Lectio Divina de 12 a 18 de agosto

LECTIO DIVINA

(Giorgio Zevini y Pier Giordano Cabra)

19ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO B

João 6,41-51(Catequese sobre o Pão da vida) As anteriores revelações de Jesus sobre sua origem divina («Eu sou o pão da vida»; v.35 e «Eu desci do céu»; v.38) havia provocado desentendimento e protesto na multidão, que começa a murmurar e se mostra hostil. É duro demais superar o obstáculo da origem humana de Cristo e reconhecê-lo como Deus (v.42). Jesus evita, então, uma discussão inútil com os judeus e lhes ajuda a refletir sobre sua dureza de coração, enunciando as condições necessárias para crer n’Ele. A primeira é ser atraído pelo Pai (v.44), dom e manifestação do amor de Deus à humanidade. Ninguém pode ir a Ele senão pelo Pai. A segunda é a docilidade a Deus (v.45a). Os homens devem dar-se conta da ação salvífica de Deus a respeito do mundo A terceira é a escuta do Pai (v.45b). Estamos ante o ensinamento interior do Pai e ao da vida de Jesus, que brota da fé obediente do crente à Palavra do Pai e do Filho. Escutar Jesus significa ser instruído pelo Pai. Com a vinda de Jesus, a salvação está aberta a todos, mas a condição essencial que se requer é deixar-se atrair por ele escutando, com docilidade, sua Palavra de Vida. Aqui é onde precisa o evangelista a relação entre fé e vida eterna, princípio que resume toda a regra para acender a Jesus. Só o homem que vive em comunhão com Jesus se realiza e se abre a uma vida duradoura e feliz. Só «o que come» de Jesus-pão não morre. É Jesus, pão da vida, que dá a imortalidade a quem se alimenta d’Ele, a quem interiorize sua palavra e assimile sua vida na fé. 

1 Rs 19,4-8 (Elias a caminho do Horeb) No tempo de Elias reinava Acab em Israel: o soberano «ofendeu com sua conduta ao Senhor mais que todos seus predecessores. Não contente com imitar os pecados de Jeroboão, filho de Nabot, se casou com Jezabel, filha de Etbaal. Devido à idolatria que havia se estendido ao povo, Deus, pela boca de Elias, anuncia três anos de seca. A chuva voltaria só depois que Elias derrotasse os profetas de Baal, mostrando que há realmente um só Deus. Jezabel jura vingar-se de Elias e o ameaça de morte: «Elias se encheu de medo e fugiu para salvar sua vida» (1Rs 19,3). Como fizera Moisés, após a enésima lamentação do povo, desabafa com o Senhor: “Por que tratas mal a teu servo? Por que me tiraste tua confiança e lanças sobre mim a carga de todo este povo? Acaso eu o concebi […]? Eu só não posso suportar este povo; é demasiada carga para mim. Se vais me tratar assim, prefiro morrer”  (Nm 11,11-12.14-15). Elias acaba de comer e pede para ficar sozinho, afastado também de seu criado (1 Rs 19,3): não lhe fica outra coisa mais que a invocação desesperada da oração. Foge ao deserto do sul para salvar sua própria vida; sem dúvida, uma vez chegado ali, ora, pedindo a morte: em seu comportamento se pode vislumbrar uma particular ambivalência. A intervenção do anjo produz uma reviravolta na situação: o enviado de Deus não fala de fuga ou de morte, mas de «levantar-se, comer e caminhar» (vv.5.7). Elias continua fugindo (em efeito, Deus lhe perguntará: “Que fazes aqui Elias?, deverias encontrar-te em Israel), mas o pão cozido que recebe é “pão do céu” (Sl 104,40); a água recorda à recebida por Israel quando acabava de sair do Egito (Ex 15;17); os 40 dias e as 40 noites recordam o tempo que o povo de Deus passou no deserto antes da entrada na terra prometida; «o monte de Deus, o Horeb» (v.8), para o qual Elias se põe a caminhar, é o lugar das teofanias vividas por Moisés (Ex 3-4;33,18–34,8): agora já não se trata de uma fuga, mas de um êxodo que o conduzirá ao encontro com Deus (1 Re 19,9-18).

 

Ef 4,30—5,2 (A vida nova em Cristo: não entristecer o Espírito)É possível a um homem «fazer do amor à norma de sua vida» (cf.v.2)? Sim, graças ao fato de ter recebido, como dom, no batismo, o selo do Espírito prometido (cf. Ef 1,13;4,30). É esta uma «idéia fixa» da carta aos Efésios. O Espírito se faz presente de um modo tão pessoal e respeitoso da liberdade que as decisões do cristão podem «causar-lhe tristeza» (v.30). Na ordem concreta, as coisas que desgostam o Espírito, enumeradas neste texto, podemos encontrá-las em outros textos do Novo Testamento (Rm 1,29-31; Gl 5,19-21) ou nas obras helenísticas de fundo moral. A «maldade» é raiz que provoca toda divisão e todo mal; vibra interiormente causando «agressividade, rancor, ira»; precipita-se contra os irmãos com «indignação» e «injúrias» (v.31). Neste contexto se refere Paulo, de modo particular, aos vícios que ferem a vida comunitária. O crescimento da caridade passa da “bondade” à «compaixão» até chegar ao cume que é o «perdão mútuo» (v.32). Entre as 15 expressões de caridade citadas em 1 Cor 13,4-7, há 8 negativas (o que não faz a caridade: “Não tem inveja, nem orgulho, nem jactância”) e outras seis que tem que ver com a caridade em ação: é paciente e bondosa…Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. Que é especifico do perdão cristão, onde está o limite ante o qual poderíamos pretender deter-nos? “A cada um de nós, sem dúvida, foi dado a graça segundo a medida do dom de Cristo” (Ef.4,7). “Amou-os até o extremo” (Jo 3,1). E vós “sede misericordiosos como também é misericordioso vosso Pai” (Lc 6,36; cf Mt 5,48). Assim é para João (cf.Jo 3,16), para Paulo (cf.Gl 2,20), para cada cristão que queira ser causa de alegria para o Espírito Santo.

 

 

 

Salmo 33/34 (Louvor à justiça divina) Deus é vida e amor, mas precisamos estar atentos, pois estamos cercados de situações que nos levam à morte: o mal, a violência, o ódio, as guerras. Além disso, vivemos um momento em que a vida está sendo destruída já no seu nascer, por meio do aborto. Há também uma morte que engana, pois não parece morte, mas igualmente pode matar: a injúria, o ódio, o rancor, a inimizade, a calúnia. Quem se decide a seguir o Senhor deve viver de acordo com a Palavra.

Senhor, que eu seja coerente no meu dia a dia, defenda a vida e participe de todos os atos e realizações que busquem resplandecer o amor e a justiça. A pedagogia do seu amor nunca se altera: os ricos que não partilham passarão fome e os pobres que te amam sempre serão saciados do teu amor e da tua paz. Amém.

 

 

MEDITATIO: Não é raro ouvir a expressão: «Basta, não posso mais!». A vida, em determinados momentos, é verdadeiramente dura. E quem a sente difícil, desagradável, insuportável durante anos e anos? A experiência de Elias está presente como nunca na realidade humana, especialmente nos que levam a sério a tarefa em favor ou em apoio dos outros que lhes são confiados: «Basta, Senhor, tira-me a vida, que não sou melhor que meus antepassados!». Esta experiência, típica da condição humana, marcada pelo limite e pela precariedade, pela vulnerabilidade e pela fragilidade, pode ser o começo de uma invocação que se abre ao mistério de Deus. Deus quer que seus filhos tomem consciência de que Ele está presente em suas vidas. A Elias mandou um anjo com um pão; a nós nos envia seu Filho, que se faz pão da vida, pão para nossa vida, pão para manter-nos no caminho, pão para não deixar-nos sozinhos nas missões difíceis. O pão que nos oferece contém todas as atenções que tem conosco. É o ponto de chegada da ação criadora do Pai, da obra de reconstrução realizada pelo Filho; é pão sempre terno por obra do Espírito. Esse pão é memorial de uma história infinita de amor: com Ele também nos sustenta, nos alenta, nos convida a empreender o caminho, com o mesmo coração e a mesma audácia recordada e encerrada no pão da vida.

 

ORATIO: Ilumina, Senhor, minha mente para que eu possa compreender que a Eucaristia é «memorial da morte do Senhor». Nesse pão puseste «todo deleite», porque nele puseste toda tua história de amor comigo e com o mundo. Com esse pão queres recordar-me todo o amor que sentes por mim, um amor que chegou a seu cume insuperável na morte e ressurreição de teu Filho, de sorte que eu não possa duvidar nunca. Ó Senhor, esse pão que recebo com tanta pressa contém, verdadeiramente, todo teu amor por mim, contém a recordação de tuas maravilhas e o cume das maravilhas de teu amor. E contém assim mesmo a recordação de que este teu amor te custou muito e me sugere que, se desejo amar-te e a meus irmãos, não devo reparar em custos. Reforça meu pequeno coração, demasiado pequeno para compreender; ilumina-lhe sobre os custos do amor, para que não se desanime, para que se reanime, recomece o caminho, não se acovarde e esteja seguro de que contigo e por ti vale a pena caminhar e fatigar-se ainda um pouco mais, especialmente quando temos que desenvolver tarefas delicadas. Todavia um pouco, que a meta não está longe!

 

CONTEMPLATIO: Os que, caindo nas insídias, tomaram o veneno, extinguem seu poder mortífero com outro, como antídoto. Assim também, do mesmo modo que entrou nas vísceras do homem o princípio mortal, deve entrar o princípio saudável, a fim de que se distribua por todas as partes de seu corpo a virtude salvífica. Visto que havíamos provado do alimento destruidor de nossa natureza, tivemos necessidade de outro alimento que redima o que está desagregado, para que, tendo entrado em nós este medicamento de salvação, opere, como antídoto, contra a força destruidora presente em nosso corpo. E que é este alimento? Nenhuma outra coisa que aquele corpo que se revelou mais potente que a morte e foi o começo de nossa vida (Gregório de Nisa).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Levanta-te e come, pois te resta ainda um caminho muito longo!» (1 Rs 19,7)

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – A vida vivida eucaristicamente é sempre uma vida de missão. Vivemos em um mundo que geme sob o peso de suas perdas: as guerras que sem piedade destroem povos e países, a fome e a morte de fome que dizimam populações inteiras, o crime e a violência que põem em perigo a vida de milhões de pessoas, o câncer e a Aids, a cólera e outras muitas enfermidades que devastam os corpos de incontáveis pessoas; terremotos, enxurradas e desastres do tráfego… é a história da vida de cada dia que enche os periódicos e as telas de TV […]. Este é o mundo ao qual fomos enviados a viver eucaristicamente, isto é viver com o coração ardente e com os olhos e ouvidos abertos. Parece uma tarefa impossível. Que pode fazer este reduzido grupo de pessoas que hão encontrado pelo caminho […] em um mundo tão obscuro e violento? O mistério do amor de Deus consiste em que nossos corações ardentes e nossos ouvidos receptivos estarão em condições de descobrir que aquele a quem havíamos encontrado na intimidade continua revelando-se a nós entre os pobres, os enfermos, os famintos, os prisioneiros, os refugiados e entre todos os que vivem no meio do perigo e do medo (H. J.M Nowen, La forza della sua presenza)

 

 

SEGUNDA-FEIRA, 13 DE AGOSTO DE 2018 – 19ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO B

João 12,24-26 (Jesus anuncia sua glorificação através da morte) – Unir-se ao Filho é entrar na dinâmica de amor que o faz uma só coisa com o Pai. «Servir» ao Filho significa «reinar» n’Ele e com Ele no coração do Pai, e constituirá a complacência de sua paternidade divina. Servir ao Filho é associar-se a Ele e à sua obra redentora. Jesus nos deixa bem conscientes da exigência de tal se­guimento: por amor ao Pai e ao homem, o Filho se en­trega por completo, dá sua própria vida em uma morte destinada ao mistério de uma fecundidade que insere nossa histórica passageira em um horizonte transcendente. Tam­bém o discípulo se vê chamado, assim, a perpetuar no tempo um ato de amor de valor eterno e divino.

 

 

 

2 Cor 9, 6-10 (Benefícios que resultarão da coleta) – São muitas as pobrezas humanas: as pobrezas espirituais, as pobrezas materiais, as pobrezas culturais e as pobrezas morais. Porém, não há nenhuma pobreza a qual não possa chegar e transbordar a caridade divina. O senhor nosso Deus, Ele mesmo, se mostra sempre esplêndido, deixando fluir da fonte de seu seio trinitário, em tudo, impulso dinâmico e, portanto, fecundidade de frutos. A criatura se converte, portanto, em seu ins­trumento. Quanto mais ela dá, mais goza do amor divino, porque neste se trasvasará, ainda mais, em maior quantidade e se verterá nela, ao encontrar uma plena consonância. Por isso recolherá com largueza: Deus mesmo cultivará tudo quanto semeia e fará frutificar a obra do justo realizada com seu amor.

 

Salmo 111/112 (Elogio do justo) – Este Salmo é cheio de esperança e nos faz abrir o coração à presença misericordiosa de Deus. Durante a nossa caminhada na vida, há momentos de escuridão, de deserto, de dor e de desilusão, mas o homem de fé sabe levantar os olhos para o Céu e perceber que Deus caminha ao seu lado, mesmo diante da dificuldade. Com Ele nada é impossível! Ele nos abraça nos doa o perdão e é clemente e cheio de misericórdia. O nosso Deus é um Deus que se comove diante da nossa miséria e não nos afasta dele, mesmo quando estamos sujos e feridos, e o nosso coração tomado pela malícia e pelo pecado.

Senhor, procuras o homem justo para recompensá-lo e transbordar nele todo teu amor. Iluminas o caminho de quem busca a verdade, ama a retidão e se coloca ao lado dos pobres e injustiçados. Sei, Senhor, que os teus mandamentos não são pesados quando se ama de verdade. Tu queres só o amor e nada mais. Peço-te, Senhor, que o teu Filho Jesus me ensine o que é o verdadeiro amor; que eu saiba desinstalar-me das minhas seguranças, descer a escada do poder e colocar-me a serviço dos outros com alegria. Que eu nunca feche o meu coração a quem me pede ajuda. Não importa que seja meu amigo ou não, o que importa é que teu Filho e na fé é meu irmão e irmã. Dá-me um coração grande e generoso! […] como está escrito: “Distribuiu generosamente, deu aos pobres; a sua justiça permanece para sempre” (2 Cor 9,9). Senhor, não permitas que meu coração seja vingativo, duro e sem compaixão. Amém.

 

 

 

MEDITATIO: Quando o imperador romano lho ordenou entregar as riquezas da Igreja, o diácono Lourenço se apresentou ao juiz com uma multidão de pobres de Roma, declarando: “Aqui estão os tesouros da Igreja!”. De imediato ele deu a ordem aos seus carrascos de torturar São Lourenço até a morte. De sua paixão, ficou registrado que no último instante de sua vida, convidado, ainda, a sacrificar aos deuses, respondeu: «Ofereço-me a Deus como sacrifício de suave odor, pois um espírito contrito é meu sacrifício a Deus». O papa Dâmaso (+384) declarou na inscrição que fez pôr na basílica dedicada ao mártir: «Só a fé de Lourenço pôde vencer os açoites do verdugo, as chamas, os tormentos, as cadeias; pela súplica de Dâmaso, trasborda de dons estes altares, admirando o mérito do glorioso mártir». O papa João Paulo II, na memória jubilar dos mártires do século XX, disse, no Coliseu, unindo ao texto de Jo 12,25: “Trata-se de uma verdade que, frequen­temente, o mundo contemporâneo rejeita e despreza, fazendo do amor para si mesmo o critério supremo da existência. Porém, os testemunhos da fé, que, também, esta tarde, nos falam com seu exemplo, não buscaram seu próprio interesse, seu próprio bem estar, a própria sobrevivência, como valores maiores que a fidelidade ao Evangelho; inclusive em sua debilidade, eles opuseram firme resistência ao mal e em sua fragilidade resplandeceu a força da fé e da graça do Senhor”. (João Paulo II, Homilia).

 

ORATIO: O Soberano Senhor te deu, ó mártir, como ajuda, o carvão ardente: queimado por ele, deixaste a tenda de barro e herdaste a vida e o Reino imortal. Por isso celebramos com gozo tua festa, ó bem-aventurado Lourenço. Resplandecendo pelo Espírito como carvão aceso, Lourenço vitorioso, arquidiácono de Cristo, queimaste os espinhos do engano: por isso foste oferecido em holocausto como incenso racional àquele que te exaltou, chegando à perfeição com o fogo. Protege, pois, de toda ameaça a quantos te honram, ó homem de mente divina (de antigo texto da Igreja bizantina).

 

CONTEMPLATIO: São Lourenço, como já se tem explicado mais de uma vez, era diácono da Igreja de Roma. Nela administrou o sangue sagrado de Jesus Cristo; nela, também, derramou o seu próprio sangue, pelo nome dele. […] Amou a Cristo durante toda a sua vida e imitou-o em sua morte. Também nós, irmãos, se amamos de verdade a Cristo, devemos imitá-lo. A melhor prova que podemos dar de nosso amor é imitar seu exemplo, porque Cristo padeceu por nós, deixando-nos um exemplo para que sigamos suas pegadas. […] Entendamos, pois, de que modo o cristão deve seguir a Cristo, além do derramamento de sangue, além do martírio. […] Cristo se rebaixou, isto é, cris­tão, o que deves tu procurar (Santo Agostinho).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Pois sempre tereis pobres convosco»

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – O perfume agradável indica, tanto no Antigo como no Novo Testamento, à dimensão estritamente constituti­va da teologia do sacrifício. Em Paulo, é expressão de uma vida que tem se tornado pura, da qual não se desprende já o mau odor da mentira e da corrupção, da decomposição da morte, mas o sopro refrescante da vida e do amor, a atmosfera que é conforme a Deus e sana aos homens. A ima­gem do perfume agradável está unida também à do fazer-se pão: o mártir há se tornado como Cristo; sua vida há se convertido na d’Ele. D’Ele não procede o veneno da decomposição do ser vivo pelo poder da morte; d’Ele emana a força da vida: edifica vida, do mesmo modo que o bom pão nos faz viver. Sua entrega no corpo de Cristo há vencido o poder da morte: o mártir vive e dá vida com sua morte e, deste modo; entra ele mesmo no mistério eucarístico. O mártir é fonte de fé. A representação mais popular desta teologia eucarística do martírio a encontramos no relato de são Lourenço sobre a grelha, que já desde tempos remotos foi considerado como a imagem da existência cristã: as angústias e as penas da vida podem converter-se nesse fogo purificador que lentamente vai nos transformando de sorte que nossa vida chegue a ser dom para Deus e para os homens (J. Ratzinger, Conferenza per il XXlll Congresso eucaristico nazionale, Bolonia 1997).

 

 

TERÇA-FEIRA, 14 DE AGOSTO DE 2018 – 19ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO B

Mateus 18,1-5.10.12-14 (Quem é o maior; A ovelha desgarrada) No fragmento evangélico de hoje se enlaçam dois temas com dois gêneros literários de catequese. No primeiro encontramos uma ação demostrativa de Je­sus, que responde de maneira clara e inesperada a uma pergunta, um pouco fora de lugar, dos discípulos. Es­tes não hão compreendido ainda as exigências do Reino. Querem saber quem será o maior nesse Reino dos Céus que o Mestre está anunciando como próximo e inclusive como já presente. A resposta visual é a ação profética de Jesus, que acompanha sua Palavra com um gesto eloquente: põe no centro a uma criança – um ser pequeno, necessitado, sem malicia-, e o põe como modelo efetivo de acolhi­da ao Reino; a acolhida nele se produz por dom e não por mérito, o qual significa voltar a uma pobreza ontológica, original, para deixar-se formar também pela novidade inédita do Reino que Jesus proclama. Voltar a ser criança é converter-se a Deus. A figura da criança se une aqui à doutrina paulina do novo nascimento, a mensagem joanina dos filhos nascidos de Deus. Existe harmonia entre a teologia joanina, a dos sinóticos e a de Paulo. Mas, a visão da criança suscita em Jesus um duplo ensinamento que tem que ver com a criança mesmo como figura simbólica de todo ser necessitado, pobre, frágil, ao qual devemos ofertar nossa acolhida. Até tal ponto que quem acolhe a um destes pequenos acolhe ao próprio Jesus, que tem se a identificado com os últi­mos. Vem, a continuação, a advertência de que não devemos desprezar aos que se fazem como crianças. Deus se ocupa de sua defensa, e os anjos que os custodiam cuidam deles. Neste contexto, ainda que como um en­sinamento acrescentado, Mateus apresenta a parábola do bom pastor que vai em busca da ovelha perdida, parábola que está descrita melhor no evangelho de Lucas. A bem-a­venturança do Reino pertence também aos últimos, a quem Deus busca com todo o coração, como um pas­tor que não quer que se perda nenhum. Jesus, bom pastor, constitui uma esperança para todos.

 

 

Dt 31,1-8 (A missão de Josué) – Estamos nas cenas finais da vida de Moi­sés, tal como nos conta o livro de Deuteronômio.Mantendo-se sempre em um clima teologal que reme­te a Deus, Moisés, tecedor da trama da historia do povo, fala de sua velhice e de sua morte iminente. A terra prometida está próxima, ao outro lado do Jordão, porém sabe que não passará o limite, segundo a Palavra do Senhor: «Não passarás o Jordão» (v.2). Sem dúvida, Deus estará sempre com o povo, lhe abrirá caminhos e lhe pro­curará a vitoria. Ainda em ausência de seu chefe, ao povo lhe acompanhará constantemente uma certeza: Deus estará presente. YAHWEH é aquele que está próximo, pre­cede e acompanha ao povo, precisamente como tem feito até esse momento. É a hora das instruções. Josué, eleito também por Deus para conduzir o povo à terra prometida, será o herdeiro de Moisés. Passam os mediadores hu­manos, porém Deus permanece. Esta certeza, que Moisés tem experimentado ao longo de toda sua vida, pretende dar segurança a Josué. As promessas feitas ao povo também valem para ele. Deus segue sendo o protagonista de uma historia que leva adiante entre as contradições dos homens e sua provada fidelidade. Moisés ga­rante a Josué esta presença após ter lhe imposto as mãos, sinal da transmissão de poderes, junto com o dom do espírito de sabedoria (Dt 34,9). Deus é sempre aquele que caminha adiante. Sempre estará presente, junto ao povo e a sua cabeça. Será fiel. É uma garantia que abre um futuro de esperança.

 

 

Dt 32,26-28.30.35-36.39 (Cântico de Moisés) – Cântico composto e recitado às margens do Jordão… Poema de grande originalidade e fôlego, no qual confluem e se fundem elementos variados, rico em imagens e em linguagem seleta… Não podemos descrever sua origem nem datá-lo com segurança. Talvez seja uma composição exílica, de um grande poeta, que talvez tenha empregado um texto mais antigo ou nele se tenha inspirado. Para orientar a leitura, podemos propor uma visão global simplificada: numa grande querela do Senhor com seu povo, projeta castigá-lo e acabar com ele; mas, antes de ditar a sentença, pensa que o executor estrangeiro seja mais culpado, volta-se contra ele e salva seu povo. Em outras ocasiões se interpôs a intercessão de Moisés; aqui tudo se resolve no interior misterioso de Deus.

 

MEDITATIO: Poderíamos contar toda a historia da salvação à luz da categoria de presença, tal como temos constatado ao longo das páginas do Êxodo e do Deuteronômio. Da presença de Deus na criação se passa a uma presença ainda mais próxima na tenda e na arca. Deus, cujo nome – YAHWEH – significa também o «Deus presente», «Aquele que precede, segue e acompanha», é sempre o Deus próximo, até o ponto de fazer excla­mar Moisés: “Que nação há, tão grande, que tenha deuses tão próximos a ela como está o Senhor, nosso Deus, sempre que o invocamos?” (Dt 4,7). A certeza que possui o povo de Israel, ao atravessar o umbral da terra prometida, se baseia, também, na promessa desta presença. Uma presença que, ao seu tempo, terá uma sede no templo, no Santo dos Santos, e que não cessará, nem sequer com a destruição do templo. O Senhor «emigrará», de fato, com seu povo ao exílio. No auge da presença de Deus no Novo Testamento temos o Verbo encarnado. Ele é a tenda e o templo, ele é a presença, ainda mais próxima, em nossa carne, em nossa companhia. Sem dúvida, tal como nos ensina o Evangelho, Jesus mesmo quis trasladar, por assim dizer, sua presença também ao homem, a todo homem, aos pequenos do Reino, que devem ser tratados e acolhidos como o próprio Cristo. Quem acolhe um pequeno do Reino – a uma criança, a um pobre, a um necessitado – acolhe Jesus pre­sente nele, pois o que lhe fazemos, é a Jesus mesmo que o fazemos (cf Mt 25,40).

 

ORATIO: Tu és um Deus presente, Senhor. Compraz-te em viver, não só em teu altíssimo céu, mas em meio de nós. Como haverias de ser um Deus da historia se não marchasses conosco pelos caminhos da vida? Esta tua presença é sinal de ilimitada bondade e de amizade divina. Um amigo é uma pessoa que está presente, um rosto próximo, um coração cujo bater próximo sentimos e com cuja conversa e intimidade gozamos. Sem dúvida, tua presença está escondida e velada. Necessitamos o suplemento da luz da fé para cap­tar tua presença, que se esconde e se revela ao mesmo tempo: na natureza, na historia, na Palavra, na eucaristia. Existe, também, uma presença através da qual queres ser acolhido, amado, reverenciado, servi­do. É tua presença nos pequenos, no necessitado e sofredor. Deves atrair, em certo modo, nosso amor para os irmãos, de maneira que, ainda que siga sendo verdadeiro em sua orientação a ti, se dirija a todos aqueles a quem tu amas, com quem te identifi­caste e nos que queres ser servido. Concede-nos uma fé pura, para vislumbrar teus traços no rosto dos irmãos pequenos e pobres, e um amor grande para servir-te naqueles que se con­verteram em tua presença mística: assim nos atrairás para que amemos e sirvamos como tu amaste e serviste em nós àqueles que te deu o Pai.

 

CONTEMPLATIO: Queres honrar o corpo de Cristo? Não permitas que seja objeto de desprezo em seus membros, quer dizer, nos pobres, que carecem de panos para cobrir-se. Não honres aqui, na igreja, com telas de seda enquanto que fora o esqueces quando sofre pelo frio e a nu­dez. O que tem dito: Este é meu corpo», confirmando o fato com a palavra, disse também: « Me vistes faminto e não me destes de comer» (cf Mt 25,35) e «Vos asseguro que, quando deixastes de fazê-lo com um destes pequenos, também comigo deixastes de fazer»’ (Mt 25,45) […]. Aprendamos, pois, a pensar em honrar a Cristo como ele quer. Em efeito, a honra mais agradável que pode­mos render àquele a quem queremos venerar é o que ele mesmo quer, não o que inventemos […]. Faz que os homens se beneficiem de tuas riquezas. Deus não tem necessidade de vasos de ouro, mas de almas de ouro […]. Portanto, enquanto adornas o lugar do culto, não feches teu coração ao irmão que sofre. Este é um templo vivo mais precioso que aquele (Juan Crisóstomo, Homilía evangelio de Mateo).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Acolhe o Reino de Deus em ti como uma criança, e cada criança como ao próprio Cristo»

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Não é raro que, no mundo atual, nos sintamos perdedores. Mas a aventura da esperança nos leva mais além. Um dia vi em um calendário este dizer: «O mundo é de quem o ama e melhor sabe demonstrar». Que ver­dadeiras são estas palavras! No coração das pessoas há uma sede infinita de amor, e nós, com o amor que Deus há infundido em nossos corações (cf. Rm 5,5), podemos saciá-la. Mas é preciso que nosso amor seja «arte», uma arte que su­pera a capacidade de amar simplesmente humana. Muito, por não dizer tudo, depende disto. Eu tenho visto esta arte, por exemplo, em Teresa de Calcutá. Quem a via, a amava. Também em João XXIII. Ainda que tenham passado muitos anos desde sua morte, sua memória está muito viva na gente. Ao entrar em um convento, em um centro diocesano ou em nossas oficinas, nem sempre se encontra esta arte que faz o cristianis­mo formoso e atraente. Encontram-se, pelo contrario, caras tristes e aborrecidas devido à rotina de todos os dias. Não de­penderá também disto a falta de vocações? E a escassa in­cidência de nosso testemunho? Sem um amor forte não podemos ser testemunhas de esperança! Ainda que sejamos expertos em matéria de religião, corremos o risco de ter uma teoria do amor e não possuir suficientemente sua arte. Como um médico que tem ciência, porém não a arte da relação amável e cordial. A gente se consulta porque nece­ssita, porém, quando se cura, já não volta mais. Jesus era como ninguém mestra na arte de amar. Igual que um emigrante que se ha marchado ao estrangeiro, ainda que se adapte à nova situação, leva sempre consigo, ao menos em seu coração, as leis e os costumes de seu povo, assim ele ao vir à terra se trajo, como peregrino da Trindade, o modo de viver de sua pátria celestial, «expressando humanamente os comportamentos divinos da Trindade» (cf.CIC,n.470) (Van Thuan, Testigos de es­ peronzo).

QUARTA-FEIRA, 15 DE AGOSTO DE 2018 – 19ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO B

Mateus 18,15-20 (Correção fraterna, Oração em comum) – O capítulo 18 de Mateus leva, em algumas edições da Bíblia, o significativo título de «discurso eclesiástico». Este capítulo introduz, com efeito, temas tipicamente eclesiais, no sentido primitivo de qestões referentes à comunidade de Jesus, à nova comunidade que ele fundou. Após as instruções encaminhadas a acolher oel Reino como las crianças e à conversão – esta é a condição para entrar na família de Jesus e viver segundo seus ensinamentos – e o discurso sobre a salvação de todos, encontramos alguns ensinamentos essenciais e progressivas. A primeira tem que ver com a correção fraterna na comunidade de Jesus, um momento importante numa comunidade de pecadores para chegar à conversão. Trata-se de uma atitude que manifesta o cuidado que os irmãos e as irmãs da família de Jesus devem ter uns com os outros num clima de amor verdadeiro, isento de hipocrisia e que chega inclusive à correção fraterna. Aparecem três momentos progressivos de grande finura psicológica: a correção a sós, a correção em companhia de um testemunha, a fim de reforçar a autoridade da correção com a presença de um irmão, e, por último, o recurso à assembléia. O limite final é a expulsão da pessoa indigna da comunhão como um remédio medicinal extremo, quase para provocar, na solidão e na distância, o desejo do retorno à comunhão fraterna. O segundo ensinamento reforça a consciência de uma comunidade onde a autoridade do amor de Cristo se transmite aos responsáveis. Com as palavras clássicas, de indubitável sabor semítico, «atar» e «desatar» indica Jesus o poder que transmite aos seus. Por fim, Jesus fala da oração em comum, uma oração que será escutada pelo Pai se se faz em seu nome, em união com Ele e nele. A esta oração unânime e unida garante Jesus sua presença e a eficácia de sua intercessão celestial.

 

 

 

 

Dt 34,1-12 (A morte de Moisés) – As alturas do monte Nebo, de onde se divisa o belíssimo e extenso panorama da terra prometida, tornaram-se familiares a nós desde que, em vinte de março do ano 2000, João Paulo II, em sua peregrinação jubilar a Terra Santa, se ergueu desde as alturas do templo dedicado a Moisés para comemorar o que hoje nos propõe a Escritura. Da parte do Senhor, que fala uma vez mais a Moisés, a terra é como o selo da fidelidade a ele, ao povo, mas também aos patriarcas que receberam as promessas: Abraão, Isaac, Jacó… Também neste momento se mostra Deus fiel a si mesmo e a suas próprias palavras e promessas: «Faço-te ver com teus olhos, porém não entrarás nela». A seguir, tem lugar a morte e a sepultura de Moisés. Este é o «servo do Senhor», na dupla acepção que tem este termo na Escritura: a honra da eleição para servir ao Senhor e executar seus desígnios; a entrega total e efetiva a seu plano de salvação. O livro sagrado sela a narração da morte do grande caudilho com o elogio típico dedicado aos homens que deixaram marcas na história, mas com os traços característicos e únicos de Moisés, aquele «com quem o Senhor tratava cara a cara», sinal máximo de familiaridade. Moisés foi o homem dos grandes sinais e milagres, em especial o homem do êxodo, da páscoa da liberdade e da libertação. Sua tumba fica como um memorial, e sua pessoa se acerca agora à estirpe dos antigos patriarcas. O Deus de Abraão, Isaac e Jacó é também o de Moisés. E Josué assume agora a responsabilidade de conduzir o povo até a terra prometida.

 

Salmo 65/66 (Ação de graças pública) – O cântico une de maneira harmoniosa o louvor solene com a ação de graças oferecida por todas as bênçãos recebidas de Deus. É possível perceber que o orante é chefe de uma comunidade e convoca a todos para deixar de lado qualquer forma de egocentrismo, abandonando os próprios e pequenos problemas, e para dirigir toda a atenção ao louvor de Deus. A comunidade, livre de sofrimento e dificuldades graças à intercessão de Deus, agradece a Ele por todas às bênçãos. A alma humana foi criada para agradar e louvar; o olhar atento de Deus contempla com prazer as ofertas a Ele concedidas. Jesus, que se sacrificou por nós, levou consigo os nossos pecados. Somos livres para adorá-lo!

Senhor, quero me colocar diante de ti com humildade e confiança e agradecer pela tua presença na minha vida, na minha família, no meu trabalho. Quero ser sempre para todas as pessoas um sinal vivo e verdadeiro do teu amor. Quero que outros consigam ver a fé em minha vida e o amor com que te amo. Senhor, como é bom ver em todas as obras a tua presença de Pai, que cuida de cada um que avança no deserto da vida. Não estamos sozinhos nem com medo, pois sabemos que tu caminhas conosco e nos protege durante o dia com a nuvem do calor do deserto e durante a noite com a chama viva do teu amor, indicando-nos o caminho a seguir. A chuva da graça é derramada sobre nós e o nosso coração abre-se ao teu amor e se faz generoso e solícito em tudo. Tu estás sempre do lado dos pobres e os ama e cuida deles. Sou o teu pobre. Senhor, estou carente de teu amor. Cuida de mim. Amém.

 

 

 

MEDITATIO: O sugestivo final do texto de Mateus constitui uma fonte de meditação. Jesus promete sua presença espiritual no meio àqueles que se reúnam em seu nome: «Onde estão dois ou três reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles» (v.20). Estas palavras faziam exclamar a Orígenes que onde dois ou mais estão reunidos em nome de Cristo, ainda que sejam leicos, ali está a Igreja. Muitos cristãos, em tempos de perseguições, tanto ontem como hoje, experimentaram esta simples e essencial constituição da Igreja em virtude da presença de Cristo. João Crisóstomo, por sua vez, exaltava estas palavras de Jesus a fim de fazer reconhecer sua presença em meio da assembléia litúrgica, e para expressar que com essa presença toda celebração é uma festa. Estar unidos em nome de Jesus significa estar unidos em fidelidade a seu ensinamento, em comunhão com sua pessoa, sendo fiéis a seu exemplo, especialmente no amor recíproco. Deste modo se cria uma atmosfera espiritual completamente repleta da presença de Cristo, que une pela certeza de constituir um lugar habitado, ou um espaço teologal onde vive o Ressuscitado. Esta presença assegura a unidade entre o céu e a terra, a eficácia da oração, a alegria do Pai celestial. Isso significa que a primeira condição que temos de buscar necessariamente, na vida cotidiana, em toda relação com aqueles que partilham nossa mesma fé, é a mesma unidade no nome de Cristo. Mas significa também que a condição de todo testemunho e toda missão é garantir de nossa parte aos outros a comunhão com o Senhor, a fim de que ele se faça presente e seja escutada e vivida a Palavra do Evangelho.

 

ORATIO: Senhor, tu tornaste a Igreja lugar de tua presença. Que grato é habitar em tua casa, ainda que indignos; receber dos irmãos a ajuda necessária para seguir em tua presença, inclusive a graça da correção fraterna quando nos achamos no erro. Com tua Igreja estamos seguros de contar com tua presença e tua graça, inclusive naqueles que te representam, aos quais destes poder de atar e desatar em teu nome, com um amor que procede de ti. Mas, sobretudo, vemos na Igreja uma antecipação da vida celestial, uma terra de que, como a Moisés, mais ainda, mais que a Moisés desde o monte Nebo, tu mesmo nos fazes ver e gozar, em uma Igreja que já é também um pouco do céu na terra, em virtude de tua presença que une no céu, onde estás com o Pai, e a terra, onde estais conosco. Concede-nos a graça de assegurar sempre entre nós o amor recíproco que nos converte em âmbito onde moras.

 

CONTEMPLATIO: Se nos mantemos unidos, Jesus está entre nós. E isto é valioso. Vale mais que qualquer outro tesouro que possua nosso coração: mais que a mãe, o pai, irmãos, filhos. Vale mais que a casa, que o trabajo, que a propriedade; mais que as obras de arte de uma cidade como Roma; mais que nossos negócios; mais que a natureza que nos rodeia com flores e prados, o mar e as estrelas; mais que nossa alma. É Ele quem, inspirando seus santos com suas eternas verdades, fez época em cada época. Também esta é sua hora: não tanto de um santo, mas dele; dele entre nós, dele vivo em nós, edificando – em unidade de amor – seu Corpo místico. Mas é preciso dilatar a Cristo, fazê-lo crescer em outros membros; fazer-nos portadores de fogo como Ele. Fazer um de todos e em todos o Um. E então viveremos a vida que Ele nos dá momento a momento na caridade. O do amor fraterno é o mandamento de base. Por Ele vale tudo o que é expressão de sincera caridade fraterna. Nada do que fazemos vale se não está presente nele o sentimento do amor aos irmãos: Deus é Pai e no coração tem sempre e unicamente filhos (Chiara Lubich, El atractivo de nuestro tiempo).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Que admiráveis são tuas obras!» (Sl 65,3a)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – São Mateus se refere a esta promessa de Jesus: «Porque onde estão dois ou três reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles» (Mt 18,20). Aqui não temos de pensar só na assembléia litúrgica, mas em toda situação na qual dois ou mais cristãos estão unidos no Espírito, na caridade de Jesus. E, tampouco, temos de pensar só na simples onipresença do Cristo ressuscitado em todo o cosmos. Escreve um exegeta de nossos dias: «Mateus pensa numa presença “personalizada”. Jesus está presente como crucificado ressuscitado, quer dizer, na abertura de doação total vivida na cruz, onde ele, com toda a sua humanidade, se abre à ação divinizante do Pai e se entrega totalmente a nós, comunicando-nos o seu espírito, o Espírito Santo. A presença do Ressuscitado não é, pois, uma presença estática, um estar-aqui e nada mais, mas uma presença relacional, uma presença que reúne e unifica e que, em consequência disso, espera nossa resposta, a fé. Brevemente, a proximidade de Cristo reúne “os filhos de Deus dispersos” para fazer deles a Igreja». Desde a aliança selada no Sinai com Israel, Yhaweh se revela como o que intervém eficazmente na história. Libertou os hebreus da escravidão de Egito, fez deles seu povo. «Eu estou no meio de vós», é a palavra que identifica a primeira aliança: uma presença que protege, guia, consola e castiga… Com a chegada do Novo Testamento, esta presença adquire uma densidade especial e nova. A promessa da presença definitiva de Deus, ou seja, a promessa da Aliança definitiva, acha seu cumprimento na ressurreição de Jesus. Na comunidade cristã, o Emanuel, o Deus-conosco, é «o salvador de seu Corpo», a Igreja (cf. Ef 5,23). Presente em meio dos seus, Ele convoca e reúne não só Israel, mas toda a humanidade (cf. Mt 28,19-20). Viver com Jesus «em meio», segundo a promessa de Mateus 18,20, significa atualizar desde agora o desígnio de Deus sobre toda a história da humanidade.

 

 

QUINTA-FEIRA, 16 DE AGOSTO DE 2015- 19ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO B

Mateus 18,21-19,1 (Perdão das ofensas; Parábola do devedor implacável) – O presente texto evangélico nos transmite um en­sinamento essencial. Toda a substância do discurso se en­contra precisamente na pergunta que Pedro faz a Jesus a propósito das vezes que devemos perdoar ao irmão que nos ofende. Trata-se de um irmão, e por isso tem que ser perdoado sempre, até o absurdo. Não só «sete vezes», um número que indica plenitude, mas inclusive um número inverossímil de «setenta vezes sete», que é como um número infinito, que significa «sempre», sem pôr limites à misericórdia. Agora bem, na realidade a chave de compreensão do ensinamento de Jesus se encontra não só no número ilimitado das vezes que se deve conceder o perdão ao irmão que nos ofende, mas na qualidade mesma do perdão que temos de conceder. Trata-se de um perdão que não se reduz a uma fórmula ou a uma má dissimulada obrigação de perdoar porque não se pode fazer outra coisa. A qualidade do perdão incide em seu mesmo sentido. Deve ter a qualidade do perdão de Deus, e deve chegar ao coração, lugar da verdade, dos sentimentos e das vinganças, do amor verdadeiro e do perdão sincero. Um coração que perdoa é um coração misericordioso. Perdoar «de coração» (v.35) significa selar como amor verdadeiro o perdão que se concede. Dado que al­guém nos há perdoado assim, sem limite no número de vezes, não podemos nós pôr limites ao amor mi­sericordioso do perdão.

 

 

Js 3,7-10a.11.13-17  (Ultimas instruções; A passagem do rio) – A entrada do povo de Israel na terra prome­tida está descrita no livro de Josué como uma sole­ne procissão litúrgica. No centro se encontra a arca da aliança: é o lugar da presença de YAHWEH em meio de seu povo, o memorial da aliança, posto que a arca contem as tábuas da lei. A re­petição do nome da arca por seis vezes neste fragmento – chamada também no texto «arca da aliança do dono de toda a terra» (v.11)- marca quase ritmicamente o passo da presença de Deus à cabeça de seu povo. É sempre o Deus fiel que precede e acompanha ao povo. Fala a Josué, como antes falava a Moisés, e o novo chefe interpreta e transmite a voz de Deus. Ante a terra prometida se repete o mesmo que suce­deu na passagem do mar Vermelho. As águas se detêm e o povo ao qual acompanha a arca da aliança cruza o rio através de uma trilha seca. Assim, de uma maneira si­métrica, o passar da escravidão do Egito à liberdade, ainda que fora no deserto, e a entrada na terra pro­metida estão marcados pela intervenção maravilhosa de YAHWEH. O salmo 113, salmo responsorial da liturgia da Palavra de hoje, associa a recordação do mar Vermelho e do rio Jordão, implicados em um prodígio semelhante: «O mar, ao vê-los, fugiu, o Jordão se lançou atrás… Que te passa, mar, que foges; a ti, Jordão, que te lanças atrás?» (vv.3.5). É o Deus soberano que passa e, com seu povo, atraves­sa agora o umbral da terra prometida.

 

 

Salmo 113A/114 (Hino pascal) –

 

 

 

MEDITATIO: A magna procissão com a arca da aliança que pre­cede à entrada do povo na terra prometida nos fala da presença de Deus em meio do povo e, também, do pacto de amor de Deus como mesmo. É um pacto gratuito, onde Deus tem a iniciativa da ca­ridade superabundante, porém também um pacto que exi­ge por parte do povo a fidelidade à aliança a través do cumprimento do duplo mandato do amor a Deus e do amor ao próximo, com os preceitos das tábuas da lei, que são como a presença da fidelidade de Deus, encerrada na arca. Diante desta presença de Deus se renovam os prodígios do êxodo. Nós sabemos que a crise no cumprimento da aliança por parte do povo, ao longo da historia de Israel, aconteceu, sobretudo, por uma negligencia na observância tanto do amor a Deus como do amor ao próximo. Ainda quando o povo permaneceu fiel em cer­to modo a unos ritos que honravam a Deus, os profetas lhe reprovavam a falta de atenção ao próximo, ao ór­fão, à viúva, aos pequenos. Deus não pede sacrifícios, mas misericórdia. O ensinamento de Jesus se situa no mesmo plano de continuidade da pregação profética, ainda que com uma proposta inaudita, a do perdão oferecido ao irmão sem condições de tempo e de número: perdoar sempre, perdoar a todos, perdoar sem pedir contas, perdoar de coração. No fundo do ensinamento da parábola está a lógica divina da imitação do Pai celestial, que oferece a nós, se não temos o coração endurecido, um perdão sem limites. Perdoar é a última palavra do amor. É amor gratuito, o único que, junto com a misericórdia, pode ir mais além da justiça.

 

ORATIO: Senhor, cada dia te pedimos, com as palavras que teu Filho nos ensinou, que nos perdoes nossas ofensas como nós perdoamos aos que nos ofendem. Esta petição, à qual santo Agostinho chamava «nossa medicina cotidiana», porque necessitamos ser perdoados e abrir o coração ao perdão, é como um bálsamo para nossas feridas. Estamos feridos quando pecamos e sentimos a ne­cessidade de uma efusão de caridade, do Espírito que nos torna a curar, porque ele é a remissão de nossos pecados. Porém temos endurecido o coração e uma ferida escondida, uma esclerose ocul­ta, quando nos negamos a perdoar a alguém, a acolher-lhe em nosso amor. Concede-nos, Senhor, recitar sempre as palavras de teu Filho com toda sinceridade, contar sempre no coração com um suplemento de caridade para ir mais além da ló­gica da vingança, da condenação, da autojustificação. Não sabemos perdoar nem podemos perdoar sem esse suplemento de caridade divina que é a graça do Espírito Santo. Tu, que manifestas tua onipotência com a misericórdia e o perdão, amplia nossa capacidade de amar e de perdoar, estendendo também de coração o perdão àqueles que nos hão feito dano.

 

CONTEMPLATIO: Assim, adquirem vida as palavras do Senhor sobre o perdão, este Amor que ama até ao extremo (cf.Jo 13,1). A parábola do servo sem compaixão que culmina com o ensinamento do Senhor sobre a comunhão ecle­sial (cf. Mt 18,23-35), termina com esta frase: «Isto mesmo fará convosco meu Pai celestial se não perdoais cada um de coração a vosso irmão». É, de fato, no fundo «do coração» onde tudo se ata e desata. Não está em nossa mão já não sentir a ofensa e esquecê-la, mas o coração que se oferece ao Espírito Santo muda a ferida em compaixão e purifica a memória transformando a ofensa em intercessão […]. Não há limite nem medida neste perdão, essencial­mente divino (cf.Mt 18,21-22;Lc 17,3-4). Se são ofensas (de «pecados» Lc 11,4, ou de «dívidas» Mt 6,12), de fato somos sempre devedo­res: «Com ninguém tenhais outra divida que a do mutuo amor» (Rm 13,8). A comunhão da Santíssima Trin­dade é a fonte e o critério de verdade em toda relação (cf.1 Jo 3,19-24). Vive-se na oração e, sobretudo, na eucaristia (cf.Mt 5,23-24): Deus não aceita o sacrifício em desunião e nos despede do altar para que antes se reconcilie com os irmãos: Deus quer ser pacificado com orações de paz. A obrigação mais bela para Deus é nossa paz, nossa concórdia, a unidade no Pai, no Filho e no Espírito Santo de todo o povo fiel (são Cipriano; Catecismo da Igreja católica, nn. 2843.2845).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Perdoa-nos nossas ofensas, como também nós perdoamos aos que nos ofendem» (Mt 6,12)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Cristo sublinha com tanta insistência a necessidade de perdoar que a Pedro, que lhe havia perguntado quantas vezes deveria perdoar o próximo, lhe indicou a cifra simbólica de “70×7”, querendo dizer com isso que deveria saber perdoar a todos e sempre. É obvio que uma exigência tão grande de perdoar não anula as objetivas exigências da justiça. A justiça retamente entendida constitui, por assim dizer, a finalidade do perdão. Em nenhuma texto da mensagem evan­gélica o perdão, e nem sequer a misericórdia como sua fonte, significam indulgência como mal, como escândalo, injúria, ou ultraje cometido. Em todo caso, a reparação do mal do escândalo, o ressarcimento pela injuria, a satisfação do ultraje como condição do perdão. Assim, pois, a estrutura fundamental da justiça penetra sempre no campo da misericórdia. Esta, sem dúvida, tem a força de conferir à justiça um conteúdo novo, que se expressa da modo mais simples e pleno no perdão (Juan Pablo II, Dives in misericordia)

 

 

 

SEXTA-FEIRA, 17 DE AGOSTO DE 2018- 19ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO B

Mateus 19,3-12 (Pergunta sobre o divorcio; A continência voluntária) Não falta na pregação de Jesus uma precisão relativa aos temas mais fundamentais da vida. Je­sus não foge a confrontação com a realidade huma­na, mas ilumina com uma nova luz os pontos crí­ticos da vida dos homens. No caso de hoje se trata do matrimonio como projeto original do Criador. O Mestre, à luz do relato fundacional do Gênesis, recorda a duali­dade e a reciprocidade da natureza humana criada por Deus no casal complementar: «varão e fêmea». O casal é sinal de um dom recíproco, manifes­tado na união conjugal, que expressa a entrega total de ambas, uma à outra. Trata-se de um projeto de Deus que o homem não pode separar. Na prática, é a afirmação do projeto original de um matrimonio único e indissolúvel. Jesus ratificou esta mesma doutrina seguindo o itine­rário do que havia vindo a realizar: cumprir a lei e não aboli-la. Agora, trata-se de um reconhecimento que nem sempre se tem levado a sério; e mais, uma so­ciedade machista fez prevalecer sobre a debilidade da mulher o repúdio desta, como se só ela pudesse ser culpável. O restabelecimento do equilíbrio dos direitos e dos deveres entre o homem e a mulher no matrimonio é também próprio de Jesus. Por outra parte, o Mestre-celibatário por decisão própria, ainda que isto fosse um acontecimento muito singular em sua cultura­ afirma de sua própria colheita, com fórmulas que encerram algo de enigmático, que se pode optar também pelo celibato: não pela comodidade de não ter problemas, mas para dedicar-se por completo ao serviço do Reino de Deus. Sem dúvida, esta opção, segundo nos explica Jesus, é um dom que vem do alto.

 

 

Js 24,1-13 (A grande assembléia de Siquém) – Memória, reconhecimento, gratuidade. Nos livros sagrados do Antigo Testamento se recorda, com freqüência, a história do povo a partir de Abraão, que é seu pai na fé e em tomo ao qual se tornam a enlaçar constantemente os fios da memória. Na magna assembléia de Siquén, celebrada quando o povo já adentrou na terra prometida, se renova de modo solene a aliança com YAHWEH. Com certa estru­tura ritual, e antes da renovada adesão de fé por parte do povo, Josué traça as grandes linhas da história de Israel, presidida sempre pela presença do Senhor; transmite a memória das admiráveis obras realizadas pelo Senhor, em seu nome, como uma histo­ria levada a cabo por Deus mesmo com seus servos. Trata-se do relato de tudo o que YAHWEH vem fazendo ao longo de uma peregrinação que arranca com os ante­passados de Abraão, até o momento presente, no qual se vê realizadas as promessas que lhe foram feitas ao amigo de Deus, a nosso pai na fé. Em uma síntese vertiginosa se passa revista aos pais e aos pa­triarcas da historia do povo: Abraão, Isaac, Jacó e seus filhos, que desceram ao Egito. Depois se recorda o acontecimento maravilhoso da libertação do Egito, presente sempre na memória, como acontecimento chave da historia de Deus como povo, a entrada na terra prometida e as dificuldades superadas contra os habitantes desta terra. Tudo é historia de Deus em favor do povo, que deve captar sempre e em tudo a gratuidade dos dons de Deus, a fim de responder também com um coração reple­to de gratidão. Com este sentimento se conclui a pro­fissão de fé, memória histórica das obras de Deus. O povo tem agora uma terra que não exigiu nenhum trabalho, habita em cidades que não edificou, come o fruto de vinhas e olivais que não plantou (v.13). Tudo é dom de Deus.

 

Sl 135/136 (Grande ladainha de ação de graças) Neste belíssimo Salmo, em cada versículo repete-se: “pois eterno é o seu amor”, como uma eterna profissão de fé na misericórdia de Deus. Aplique este cântico nos seus dias e reze-o a fim de firmar, diante de todos, que o amor de Deus é eterno. Não podemos dizer que o amor de Deus “foi” eterno e nem que “será” eterno, mas sim “é“ eterno. Hoje e sempre; a Deus pertence toda a história e para Ele tudo é presente. “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou em toda benção espiritual nos céus, em Cristo. Nele, Deus nos escolheu, antes da fundação do mundo, para sermos santos e íntegros diante dele, no amor. Conforme o desígnio benevolente de sua vontade, Ele nos predestinou à adoção como filhos, por obra de Cristo, para louvor de sua graça gloriosa, com que nos agraciou no seu bem-amado” (Ef 1,3-6). Como é maravilhoso acreditar no amor imutável de Deus. Podemos mudar, mas Deus sempre nos amará, mesmo que não o amemos. Como a água que molha e o sol que ilumina, Deus, que é amor, ama toda e qualquer circunstância. A nós cabe dizer sim a este amor.

Deus me criou e amou, pois eterno é seu amor; chamou-me à vida, deu-me uma família, sim, pois eterno é seu amor; colocou-me neste momento histórico da Igreja, do mundo, pois terno é seu amor; deu-nos Maria como mãe, o batismo, fez-nos comunidade… Agradeço-te por todos os sacerdotes, pelos nossos bispos, pelo Papa, pela fraternidade e pela nossa capacidade de amar, por todos os pecadores que querem voltar a ti, pelos pequenos e pobres, pelos santos nossos amigos e teus amigos.

 

 

MEDITATIO: Um dos aspectos fundamentais da oração bíblica é o agradecimento. A recordação agradecida das obras realizadas por Deus na historia do povo de Is­rael suscita o louvor de bênção. Toda modalidade de oração que, com razão, se chama berakhah, «benção» dirigida a Deus por seus beneficias, é uma memória. Antes inclusive de ser uma oração de súplica é uma invocação de louvor Como se diz com frequência, a oração judia é narrativa, conta a historia de Deus através da his­toria do homem, diferente da oração dos pa­gãos dirigido a seus deuses, que era uma súplica inte­ressada, uma invocação destinada a obter benefícios, dado que, em verdade, pouco podiam contar das coisas feitas pelos deuses em favor dos homens. Não ocorre assim com Israel, um povo que sabia orar e que, de fato, orava relatando, pondo ante seu Senhor e ante o povo as maravilhas de Deus, as grandes obras realiza­das por ele. Por isso o «Credo» do povo que aparece na leitura do livro de Josué é uma narração de suas obras. Assim mesmo, só a partir deste principio da gra­tuidade de Deus se pode compreender a lição que nos apresenta o Evangelho. O matrimonio e a virgindade são duas vocações, dois projetos de amor, no desígnio de Deus. Tanto um como o outro não são opção do homem, mas projeto de Deus. Mais ainda, são um projeto complementário de duas vocações que, se só fossem opção do homem, seriam duas deformações, sujeitas a suas veleidades. Assim, quem vive a graça do matrimonio, único e indissolúvel, aceita e res­peita a vocação do próprio cônjuge. E quem vive a virgindade pelo Reino de Deus não leva a cabo uma opção egoísta ou se resigna a um expediente de impotência de amar. Vivem todos, a partir de Deus, uma opção de amor e de serviço na comunidade que Jesus veio fundar.

 

ORATIO: Bendito sejas, Senhor, Deus de nossos pais. Todas tuas obras destinadas a nós são ações de amor e de misericórdia. Também hoje te bendizemos com nossa ação de graças, que tem a eucaristia como seu ponto culminante. Em realidade, a história da salvação tem como meta e síntese a encarnação, paixão e ressurreição de Jesus, teu amantíssimo Filho. Nele se cumpri­ram todas as promessas, nos foram dados todos os be­ns, se esclareceram todos os enigmas, se realizaram todas as profecias. Damos-te graças, ó Pai, por nossa pequena his­tória de salvação, feita a partir de acontecimentos, de encontros, de relações. Tudo nos diz que és tu quem tece conosco uma história de amor e que le­vas a seu cumprimento, com a força de teu Espírito, teu desígnio de misericórdia. Faz que cada um de nós saiba reconhecer em cada acontecimento tua presença e possa dizer, de verdade, que tudo é graça, porque «é eterna tua misericórdia». Também te damos graças pelo dom precioso do matrimônio e da virgindade, pelas famílias e pelas pessoas consagradas. Faz que sejamos fiéis a teu desígnio de amor, de um amor que é santo e fecundo.

 

CONTEMPLATIO: Neste mundo santo, bom, reconciliado, salvo, melhor dizendo, que há de ser salvo, já que agora está salvo só em esperança, porque em esperança fomos salvos, neste mundo, pois, que é a Igreja, que se­gue a Cristo, o Senhor nos diz a todos: O que queira vir comigo que negue a si mesmo. Este preceito não se refere só às virgens, com exclusão das casadas; ou às viúvas, excluindo às que vivem o matrimonio; Ou aos monges e não os casados; ou aos clérigos, com exclusão dos laicos: toda a Igreja, todo o corpo e cada um de seus membros, de acordo com sua função própria e específica, devem seguir a Cristo. Siga-lhe, pois, toda inteira a Igreja única, esta pomba e esposa redimida e enriquecida como sangue do Esposo. Nela encontra seu lugar a integridade virginal. A continência das viúvas e o pudor conjugal. Todos estes membros, que encontram nela seu lugar, de acordo com suas funções próprias, sigam a Cristo; neguem-se, quer dizer, não se vangloriem; carreguem-se com sua cruz, quer dizer, suportem, no mundo, por amor de Cristo, tudo o que no mundo vos aflija. Amem Àquele que é o único que não nos trai, o único que não é enganado e não engana; amem a Ele, porque é verdade o que promete. Tua fé vacila, porque suas promessas tardam. Mantém-te fiel, persevera, tolera, aceita a demora: tudo isto é carregar-se com a cruz (Santo Agostinho, Sermão 96).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Porque eterna é sua misericórdia» (do salmo respon­sorial)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – A virgindade e o celibato pelo Reino de Deus, não só não contradizem a dignidade do matrimonio, mas a pressupõem e confirmam. Matrimonio e virgindade são dois modos de expressar e de viver, o único Mistério da Aliança de Deus com seu povo. Quando não se estima o matrimonio, não pode existir, tampouco, a virgindade consagrada; quando a sexualidade hu­mana não é considerada como um grande valor dado pelo Criador, perde o sentido a renuncia pelo Reino dos Céus. De fato, acertadamente disse são João Crisóstomo: «Quem condena o matrimonio priva, também, à virgindade, de sua glo­ria; e, ao contrário, quem o exalta faz a virgindade mais admirável e luminosa; o que parece um bem, só em comparação com um mal, não é um grande bem, mas o que é melhor ainda que bens por todos considerados tais é, certamente, um bem em grau superlativo». Na virgindade, o homem está à espera, inclusive corporalmente, das bodas escatológicas de Cristo com a Igreja, dando-se totalmente à Igreja com a esperança de que Cristo se dê a esta, na plena verdade da vida eterna. A pessoa virgem ante­cipa, assim, em sua carne o mundo novo da ressurreição futura. Em virtude deste testemunho, a virgindade mantém viva, na Igreja, a consciência do mistério do matrimonio e o defende de toda redução e empobrecimento. De modo especial, fazendo livre, o coração do homem, “até incendiá-lo magnanimamente” de caridade para com Deus e para com todos os homens, a virgindade testemunha que o Reino de Deus e sua justiça são a pérola preciosa, a qual se deve preferir a qualquer outro valor, ainda que seja grande; é mais, que deve ser buscada como o único valor definitivo. Por isto, a Igreja, du­rante toda sua historia, defendeu sempre a superioridade deste carisma frente ao do matrimonio, por razão do vínculo sin­gular que tem como Reino de Deus. Ainda que tendo renunciado à fecundidade física, a pessoa virgem se faz, espiritualmente, fecunda, pai e mãe de muitos, cooperando na realização da família segundo o desígnio de Deus (João Paulo ll, Familiaris consor­tio).

 

 

 

SÁBADO, 18 DE AGOSTO DE 2018   19ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO B

Lucas 1,39-56 (A visitação; Cântico de Maria) – O encontro de duas mães é sinal claro de ligação e continuidade da história da salvação contida no Antigo Testamento com a nova que inicia. Por isso, Isabel vê em Maria à mãe «de seu Senhor» (cf.v.43); proclama-a “bem-aventurada” por sua fé, exultando, junto com seu filho, no Espírito Santo (vv.41-45). A presença misteriosa do Espírito nos mostra, que as duas mães são parte de um mesmo plano de salvação. No fundo, é a humildade de quem acolhe, em si, a verdade da história. Exatamente por isso, a hu­mildade de Maria não a impede reconhecer-se, inclusive, como destinatária privilegiada do amor de Deus e profetizar que a história a recordará (e com isso se insere, uma vez mais, no exército de todos os orantes do An­tigo Testamento). Desta perspectiva parte a recordação das obras rea­lizadas pelo verdadeiro Senhor da história (vv.51-53). E esta se cumpre: na salvação levada a quem parece não ter salvação: os humildes, os famintos; e na dispersão daqueles que têm uma salvação fabricada à sua medida (os soberbos, os poderosos, os ricos). Estes dois aspec­tos da história parecem combater-se reciprocamente: «Demonstrou a força de seu braço” (v.51) é uma frase de conotação militar (cf. Sl 118,16). Sem dúvida, a profecia de Maria revela um único aspecto de salvação: a proximidade do Senhor. Tanto quanto demonstra ser fiel à suas próprias pro­messas (vv.54ss) e, assim, digno de confiança. A quem tem olhos humildes, capazes de ver a humildade da história da salvação, o Deus em quem se pode confiar permanece como confirmação da bênção que Ele mesmo dirigiu a Israel e a seu povo, a promessa que levam com eles, o menino que dá saltos no seio de Isabel e o que está crescendo no seio de Maria.

 

 

 

Ap 11,19a;12,1-6a.10ab (Visão da mulher e o dragão) – O texto apresenta uma visão. Nela se mesclam figuras e realidades, de modo que nem sempre é fácil interpretar com exatidão o significado. De outro lado, na linguagem profética e apocalíptica convém, com frequência, deter-se no nível da sugestão, a fim de entender melhor o texto. Este pode ser apresentado assim como um de nossos sonhos reveladores, um sonho no qual vêm à tona nossos medos e nossas certezas, nossas necessidades e nossos desejos… Este sonho nos fala de zelo, antes de tudo. Está se levando a cabo algo que está acima de nós, algo que nos inclui. A luta entre a mulher, o menino, o dragão e os exércitos angélicos não é algo fora de nós, mas se cumprem em nosso próprio zelo. Mas, trata-se de uma luta final, pois nela está em jogo nossa vida ou morte. Mostra-nos muito bem o sinal da mulher (12,1ss). Esta é quase uma rainha, soberana sobre a lua (quer dizer, sobre o «outro» lado de nossa consciência, a nossa natureza mais inconsciente) e sobre as es­trelas (as doze estrelas se referem às doze tribos de Israel, ou seja, que esta figura também é soberana da história, que, mesmo sem sabermos, está por trás de nós). Este sinal constitui o lado vivo de nossa realidade; mais ainda, o lado mais fecundo, o lado que nos impulsiona a continuar a vida, o sinal que nos permite alimentar a esperança de um dia novo. Sem dúvida, este sinal não está isento de dor e de perigo (12,3ss). A mulher grita em dores do parto e, ao mesmo tempo, teme o dragão que quer devorar o menino. Se nos deixamos cativar por este sonho, sentire­mos que significa que nosso sonho de uma vida no­va esteja em perigo, daremos conta até que ponto, está tremendo por dentro nossos desejos, perguntaremos se conseguiremos ver de verdade a luz.

 

1 Cor 15, 20-27a (O fato da ressurreição) – Paulo aponta, também, em outras ocasiões, que o anúncio da Ressurreição está no centro da mensagem cristã (cf.Rm 1,4;Gl 1,2-4;etc.): «Se Cris­to não ressuscitou, vã é vossa fé» (1Cor 15,17). Também neste caso, após voltar a chamar os fieis a compartilhar um mesmo caminho de fé, torna a apresentar-lhes o Evangelho inicial: «Cristo morreu por nossos pecados segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia segundo as Escritu­ras» (1Cor 15,3ss). Em consequência, tenta dar possíveis explicações da Ressurreição, ante possíveis objeções. No texto, a Ressurreição está unida a seu acontecimento primeiro: Jesus Cristo. De fato, o «primeiro homem, Adão, é figura de um ser para a morte, que introduz a morte-pecado na natureza humana; o homem «novo» Jesus, ao contrário, traz a vida e, através dele, tem lugar à Ressurreição.” A leitura cristológica da Ressurreição é óbvia; mais ainda, serve para valorizá-la como um acontecimento de graça e evitar leituras sim­plesmente naturalistas ou moralistas. A Ressurreição é o dom da vida de Deus em Cristo: não se trata de um prê­mio para quem tem se comportado bem ou da evolução na­tural das coisas… A Ressurreição é a Vida nova que irrompe em nossa vida, é a Vida da graça, que transforma todo nosso ser e faz que nosso espírito e nosso corpo possam ver o rosto de Deus e sejamos elevados ao céu. Este é o real anúncio da de­rrota definitiva da morte, que já não é considerada como pecado e dor, mas se converte na porta santa, no último passo para o encontro com o Senhor de nossa vida.

 

Sl 44/45 (Epitalâmio real) – A Igreja aplica este Salmo à Virgem Maria. Quem ama sente a necessidade de louvar e cantar as maravilhas do mundo. Quem mais do que Maria pode cantar a beleza do Verbo feito carne? Quem mais do que ela pode sentir a alegria de contemplar o seu Filho? E quem mais do que Jesus pode cantar as belezas de sua Mãe Maria? Este hino de amor nos faz perceber como a vida é bonita quando nos doamos no amor, quando Deus se coloca na nossa frente com toda sua beleza e poder.

Senhor, que eu possa em cada momento sentir-me atraído por ti, por um amor infinito. Que este amor nunca venha a menos e que tudo o que faço seja só feito por amor e no amor. Que nada me afaste da tua beleza. Seduz-me, Senhor, e que me deixe seduzir. Que estejamos unidos por laços de amor eterno. Amém.

 

 

MEDITATIO: À medi­da que o senhorio de Deus entra em nossa história conseguimos ver com olhos novos a realidade que nos rodeia. Já não vêem só os abusos, as in­justiças, as mentiras… Aos poucos se tornam semelhantes aos de Maria, que é capaz de reconhecer o poder de Deus que atua na história em favor da justiça e da paz, e que nós mesmos po­demos fazer parte dessa história, exatamente como Maria, se nos confiamos a este anúncio. O senhorio de Deus encontra também sua realização em nosso caminho de fé. Com Maria nos damos con­ta que somos «servos» chamados a proclamar a obra e as maravilhas do Senhor, a engrandecer sua presença em nossa vida. Com Ma­ria: não temos medo de reconhecer, ante o mundo, nossa eleição e de chamar-nos ser­vos e filhos de Deus; não temos medo da obra que o Espírito Santo está realizando em nós. Este cami­nho se realiza através da oração, do serviço e do testemunho, junto com Maria, que foi capaz de realizar, em sua própria carne, sua oração do Magníficat e seu anúncio de libertação. O último anúncio deste senhorio de Deus sobre nossa vida tem lugar quando conseguimos com­preender que este não permanece estranho a nossa cor­poreidade. E podemos intuir já no anúncio da en­carnação ou tê-lo em nossa vida, através da corporeidade dos distintos sacramentos. A realidade da ressurreição, que para nossa natureza huma­na se torna eficaz já na assunção de Maria ao céu, é o último chamado a entregar nosso corpo, do mesmo modo, ao poder do Reino de Deus. Até nosso cor­po, com suas necessidades mais insignificantes e seus desejos mais elevados, está incluído no Reino de Deus. O corpo de Maria, que levou nele o corpo do Verbo encarnado e fez frente, também, à dor da história, torna-se, em sua Assunção, a promessa e a realização disto: nossos desejos, nossas necessi­dades, não podem apartar-se da presencia divina que tocou nossa vida.

 

ORATIO: Dou-te graças, ó Pai, porque elegeste Maria, mulher humilde e pobre, para dar cumprimento às promessas que fizeste a Abraão, que «teve fé e esperou contra toda esperança»(Rm 4,18). Nela nos mostraste que operas simplesmente por amor. Ajuda-me a ver que, também, estou chamado a este amor, sem medos. Dou-te graças, Verbo eterno, porque em Maria, com tua encarnação, tocaste nosso corpo mortal e, em Ti, o fizeste capaz de acolher a santidade de Deus. Tudo o que tens feito na história, com tuas palavras e ações, se converte, para nós, em chamado e promessa de um mundo novo. Ajuda-nos a crer em Ti e que Tua história é a verdadeira história do mundo. Dou-te graças, Espírito do Pai e do Filho, porque Tua ação misteriosa mudou o sentido da história. Teu poder tocou o seio de Maria e a preparou para a vinda do Verbo de Deus. Teu poder transformou as palavras de uma pobre mulher em um anúncio capaz de revolucionar a história, em profecia de verda­deira libertação. Teu poder santificou um corpo destina­do ao pó, tornando-o glorioso e capaz do infinito. Que teu poder nos ajude, também, a confiar nossos sonhos e nossos desejos a este anúncio de Ressurreição, para que consigamos rea­lizar, também, em nossa vida, o ato de fé total como foi o de Maria.

 

CONTEMPLATIO: Nossa celebração consiste mais na contemplação do mistério que em sua explicação. E ainda que eu quisesse antepor ao silêncio, à fala, esta última se vê forçada pelo afeto, dando lugar às palavras, e cede a estas, ainda que não tenham coragem e não ignorem sua de­bilidade, que é grande demais com respeito à possibili­dade de satisfazer, de um modo adequado, o arcano do prolongado silêncio […]. Por isso, ânimo! Obedecei a mim, que sou bom con­selheiro, e correi ao encontro da Mãe de Deus. E, enquanto estais reluzentes pela ação e pela palavra, e resplandeceis por todos os lados, graças à be­leza da virtude, queira o próprio Cristo recolhê-los e re­cebê-los, ao mesmo tempo, no místico banquete. E os mostra, claramente com o fato de que hoje traslada a sua Mãe sempre virgem, de cujo seio, e ainda sendo Deus, tomou arcanamente nossa forma, dos lugares terrenos como rainha de nossa natureza, deixando o poder do mistério sem anúncio, ainda que não de todo inco­municável. De fato, ela veio no nascimento e, sem dúvida, teve uma condição extraordinária. Aquela que procurou a vida sobe para uma viagem de nova vida e traslada-se ao lugar incorruptível, princípio de vida (Andrés de Creta, Omelie mariane, Roma 1987).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«O Senhor olhou a humildade de sua serva» (Lc 1,48)

 

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Só acrescentarei que, assim como a cada ano, honramos um mistério de Jesus de modo especial, convém também escolher, no dia da Assunção da Santíssima Virgem, um mistério de sua vida para dar-lhe honra particular durante o ano. Os principais estados e mistérios da vida da santa Virgem Maria são: sua Concepção; sua residência nas ditosas entranhas de sua mãe Santa Ana; seu Nascimento; o dia em que recebeu o Santo Nome de Maria; sua Apresentação no templo; seu estado de infância até a idade de doze anos; seu matrimônio com São José; a Encarnação de Jesus nela; sua condição de Mãe de Deus; a residência de Jesus nela; sua visita a Isabel e sua permanência de três meses em sua casa; sua viagem de Nazaré a Belém; seu divino parto; sua Purificação; sua fuga ao Egito e permanência ali; seu regresso do Egito e sua vida em Nazaré com seu Filho até os trinta anos; as viagens com seu Filho durante sua vida pública; seu martírio ao pé da cruz; sua alegria na Ressurreição e Ascensão de seu Filho; todo o tempo de sua vida desde a Ascensão de Jesus até sua própria Assunção; suas santas comunhões durante esse tempo, sua ditosa morte; sua gloriosa Ressurreição; sua triunfal Assunção; sua colocação à direita de seu Filho como soberana do céu e da terra; a vida gloriosa e feliz que leva no céu desde o dia de sua Assunção (São João Eudes).

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