba o tempo das lágrimas e inicia o tempo da benção onde o povo é socorrido por bons líderes que reúnem “as ovelhas perdidas da casa de Israel” (v.6).Eles, em nome de Jesus e despojados de qualquer interesse próprio, proclamam a chegada do Reino e curam os sofrimentos do povo (vv.7-8). Em Jesus e seus mensageiros a misericórdia de Deus que atende ao clamor de seu povo é patente.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:
Hoje estamos ante uma das expressões mais concretas da fé que falávamos ontem. Nestes dias pensemos, não só nos presentes dos amigos e familiares, no Natal, mas no que o Senhor nos quer dar e que melhor responde ao que necessita nosso coração, o qual nos fará dar presentes nascidos do coração às pessoas que nos rodeiam. O maior de todos é o perdão e para isso “vem” o Senhor. Do fundo de nosso ser serão liberadas novas forças de vida e bênçãos sobre os que nos rodeiam quando o Senhor “curar nossas feridas”.
- De que necessito ser curado? Qual a causa e as conseqüências de meu pecado?
- Na celebração da misericórdia, que me dá a Igreja, por meio de seus mensageiros?
- Por não se tratar só de receber, que posso fazer nestes dias pelos que mais sofrem fisica e espiritualmente, de modo que a minha vida seja uma imagem viva da proximidade misericordiosa de um Deus a quem dói
os sofrimentos de todas as pessoas, as que estão perto e as que estão longe?