ESTUDO BÍBLICO NESTA 11ª SEMANA COMUM ANO 2020
ESTUDO BÍBLICO NA 11ª SEMANA COMUM ANO 2020
SEGUNDA-FEIRA
Mateus 5,38-42
ESCOLA DE VALORES (IV): NÃO DEVOLVER VIOLÊNCIA, MAS TRANSFORMAR O AGRESSOR.
“Não ofereçais resistência ao malvado”
Continuamos no Sermão da Montanha. Através deste vamos vendo como a vida nova do Reino, proclamada nas bem-aventuranças, vai se tornando “sal” e “luz” no cotidiano da vida de um discípulo de Jesus. Como vimos na semana passada, o primeiro espaço da vida no qual entra o Reino de Deus e sua justiça (maior) é no âmbito das relações com os demais.
Jesus, por meio de duas situações, mostrou-nos como se dão as bem-aventuranças, isto é, como elas entram no nosso modo de agir: quando a iniciativa da relação depende de mim; e quando a iniciativa depende de outra pessoa. A primeira já foi visto antes. Agora veremos o outro lado da moeda: quando alguém tem boas intenções, porém, a outra pessoa, não.
- A situação
Para atenuar a prática da vingança, vigorava a lei de Talião, ou seja, na agressão, o modo de fazer justiça era devolver na mesma moeda. O Antigo Testamento já havia admitido isso: “Olho por olho, dente por dente” (Ex 21,24). Ou seja, se, na briga, um soco quebrasse um dente, a vítima tinha o direito de fazer o mesmo ao agressor (um só dente, não dois!). E depois os dois ficavam em paz. Em seu tempo, foi de grande avanço na história da civilização, já que seu objetivo era evitar o “fazer justiça com as próprias mãos”, pois, quando isso acontecia, as consequências eram terríveis: tomada de fúria cega, a pessoa acabava matando o agressor, às vezes por uma pequena transgressão.
- O valor
Mas, quando veio Jesus, começa a anunciar, em suas pregações, que a vingança não tem lugar no Reino de Deus. Não é assim que se faz justiça. Tem que dar um novo passo à frente, pois a verdadeira justiça não está ai, mas na aparente derrota da vítima. Este novo valor que brota da justiça do Reino aponta para o fim da violência mediante dois caminhos: não prolonga a violência através da habitual desforra (passagem de hoje); e entra ai o trabalho pela conversão do agressor (passagem de amanhã).
Jesus cita cinco situações bem conhecidas no Evangelho, nas quais um discípulo se sente agredido em sua integridade física, moral e sociológica. Em cada caso, o valor que se exerce é sempre o mesmo:
- Uma bofetada da face (5,39b): neste caso a vítima não devolve o golpe, mas, ao contrário, demonstra seu espírito indefeso, expondo a outra face (5,39c);
- Um processo para reclamar uma dívida (5,40a): a vítima se mostra mais generosa que o agressor entregando mais que o reclamado (o manto era peça de grande valia para um pobre);
- Uma retenção do exército romano (5,41a): Os soldados romanos podiam parar as caravanas e forçá-las a carregar pedras. Como havia abusos a lei previa que um romano não podia exigir mais que uma milha em tal esforço. A resposta é, por conta própria, fazer o dobro do pedido, assim fica claro que não é um escravo, mas um homem livre que serve generosamente ao outro (5,41b);
- Uma pessoa pede ajuda (5,42a): Um mendigo pede esmola. Alguém que pede ajuda todos os dias, aos poucos não começa a cansar as pessoas? Entretanto, não podemos perder a paciência;
- Um empréstimo (5,42b): Aqui o contexto é bem conhecido: as desapropriações por causa da violência romana (anos 60/70) levaram muitas famílias a perder seus bens. Então iam a outras cidades e buscavam auxílio junto aos irmãos cristãos. Estes os acolhiam com generosidade e lhes faziam empréstimos para que pudessem reorganizar a vida. Mas a situação era tal que não havia como pagar e os mesmos voltavam a pedir mais. Então começavam a negar-lhes (6,12; 18,23-25).
Em todos estes casos vê-se como a vítima não devolve a ofensa, mas mostra-se sempre bondoso: enfrenta o problema com uma atitude diferente; anula a tensão do agressor; e desarma, de maneira inusitada, a agressão. Não se afronta o mal de maneira passiva, mas com uma atitude de violência a si mesmo que corresponde ao fazer o bem ao inimigo. A raiz de tudo isso veremos amanhã.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração
- Que faço quando me sinto agredido? Como controlo a raiva?
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Como pede Jesus que façamos nestes tipos de situações?
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Qual é o princípio e o valor? Em que bem-aventurança se inspira?
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- Para um discípulo do Senhor a solução dos problemas deve consistir unicamente em evitá-los ou esquivar-se, ou há algo mais?
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- Que é que se tem que buscar em última instância na solução de um problema?
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TERÇA-FEIRA
Mateus 5,43-48
ESCOLA DE VALORES (V): UMA VIDA DE FILHOS QUE REFLETE O AMOR PERFEITO DO PAI
“Vós, pois, sede perfeitos como é perfeito vosso Pai”
A justiça do Reino, a que gera vida e fraternidade, é a que dá pleno sentido à Lei e aos Profetas. Mas Jesus não veio dar-lhe cumprimento, exigindo observância mais rigorosa da Lei. De fato, a Lei não faz, senão assinalar o que o Pai quer que façamos, mas não tem força para fazer-nos realizar sua vontade.
A última lição que Jesus dá, nesta escola de valores que ensina a conviver no estilo do Reino de Deus, é precisamente isto: o que dá plenitude à Lei é a identificação com os comportamentos e atitudes do Pai celestial: uma vida de Filhos de Deus: “sede perfeitos como é perfeito vosso Pai celestial” (5,48).
Aqui já não se fala dum valor específico e, sim, da fonte de todos os valores: a perfeição do Pai. Mesmo que Deus Pai seja perfeito em tudo que possamos imaginar, aqui se está mencionando ao que mais o caracteriza com relação a nós: o amor (ver Lc 6,39, como aparece claramente o termo “misericórdia”).
As bem-aventuranças levam a viver segundo o Coração do Pai. As “boas obras”, que refletem a luz da vida nova dos discípulos, são aquelas que fazem notar uma vida de “filhos”, filhos que levam em si a marca da personalidade do Pai: “para que vendo… glorifiquem a vosso Pai que está nos céus” (5,16). Os bons filhos honram seu nome. Portanto, o critério último de ação não é a “Lei” escrita e, sim, o modo de ser do Pai, que se refletiu, nitidamente, na prática de misericórdia de Jesus de Nazaré.
- A situação
Tenho um inimigo. No tempo de Jesus, quando se cita o antigo mandato de “odiar” e, também, de limitar as relações com o próximo, pensa-se no irmão israelita. Mas, agora, anos depois, já no tempo das comunidades, provavelmente, se está pensando nos inimigos da comunidade. Recordemos que, ao final das Bem aventuranças, se ressalta que as comunidades estavam sendo perseguidas (5,10-12).
É dentro deste horizonte que se descreve a última lição, onde o “ódio ao inimigo” (5,43) pode ser válido para quem conhece a “Lei” (Lv 19,18), mas, não mais para quem fez a experiência de Jesus ressuscitado. Não mais para quem já vive na esfera do Reino.
- O Coração do Pai como modelo que inspira a vida do discípulo
O homem velho costuma pensar assim: “de um lado, os meus amigos e, do outro, os meus inimigos. Aos primeiros eu me dirijo, aos outros não”. Deus Pai não é assim: ele “faz brilhar seu sol sobre maus e bons, e chover sobre justos e injustos”. No coração de Deus, Pai de Jesus, cabe todos.
- Aplicação: um amor sem limites e com capacidade de regenerar
A menção do “sol” e da “chuva” é uma referência às bênçãos que Deus providencia aos seus: com elas Deus mantém e faz prosperar o que criou. Que Deus ilumine e conceda prosperidade a uma pessoa “má” ou “injusta”, indica que – assim como acontece com o sol e a chuva – o amor do Pai não se limita aos que o amam, mas o oferece, gratuitamente, e sem distinções, mesmo a quem não o merece.
Assim age o discípulo de Jesus com quem o persegue e o causa dano, a ele e à comunidade. Por isso Jesus muda a frase “odiar o inimigo” por “amar o inimigo”. A maneira concreta de amá-lo é incluí-lo em sua própria vivência do Deus Pai, no Reino: “rogai pelos que vos perseguem” (5,44b). Então o Deus do Reino o transformará com suas bênçãos.
Realiza-se, assim, o segundo passo o modo de enfrentar uma inimizade: transformar o inimigo com o poder regenerador do Reino. A atitude fundamental de um discípulo de Jesus é o amor, que só deseja o bem, faz o bem, e, assim, torna o outro bom. Como afirma São Paulo: “Não te deixes vencer pelo mal; antes, vence o mal com o bem” (Rm 12,21). Assim se corta o mal pela raiz. Enfim, uma maneira de ser diferente e fazer a diferença.
Enfim, uma maneira de ser diferente e especial. Uma pessoa que age assim, evidentemente, é diferente de outra que não “conhece” o que é viver sob a graça da filiação divina. Exemplos claros são: o publicano, que vive em seu pecado, e o gentio, que adora outros deuses (ver 5,46-47). Eles amam (nada mais) aos que os amam e saúdam (não mais que) aos de seu estrito círculo de amizades. Por outra parte, o discípulo é claramente diferente porque, o motivo fundamental que inspira seu agir, é o amor perfeito, primeiro e criador do Pai celestial.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração
- Por que sinto antipatia ou aversão?
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Há alguém quem não abro o coração ou que decidi excluir dele?
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- Meu coração é capaz de acolher a todos, como o de meu Pai celestial?
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- Parece que o Senhor me pede demasiado? Isto me desanima?
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Que fundamento que me faz crer que amar é possível ainda que as circunstâncias sejam adversas?
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QUARTA-FEIRA
Mateus 6,1-6.16-18
SABER-NOS AMADOS PELO PAI
“Teu Pai, que vê no segredo, te recompensará”
Na lição anterior do Sermão da Montanha vimos como Jesus educa os discípulos para que cortem o mal pela raiz. Agora Jesus aprofunda no que deveríamos considerar como o mais alto ponto deste Sermão: na raiz da vida está Deus Pai que “vê no segredo”.
A relação com Ele nos dará a força para vivermos positivamente todas as demais relações. Como aconteceu na seção anterior (Mt 5,21-48), que trata das relações com os demais, a justiça – ou justa relação – com Deus deve ser “superior”, “diferente” para todo aquele que vive no âmbito do Reino.
Já desde o início desta nova seção (Mt 5,1-18), que trata da relação com Deus, se sente a exigência: “Cuidado de não praticar vossa justiça diante dos homens para serem vistos por eles; do contrário não tereis recompensa de vosso Pai celeste” (6,1).
Que didática utiliza Jesus desta vez? Como na seção anterior, mais que propor normas, a proposta é fazer da vida um contínuo ato de discernimento das situações. Seguindo o fio condutor da pergunta em que se baseiam nossas relações com Deus?
Jesus faz uma revisão sobre as três obras de piedade que unem o coração do homem a Deus, típicas da cultura religiosa hebréia:
- a esmola (6,1-4);
- a oração (6,5-15);
- o jejum (6,16-18).
Em cada uma faz, esquematicamente, a mesma contraposição que diferencia a prática dos fariseus e escribas da prática de um discípulo seu: “não faças (isto ou aquilo)”, “tu, ao contrário” (6,3.6a. 17). Todas as contraposições acabam sempre do mesmo modo: “Teu Pai que vê em segredo, te recompensará” (6,4.6b.18).
Esta observação analítica de diversas práticas religiosas que põem uma pessoa em comunhão com Deus expõe no fundo as perguntas: De onde parte a espiritualidade? Qual sua finalidade?
As comparações estabelecidas por Jesus fazem emergir atitudes corretas e incorretas; o discípulo deverá analisar a si mesmo e tomar decisões. A repetição do verbo “ver” (sete vezes na passagem de hoje), concretamente o “ser visto”, a necessidade humana do reconhecimento – nos dá a pista para a abordagem do texto.
- A esmola: para que me vejam?
O primeiro caso (vv.1-4) é o da pessoa que ajuda outros com o fim de obter boa fama. É a caridade com “publicidade” (“trombetear em público”, 6,2), para “ganhar pontos”. A motivação são os aplausos: ganhar privilégios ante as pessoas e adquirir poder. Se isso é o que busca, já recebeu o prêmio. Mas, para Jesus, o gesto deve ficar entre a pessoa e Deus. A recompensa nesse caso é a profundidade da relação com o Pai.
- A oração: para que me vejam?
O segundo caso (vv.5-6) nos coloca ante a situação de quem faz da oração um instrumento de promoção pessoal. Para Jesus isto, assim como no caso anterior e no que vem, é uma hipocrisia, a oração perde sua finalidade que é a comunhão profunda com Deus, que nos faz entrar no âmbito de seu poder criador e transformante desde o mais profundo de nosso ser; precisamente ali onde não pode chegar os olhares dos outros.
A fim de indicar este espaço de intimidade, Jesus fala de “entrar no quarto” e “fechar a porta”, para enfatizar que a oração é, sobretudo, relação com o Pai, que está escondido, quer dizer, fora de nosso controle, nos “recompensará”, ampliando seu reinado em nossas vidas.
- O jejum: para que me vejam?
Na piedade dos fariseus, o jejum reforçava a oração: tinha valor de penitência, mas, também, quando coletivo – era um modo de pedir a Deus o Messias. Por outro lado, a privação de alimento é fonte de vida em vários aspectos; assim, quando uma pessoa jejua traz mais vida a seu organismo, dando-lhe a possibilidade de repor-se.
Também é um gesto de solidariedade para com quem está passando fome, que se concretiza logo no partilhar o alimento que se deixou de comer, para que outros tenham vida. Agora, quando uma pessoa jejua, é difícil que não se note que está passando fome. Pior é quando isto se faz intencionalmente: através do corpo desfigurado anunciar ao mundo que está jejuando (6,16-18). Então algo tão sagrado se converte em um ato hipócrita.
Jesus insiste que o jejum deve ser em segredo, na intimidade com o Pai. Enfim, nos 3 casos anteriores se faz notar uma falha na vida espiritual, ainda que dentro dum esforço espiritual. Quando uma pessoa faz as coisas para “ser visto” e que está buscando confirmação, aprovação, reconhecimento; portanto, não entendeu ou assumiu que Deus Pai tem estado ai amando-lhe, e que conta com sua confirmação, aprovação e reconhecimento, em poucas palavras, que o ama desde o mais profundo de seu ser.
O caminho correto da espiritualidade parte deste estar “cara a cara” ante o Pai, de quem recebemos vida e afeto. Então projetaremos este amor aos demais e não a avidez de um reconhecimento, que no fundo, indica uma profunda carência.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração
- Que objetivo tem a esmola, a oração e o jejum? Que âmbitos de relação estão implicados em cada?
QUINTA-FEIRA Mateus 7,21-29
UM CHAMADO À SOLIDEZ:
“Não caiu porque estava cimentada sobre rocha”
Para ter maior claridade sobre o evangelho de hoje é bom remitir-nos ao parágrafo anterior, o qual se omitiu, por ser a festa do nascimento de João Batista. Nele Jesus define quem são os “falsos profetas”.
Hoje, ao contrário, Jesus esclarece quem são os “verdadeiros discípulos”. Jesus começa dizendo que nem todos os que o chamem com o nome de Senhor, para pedir algo, entrarão no Reino dos céus.
Somente entrarão quem a esta súplica acrescentam, de bom coração, o cumprimento da Vontade de seu Pai. E mais, Jesus nos diz que no último dia muitos dirão: “Senhor, Senhor, não profetizamos em teu nome e em teu nome expulsamos demônios e em teu nome fizemos muitos milagres?” (22). Em outras palavras. Contudo, isto já temos o passaporte assegurado para o Reino dos Céus. Fácil!
Jesus esclarece muito bem que isto não é suficiente para ser reconhecido como verdadeiro discípulo e que se não está na raiz buscar a Vontade do Pai Jesus mesmo naquele dia lhes dirá: “Jamais vos conheci, apartai-vos de mim agentes de iniquidade” (23).
São palavras muito duras. Não só lhes dirá que não os conhece, mas que tudo o que eles hão feito, se havia sido milagres, não tem sido outra coisa que ‘iniquidade’.
Trata-se, pois, como Jesus mesmo disse na continuação, de “ouvir suas palavras e pô-las em prática” (24). Jesus ilustra esta sentença com uma bela parábola: a casa que se constrói sobre a rocha ou sobre a areia.
O verdadeiro discípulo é o que constrói sobre a rocha uma casa com suficiente cimento e este cimento é a mesma rocha. O escutar a Palavra e pô-la em prática garante a solidez da vida do verdadeiro discípulo.
Tudo o que possa vir sobre essa casa: chuva, torrentes, etc. não a afetarão. Tudo o que possa acontecer ao discípulo prudente: dificuldades, sofrimentos, calamidades, não o poderão derrubar porque a rocha na qual descansa sua vida é a Palavra.
Não é assim quem constrói sobre areia. Sobre cimentos não confiáveis. Não será capaz de sobreviver às adversidades que lhe apresenta a vida. E Jesus termina dizendo: “E foi grande sua ruína” (27).
Aprofundemos com os nossos pais na fé:
Santa Teresa de Ávila (1515-1582), carmelita, doutora da Igreja.
“Não basta dizer ‘Senhor, Senhor…’; é preciso fazer a vontade de meu Pai”
Parece muito fácil dizer que alguém entrega a sua vontade nas mãos de outro…
Mas quando chega a altura, compreende-se que nada é tão difícil como conformar-se a isso de uma forma correta. O Senhor sabe do que é capaz cada uma das Suas criaturas; e, quando encontra uma alma forte, não desiste até ter cumprido nela a Sua vontade.
Quero expor-vos ou recordar-vos qual é a Sua vontade. Não temais que Ele vos queira dar riquezas, prazeres, honras, ou todos os outros bens da terra.
Ama-vos demasiado para fazer tal coisa e aprecia muito os vossos presentes: é por isso que quer recompensar-vos dignamente e dar-vos o Seu reino, ainda nesta vida.
Vendo o que o Pai deu a Seu Filho, que amava acima de todas as coisas, percebeis qual é a Sua vontade. Assim são os dons que Ele nos faz neste mundo. A medida deles é o Seu amor por nós.
Dá mais aos que ama mais e menos aos que ama menos.
Regula-se também pela coragem que descobre em cada um de nós e pelo amor que temos por Ele.
Vê que somos capazes de sofrer muito por Ele quando O amamos muito, mas de sofrer pouco quando O amamos pouco; e eu estou convencida de que a força para suportar uma grande ou uma pequena cruz tem a mesma medida que o amor.
Por isso, se este amor está em vós, tereis cuidado, quando falardes a tão grande Senhor, para que as vossas palavras não sejam meros cumprimentos…
Se não abandonarmos completamente a nossa vontade nas mãos do Senhor, para que Ele próprio tome conta dos nossos interesses, Ele nunca nos deixará beber na Sua fonte de água vida.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração
- Que me faz pensar que estou construindo minha vida sobre a rocha ou sobre a areia?
- Que faço concretamente para que a Palavra de Deus seja dia a dia o cimento de minha vida?
- Recordo um momento difícil na vida de minha comunidade, de minha família ou de meu grupo no qual nos esquecemos de haver-nos apoiado na Palavra de Deus. Que poderíamos ter feito?
SEXTA-FEIRA
Mateus 11,25-30
o pai se inclina aos pequeninos e jesus é o mestre do fardo leve
“Ocultaste estas coisas aos sábios e inteligentes… Meu jugo é suave e meu fardo leve”
A primeira palavra do evangelho de hoje é uma oração de louvor que leva o selo da experiência particular de Jesus. Esta oração vai dirigida ao “Pai”, que é “Senhor do céu e da terra” (11,25).
Novamente Jesus quer mostrar-nos a estreita vinculação que existe entre o Pai e Ele, junto com a possibilidade que nos dá de ascender, de nos elevar, a este mesmo estado. Os seguidores de Jesus são pessoas que conhecem muito bem sua missão e o horizonte que possuem ao conhecer Jesus: onde está a origem e qual é a meta de sua existência.
Na raiz do discipulado está à relação do Pai e do Filho como realidade fundante da qual brota todo o conhecimento de Deus que se recebe e como paradigma do verdadeiro sentido do chamado recebido: participar desta comunhão. Como deixa entender, Jesus, a boa comunicação com Deus e a constante relação com Ele, nos permite conhecer os mistérios e as verdades que estão no interior de nossa vocação e de nossa missão cristã.
Os “sábios e entendidos” são, no contexto deste evangelho, os mestres da lei e os fariseus, que conhecem a Lei de Moisés, porém, rejeitam Jesus porque lhes parece insignificante. Rejeitam-no, não porque não compreendam suas palavras a nível intelectual, mas, precisamente porque, captando bem o que tem ensinado, se negam, categoricamente, a aceitá-lo.
Eles não estão abertos à nova proposta de salvação e vida que provém do Reino, cuja irrupção definitiva anuncia Jesus. Ainda que sendo grandes teólogos, eles preferem seguir atados à sua norma, a um sistema de vida rígido que impede de ler os sinais vivos da presença de Deus em Jesus de Nazaré.
Ao contrário os “pequenos” são os que, com simplicidade de coração, têm aberto, de par em par, as portas de seu coração, para receber a revelação de Jesus e a acolhido efetivamente.
Os “pequenos” são os que, não importa sua condição social, têm uma atitude diferente, que parte do reconhecimento de que “não sabem tudo” e, portanto, desejam, vivamente, aprender e viver mais ao lado do Mestre. “Ninguém conhece o Filho senão o Pai e ninguém conhece o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (11,27). Esta revelação que o Filho faz do Pai é a que o Pai tem manifestado aos simples: que todos nos façamos um com Ele e para Ele.
O olhar em oração ao Pai, dos “pequenos” do Reino, se converte, agora, em olhar misericordioso para os sofridos da terra. “Venham a mim…” (11,28a). Nestas palavras, Jesus faz um convite direto a todos os seus ouvintes para que se façam seus discípulos. Estes são os que “estão fatigados e sobrecarregados” e assim repousarão: “… e eu lhes darei descanso”.
Os termos que Jesus utiliza não são como as típicas “frases de gavetas” ou os lemas publicitários, que dizem belas frases para captar incautos seguidores que, cedo ou tarde, terminarão desiludidos com promessas de felicidade que nunca viram cumprir-se. Não, o convite é que todo homem, desde as agitações internas de sua busca de sentido, dos sonhos e anseio de esperança que o Criador, desde o princípio gravou em seu coração, converta-se em um verdadeiro discípulo da sabedoria.
Na literatura sapiencial bíblica lemos frases deste tipo: “Venham a mim” (Eclo 24,19;51,23); “Tomem meu jugo” (Eclo 6,24-25;51,26); e “Encontrarão descanso” (Eclo 6,28). Entre os fariseus do tempo do ministério de Jesus (e ainda um pouco depois), se falava de “tomar o jugo da Lei” como um modo de descrever a decisão de assumir a Palavra de Deus como norma de vida.
O “jugo”, como no caso dos bois, faz inclinar a cabeça e dá docilidade. Dadas às complicações em que havia caído o estudo da Palavra, convertida em matéria de retórica jurídica, o “jugo” da Lei do Senhor havia se convertido em um forte peso para o povo que se sentia “fatigado e sobrecarregado” por ela. “Tomai sobre vós meu jugo” (11,29a).
O Evangelho de Jesus revelado aos pequenos é o novo “jugo” que não oprime, mas que liberta. O evangelho está feito, não para esmagar, mas para levantar. Curiosamente, ao reter um termo que já começava a soar pejorativo para o povo, o de “jugo”, Jesus exprime o melhor de seus sentidos: Jesus não sobrecarrega, mas troca conosco sua carga: Ele toma nossos fardos pesados da vida sobre seus ombros e nos dá seu coração “manso e humilde” (11,29b).
Jesus toma nossas preocupações e dificuldades. Porém, também toma os mesmos caminhos que temos para ascender a Ele, e os faz possível com a força de seu Espírito Santo. Entrega-nos logo a “carga” da missão, do anúncio da Boa Nova do Reino, as tarefas que provêm da vontade amorosa do Pai sobre o mundo, para que lhe ajudemos a concretizá-la na história que, dia a dia, construímos e amassar, assim, o pão com o fermento do Reino (ver 13,33).
Uma vez mais Jesus nos convida a acolhê-lo com simplicidade e, desta vez, com uma bela novidade: Ele nos acolhe primeiro com tudo o que temos e nos submerge na doçura de seu coração. É assim que viveremos sempre unidos a Ele, tendo-o como apoio que dá “repouso” ao nosso coração inquieto e como modelo (“aprendei de mim”) que inspira nossa vida.
Meditemos, agora, o texto do evangelho e tomemos consciência, mediante a acolhida repousada da Palavra, sobre a forma como estamos vivendo e acolhendo à revelação de Deus na pessoa de Jesus: que efeitos têm, em nós, a escuta diária da Palavra, a celebração eucarística, os diversos compromissos que temos com Deus e com os irmãos, no nome de Jesus, e que nos põe em contacto diário com sua presença sacramental em nosso meio.
Não caiamos na atitude dos fariseus, que pretendendo cumprir um montão de preceitos e normas, para conhecer, verdadeiramente, a Deus, esqueciam que a forma mais simples e humilde era a mais eficaz: o saber-nos amados em nossa miséria e compreendidos em nossas crises, porém, sobretudo, acolhidos, no amor de seu adorável Coração.
É na transparência de seu coração onde lemos o evangelho e recebemos o “jugo” que dá sabedoria a nossas vidas.
Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração
- Segundo o evangelho de hoje, quem são os “sábios e inteligentes” e os “pequenos”? Que relação em a passagem de hoje com os textos que lemos ontem? Como se conectam? Que nova mensagem se agrega?
- Que espera Jesus de nós, segundo o evangelho? Que decisão eu tomo para minha vida espiritual?
- Que valor simbólico tem o “jugo” na Sagrada Escritura?
- Que “jugos” encontramos em nossa sociedade de hoje e que se convertem em cargas intoleráveis? Que intercâmbio nos propõe hoje Jesus? Como se realiza este intercâmbio?
SÁBADO
Lucas 2,41-51
IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA:
“Entre nós, Jesus e Maria: um só coração”
Neste sábado celebramos o Imaculado Coração de Maria. A natureza humana em sua originalidade natural foi criada à “imagem semelhança” de Deus, porém, com o pecado, essa identidade ficou manchada, mas não destruída; foi preciso que o Filho de Deus, segunda pessoa da Trindade Santa, livremente a assumisse na Encarnação para que voltássemos a uma nova originalidade, preparada pelo Altíssimo conforme a Eternidade do Seu Querer.
O que Adão e Eva não conseguiram realizar
O que Adão e Eva não conseguiram realizar, por meio dos dons recebidos, livre arbítrio, inocência, santidade, visão espiritual, obediência, etc.; Deus o fez por meio de Seu Filho Jesus, Novo Adão, não nascido do barro, mas do Espírito Santo, no seio da Nova Eva, Maria; não tirada do homem, mas perfeitamente redimida por seu próprio Filho, para ser mãe da Nova Criação.
Falar dessa íntima-união da Imaculada com a Santíssima Trindade na Nova Criação é o mesmo que falar da união perfeita das duas naturezas, Divino-humana, sem perca alguma por parte da primeira e com elevação da segunda à Plenitude da Perfeição, conforme o propósito do Criador. Pois, a primeira divinizou a segunda, por isso agora, já não somos apenas seres humanos, mas seres humanos perfeitamente divinizados pela Encarnação, Morte e Ressurreição do Verbo de Deus que nos livrou definitivamente do pecado e da morte.
Maria é toda de Deus e toda Vontade de Deus para nós
Pela transparência de seu ser Imaculado, Maria é, de fato, toda de Deus e toda Vontade de Deus para nós; pois, o principal atributo dos filhos redimidos é a cooperação na obra redentora até que venha a consumação de todas as coisas onde seremos um só em Deus que é bendito para sempre. Ninguém conheceu Jesus tão bem quanto sua Mãe, a Virgem Maria; ninguém foi mais íntima, ninguém mais amiga e conselheira e que teve mais acesso ao Filho de Deus que sua Mãe Santíssima; muito mais agora que vive na Sua intimidade por toda a eternidade.
No Evangelho de hoje vamos ao final aonde nos encontramos com um retrato lucano de Maria: “Sua mãe, porém conservava a lembrança de todos esses fatos em seu coração” (2,51). A atitude de Maria ante a primeira palavra desconcertante de seu Filho, por ocasião de seu reencontro no Templo, após tê-lo perdido por três dias, é de reflexão paciente. Esta atitude acompanhou-a desde o momento da encarnação (1,29), do nascimento (1,19), até a entrada de Jesus na vida adulta e no ministério. Assim os anos ocultos da vida de Jesus ficaram somente escritos no coração de Maria.
Contemplando esta sua atitude, poderíamos dizer: Jesus crescia e sua Mãe também. O coração de Maria permanece então como o modelo do qual nós devemos ser como ouvintes do Evangelho. Maria nos ensina a viver um caminho de crescimento espiritual por meio da confrontação permanente entre os sucessos da vida e da Palavra, aguardando com paciência nos momentos de ignorância e deixando que Deus conduza as coisas segundo sua pedagogia.
Cultivemos semente da Palavra no profundo do coração:
- Que novo tipo de relação começa Maria com Jesus a partir de então?
- Como se projeta em nossa experiência familiar?
- Que pistas nos dá este texto para fazer nosso projeto de vida familiar?
Autor: Padre Fidel Oñoro, CJM