QUARESMA: 3ª SEMANA (Estudos Bíblicos)

ESTUDO BÍBLIBO NA 3ª SEMANA DA QUARESMA ANO A 2023

Comunidade Paz e Bem

Segunda–feira

Lucas 4,24-30

RESISTÊNCIAS DE CORAÇÃO PARA A CONVERSÃO

Nenhum profeta é bem recebido em sua pátria”

Ao iniciar esta terceira semana de quaresma, a Palavra nos introduz, delicadamente, no mistério Pascal que, de alguma forma, esteve sempre presente durante sua vida e, em particular, durante sua missão.

O evangelho de hoje nos situa no começo da pregação de Jesus na Galiléia e, particularmente, em Nazaré. Jesus prega nas sinagogas com a força do Espírito Santo.

Quem o escuta recebe a salvação prometida pelos profetas: “Esta escritura que acabam de ouvir se cumpriu hoje” (4,21) e todos se admiram das palavras de graçaque saem de sua boca (4,22).

Mas, à admiração, segue-se, imediatamente, o escândalo. Desde o início até o final de sua vida Jesus será ocasião de escândalo para seus contemporâneos: “Não é este o filho de José?” (4,22).

A simplicidade, a humildade e a pobreza de Jesus “que não fazendo alarde de sua categoria de Deus, se esvaziou de si mesmo e assumiu a condição de escravo” (Fl 2,6), colocando-se entre os últimos, é motivo de escândalo para seus vizinhos e conterrâneos.

Eles creem conhecer tudo de Jesus, porque conhecem sua família humilde de Nazaré, enquanto que Jesus conhece seus pensamentos e desmascara sua realidade: “seguramente vão me dizer o refrão: médico cura-te a ti mesmo. Tudo o que temos ouvido que tens feito em Cafarnaum, faz também aqui em tua terra” (4,23).

Os vizinhos e conterrâneos de Jesus, em lugar de converter-se com “as palavras de graça que saem de sua boca” (4,22), se negam a crer n’Ele e pretendem que faça, para eles, os mesmos milagres que fez em Cafarnaum.

O conhecimento que crêem ter de Jesus e a pretensão de vê-lo realizar milagres não lhes permite crer n’Ele. E Jesus, vendo sua incredulidade, lhes diz com autoridade: “nenhum profeta é bem acolhido em sua terra”.

A rejeição que é dada a Jesus é a mesma que foi dada aos profetas. Elias e Eliseu não puderam fazer milagres em Israel, só em Sarepta de Sidón e na Síria (25-27) onde encontraram corações abertos para acolher a palavra de Deus (ver 1 Rs 17,7.16; 2 Rs 5,1.14).

Enquanto Jesus está cheio do Espírito Santo, em sua pregação, seus vizinhos e conterrâneos estão cheios de raiva e querem matá-lo (4,28-29). “Porém, Jesus, passando no meio deles, saiu” (4,30).

São Lucas deixa entrever algo de extraordinário que não permite aos nazarenos acabar com Jesus: o Mestre se sai das mãos deles, passa pelo meio da raiva e da rejeição de seu povo, não se deixa atrapalhar, nem afetar, sai livre de suas mãos. Nesta incrível liberdade de Jesus se pré-anuncia a sua ressurreição, a sua vitória sobre as garras da morte.

Encaminhando-nos, já, para o final da quaresma, o Evangelho de hoje questiona, fortemente, nossa fé e a autenticidade de nossa conversão. Haverá algo que a este ponto, está nos impedindo uma verdadeira conversão?

Cultivemos a semente da Palavra no coração.

  1. Que significa dizer que Jesus prega com a força do Espírito Santo?
  2. De que forma concreta eu estou aproximando-me, diariamente, da Palavra de Deus e, que efeitos de mudança constato em mim?
  3. Como manifestamos que cremos em Jesus, não só a nível individual, mas como família e também como comunidade?

Não será que nossa fé se reduz a uns curtos momentos, diários ou semanais, que depois não tem que ver, em nada, com a nossa vida?


TERÇA-FEIRA

Mateus 18,21-35

NOSSA converSÃO: Perdoar de coraÇÃO.

“Não devias tu, também, compadecer-te de teu companheiro, como eu me compadeci de ti?”

Em nosso itinerário quaresmal, a Palavra de Deus nos convidou a verificar nosso processo de conversão. Continuamos na escuta do Mestre e na docilidade a seu Espírito, permitindo que Ele possa infundir-nos esse espírito novo que nos faz pessoas renovadas, verdadeiros discípulos.

O Evangelho deste dia iniciado no discurso de Jesus sobre as relações fraternas próprias da comunidade dos discípulos (Mt 18), nos coloca ante um ensinamento de Jesus sobre a necessidade de perdão.

Nosso texto tem duas partes:

1. O Diálogo de Pedro com Jesus: o “perdão” dá identidade à comunidade (vv.21-22)

Pedro toma a iniciativa e se aproxima de Jesus para perguntar-lhe: Senhor, quantas vezes tenho que perdoar as ofensas que me faça meu irmão? Até sete vezes? (v.21). A pergunta de Pedro nos deixa ver que ele havia entendido muito bem que a comunidade de Jesus se constrói no perdão recíproco. É assim que somos identificados como filhos do Pai celestial (ver 5,43-45; 6,14-15). Na pergunta, Pedro pôs um limite: “Até sete vezes?”. 

A resposta de Jesus, por sua parte, abre o perdão do discípulo para um horizonte ilimitado: “Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete” (v.,22). Portanto, o perdão do discípulo não tem limites, assim como tampouco tem limites o perdão e a misericórdia do Pai para nós. Para aprofundar este ensinamento, Jesus introduz, em seguida, a parábola do “Servo sem misericórdia”.

2. A Parábola do servo sem misericórdia (vv.23-35)

A parábola está construída a partir do contraste entre a misericórdia de um rei que perdoa a um de seus servos, uma dívida incalculável e a crueldade e dureza desse mesmo servo, que não perdoa seu companheiro que lhe deve uma pequena soma de dinheiro.

A magnitude do coração do Pai:

Ao rei, que chama os servos a ajustar as contas, é apresentado um que lhe devia dez mil talentos (v.24). Dez mil talentos é uma soma tão desproporcional, que, talvez, só o rei poderia possuí-la e que, talvez, o servo não teria conseguido pagar durante toda sua vida. Ante o servo que lhe suplica, o rei se deixa tocar o coração.

Não pensa na grande soma de dinheiro que tem a perder, não persiste em fazer-lhe cumprir de acordo com a justiça, mas, cheio de compaixão e misericórdia, perdoa-lhe tudo e o deixa ir, livre. A magnitude de seu coração superou, imensamente, aquela dívida que superava, já, toda medida. Com estes traços desproporcionais, Jesus nos mostra como é o coração do Pai, sua infinita ternura e compaixão para conosco. Os “dez mil talentos”, soma incalculável, aludem à grandeza do que Deus tem feito e segue fazendo por nós.

A dureza de nosso coração:

Ao sair,aquele servo encontrou um de seus companheiros que lhe devia cem denários” (v.28a).      Cem denários é uma soma mínima, em comparação com a dívida que fora perdoada. Vem, então, a hora cruel, o servo maltrata física e moralmente seu companheiro. Ante a súplica do companheiro, que usou exatamente as mesmas palavras que pouco antes, havia expressado a seu senhor (v.29; ver 26), foi cruel(v.30).

Notamos uma desproporção imensa entre a misericórdia que havia recebido e a dureza de seu coração. A história põe na balança a dissipação do perdão recebido (do Pai, dos outros) e a estreiteza e dureza de nosso coração, que é incapaz de perdoar. Mas as coisas não ficam assim. Quando o rei soube do comportamento do servo, o chama de novo e encara sua maldade: (vv.32b-33).

O coração do Pai, medida de nosso perdão: O perdão que recebemos de Deus, nos indica a medida do perdão que devemos dar aos irmãos. Este é o sentido da resposta de Jesus a Pedro: “Até setenta vezes sete(18,22). Em outras palavras: o que Deus faz comigo é o princípio do quanto devo fazer pelo irmão; a misericórdia, que o Pai derrama sobre nós, sem medida, acolhida em nosso coração, deve derramar-se, gratuitamente, para os outros, como gratuitamente nos foi dada.

O perdão uma necessidade vital e recíproca: Retomando o contexto amplo no qual se encontra esta parábola, compreendemos agora que o perdão é o que torna possível a vida comunitária. Estamos juntos, não porque não nos equivocamos e não nos ofendamos, mas porque perdoamos e somos perdoados. Nossas limitações e defeitos, em lugar de afastar-nos e dividir-nos, podem fortalecer a comunhão e unidade, quando o perdão se torna uma atitude permanente em nossa vida.

Por isso, o perdão é algo vital de nossa convivência diária. Porém, temos que observar a última frase desta passagem: o perdão que Jesus pede é um perdão que vem do “coração” (18,35). Neste “coração”, quer dizer, no mais profundo de mim mesmo, deve permanecer, não o rancor pela pequena ofensa que recebo do irmão, mas o amor infinito e incondicional do Pai. Pode-se dizer que não perdoar é matar em meu irmão o amor do Pai.

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração

  1. Que diferença encontro entre a atitude do amo e a do servo, segundo nos apresenta o texto?
  2. Minha atitude de perdão para os demais é sempre generosa? Que posso melhorar a respeito?
  3. Como tenho agradecido o perdão que alguma vez tenho recebido de alguém?

QUARTA-FEIRA

Mateus 5,17-19

APRENDER A FAZER EM JESUS A VONTADE DE DEUS.

“Não vim a abolir, mas a dar cumprimento”

Quem faz a experiência das “bem-aventuranças” é um homem novo no Reino de Deus pregado e levado a cabo pela pessoa de Jesus, n’Ele tem agora um novo coração. O discípulo começa a centrar-se todo em Jesus. Mas a vivencia da radical nova do Reino pode levar a pensar que “a Lei e os Profetas” ficam abolidos (Mt 5,17ª). Isto  não é exatamente assim, mas como disse Jesus: Não vim a abolir, mas a dar cumprimento (5,17b).

A frase “a Lei e os Profetas” é uma forma de designar tecnicamente a Bíblia Hebreia (para nós é grande parte do AT), isto quer dizer que indica toda a primeira parte da revelação de Deus. A “Lei” é o critério de vida por excelência para o povo que tem feito Aliança com Yahweh. Os “Profetas”, enquanto defensores da Aliança, foram intérpretes da Lei.

Quando Jesus disse que veio a dar cumprimento a Lei e os profetas”, está afirmando que n’Ele visível todo o que a Lei e os Profetas tentaram dizer. O que Deus tem querido revelar a seu povo tem seu ponto culminante na pessoa de Jesus. Por isso, digamos assim, entre o Antigo e o Novo Testamento não há contradição, mas uma linha continua, sempre ascendente.

Pondo o olhar então em todas as ações de Jesus no evangelho, porque foi ali onde “deu cumprimento” ao querer de Deus. Já a primeira ação de Jesus no Evangelho de Mateus havia sido programática ao respeito quando, a beira do Jordão, lhe disse a João: convém que cumpramos toda justiça (3,15).

Nas palavras seguintes de Jesus se aprofunda no modo como se dá “cumprimento” à Lei e os profetas:

  1. Da parte de Deus, mantém firme sua Palavra e nos oferece um caminho para que esta se realize plenamente (“que todo suceda, 5,18);
  2. Da parte do homem, a Palavra de Deus alcança seu cumprimento nele na medida em que a leve à prática e sejam ensinadas (“observar e ensinar”, 5,19).

Deus é o primeiro que põe em prática a Lei em seu Filho Jesus. A “justiça” primeira é a de Deus. E esta justiça –segundo o evangelho de Mateus- se chama Jesus. Por isso não se falará explicitamente do “ensinamento de Jesus” (só até 7,24), mas do “cumprimento da Lei”, simplesmente porque esta ordem de idéias é o mesmo.

Deus: A Palavra se faz realidade

Asseguro-vos: passarão céu e terra antes que passe um ‘i’ ou um ‘til’ da Lei sem que tudo aconteça” (5,18). Tudo a lei quer que “aconteça”. Jesus a realiza em sua própria vida e deste modo oferece a quem quer que lhe siga a possibilidade de aprender n’Ele a fazer a vontade de Deus. O evangelho aos poucos irá desvelando de que modo o “cumprimento” está na práxis de Jesus.

A síntese do que quer a ‘Lei e os Profetas’, finalmente, será o amor misericordioso. Desta forma a “Lei” segue sendo inquebrantável, porém por outra parte não se compreende plenamente, mas na interpretação que lhe dá Jesus. Portanto, porque Jesus deu sua máxima expressão a todo o valor que tem “A Lei e os Profetas”, todos temos a possibilidade de viver a Palavra de Deus em seu seguimento e, assim, esta manterá sua vigência até o fim do mundo (“céu e terra passarão antes de que passe…”).

O discípulo: A Palavra se faz vida

Deus cumpre sua Palavra, mas os discípulos também tem que cumpri-la, isto é, passar da teoria à prática. Todos os mandamentos, inclusive os menores, são obrigatórios, já que o homem somente se faz “justo” na vivencia do querer de Deus. Mas o discípulo não andará ansioso por detalhes, porque vive a Lei desde uma vida inspirada na nova “justiça” que ensina Jesus, uma “justiça” que provem do estar imerso na experiência do “Reino” (ver as bem-aventuranças).

Para enfatizar isto, Jesus apresenta a mesma idéia tanto em negativo como em positivo:

(1) “O que traspasse…”/“o que observe”;

(2) “Será o menor no Reino…”/“será grande…”.

Jesus havia de “por em prática”, porém também de “ensinar”. Jesus aplica a mesma lógica do compromisso com a Palavra ao compromisso com a correta educação que consiste no aprendizado do evangelho enquanto cumprimento perfeito “da Lei e os profetas”.

O discípulo que põe em prática a Palavra, já é por si um bom mestre e com a mais eficaz das didáticas: o testemunho.  Mas não pode esquecer que diante dele vai Jesus. Ao dizer que veio “dar cumprimento”, que maravilha! Ele mesmo faz o que ensina! Estar na escola de Jesus é aprender sua vida.

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração

  1. Um cristão pode permitir que se desvalorize o Antigo Testamento? Que argumentos tem para sua resposta?
  2. Em contrapartida, que se passaria se lêssemos o Antigo Testamento sem chegar ao Novo? Que tipo de espiritualidade viveríamos?
  3. Quem dar “cumprimento” à “Lei e os Profetas”?
  4. A “lectio divina” tem como finalidade ajudar-me a passar da teoria do texto à prática da Palavra de Deus

em minha vida. Como a estou fazendo? Estou ensinando-a a outras pessoas?


QUINTA-FEIRA

Lucas 11,14-23

Estás com Jesus para seres libertados do mal

“O que não está comigo, está contra mim, o que não recolhe comigo, espalha”

A Palavra de Deus que vem iluminando e orientando nosso caminho quaresmal, nos tem mostrado, nas parábolas e discursos de Jesus, os diferentes matizes do amor cristão, com uma particular acentuação na reconciliação, no perdão e na misericórdia, como experiências fundamentais de nossa identidade de filhos de Deus.

A vivência do amor à maneira de Jesus é o selo que distingue seus discípulos.

O Evangelho de hoje tem como contexto anterior o ensinamento de Jesus sobre a oração segundo a versão de Lucas.

Na oração pedimos ao Pai o “pão de cada dia” (11,3). O pão é o dom ‘do amigo que já está descansando’ para dar ‘ao amigo que vem de viagem’ (11,6-7), é o símbolo da “coisa boa” que um pai – por mau que seja – nunca nega a seu filhinho (11,11-12).

E na oração, que sempre é escutada (11,10), obtemos o dom do Espírito Santo (11,13), que é o dom maior do Pai com o qual também nós podemos vencer ao maligno. E isto porque a luta de Jesus, no deserto, continua em nós, seus discípulos (11,4).

  1. Jesus liberta do mal com o dedo de Deus

Em nosso texto (=Mt 12,22-30 e Mc 3,22-27), vemos Jesus que, depois de expulsar um demônio, é acusado, por seus opositores, de fazê-lo com o poder de beelzebu, o príncipe dos demônios (11,14-16).

Porém ele, conhecendo seus pensamentos” (11,17) explica quão contraditória e ilógica é sua acusação:

  •  “Se, pois Satanás está dividido contra si mesmo, como vai subsistir seu reino?…” (11,18).
  • Porém se pelo dedo de Deus expulso, eu, os demônios, é que chegou a…”(11,20).

Na vitória sobre o mal, Jesus revela seu mistério e dá um sinal inequívoco da chegada do Reino. “Pelo dedo de Deus” (11,20).

A imagem expressa, na Bíblia, a realidade do poder de Deus atuando em meio do povo (Dt 9,10; Ex 7,18;8,15); “Pelo dedo de Deus, quer dizer, com a força de Deus, com seu Espírito, Jesus liberta da escravidão do pecado e reconstrói em cada pessoa o rosto do filho para o qual foi chamado.

O gesto que Jesus realiza é pascal. O que Deus fez no passado, libertando o povo da escravidão, realiza agora em Jesus. Assim afirma sem rodeios:“chegou a vós o Reino de Deus”.

  • Quem conhece Jesus, sente a necessidade de optar por Ele.

Esta apresentação do Jesus pascal, vencedor do maligno, nos orienta, em seguida, em uma direção prática, para o discipulado: Quem reconhece em Jesus a chegada do Reino de Deus, não pode deixar de segui-lo.

Conhecê-lo, é acolhê-lo e optar por Ele: “O que não está comigo, está contra mim, o que não recolhe comigo, espalha” (11,23).

Portanto, quem está com Jesus recolhe frutos de vida: recupera a filiação perdida, entra no coração do Pai e ama aos irmãos com seus mesmos sentimentos. Estar com Jesus leva-nos a ter seu Espírito.

Quem não está com ele, espalha (11,23b), quer dizer, perde sua vida, fica indefeso em mãos do inimigo.

Ao contrário, com Jesus o mais forte(11,22), que derrotou, definitivamente, ao maligno, é possível vencer as insídias do mal e serem os filhos amados do Pai (ver 11,2.13).

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração

  1. Que quer dizer que Jesus liberta do mal com o dedo de Deus?
  2. Em que momentos de minha vida tenho constatado que estou com Deus? Em que momentos ou situações tenho constatado o contrário?
  3. Que implicação “pascal” tem o ser discípulo? De onde vem à vitória sobre o mal? Como fazer para obtê-la?

SEXTA-FEIRA

Marcos 12,28b-34

PRIORIDADE EVANGÉLICA (I): UM AMOR OBLATIVO QUE É EXPRESSÃO DA VINDA DO REINO

“Amarás ao Senhor, teu Deus… e a teu próximo como a ti mesmo”

Na resposta de Jesus aos Saduceus ficou claro que o fundamental é: Quem é Deus? Qual é a natureza de sua relação conosco? A ênfase estava na obra de Deus: obra criadora sempre a serviço da vida.

  1. A pergunta do Rabino (12,28)

Agora a pergunta se inverte: O que Deus espera que façamos para entrar na justa relação com Ele? A resposta é clara: amar! 

A pergunta, traçada, desta vez, por um escriba, sobre o que Deus quer que façamos, aparece nestes termos: “Qual o primeiro de todos os mandamentos?” (12,28). É como se dissesse: Que é, em última instância, o mais importante para Deus? Em que devemos concentrar todas as nossas forças?

  • A resposta de Jesus (12,29-31)

Jesus toma citações do Antigo Testamento para assinalar o caminho que devemos seguir de modo que nossa vida siga na direção reta e alcance sua plena realização.

Jesus recita o texto de Dt 6,4-5, no qual está ordenado que a primeira e mais importante tarefa de um israelita é amar a Deus sem divisão, pois é o Deus único, e com todas as forças de que disponha.

Fala-se “da força” em geral: “Com todas as tuas forças”. Mas, antes se especifica: o amor se exerce com todas as faculdades humanas, isto é:

  • “Com todo teu coração”, quer dizer, com todo teu querer, com tua vontade. O amor é decisão;
  • “Com toda tua alma”, quer dizer, com todas tuas forças vitais. O amor é impulso vital;
  • “Com toda tua mente”, quer dizer, com toda tua inteligência. O amor é inteligente.

Estas dimensões do amor acima mencionadas não esgotam tudo, nem pretendem tampouco estabelecer compartimentos. O que se quer dizer é que devemos empregar todas as nossas forças, sem exceção alguma, no amor a Deus.

Por isso se repete o termo “Todo”: tal deve ser a intensidade e a cobertura de nosso amor. Em seguida, apesar de que somente lhe perguntaram pelo primeiro, Jesus menciona “Amarás a teu próximo como a ti mesmo”, colocando o segundo em equivalência com o primeiro (“Não existe outro mandamento maior”, disse).

Este novo mandamento tem como critério o amor que tenhamos por nós mesmos, isto é, o aceitar-nos com tudo o que somos e que constitui nossa personalidade e nosso projeto, com todas nossas capacidades, porém também com todos nossos limites. 

Por isso este segundo mandamento é um “sim” a tudo o que Deus nos tem dado (a nós e a nosso próximo) e, portanto, uma forma de amá-lo.

  • A conclusão (12,32-34)

É tão importante o que Jesus acaba de dizer que o escriba o repete quase nos mesmos termos (32-33).

O fato que lhe agregue, que este amor “vale mais que todos os holocaustos e sacrifícios” (12,33), indica que este é o valor número um sobre o qual se devem ordenar todos os demais, por ser oblativo, de oferenda do próprio ser, supera toda a espiritualidade sacrificial do Antigo Testamento.

As palavras finais do escriba fazem supor que está assumindo um compromisso com o que se está dizendo e que, portanto, está em plena sintonia com Jesus. Por isso, a declaração final de Jesus o coloca na categoria dos discípulos: “Não estás longe do Reino de Deus(12,34).

Tenhamos presente: amar significa sair da passividade, da indiferença, da comodidade, da superficialidade, da desconfiança, de modo que todo nosso ser tenda, ativamente, fortemente e decididamente, a Deus, com uma motivação despojada de qualquer mesquinhez, com interesse profundo, pronto e vivo.

Quando vivemos isto, “O Reino de Deus está próximo” (Mc 1,15).

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração

  1. Por que o amor a Deus e ao próximo “Vale mais que todos os holocaustos e sacrifícios”?
  2. De que forma o amor a Deus move e anima minha vontade, minhas forças vitais e inteligência?
  3. Que expressões de amor são as que mais necessitam nossos povos hoje, nossos jovens, crianças, esposos, os necessitados, e nossos irmãos de comunidade? Qual foi o último gesto de amor que fiz a alguém?        Que me moveu a fazê-lo?

“Amabilíssimo Coração de meu Salvador, ofereço-te o amor que arde por ti nos corações dos divinos amantes, e rogo-te que associe meu coração aos seus neste mesmo amor” (João Eudes)


SÁBADO

SÃO JOSÉ, ESPOSO DA BEM-AVENTURADA VIRGEM MARIA, Padroeiro da Igreja Universal, Solenidade, Ano A

Mateus 1,16.18-21.24a

José e a anunciação noturna:

“Era justo”

Celebramos hoje a festa do glorioso São José, pois foi portador de grande sensibilidade espiritual diante do mistério profundo.

A liturgia da Igreja nos convida a ler as palavras que descrevem a José, primeiro na genealogia de Jesus (“Jacó gerou a José, o esposo de Maria”; Mt 1,16) e logo no relato do anúncio da concepção virginal de Jesus (Mt 1,18-24).

Na genealogia de Jesus, José aparece como um verdadeiro Israelita, o descendente davídico que dá esta dignidade – por adoção – a Jesus.  A lista dos descendentes tem uma variante – justo – quando chega a José, para expor que José é esposo de Maria, porém, que Jesus não é filho natural de José.

Jesus, nem é gerado nem gera, com Ele acaba a lista. Contudo, graças a José, Jesus se insere na história do povo do qual é a plenitude. Por meio de José recebe uma nação, um povo, uma cultura e a adesão ao povo de Abraão.

A passagem de hoje relata como José supera suas dúvidas e acolhe Maria em sua casa. Com poucas palavras se disse muitíssimo sobre Jesus, Maria e José.

O relato aponta para a afirmação, de que Jesus não tem um pai terreno, que deve a origem de sua existência ao Espírito Santo, à obra criadora de Deus. Deus interveio e pôs um novo começo na história da humanidade.

Porém, José tem um papel importante nos acontecimentos. O relato nos apresenta as diversas fases de que passa José para compreender seu lugar e sua missão.

Depois de ficar perplexo pela notícia da gravidez de Maria (1,18), José tenta resolver o impasse jurídico com um repúdio em segredo (1,19). Está planejando isto, quando Deus, intervêm com uma palavra que contradiz seus planos (1,20-21), e ao qual José responde positiva e pontualmente (1,24).

Tudo poderia sintetizar-se na “justiça” de José. De fato, é chamado “justo” (1,19). Esta justiça consiste na obediência aos projetos de Deus: se trata de uma pessoa madura na fé, que tem uma profunda relação com Deus, que percebe seus caminhos e transita por eles. Jesus nasce à sombra deste “justo”, testemunho de maturidade na fé.

Esse ânimo lhe permite confrontar seu projeto pessoal com o projeto de Deus, e deixar-se vencer pelo segundo. O faz porque é capaz de compreender a Deus, e é por isso que está em condições de saltar as barreiras legais, que se lhe apresentam no momento crítico de sua vida, e fazer algo inaudito. José compreende o projeto de Deus em sua esposa e opta por ele.

A página do Evangelho nos coloca hoje ante um quadro estimulante: um homem com uma grande estatura em sua fé, que não é eximido das vacilações e temores ante as situações difíceis, porém, que é capaz de dar o salto pelo qual se abandona na graça iluminadora de Deus, que o anjo lhe lançou quando lhe disse: “Não tenhas medo” (1,20).

Assim, atravessa a cortina escura, e se abre ante o grande horizonte da salvação que se inaugura em Jesus. Nos relatos seguintes, nos quais a vida do menino Jesus se vê ameaçada (Mt 2,13-21), José assume o papel de defensor da vida do menino e da mãe.

O que teve em seus braços o Emanuel teve a oportunidade de, primeiro ver como, nesse menino, Deus estava com Ele, foi, também, na hora da violência cruel sobre os inocentes, o mediador do Deus-Pai que protege a vida de seu filho. Em José, Jesus também viu como Deus-Pai estava com Ele.

Aprofundemos com os nossos pais na fé

São Bernardo (1091-1153), monge cisterciense e doutor da Igreja 

«José, Filho de David»

Não há dúvida de que este José, cuja esposa é a Mãe do Salvador,

é um homem bom e fiel.

Repito, servo fiel e prudente, que o Senhor escolheu como consolo

de sua Mãe, sustento da sua carne e, na terra, o único fidelíssimo coadjutor do grande projeto de Deus.

Diz-se também que ele foi da casa de Davi…

Perfeitamente filho de David, não tanto segundo a carne, mas pela fé, pela santidade e pela devoção.

Como um outro Davi, o Senhor o julgou segundo o seu coração e lhe confiou o mistério secretíssimo e santíssimo do seu coração… revelou-lhe as coisas escondidas e ocultas da sua sabedoria e lhe fez conhecer o mistério que nenhum príncipe deste mundo conheceu; enfim, foi-lhe dado o que muitos reis e profetas, querendo ver, não viram, e ouvir, não ouviram; e não só ver e ouvir, mas também carregar, conduzir, abraçar, beijar, nutrir e guardar.

Maria e José pertenciam, ambos, à estirpe de Davi; em Maria cumpria-se a promessa feita, outrora, a Davi, enquanto José era o testemunho desse cumprimento.

Autor: Padre Fidel Oñoro, CJM

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