14º DOMINGO DO TEMPO COMUM (Estudo Bíblico)

Marcos 6,1-6

 O ministério de Jesus na Galiléia

Conhecem-me e não me conhecem;

sabem de onde venho e não o sabem;

sabem quem sou: sou Jesus de Nazaré;

também conhecem meus pais”

(Santo Agostinho)

Introdução

Normalmente, na própria terra, é onde se espera que haja mais um personagem importante. No caso de Jesus acontece o contrário: enquanto os mais distantes crêem n’Ele, os mais próximos não.

O Evangelho de Marcos neste ano litúrgico nos põe hoje ante uma cena de fracasso missionário. Não devemos perder de vista que, desde o primeiro momento, se diz que os discípulos estavam ali com Jesus, portanto, há uma lição orientada também ao discipulado.

 Surge espontaneamente a pergunta: Que fazemos quando nos rejeitam, sobretudo, onde mais nos conhecem desde criança? Como lidamos com os fracassos pastorais?

Porém, uma pergunta clara no dia de hoje certamente é: quem é Jesus para mim? Especialmente, para mim que conheço e tento seguir e servir a Jesus desde há alguns anos, para mim que, praticamente, tenho crescido com Ele?

  1. O texto

Leiamos Marcos 6,1-6

Releiamos agora o texto, fazendo alguns grifos nele e destacando seus valores.

  • Uma nova iniciativa de Jesus: a missão na sinagoga de Nazaré (vv.1-2ª)

O evangelista começa ambientando-nos, descrevendo-nos o lugar, o dia, os personagens e a circunstância:

  • Lugar: Nazaré, a sinagoga;
  • Dia: Sábado;
  • Personagens: Jesus, os discípulos, os participantes no culto na;
  • Circunstância: o culto sinagogal.

Além destes dados, há algo notável: Jesus toma a iniciativa de ir evangelizar aos que o conhecem desde menino. Antes era a multidão que vinha até ele a buscá-lo, a escutá-lo e a pedir-lhe ajuda. Jesus tem vontade de falar para a sua gente.

Sublinhemos algumas iniciativas desta ação missionária:

  • Saiu dali…” (6,1ª). Termina a grande atividade de Jesus realizada entre as duas orlas do lago, a pregação em parábolas e os quatro milagres (4,1-5,43). Agora Jesus volta “a sua pátria”;
  • “Veio a sua pátria…” (6,1b). Não se menciona, expressamente, Nazaré. Este regresso liga a cena anterior com a cena de 3,21.31-35, quando seus parentes vieram buscá-lo para levá-lo para casa e Ele os havia deixado na porta,
  • E seus discípulos lhe seguem(6,1c).Jesus não se deixa levar, vai espontaneamente a sua pátria, e o faz com seus discípulos: “seus discípulos o seguem” (6,1c)
  • “Se pôs a ensinar na sinagoga (6,2ª). Jesus não volta a suas antigas atividades em Nazaré (a carpintaria), mas vem como Mestre rodeado de seguidores e que ensina na sinagoga. Precisamente, a realizar o que havia feito, é que o consideraram louco e tiveram que preocupar-se com Ele.

Tenhamos presente que esta é a última visita de Jesus a uma sinagoga em dia sábado, segundo o evangelista Marcos. A partir daqui mudará a estratégia missionária.

  • A reação dos conterrâneos de Jesus (vv.2b-3)

Podemos ver neste trecho: O encantamento inicial do povo; A decepção posterior do povo; Os questionamentos do povo; e O escândalo do povo.

O encantamento

A reação do povo ante a pregação de Jesus é “maravilhar-se”. Isto coincide com o ocorrido na primeira pregação na sinagoga de Cafarnaum (1,21-28).

A atitude de decepção

Sem dúvida, se dá, em seguida, uma notável diferença: enquanto em Cafarnaum o povo reconheceu a “novidade” e a “autoridade” de seu ensinamento (1,22), demonstrada na vitória sobre os demônios (1,27b), seus próprios conterrâneos se mostram incapazes de reconhecer, nele, alguém mais do que o simples carpinteiro que sempre viram e se escandalizam com Jesus.

Jesus não é recebido com nenhum apreço. Só a maneira de referir-se a ele deixa isso muito claro: sem mencionar seu nome, mas com um decepcionante “este”.

Os questionamentos

Em Nazaré não há confissões de fé, mas, unicamente, perguntas. Concretamente, são cinco os questionamentos lançados sobre Jesus.

As três primeiras são sobre a origem e a natureza dos ensinamentos e obras de Jesus (6,2c):

  • De onde provêm: “De onde vem isto?”;
  • De que tipo é seu ensinamento: “Que sabedoria é esta que lhe foi dada?;
  • Sobre seus milagres: ”E esses milagres feitos por suas mãos”.

As duas formas básicas do ministério de Jesus são, precisamente, o ensinamento e os milagres. O problema é a origem de seus conhecimentos e de seu poder (tal como acontece em 11,28). É um enviado de Deus ou é, unicamente, uma obra humana ou, inclusive, do diabo?

As seguintes são duas perguntas retóricas, nas quais expressam alguns dados relevantes – para eles – da pessoa de Jesus (6,3):

(a) Se é o “carpinteiro”;

(b) é o filho de Maria; e

(c) Seus irmãos são conhecidos.

Isto é tudo o que conhecem de Jesus. Só sabem um aspecto de Jesus. Isto explica por que são incapazes de responder a primeira série de perguntas.  Em suma, Jesus pode havê-los impressionado com seu ensinamento, porém não conseguem captar nele a realização de uma missão divina.

O escândalo

O bloqueio ante à pessoa de Jesus sintetiza, Marcos, com a frase: E se escandalizavam por causa dele (6,3b); o Pe. Pedro Ortiz traduz: “E não podiam crer n’Ele”).

A idéia que passa é que se negam a crer em seus ensinamentos e obras de poder, não o reconhecem como o enviado de Deus.

Esta reação é curiosa, não se dá o passo de fé, porém tampouco se desencadeia um comportamento agressivo contra Jesus (como ocorre em Lc 4,22-31). A verdade é que não o ameaçam de morte (como em 3,6), porém, tampouco levam a sério sua missão.

4. A consequência da rejeição: nova estratégia missionária de Jesus (vv.4-6)

O sujeito das ações da última parte desta passagem é Jesus: fala-lhes; não pode fazer milagres; admira-se e continua sua missão nos arredores de Nazaré.

(1) Jesus se mantém em sua reivindicação de ser enviado de Deus (v.4)

Contrapõe-se a seus conterrâneos afirmando que é, verdadeiramente, o enviado de Deus: se autodenomina “Profeta”. A frase que cita é um modo de confirmar o que sustenta.

Faz referência ao fato de que, precisamente os mais próximos humanamente (notar a tríade: “pátria–parentes–casa”), são os que menos se interessam no valor de uma pessoa.

É o que ocorre nesta parte do Evangelho, exatamente depois das majestosas cenas de ensino e milagres dos dois capítulos anteriores, os habitantes de Nazaré, parentes e conhecidos de Jesus deveriam estar orgulhosos da grandeza de uma pessoa de sua terra.

Porém não acontece assim, não há aplausos nem reconhecimentos, pelo contrário, é o fato de que creiam conhecê-lo tanto o que provoca a rejeição.

Jesus se coloca na lista dos profetas rejeitados pelos os de seu próprio povo:

Assim como ocorreu com Jeremias e seus compatriotas de Anatot: “Com efeito, assim disse Yahveh no tocante aos de Anatot, que buscam minha morte dizendo: Não profetizes em nome de Yahveh e não morrerás em nossas mãos” (11,21).

Também Jeremias, se encontrou com a dureza de sua própria família: “Porque inclusive teus irmãos e a casa de teu pai, esses também te traíram e nas tuas costas gritarão. Não confies neles quando te digam formosas palavras” (12,6).

(2) Jesus é impedido, porém nem por isso deixa de servir (v.5-6a)

A missão de Jesus se depara com a contraposição da rejeição. Surgem duas consequências imediatas:

(1) Jesus não pode realizar sua missão; e

(2) Jesus se surpreende da atitude: A expectativa de Jesus é a da resposta positiva, por isso “se admirou de sua falta de fé”.

Mas Marcos faz notar que o bloqueio da incredulidade não é total: se limita a “ali”. A Jesus fica um espaço ainda bem maior para sua missão. O fracasso é localizado, não é geral. Isto confirma o fato de que efetivamente “curou a alguns poucos enfermos”.

Jesus não obriga a crer a quem não quer, porém sua mão permanece estendida para quem deseja acolher seu poder (como em 1,45; 8,4; 9,22; 15,31).

Desta forma segue sendo esperança dos enfermos e necessitados. Ainda nos lugares onde Jesus é duramente rejeitado, não deixa de oferecer nunca o que tem para dar.

(3) Jesus abre um novo espaço missionário (6,6b)

Como se notou, as portas se fecham para Jesus, porém, não todas. A rejeição de Nazaré é ocasião para realizar sua missão entre os povos ao redor.

Neste momento se pressupõe que, como leitores, recordamos tudo o que acontece em uma missão de Jesus. Esta missão do Mestre vai se converter, no próximo episódio, e como se fosse uma força centrífuga, no ponto de partida da missão dos apóstolos, os mesmos que nesta ocasião foram testemunhas diretas de rejeição do Mestre.

5. Releiamos o Evangelho com os nossos pais na fé

5.1. Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona (norte de África) e doutor da Igreja 

Escutai a Palavra do Senhor, irmãos, e considerai como a confirmou e como o responderam: “Este sabemos de onde é; o Messias, sem dúvida, quando vier, ninguém saberá de onde é” (Jo 7,27).

Jesus, de fato, quando ensinava no templo, exclamou: “É certo que me conheceis e sabeis de onde sou; e, contudo, Eu não vim por mim mesmo e Aquele que me enviou é veraz, esse a quem não conheceis” (Jo 7,28).

É como se dissesse: conheceis-me e não me conheceis.

Sabeis de onde venho e não o sabeis.

Sabeis quem sou: sou Jesus de Nazaré, também conheceis meus pais.

Nisto apenas permanecia em segredo o mistério do parto da Virgem (…).

Portanto, exceto o parto da Virgem, sabiam tudo sobre Jesus enquanto homem: seu rosto era conhecido, sua pátria era conhecida, sua origem, se sabia onde havia nascido.

Com razão disse: “É certo que me conheceis e sabeis de onde sou” (com relação a sua natureza humana e aspecto físico).

Mas, quanto sua divindade, já o discurso era outro: “E, contudo, já não veio por Ele mesmo e Aquele que me enviou é veraz, esse a quem não conheceis”.

Para conhecer crede n’Aquele que o enviou e sabereis.

De fato, a Deus “ninguém jamais viu: foi exatamente o Filho unigênito que está no seio do Pai que o revelou (Jo 1,18); e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem Ele o revelar” (Mt 11,27).

6. Cultivemos a semente da palavra no coração

  1. De que forma haviam recebido a Jesus anteriormente quando ensinava na sinagoga? Qual havia sido a atitude dos parentes de Jesus em 3,21?
  2. Como se explica que Jesus tenha sido recebido com indiferença em Nazaré? Qual é o ponto de vista de Marcos?
  3. Que estão querendo dizer as cinco perguntas que traçam sobre Jesus?
  4. De que maneira enfrenta Jesus esta adversidade? Que passos dá? (enumere)
  5. Os discípulos de Jesus aparecem desde o começo da cena. Quais são as lições para o discipulado que se desprendem deste episódio difícil do ministério de Jesus?

Pe. Fidel Oñoro, cjm

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