Lectio Divina da 15ª Semana do Tempo Comum ano 2019

BAIXAR EM PDF LECTIO DIVINA 15ª SEMANA DO TC ANO C 2019

DOMINGO, 14 DE JULHO DE 2019 – 15º DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO C

Lucas 10,25-37 (O grande mandamento) O mestre da Lei põe uma pergunta de suma importância; refere-se à vida eterna e ao caminho para chegar a ela, ainda que o que lhe mova seja uma intenção má: “para estender-lhe uma armadilha». Jesus lhe respon­de com outra pergunta que, didaticamente, implica tam­bém o interlocutor. Tomado de surpresa, o mestre da Lei deve seguir o jogo. Na realidade, responde de um modo excelente, fundindo em um os dois mandamentos do amor a Deus e ao próximo (Dt 6,5; Lv 19,18), o que merece a aprovação de Jesus: «Respondeste bem, faze isso e viverás». “O mestre da Lei, «querendo justificar-se» , quer dizer, desejando evitar a má imagem de ter se apresentado aparentemente sem motivo, visto que mostrou conhecer a resposta à pergunta que havia traçado, se vê obrigado a interrogar Jesus sobre outro ponto: como posso saber quem é «meu próximo»? A questão à qual parece aludir é se por «próximo» se entende só «os filhos de teu povo», como se lê em Lv 19,18, ou se o conceito se estende, também, aos estrangeiros que habitam em Israel (Lv 19,33-34; cf. Dt 10,19). E, de outro lado, se entre esses estrangeiros deve amar-se só os proséli­tos, quer dizer, os que haviam aceitado a fé no Deus dos judeus e viver plenamente como eles, cumprindo toda a Lei. Jesus lhe responde com a parábola do bom samarita­no, na qual ensina três coisas: que o próximo é qualquer um, simplesmente «um homem» (v.30); que isto compreende até um samaritano: aquele que os judeus não consideravam nem sequer como próximo é proposto, por Jesus, como modelo de fazer-se próximo; e, sobretudo, mostra que a pergunta tem de fazer-se na direção oposta, não para nós mesmos, mas para o outro: não quem é próximo a mim, mas quem se faz próximo. Amor significa aqui «ter compaixão» de qualquer um que sofre; tomar a iniciativa e fazer ao outro o que, se eu estivesse em necessidade quisesse que fizessem a mim. A resposta de Jesus à pergunta do princípio soaria, em resumo, assim: «Tem a vida eter­na todo o que cuida da vida de qualquer necessi­tado». Paradoxalmente, para  ter a vida é preciso dá-la.

 

 

Dt 30,10-14 (Volta do exílio e conversão) O texto apresenta uma ordem de Moisés: «Obedece­rás… e te converterás» (v.10). À primeira vista, parece um pedido motivado pela submissão. Porém, se pomos o texto em seu contexto, veremos como a obediência se situa no marco da aliança. No início está a obra de Deus (Dt 29,1). O povo está convidado a responder à iniciativa de Deus, a entrar em sua aliança, aceitando suas condições: «Obser­vai, pois, as palavras desta aliança» (29,8). Se o povo, depois de tê-las aceitado, não as ob­serva, será castigado com o exílio. Mas, deste, será possível voltar, mediante uma nova intervenção gratuita de Deus: «O Senhor, teu Deus, fará voltar teus deportados, terá piedade de ti» (30,3), e ele mesmo te induzirá à conversão, «circuncidará teu coração» (30,6). Graças a esta ação divina, todo o mundo estará, ao final, em con­dições de converter-se e obedecer, como pede Moisés, e procurar, assim, a felicidade que Deus deseja oferecer: «O Senhor se alegrará de novo por ti fazendo-te feliz» (30,9). Por outro lado, é possível obedecer, não só pelo im­pulso interior que vem de Deus, mas, também, porque o que Ele manda está ao nosso alcance: «Não é superior às tuas forças nem está fora de teu alcance», mas «está muito próximo de ti» (vv.11.14). A lei do Senhor é acessível e obedecê-la é o caminho da «vida»: «Se escutas os mandamentos do Senhor, teu Deus, que hoje te prescrevo, amando-o, seguindo seus caminhos e observando seus mandamentos, suas leis e seus preceitos, viverás e serás fecundo» (Dt 30,16).

 

Cl 1,15-20 (Primado de Cristo) O hino exalta a grandeza de Cristo apoiando-se em três pontos de referência. Com respeito ao Pai, Jesus Cristo é o ícone, a imagem visível do Deus invisível (cf v.15). Por isso disse: «Quem me vê, vê àquele que me enviou» (Jo 12,45; 14,9). É o mediador da obra da redenção: «Por meio dele», mediante seu sangue de­rramado na cruz, o Pai celestial reconciliou consigo o universo (v.20); Em um contexto filosófico, no qual se pensava que o céu e a terra estavam povoados por potências mis­teriosas, se afirma que Jesus Cristo possui o primado absoluto sobre todas elas, que o cosmo está sob seu domínio, que Ele é o princípio e o fim de todas as coisas: «tudo Deus tem criado por ele e para ele», «Cristo existe antes que todas as coisas» e todas encontram «nele» sua consistência (vv.15b-17); e Jesus Cristo exerce seu senhorio, ainda, sobre a Igreja, seu «corpo», do qual é «a cabeça» (v.18).

 

Sl 68/69 (Lamentação) Trata-se de uma belíssima “lamentação individual”. O povo de Israel tem como hábito “queixar-se de Deus” e chorar pelos pecados, tanto os próprios como os dos irmãos. São conscientes que os pecados individuais tornam-se sofrimento para toda a comunidade, assim como a santidade dos indivíduos se torna santidade e alegria para todos. Este sentimento de coletividade deve ser recuperado e transformado em solidariedade ao bem. Infelizmente, existem pessoas que são solidárias só com o mal. Com uma imagem forte e eloquente, o salmista fala do medo que o assalta e dos perigos que pesam em sua vida. O salmista está vivendo um período em que não consegue encontrar saída para os seus problemas. E este sentimento é comum a todos nós; cedo ou tarde nos depararemos com situações de extrema dificuldade, e conseguir enxergar uma saída não será uma tarefa fácil. São estes momentos preciosos que devem ser lembrados como um caminho de purificação, pois neles descobrimos o amor de Deus.

Senhor, quero fazer deste Salmo a minha oração preferida nos momento duros da minha vida, quando não enxergo nada e parece que estou em meio a nuvens espessas e densas ou num túnel, como Santa Teresinha do Menino Jesus.  É neste momento que eu quero cantar a misericórdia, a beleza da fé. E crer, sem dúvidas, que a noite não é para sempre, que as nuvens não cobrem para sempre o Sol, que o mal deve ser vencido. Senhor, esta fé deve me sustentar; quero rezar de novo este Salmo com amor, pensando nas milhões de pessoas que se sentem perseguidas, solitárias e abandonadas; quero fazer deste Salmo um grande “cinturão” de segurança por meio do qual quero ser solidário aos que sofrem e compreender os que nada enxergam e nada conseguem amar. Senhor, toca a humanidade sofrida, dura e insensível e faz que todos sejamos centelhas de amor e de verdade, para incendiar com o novo fogo o mundo em que vivemos. Amém.

 

 

MEDITATIO: A primeira leitura harmoniza-se ao Evangelho: nestas podemos recolher duas mensagens para aprofundar e atualizá-las. A primeira é a mensagem da proximidade. O texto do Deuteronômio afirma que a Palavra de Deus se fez «próxima», se fez acessível e praticável. O mandamento de amar ao próxi­mo está próximo do coração do homem; de fato, o compreende e o põe em prática até um samaritano, ainda que não reconheça mais que uma parte da Escritu­ra (o Pentateuco) e seja considerado, pelos judeus, como alguém meio pagão. Mas, de maneira estranha, na observância deste mandamento, se mostra inseguro o mestre da Lei e, falham, de todo, o sacerdote e o levita, que antepõem à pureza legal (cf Lv 22,4-7) à ajuda a uma pessoa. Por outra par­te, a parábola do bom samaritano refere-se à ideia de próximo: não se trata de alguém que se aproxima a ti, mas de que tu deves aproximar-te ao necessitado. O mo­mento de tomar a iniciativa não depende de quem seja o outro, mas de tua capacidade de «compaixão». O princípio da proximidade não está fora, mas dentro de nós. As ocasiões de atualizá-la se nos apresentam continuamente. Uma segunda mensagem que se desprende das duas leituras está no nexo entre a observância dos mandamentos (em particular o da caridade) e a vida. No texto do Deuteronomio, a vida é a deste mundo, sustentada pela abundância dos bens ma­teriais, nos quais se reconhece de modo concreto, a benção de Deus. Ao contrário, no Evangelho, a per­gunta versa sobre a vida eterna, uma vida qualificada pela comunhão com Deus, antes que por sua duração perene. Em ambos os casos, o caminho da vida passa pela observância do duplo mandamento de amar a Deus e ao próximo. Se, em outro lugar, se disse que a vida nasce do amor que recebemos aqui se afirma que a vida se desenvolve em virtude do amor que somos capazes de dar. Quem quer plenitude de vida sabe, agora, como alcançá-la e, pode examinar-se sobre seu caminho: se tem seguido os passos do bom samaritano ou os do sacer­dote e o levita.

ORATIO: Projetando a luz destas mensagens sobre nossa vida, podemos ver as realizações positivas. As oca­siões onde nos temos feito próximos e outras, onde, talvez, prevaleceram o fechamento, a discriminação, o medo de ser explorado pelo que, com diversas necessidades, esperava nossa ajuda. Demos graças ao Senhor pelo bem que fizemos e peçamos-lhes perdão pelas omissões. Invoquemos ao Espírito, que «dá vida» e é fonte do amor, para que abra nossos olhos para dar-nos conta dos necessitados, que nos inspire as iniciativas ade­quadas e dê força de amor a nosso coração para realizá-las. E, sobretudo, elevemos uma oração de louvor ao Senhor, que nos tem revelado o caminho da vida e, tem suscitado na Igreja todo um exército de santos que seguiram o exemplo do bom samaritano.

CONTEMPLATIO: Após meditar sobre os mandamentos e a oração, fixemos o olhar em Deus que se re­vela através de sua Palavra. Com o duplo mandamento do amor, Deus não nos pede nada diferente do que Ele mesmo é. O Pai nos quer conaturais, filhos aptos a amar à sua imitação. No mandamento principal se reflete o rosto de Deus. Deveríamos deter-nos a considerá-lo assim: «Deus é amor»; o medo de ir ao encontro dele no final de nossa vida se desvanecerá, à medida que, desde já, «sejamos como ele é» (1 Jo 4,16.17). Na parábola do bom samaritano, Jesus nos fala, no fundo, de si mesmo: é Ele quem, na sinagoga de Nazaré, proclama «o ano de graça», o tempo da libertação dos pobres; dos prisioneiros de quantos estão oprimidos pelas diferentes enfermidades (Lc 4,18ss). O Evangelho conta às obras que Jesus, «imagem» do Pa­i (Cl 15), realiza «movido pela compaixão» (Lc 7,13;10,33;15,20).

 

 

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Faze isto e viverás»; «Vai e faz tu o mesmo» (Lc 10,28.37)

 

 

 

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL Ao longo da história, cada vez que os homens e as mulheres têm sido capazes de responder aos acontecimentos do mundo tomando-os como ocasiões para amadurecer seu próprio coração abriu-se uma fonte inesgotável de generosidade e de vida nova, entreabrindo uma esperança que superava toda predição humana. Se pensamos nas pessoas que nos têm infundido esperança, reforçando nosso espírito, descobrimos com frequência que não eram em absoluto profissionais do conselho, da admoestação e da moral, mas só pessoas capazes de expressar, com suas palavras e suas ações, a condição humana da qual participavam, e que nos incitaram a fazer frente aos atos reais da vida. Os pregadores que reduzem o inexplicável problema, oferecendo soluções de serviços médicos de urgências, nos deprimem porque evitam a piedosa solidaridade de onde provém a cura. Nem Kierkeqaard, nem Sartre, ni Camus, nem sequer Solzhenitsin nunca ofereceram soluções. Sem dúvida, muitos dos que os leem encontram energias para prosseguir na busca. Que não foge de nossas dores, mas as toca piedosamente, nos cura e nos reforça. Verdadeiramente, o paradoxal consiste no fato de que o começo da cura está na solidaridade nessa dor. Em nossa sociedade, orientada para as soluções, cada vez é mais importante dar-se conta de que pretender aliviar a dor sem partilhá-la é como pretender salvar a uma criança de uma casa em chamas sem correr o risco de queimar-se (H. J. Nouwen, Viaggio spirituale per l’uomo contemporáneo, Brescia).

 

 

 

SEGUNDA-FEIRA, 15 DE JULHO DE 2019 – 15ª SEMANA DO TEMPO COMUM  ANO PAR

Mateus 10,34-11,1 (Jesus, causa de divisões; Renunciar a si mesmo para seguir a Jesus; Conclusão do discurso apostólico) Mateus prossegue delineando o estilo de vida do discípulo-missionário, pondo de relevo as exigências radicais da missão. Nada pode ser impedimento para seguir a Jesus, ainda que isso possa causar sofrimentos e até provocar rupturas, inclusive no inte­rior da própria família. O cristão tem de contar com mal entendidos e com a incompreensão de seus achegados e dos que lhe estão unidos por laços afetivos. O discí­pulo, Jesus já o havia declarado, não pode ter uma sorte diferente da de seu mestre, desconhecido e rejeitado, precisamente, pelos seus (cf. Mc 3,21; Jo 1,11). Não se trata de que não possa viver, o discípulo, com entrega e fidelidade, as relações familiares, mas de dar prioridade às exigências do seguimento de Jesus e ao amor «com todo teu coração, com toda tua alma, com toda tua mente e com todas tuas forças» (Mc 12,30) que devemos ao Senhor. Mas, isso seria humanamente impossível se ele não nos tivesse amado antes até dar a vida por nós. Fazendo como Jesus, tomando, so­bre nós, a carga crucificante do mal que se opõe ao amor e realizando gestos simples, porém, autênticos, dirigidos ao outro, ao qual reconhecemos como irmão (o dar um copo de água), viveremos a mesma dignidade de filhos do Pai misericordioso.

 

 

Isaias 1,10-17 (Contra a hipocrisia) A passagem apresenta um dos oráculos introdu­tórios do livro de Isaías. O profeta, que desenvolve sua missão no Reino de Judá durante a segunda metade do século VIII antes de Cristo, em um período de prosperidade econô­mica e de relaxamento moral, condena em especial o formalismo religioso das classes mais ricas. Os que a elas pertencem, fechados no egoísmo de sua riqueza e insensíveis às necessidades dos cada vez mais nu­merosos indigentes, praticam um culto que é inútil porque está separado da vida. Empregando a forma literária de um julgamento empreendi­do por Yhaweh contra seu povo, ao qual, de maneira sig­nificativa, se chama “Sodoma e Gomorra», as cidades pecadoras por antonomasia (v.10), reivindica, Isaías, à Deus, seus direitos, e recorda, ao povo, os deveres san­cionados pela aliança sinaítica. Deus confessa que lhe desagrada a oferenda dos sacrifícios cruentos e in­cruentos, a observância das festas e das prescrições rituais (vv.11-14), dado que a isso não  corresponde um coração dócil, atento às necessidades do próximo. Deus não olha nem escuta a quem crer render­-lhe honras e logo pisoteia os fracos e os pobres (v.15ab). Entre o culto e a vida não pode haver contradição: não é possível oferecer o sangue de uma vítima sacrificial com mãos manchadas pelo sangue dos homicídios cometidos (v.15c). A conversão do coração “Deixai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem»: vv.16d-17a) é a condição fundamental para que a aliança de Deus com seu povo seja real e eficaz. Deus renova o convite a uma purificação, tanto interior, do coração, como exterior, do comportamento, para restituir a verdade ao culto praticado e pôr as bases da justi­ça social.

Salmo 49/50 (Para o culto em espírito) – Este Salmo tem o sabor de um exame de consciência violento, daqueles que nos obriga a parar e a olhar dentro de nós para vermos se ali existe o bem ou o mal. Deus sabe elogiar o homem quando ele faz o bem, mas também sabe condená-lo quando faz o mal. Deus sabe elogiar o homem quando ele faz o bem, mas também sabe condená-lo quando faz o mal. O mesmo fazem os seus profetas. Deus nos mostra o mal para que possamos nos converter e tomar resoluções novas de uma vida santa. Deus não critica os louvores que lhe são oferecidos, exceto quando a nossa atitude de louvá-lo não condiz com a nossa vida cheia de pecados. De que serve sermos religiosos, frequentarmos a Igreja, se negamos tudo isso diariamente com as nossas atitudes?

Senhor, dá-me a coerência de vida. Que eu te ofereça sacrifícios e seja atento aos teus preceitos, mas nunca permita que minha vida renegue minha fé. Dá-me a força de ser fiel e que minha felicidade seja a melhor pregação e evangelização. Palavras nada servem se não são comprovadas e consagradas pelos atos. Amém.

 

 

MEDITATIO: Deus nos leva a serio. Assim tem sido desde o primeiro instante em que quis que fôssemos seres livres. Por isso, não pode estar de acordo quando reduzimos nossa relação com Ele a uma serie de conveniências. E, se agimos deste modo, não enganamos a Ele, mas a nós mes­mos. Crer em Deus, quer dizer, receber o dom da fé que Ele mesmo nos oferece gratuitamente, é uma questão de coração. Não é possível comprometer-nos com Ele só de fachada ou em momentos alternados. Deus nos ama antes e em tempo integral. E nós, sabendo-nos assim amados (o que é, portanto, o vértice de todo desejo), que outra coisa podemos nós fazer de nossa parte, senão amá-lo? Amar é uma ação muito concreta. Amar a Deus, sem dúvida, não é uma questão limitada a impulsos inte­riores: inclui amar aos irmãos; amá-los em seu caráter concreto, na necessidade em que se en­contram. Fazer-lhes o bem pode traduzir-se em grandes gestos e, com maior probabilidade, em gestos cotidianos, esses que muitas vezes definimos como «peque­nos», damos por descontado e não vivemos com atenção e ternura. Com freqüência, são, precisamente, esses gestos, tri­viais em aparência, os que mais nos custa realizar com amor, especialmente com as pessoas difíceis ou simple­smente desagradáveis e que convivemos mais de perto. Se ficamos fechados em nós mesmos, com nossa presunção de santidade, porque, talvez, re­zamos alguma oração e nos sentamos aos domingos na primeira fila na igreja, não encontraremos a vida e perderemos a recompensa. Mas, ao contrário, a obterá quem saiba reconhecer que só o Senhor é Deus e que, por amar-nos, tem «direito» a nosso amor; esse Deus que é imenso e que goza «escondendo-se» e fazen­do-se amar nos «pequenos».

 

 

ORATIO: Obrigado, Senhor Jesus, por haver me chamado a caminhar jun­to a ti, a ser teu. Reconheço que sou pouca coisa, que me sinto atraído aqui e acolá, longe da Verdade que Tu és, por medo de vir a perder a segurança de um afeto ou, inclusive, da imagem que tenho feito de ti. Obrigado, Senhor Jesus, por tua confiança chamando-me a mudar de vida: a passar do formalismo à autenticidade do amor a ti e ao próximo. Concede-me, Senhor Jesus, o gosto de arriscar-me seguindo tua Palavra, de atrever-me a perder a vida fazendo o bem aos outros. Concede-me coragem de oferecer o «vaso de água» cotidiano ao «pequeno». Concede-me, ainda, saber reconhecer que, exatamente nele, é Tu que estás, minha infinita recompensa.

 

 

CONTEMPLATIO: Após ter conhecido o temor de Deus, sua benignidade e humanidade, pelo Antigo e o Novo Testamento, convertamo-nos com todo nosso coração. Consideremos, ainda, como irmãos nossos os que nos odeiam e nos detestam, a fim de que seja glorificado o  ­nome do Senhor e manifestado em sua gloria. Dado que tentamo-nos uns aos outros, por sermos combatido, todos, pelo inimigo comum, perdoemo-nos uns aos outros. Amemo-nos uns aos outros e seremos amados por Deus. Sejamos magnânimos uns com os outros e Deus será magnânimo com nossos pecados. A misericórdia de Deus está escondida em nossa compaixão com o próximo. Ofereçamo-nos, portanto, nós mesmos, por completo, ao Senhor, para podermos recebê-lo também por inteiro (Máximo, o Confessor).

 

AÇÃO: Repite com frequência e vive hoje a Palavra:

«Quem perder sua vida por causa de mim, a achará» Mt 10,39)

 

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL O Carmelo era minha aspiração há quase doze anos. Ao receber o batismo no dia de Ano Novo de 1932, não duvidava de que este era uma preparação para meu ingresso na ordem. Mas depois, alguns meses mais tarde, ao encontrar-me a primeira vez frente a minha querida mãe depois do batismo, entendi que ela não havia estado em condições, por enquanto, de suportar este segundo golpe: não havia morrido de dor, não, porém sua alma havia ficado literalmente inundada de tal amargura que não me sentia capaz de carregá-la com semelhante responsabilidade […]. O último dia que passei em casa era o 12 de outubro. Minha mãe e eu ficamos a sós na casa, enquanto minhas irmãs se ocupavam de lavar os pratos e por tudo em ordem. Escondeu o rosto entre suas mãos e começou a chorar. Pus-me detrás de sua cadeira e fui apertando contra meu seio sua cabeça de prata. Ficamos assim muito tempo, até que consegui persuadi-la de que fosse para a cama; a levei e a ajudei a trocar a roupa… pela primeira vez em toda minha vida […]. Às cinco e meia saí como sempre de casa para escutar a santa missa na igreja de São Miguel. Depois nos reunimos para o café; Erna chegou às sete. Minha mãe tentava tomar algo, porém logo afastou a taça e começou a chorar como na noite anterior. Aproximei-me de novo dela e abracei a ela até o momento de ir-me. Então fiz um sinal a Erna para que ocupar meu posto. Após por meu abrigo e a sombrinha no cabide do lado… chegou o momento do “adeus”. Minha mãe me abraçou e me beijou com muito afeto […].Finalmente, o trem se pôs em marcha. Agora tornara-se realidade o que apenas havia me atrevido a esperar. Não se tratava, certamente, de uma alegria exuberante que pudesse apoderar-se de mim… o que havia se passado era muito triste! Mas minha alma se encontrava em uma paz perfeita: no porto da vontad de Deus (E. Stein).

 

 

TERÇA-FEIRA, 16 DE JULHO DE 2019 15ª SEMANA DO TEMPO COMUM  ANO PAR

Mateus 12,46-50 (Os verdadeiros parentes de Jesus) O encontro de Maria com Jesus durante sua pregação é importante na revelação da identidade do Mestre e também de sua mãe, neste episódio, com alguns parentes. Maria aparece sempre, no Evangelho, em comunhão com todos, e conduz à comunhão com o Filho. Mas, o passar da fraternidade-familiaridade, pura­mente natural, à espiritual, que Maria já vive (como Lucas mostrou em seu Evangelho da infância), torna-se, agora, evidente, nas palavras do Filho. A pergunta retórica de Jesus, consciente da pre­sença de sua família natural e da necessidade de proclamar a novidade de sua relação com ela, em outro âmbito, é, pelo menos, significativa. Trata-se de revelar o passo necessário que foi dado agora, com a nova família que o próprio Jesus está formando com seus discípulos. Sua resposta é uma revelação que também indica a nova fraternidade que acontece mediante a acolhida de Jesus, de sua Palavra (v.49). Alarga-se o círculo dos fa­miliares de Jesus, pois supera os limites da família natural. E nasce a nova relação consangüínea, que é a vida da Palavra e, de fato, cumprimento da vontade do Pai. Maria, serva, discípula, mãe que se oferece por completo, para que se cumpra a vontade do Pa­i, é o exemplo sumo desta comunhão familiar com Jesus, através do vínculo da Palavra escutada e vivida, que, com frequência, sublinham os Padres da Igreja. Também o cristão gera Je­sus em si mediante as fidelidade da Palavra. Corres­ponde à espiritualidade do Carmelo, toda ela centrada na escuta, meditação e contempla­ção da Palavra, a visão de Maria que apresenta a Je­sus seus verdadeiros irmãos e filhos instruídos por ela no cumprimento da vontade do Pai.

 

Zc 2,14-17 (Apelo aos exilados) Zacarias viveu pelos anos 500 aC. e se esforçou em dar apoio, com a palavra de Deus, aos israelitas desiludidos de regresso à Jerusalém, vindos do exílio da Babilônia. Na primeira parte de seu livro se descreve oito visões que anunciam a vinda do Messias. Nos capítulos seguintes o profeta promete que um dia chegará à recompensa e que Israel será restaurado, não sem antes passar por guerras e calamidades por não haver reconhecido o Messias. No texto de hoje temos um apelo do profeta convidando os cativos à alegria, porque Deus está em meio de seu povo. Para nós agora isto é muito mais verdadeiro. Na Bíblia a expressão “filha de Sião” é um dos nomes do povo de Deus, imagem poética da cidade santa, representada como mulher e data da época pós-exílica, quando Jerusalém se converteu, para os judeus, em coração e centro de adoração do povo escolhido (Ez 5,5;38,12;Lm 2,13;Zc 9,9). Zacarias anuncia os tempos novos quando diz que Deus ficará para sempre em Sião, na cidade em que se reunirão todos os povos. O profeta promete a atuação permanente de Deus.

 

 

Lc 1,46-55 (O cântico de Maria) Maria dirige o louvor a Deus que fez tudo. Na passagem prodigiosa da virgindade à maternidade ela descobre o estilo e esquema da renovadora ação de Deus, manifestada também na esfera política e econômica: não para mudar os lugares, deixando as coisas como estão, mas no espírito messiânico das bem-aventuranças (felicidades, venturas). A ela felicitarão todos os que reconhecerem esses valores. Ela é a “serva” que representa Israel, “servo” desvalido e socorrido por Deus (e também a igreja das bemaventuranças). O hino é de puro estilo bíblico, cheio de citações e reminiscências do Antigo Testamento. Divide-se em duas seções, com o corte final do v.50. Parece unir-se a Israel, o povo escolhido; no tempo, parte de Abraão e continua sem fim. Não menciona expressamente a maternidade, implícita no contexto próximo. Não é improvável que Lucas tenha adaptado um hino já existente. Do cântico de Ana e seu contexto toma: o tema básico da maternidade, as duplas poderosos/humildes, ricos/pobres, a reviravolta da situação, a alegria da celebração, a santidade de Deus, a atenção para a humildade ou humilhação, o Deus de Israel.

Lembrai-vos, ó piedosíssima Virgem Maria, que nunca se ouviu dizer, que algum daqueles que a vós têm recorrido, implorado a vossa assistência, e implorado o vosso socorro, fosse por Vós desamparado. Animado eu, pois, com igual confiança, a Vós, ó Virgem entre todas singular, como à Mãe recorro, de Vós me valho e, gemendo sob o peso dos meus pecados, me prostro a vossos pés. Não rejeiteis as minhas súplicas, ó Mãe do Verbo encarnado, mas dignai-Vos de as ouvir propícia, e de me alcançar o que vos rogo. Amém

MEDITATIO: A busca da sabedoria, a escuta da Palavra e o cumprimento da vontade de Deus são temas que iluminam o sentido mais verdadeiro da devoção à Virgem do Carmelo, segundo a mais pura e genuína tradi­ção da ordem. Antes, inclusive, de ser Santa Maria do Monte Carmelo para o povo fiel, ou seja, a imagem familiar que apresen­ta o escapulário às almas do purgatório para levá-las ao céu, Maria é, na espiritualidade do Carmelo, a guardiã da Palavra, a Virgem do silêncio e da oração, a Mãe da contemplação e da vida mís­tica. É a que leva os fiéis, como guia sábia, pelas vias da santa montanha, conduzindo-os até o cume que é Cristo. Como Mãe espiritual, gera seus filhos para a vida de graça na Igreja e as acompanha, do mesmo modo, com o exemplo e intercessão, e com uma delicadeza absolutamente materna, em cada etapa da vida espiritual, através das noites escuras e dos dias luminosos da vida. E, sempre na linha do Evangelho, marca mais profundamente, nos que se deixam plasmar por sua presença e ação materna, uma santidade toda mariana, interior na contemplação, generosa no serviço. Maria, sede da sabedoria, nos conduz a Cristo, sa­bedoria viva, e forma discípulos da divi­na sabedoria. Maria, discípula do Senhor, reúne e forma discípulos da divina Palavra, nova seiva vital que nos faz, com e como a Eucaristia, membros consanguíneos do próprio corpo de Cristo.

 

ORATIO: Ó, Virgem santa, Mãe do Criador e Salvador do mundo, advogada dos pecadores. É justo que, após ter dado graças a Jesus, teu Filho e Redentor meu, por entregar-se, com amor, por mim, pecador, e entregar seu santíssimo corpo, também dê graças a ti, Rainha celestial, porque de ti este Verbo divino tomou a humanidade; teu Filho e meu Deus e Criador. Com humildade suplico tua clemência, porque és Rainha do céu e Mãe da misericórdia e deste misericordioso Senhor e, visto que, da plenitude de tua graça recebem, de ti: redenção, os prisioneiros; consolo, os aflitos; perdão de seus pecados, os pecadores; ob­têm graça e glória, os justos; saúde, os enfermos; e grande glória os anjos; suplico-te que me comuniques tua benevolência, ó Senhora e Mãe da mesma graça e misericórdia.

 

CONTEMPLATIO:  Após Jesus Cristo e, sem dúvida, a distância que há entre o infinito e o finito, houve também uma criatura que foi um magno louvor de glória à Santíssima Trindade, que respondeu plenamente à eleição divina, da qual fala o apóstolo. Esta foi sempre «pura, i­maculada, irrepreensível» aos olhos do Pai, três vezes santo. Sua alma é tão simples e os movimentos de seu espírito tão profundos que não podiam ser sondados. Parece reproduzir na terra a vida própria do ser di­vino, do ser simples. Ao mesmo tempo, é tão transpa­rente e luminosa que poderia ser comparada à luz. Contudo, não é mais que o «Espelho» do Sol de justiça, Speculum iustitiae. «A Virgem conservava todas estas coisas em seu coração». Toda sua vida pode resumir-se nestas poucas palavras. Vivia em seu coração, a tal profundidade, que o olhar humano não pode sondar. Quando leio no Evangelho que Maria «correu às pressas as montanhas da Judéia» para cumprir seu ministério de caridade junto a sua prima Isabel, vejo-a passar altamente bela, com grande calma e majestosa, recolhida por completo em si mesma com o Verbo de Deus. Sua oração, como a dele, também foi sempre esta: «Ecce; Aqui estou». Quem? “a escrava do Senhor, a úl­tima das criaturas», ela mesma, sua Mãe. Mostrou-se tão verdadeira em sua humildade, porque, esqueceu-se sempre de si mesma e foi sempre livre de si mesma e, por isso, podia cantar: «O Poderoso tem feito obras grandes por mim. De agora em diante, as nações me proclamarão bem-aven­turada» (Isabel da Trindade, «Último retiro», 15).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

“Que a Virgem Maria esteja presente em nosso pensa­mento e em nosso coração”

 

PARA LEITURA ESPIRITUAL – As distintas gerações do Carmelo desde as origens até hoje tentaram plasmar sua própria vida seguindo o exemplo de Maria: por isso, no Carmelo, e em toda alma mo­vida pelo terno afeto à Virgem e Mãe Santíssima, floresce a contemplação dela, que já vive em si o que todo fiel de­seja e espera realizar no mistério de Cristo e da Igreja. Por isso, os carmelitas e carmelitas elegeram justamente a Ma­ria como própria patrona e mãe espiritual. Ela é a Virgem pu­ríssima que guia a todos ao perfeito conhecimento e imitação de Cristo. Floresce, assim, uma intimidade de relações espirituais que incrementam cada vez mais a comunhão com Cristo e com Maria […]. Ela não é só modelo para imitar, mas também uma doce presença de Mãe e Irmã em quem confiar […]. Este rico patrimônio mariano do Carmelo se tornou com o tempo, através da difusão do escapulário, em um te­souro para toda a Igreja […]. Este se tornou sinal de «aliança» e de comunhão recíproca entre Maria e os fieis (…). Desta espiritualidade mariana, que plasma interiormente às pessoas e as configura a Cristo, primogênito entre mu­itos irmãos, constituem um esplêndido exemplo, os testemunhos de santidade e sabedoria de tantos, santos e santas do Carmelo todos eles criados à sombra e sob a tutela da Mãe (João Paulo II, Carta, 25 de março de 2001)

 

 

 

 

QUARTA-FEIRA, 17 de julh9 de 201915ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

Mateus 11,25-27 (O Evangelho revelado aos simples; O Pai e o Filho) Jesus louva ao Pai e lhe dá graças por seu agir, tão diverso e surpreendente, com respeito à lógica humana, que exalta o poder e a força. Não são os que contam com sua própria sabedoria, os que põem o fundamento de sua própria segurança sobre as capacida­des em contínua dependência da inteligência, mas que são os «pequenos» os beneficiários da revelação do Pai (v.25). Assim, o grito de dor de Corozaín, Betsaida, Cafarnaum, refratárias ou indiferentes com respeito a sua palavra (Mt 11,20-24), vai seguido do grito de alegria de Jesus por aqueles que, ao contrário, abriram seu coração à Palavra. As cidades galileias, que co­nheciam bem o «filho do carpinteiro» (Mt 13,55), porque era sua pátria, parece incompreensível a novidade do Evangelho, que se revela, ao contrário, a quem, pri­vados de títulos de méritos e sem estar em condições de apoiar-se em prerrogativas humanas, são capazes de confiar em Deus, seguros de sua fidelidade. Jesus constata, com alegria, a eleição preferencial do Pai, jamais, desmentida ao longo de toda a revelação, pelos que são pequenos, pobres, simples. Assim parece bem ao Pai (v.26) e assim parece a Jesus. O evangelista aproveita esta ocasião para declarar a consciência de Jesus e a fé da Igreja no mistério das relações trinitárias. O Pai dá, ao Filho, tudo, por amor, o Filho acolhe tudo e o restitui, ao Pai, por amor. O movimento eterno de entrega recíproca entre o Pai e o Filho segue sendo um mistério para a criatura. Sem dúvida, por obra do Espírito, perene efusão de amor, o Pai se faz acessível, no Filho, e revela a si mesmo (v.27). Tal manifestação é incompreensível para a sabedoria racional humana. Só quem se faz «pequeno», no coração, em toda sua existência, só quem se torna disponível, para entrar na lógica do dom gratuito de Deus, pode compreendê-la. O apóstolo Paulo dirá com outras palavras: «O que em Deus parece debilidade é mais forte que os homens» (1 Cor 1,25a).

 

 

 

Is 10,5-7.13-16 (Contra o rei da Assíria) O oráculo contra Assíria que nos apresenta este frag­mento deve ser colocado no contexto da iminente ameaça da invasão Assíria, que marca a época da profecia de Isaías. Os reis de Judá, primeiro Acaz e, depois, seu filho Ezequias, adotam uma política diferen­te respeito à potência estrangeira: de aliança-vassalagem o primeiro, de oposição o segundo. Sem dúvida, nenhum dos dois segue os conselhos do profeta, que exorta a buscar na fé em Deus e não nas alianças políticas a estabilidade e a segurança do Reino. Deste modo, Isaías considera a Assíria umas vezes como ini­miga que tem de ser castigada, e outras, como instrumen­to do que se serve Deus para admoestar seu povo e incitar-lhe ao arrependimento. Neste oráculo se chama a Assíria «vara» e «bastão» da cólera de Deus (v. 5), instrumento eficaz destinado a que o povo tome consciência da impiedade em que vive. Sem dúvida, Assíria troca em vantagem a tarefa, que lhe foi confiada: o castigo que deve infligir a Israel e a Judá está se transformando em sua própria destruição. Pôs a si mesma como árbitro de suas próprias opções. Deste modo, o «bastão do furor» de YHWH (v. 5b) pretende «mover a quem o leva» (v. 15c). O destino que lhe está reservado, seguindo a lógica da retribuição temporal, será um castigo exemplar (v. 16).

 

Sl 93/94, 5-10.14-15 (O Deus justo) Já nos acostumamos a ouvir as queixas do salmista, que proclama a sua inocência a Deus e aos homens. Este tipo de súplica é muito comum a todos os salmistas, sejam eles antigos ou atuais. Quando a cruz se faz pesada, não nos resta outra alternativa senão reclamar. Mas reclamar com quem? Com Deus, pois Ele é o único que nos ouve e nos responde. Mas a resposta do Senhor não é bem como gostaríamos: há no ser humano um gostinho de vingança que é bem difícil de ser retirado. Queremos que o Senhor aja conforme os nossos sentimentos e pensamentos, no entanto, Ele é inerte à cólera e firmado no perdão. Esta oração de súplica nos apresenta uma imagem do ser humano sofrido, chateado, mas que quando não encontra consolo em ninguém volta a buscar Deus como refúgio, rochedo, fortaleza e abrigo. O amor do Senhor nos sustenta em todos os momentos.

Senhor, peço que não leves a sério os meus clamores e minhas ameaças de que vou te deixar e abandonar caso não me ajudares. Quando sofro digo tantas besteiras, mas depois me arrependo e me sinto envergonhado. Vem, Senhor, em minha ajuda. Em ti eu confio, e somente em ti. Dói-me o coração ver a injustiça mascarada de justiça e os que deveriam defender a lei e os justos se colocarem do lado dos injustos e dos pecadores. Dê-nos advogados retos e justos que prefiram a pobreza a compactuar com o mal. Amém.

 

 

 

MEDITATIO: A tentação originária do homem é a de excluir Deus de sua própria existência… A consciência de viver na idade adulta não pode tolerar a dependência, nem a submissão, a nenhum Deus. O homem que rejeita a Deus, seja reconhecendo-o, ou não, fecha-se no gueto de seus próprios instintos, de suas próprias opiniões, de uma inteligência que, por mais que possa percorrer os espaços siderais ou adentrar-se nas partículas infinitamente minúsculas da matéria, não sabe encontrar o caminho da alegria, da paz, da plenitude interior. Deste modo, paradoxalmente, o homem que se sente senhor do mundo, assim como de sua própria existência e da liberdade, não consegue penetrar no coração do viver, com seu significado último, que é o único que lhe dá consistência. Isso é, sem dúvida, o que se revela a quem aceita a realidade de ser criatura pequena, frente ao Criador, ainda que seja tão preciosa para Ele que Ele a chama a participar de sua própria vida. É «pequeno» quem se mostra contente com o que é; quem sabe que não é onipotente, e, por isso, se abre à relação com Deus. É «pequeno» quem sabe ter recebido tudo como dom e o usa não como dono ou como predador, mas como servo, com gratidão. Quem é «pequeno» deste modo conhece algo do amor do Pai e do Filho.

 

ORATIO: Bendito sejas Pai, que nos deste Jesus, teu Filho, e n’Ele nos tens dito e mostrado o muito que nos queres. Nunca teríamos podido imaginá-lo. Se Tu não houvesses decidido manifestar-te a nós, não havia sido possível que eu estivesse, agora, aqui, falando contigo com a confiança de um filho. Rogo-te, Pai: renova, também, em meu coração, a certeza da presença de teu Espírito. Que ele me dê à certeza de que Tu és meu Pai, de que Jesus é o Senhor, de que estou chamado à comunhão contigo para a eter­nidade. Que Ele me faça degustar a beleza de ser criatura, pequena, porém preciosa, e me liberte da presunção de autossuficiência, da insensatez de quem quer dar-te conselhos, considerando-os como os melhores. Espírito de sabedoria e de piedade acende, em mim, o gosto pela pequenez, pela simplicidade, que me dispõem acolher tua manifestação.

 

CONTEMPLATIO:  Os grandes discursos não nos fazem santos e justos, mas é a vida virtuosa que nos torna agradáveis a Deus. É muito melhor experimentar compunção, que conhecer sua definição. Esta é, portanto, a su­prema sabedoria: tender ao Reino dos céus median­te o desprendimento do mundo. Que vantagens nos traz o saber sem temor de Deus? Não te deixes levar pela arte ou a ciência que possuis: que estes dons sejam para ti, bem mais, motivo de temor. Feliz aquele que é doutrinado diretamente pela Verdade tal como ela é. Do único Verbo procedem todas as coisas, só d’Ele nos falam todas, e este é o Princípio que nos fala também a nós. Quanto mais capacidade de recolhi­mento e simplicidade interior, tenhamos, nós, alcançado, tanto mais, seremos capazes de compreender, com amplitude e profundidade, e sem fadiga, por que recebemos do alto a luz da inteligência (A imitação de Cristo).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Só tu, Senhor, és Deus» (cf. ls 10,15)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL O modelo ao qual temos de adequar-nos no cristianismo não é o “adulto”, mas, ao invés, a “criança”; não é o “intelectual”, que, na perspectiva ilustrada, é o “adulto” por definição, mas, ao invés, o “simples”, o “ignorante”. Este, nas perspectivas evangélicas, está simbolizado precisamente pelo “pequeno”, pela “criança”. Paulo VI, papa “intelectual”, homem cultíssimo, elevou em 1970 ao ranque de “doutora da Igreja” – o mais elevado na hierarquia espiritual – a Santa Catarina de Sena, que a duras penas era capaz de ler e só ao final de sua vida aprendeu a escrever. Não sem razão esta minha biblioteca na qual estamos falando, composta por muitos livros, com frequências árduos e escritos em muitas línguas modernas e antigas, está presidida (como pode ver) pela imagem de uma jovem de quatorze anos que ainda não era mulher, asmática, desnutrida, filha da família mais desprezada de seu povo e, como é natural, analfabeta. “A mãe de Cristo, para confiar sua mensagem de chamado à fé, não elegeu, nem a professores, nem a notáveis, nem a periodistas, nem a outros cristãos já “adultos” e já maiores de idade”.  Dezoito vezes, falando seu dialeto, lhe apareceu, na gruta onde se guardava a manada de porcos de propriedade comum, a esta pobre ignorante para o mundo, a esta maravilhosa sábia segundo o Evangelho que é a santa Bernadette Soubirous, a filha de um moleiro fracassado da obscura Lourdes. Não é uma surpresa: é só a enésima confirmação de uma estratégia divina (V. Messori – M. Brambilla, Qualche ragione per credere, Milán 1997).

 

 

 

QUINTA-FEIRA, 18 de julho de 2019 – 15ª SEMANA DO TEMPO COMUM ANO PAR

Mateus 11,28-30 (Jesus é o mestre com fardo leve) O canto de louvor de Jesus Cristo anuncia a salvação para quem acolhe, com estupor e admiração, o amor do Pai celestial. Jesus Cristo acaba de falar da impossibilidade de conhecer ao Pai celestial, a não ser pela revelação do Filho. E agora Ele, o Filho Unigênito, convida a todos a irem a Ele, a entrar em co­munhão de vida com Ele, acolhendo seu amor, e o de seu Pai celestial, fonte de repouso, satisfação de todo desejo de gozo e paz. Ele, o único e verdadeiro Mestre, dirige, a to­dos, o convite a fazerem-se discípulos, e trata-se de um convite que leva, em si mesmo, os caracteres da urgência e da alegria. Jesus, Sabedoria do Pai que se revela aos simples, manifesta, a todos os que experimentam e reconhecem a fadiga opressora da observância da Lei em si mesma, o mistério do Reino de Deus, enquanto anuncia que o amor é a plenitude da Lei (cf. Rm 13,10; Gl 5,14) e converte o amor na norma, no mandamento supremo (cf. Jo 13,34; Mt 22,36-40). O discípulo está convidado a pôr-se junto a Jesus, a tomar seu próprio jugo. Aprende do Mestre a levá-lo, fazendo seu o próprio estilo de vida: o dos simples e o dos humildes, o dos pobres e pequenos, que hão compreendido o mandamento novo da obediência a Deus e do serviço aos irmãos. O jugo, em si, segue sendo pesado, porém, levá-lo, com Cristo, torna-se suave: o amor reclama a difícil renúncia a nosso próprio instinto egoísta, porém, abre, de par em par, os horizontes da verdadeira vida, a vida de Deus.

 

 

Is 26,7-9.12.16-19 (Oração)  A oração de Is 26,7-19, da qual estão tomados os versículos que constituem o texto litúrgico de hoje, faz parte do assim chamado «Apocalipse de Isaías», considerado como posterior à profecia do Isaías his­tórico. Trata-se de um bloco de capítulos (24-27) for­mado por liturgias proféticas, anúncios apocalípticos, cantos e orações de lamentação e de ação de graças. O centro da atenção está constituído pela ruína da cidade excelsa, cuja identificação torna-se problemáti­ca, e pelo juízo que pronuncia Deus, sobre ela e sobre toda a terra, um juízo no qual estão implicadas, do mesmo modo, todas as forças da natureza. Entre os trans­tornos cósmicos e as perspectivas da paz definitiva, convida-se o povo a confiar no Senhor, que mantém sua promessa e cuida dos pobres e dos oprimidos. Do mesmo modo que devasta as cidades pagãs, fazendo impraticáveis seus caminhos, aplaina a senda de quem conforma a vida a seus preceitos (vv.7ss). Deus realiza suas grandes obras entre as nações, a fim de que todos possam conhecer-lhe e viver segundo sua vontade. A esperança que o orante põe em Yhwh alimenta o desejo de estar em comunhão com aquele que lhe concederá, e está seguro disso, a plenitude de todos os bens e levará a bom termo as iniciativas empreendidas (vv.9.12). Isso mostrará, não obstante, a débil fé do povo, cuja oração está pobre de conteúdo e de força vital (vv.16-18). A intervenção de Deus voltará a dar energia vivificadora a um povo de “mortos», para uma nova existência jubilosa (v.19). A súplica que proclama o orante é de uma esperança certa, expressão da fé naquele a quem sabe que lhe pertence.

 

Sl 101/102 (Oração na infelicidade) – Este Salmo é um grito de súplica que brota no coração de quem sofre. O sofrimento se faz presente desde o nosso nascimento até a nossa morte. Quando sofremos, somos invadidos também pela solidão e pelo desespero, que nos fazem buscar um ombro amigo para desabafar as nossas mágoas e sermos consolados. Mas este momento de alívio é passageiro, pois o único que pode nos consolar eterna e verdadeira mente é o Senhor Jesus, que experimentou em terra a amargura de todas as dores: fome, perseguição, ódio, inimizade, cansaço, solidão e abandono de amigos. Por isso, compreende nossos sofrimentos. Considerada como uma oração feita por Jesus na sua Paixão, este Salmo apresenta fortes imagens de pássaros solitários e noturnos, evocando a solidão que adoece o coração. O que fazer diante do sofrimento? Devemos reagir, buscando saídas e confiando, principalmente e acima de tudo, no Senhor. Até mesmo lembrar que enquanto sofremos, muitas pessoas padecem mais do que nós. Não somos os únicos a carregar a cruz. Acolha a meditação deste Salmo pelos que sofrem, pois ele é considerado um dos Salmos penitenciais mais propícios para pedir perdão dos nossos pecados e dos pecados dos nossos irmãos.

Senhor, tu conheces o meu sofrimento. Não quero fechar-me sobre eles nem me deixar esmagar pelas minhas dores. Quero levantar a cabeça e olhar com amor o meu crucifixo que sempre me acompanha. Quero fixar o olhar sobre Jesus, que, como cordeiro manso, foi levado ao matadouro e não se revoltou. Dá-me a coragem, Senhor, de oferecer os meus sofrimentos pela salvação da humanidade, especialmente em comunhão com todos os cristãos do mundo inteiro que, em tantos países, se veem perseguidos em razão da própria fé. Quero, Senhor, estar ao lado de todos os sofredores, visitar todos os doentes nos hospitais, aqueles com doenças terminais, as pessoas abandonadas, os perseguidos pela justiça. Que ninguém na sua dor se sinta sozinho, mas que possa perceber a presença solitária e amiga dos irmãos e irmãs e a força de Cristo que nunca falta para quem a invoca. Senhor, permite-me não ter vergonha dos meus sofrimentos, mas não escondas, Senhor, o teu rosto quando sofro, e escuta minha voz. Amém.

 

 

MEDITATIO: Deus cuida de seu povo. Quer o bem para cada um de seus filhos criados, amados e protegidos por Ele. A última palavra de Deus é «vida», não «morte», como nos mostrou ao ressuscitar Jesus Cristo. Nossa experiência terrena é, com frequência, uma experiência de fadiga, de ter que carregar pesos, sob os quais nos abatemos: pesos físicos, pesos interiores. Cada um de nós se reconhece, com facilidade, entre os «fatigados e envergados” a quem Jesus Cristo convida a ir até Ele. Ou melhor, entre quem grita na prova, como os judeus da profecia de Isaías. Vale a pena perguntar-se como vivemos as situações difíceis, que chamamos «provas», como reagimos frente ao que nos parece pesado demais para nossas forças, ou nos espanta, nos desorienta. Talvez nos limitamos a cansar-nos (dos outros, do destino, de Deus)? Trata-se de uma reação compreensível, porém, corremos o risco de que nos faça sentir as dores, para, a seguir, dar a luz «só vento», usando a imagem do profeta Isaías. Se queremos caminhar com o Senhor Jesus pelas sendas que Ele, em sua bondade, não deixa de aplainar, poderemos nos carregar com seu jugo, um jugo leve, porque o levamos com Ele, e Ele mesmo nos ensina a levá-lo com amor. De todos os modos, as provas, as contrariedades, os sofrimentos provocados, nos fazem mal e continuam fazendo, porém, tem um significado: se vivemos, sem cessar de amar, de dar alegria e paz aos que estão junto de nós, venceremos como Jesus Cristo, o mal com o bem: em primeiro lugar, em nós mesmos, e, em seguida, em nosso redor. Con­verteremo-nos em semeadores de esperança.

 

ORATIO: Venho a ti, ó Senhor Jesus Cristo, carregado com a fadiga de minha jorna­da e os pesos dos sofrimentos dos que vivem junto a mim. Encontro-te carregado com a cruz e com todas as cruzes construídas, tanto ontem, como hoje, pela mesquinhez e pelo egoísmo de tantos. Olha-me, Senhor: olha como, apesar das aparências e de certo perfeccionismo religioso e, ainda, enchendo com frequência a boca com formosas palavras, nem sequer sou capaz de levar, com amor, meu próprio peso. Ao convite que hoje Tu me diriges: «Vinde a mim todos os que estão candados com o peso de vossos fardos…», respondes com tua oração na cruz: «Pai, perdoa­-os…». Obrigado, Jesus, por atrair-me a ti, com tanta suavi­dade. Quanto a mim, quisera, com tua ajuda, levar suavidade: talvez descubra que, com o amor, todo peso se torna leve.

 

CONTEMPLATIO: Tende uma grande humildade, pois é a virtude das virtudes, porém, uma humildade generosa e tranquila. Recomendo-vos, mais que as outras, as duas queridas virtudes que tanto deseja nosso Senhor, que aprendamos dele: a humildade e a simplicidade de coração, porém cuidai para que sejam verdadeiras virtudes do coração. Animai sempre vosso valor com a humildade, e vossa humildade, isto é, vossa miséria e vosso desejo de ser humilde, animados com vossa confiança em Deus, de sorte que vosso valor seja humilde e vossa humildade seja virtuosa. Permanecei alegremente humildes ante Deus, mas, sede, também, perante o mundo (Francisco de Sales).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Jesus, manso e humilde de coração, fazei

nosso coração semelhante ao vosso” (cf.Mt 11,29)

                                                                                                                                                                                                                      

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL Se chegou a dizer que Jesus teria crescido frágil, que teria se tornado delicado e simples: a partir daí teria se inclinado pela vida decadente, teria se colocado da parte dos pobres, dos perseguidos, dos oprimidos, dos candidatos ao sofrimento e à miséria. Quem pensa assim basta que abra os olhos e olhe bem a Jesus. Que não julgue debilidade e força, exclusivamente, segundo alguém abra caminho com ardor e com os punhos, mas pensando que há também uma fortaleza superior que talvez tem que ver com os estratos inferiores do ser. “Vinde a mim todos os que estais fatigados e carregados e eu vos aliviarei. Carregai meu jugo e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrarei descanso para vossas vidas” (Mt 11,28ss). Trata-se do mesmo que as bem-aventuranças. A consciência de dar a volta ao que tem valor no mundo, para edificar o que realmente conta. Jesus não vem para acrescentar um novo elemento à série de experiências humanas realizadas até aqui; não, Jesus traz da plenitude do céu, reservada a Deus, uma realidade santa. Traz ao mundo sedento uma corrente de vida desde o coração de Deus. Para ter parte nela é necessário que o homem se abra, deixe o apego à vida terrena e saia ao encontro daquele que vem. É preciso superar arraigada pretensão que o mundo é a única realidade que conta e basta a si mesma como pensam aqueles que estão bem situados no mundo, aos poderosos, aqueles que têm parte na grandeza e na riqueza da terra. Os pobres, ao contrário, são felizes, não porque seu estado, em si, seja feliz, mas porque reconhecem com maior facilidade que há, algo além do mundo e, iluminados por sua miséria, aspiram de uma maneira mais esplêndida a esse outro (R. Guardini, Il Signore, Milán 1977).

 

 

SEXTA-FEIRA, 19 de julho de 2019- 15ª SEMANA DO TEMPO COMUM ANO PAR

Mateus 12,1-8 (As espigas arrancadas) O evangelista São Mateus conta nesta passagem uma das inúmeras controvérsias entre Jesus e os fariseus com respeito à observância do preceito sabático. A Lei mosaica prescrevia abster-se de todo trabalho no dia de sábado, ainda que fosse particularmente urgente, como os trabalhos do campo em tempos de arado e de colheita (cf. Ex 20,8-11; 31,12-17; 34,21; Lv 23,3; Dt 5,12-15). A antiga instituição do sábado como dia de repouso dedicado a Deus, que “descansou no sétimo dia de tudo o que havia feito” (Gn 2,2), havia tomado uma grande importância durante o exílio da Babilônia e no período posterior, convertendo-se, portanto, em uma lei férrea no judaísmo até os tempos de Jesus. O preceito do sábado, vivido a princípio como dia de alegria para todos (homens, livres ou escravos, e animais), em recordação da libertação da escravidão do Egito, e como antecipação do repouso escatológico, no qual toda criatura participará do repouso do próprio Deus (cf. Hb 4,9-11), o preceito do sábado, dizíamos, havia se transformado em uma casuística opressora e vinculante do que estava permitido e o que estava proibido, uma casuística em torno à qual divergiam as diferentes escolas rabínicas. A afirmação de Jesus “o Filho do homem é Senhor do sábado” (v.8) tem um alcance desconcertante. Afirma, em primeiro lugar, que tem uma autoridade superior à de Moisés, em virtude de sua relação especial com o Deus a quem se quer honrar observando o preceito do sábado. Ele e só Ele pode estabelecer o que é licito e o que não é. Jesus, revelador do amor do Pai, volta a situar o homem no centro do verdadeiro culto: render honra a Deus não pode ser separado do estar atento ao homem, a quem Deus criou e ama. Em consequência, não pode ter conflito entre a lei religiosa e as exigências do amor. A história de Israel, dado que o caráter sagrado dos pães da oferenda não impediu a Davi e a seus famintos homens alimentar-se com eles (vv. 3ss), o confirma. O Deus misericordioso busca a misericórdia e não o sacrifício, como mostrará Jesus curando ao homem da mão atrofiada (Mt 12,9-13). Se os próprios sacerdotes devem infringir as normas do sábado para exercer seu ministério (v.5), tanto mais passarão estas a segundo plano, ante as exigências do amor ao homem, sinal incompreensível do amor e obediência ao Deus do amor.

 

 

Is 38,1-6.21-22.7-8 (Doença e cura de Ezequias) Os capítulos 36-39, que encerram o livro atribuído ao primeiro Isaias, são um acréscimo posterior feito pelo redator depois do exílio da Babilônia. Os feitos que ali se narram remontam aos últimos anos do século VIII aC, durante o reinado de Ezequías, e estão documentados desde o ponto de vista histórico tanto pelo segundo livro dos Reis como pelos textos assírios. A passagem que examinamos se situa no contexto precedente ao assédio que o rei assírio Senaquerib pôs a Jerusalém, uns quinze anos antes da morte do rei Ezequias. O relato da gravíssima enfermidade que acomete ao rei e de sua cura milagrosa, mediante a intervenção de Isaías, põe de relevo a atitude de confiança de Ezequias com Deus e com o profeta, que é reconhecido pelo que é: porta-voz de Yhaweh. Por outra parte, emerge o prestígio de Isaías e se exalta o poder que vem de sua fidelidade ao mandato profético. Ezequias reage ao anúncio de sua morte iminente com uma oração que, seguindo o estilo dos salmos de súplica, apela à misericórdia de Deus. A Ele apresenta, o rei, sua própria vida, uma vida vivida com retidão, rica em boas obras; portanto, seguindo a doutrina da retribuição temporal, como é possível que esta vida seja tão breve? A bondade da oração do rei fica demostrada pelo fato de que é escutada. Essa escuta se faz saber por meio do profeta: Ezequias será curado e Jerusalém será libertada.

 

Is 38,10-12.16-17 (Cântico de Ezequias) Canto de ação de graças com a estrutura clássica: narração da desgraça, recordação da súplica, recordação da libertação, ação de graças do salmista, convite à comunidade. Ainda que o homem seja limitado, sente certo direito a uma vida coroada: morrer aos vinte anos é fracassar, é ser privado de algo que lhe pertence. A forma impessoal esconde o sujeito, que é Deus. A existência depois da morte não conhece culto religioso nem vida social. O Abismo se opõe à “terra dos vivos”, terra criada para que o homem habite nela. A comparação da tenda mostra a vida como peregrinação, como caminho de nômade: a tenda foi por um momento hóspede de um terreno, foi cravada provisoriamente no chão. Por um momento o fio de uma vida desenhou uma figura no tapete ou cruzou uma parte do tecido; esse fio é cortado sem piedade. A imagem da teia é mais sugestiva que a simples de enovelar, que é a das parcas, e que Quevedo transfere para a dimensão cósmica: ”Enovelam sol e lua, noite e dia, do mundo a robusta vida” (Jó 6,9). De repente muda de tom: da angústia à confiança, à experiência da saúde. Nelas experimentou a mão de Deus que vivifica. Diante do túmulo vazio, o homem sente seu ser de pecado que o impele e precipita. Deus detém a queda porque perdoa o pecado.

 

 

MEDITATIO: É fácil tentar encerrar a Deus em um conjunto de regras religiosas práticas, que nos ponham em paz a consciência aqui na terra e nos assegurem a vida eterna. É fácil porque dá segurança e oferece um critério de juízo imediato entre o que é justo e o que não é. Facilita também, portanto, a aproximação aos outros, que podem ser etiquetados “objetivamente” como “justos” e “injustos” ou como “bons” e “maus”. Como em tempos de Jesus, trata-se de uma operação que tem muito êxito também hoje, em uma época na qual temos tanta necessidade de pontos de referência certos, controláveis, porém na qual não estamos dispostos a trabalhar para formarmos uma consciência ilustrada, capaz de discernimento, para aprender a acolher a cada pessoa em sua inconfundível unicidade. Jesus recorda aos fariseus de ontem e de hoje que Deus é misericórdia e que tudo o que se lhe tem atribuído tem os sinais característicos da misericórdia. A Palavra de Deus, que sempre nos interpela de uma maneira pessoal, nos incita a proceder a uma verificação: Jesus é meu Senhor? Ou construo uma religião própria, com ídolos e fetiches que – talvez – têm uma aparência devota, porém expressam o caráter pagão de meu coração? Se nos damos de senhores de Deus e de sua graça, se traçamos a relação com Ele e com o próximo sobre a base da medida, sempre mínima, da lei e do dever, terminaremos por excluir Deus da vida, declarando-nos, de fato, senhores de nós mesmos e dos outros, e nos encontraremos na nudez e na necessidade de esconder-nos como Adão e Eva (cf. Gn 3, 8-10). O grito cheio de confiança do rei Ezequias nos serve de exemplo: Deus não se deixa vencer em generosidade; sua misericórdia transborda sobre aqueles que confiam nele e estão dispostos a dilatar seu coração à medida do coração de Deus.

 

ORATIO: Confio-me a ti, ó Senhor Jesus, Deus misericordioso e fiel. Criaste-me livre porque Tu desejas meu amor, não minha submissão passiva. Tu vês quão difícil me é viver o dom que me deste: a liberdade do amor me dá medo e muitas vezes prefiro fechar-me nos apertados espaços de uma lei sem coração, de cujo interior emito graves sentenças sobre meus irmãos e me sinto poderoso. Confio-me a ti, ó Senhor Jesus, Deus misericordioso e fiel. Ensina-me, ó Senhor Jesus, a esquecer minha “justiça” sem piedade para fazer-me um pouco mais semelhante a ti e ser “sacramento” de tua misericórdia, para os irmãos que me dás.

 

CONTEMPLATIO: O povo infiel, que abandonou os preceitos divinos porque se considerava rico com aquela lei que não era mais que sombra dos bens futuros, e que fez um mau uso das riquezas adquiridas, foi arrancado da terra dos seres vivos, desraigados e expulsos do sagrado tabernáculo. Considerava-se demasiado forte, posto que confiava nas vaidade humanas, a saber: na glória de seu poder, no ouro do templo, nos preceitos dos homens, segundo o que havia dito o profeta: “Veneram-me sem razão, ensinando doutrinas e preceitos humanos”, e substituíram a Lei de Deus pelas regras do costume terreno, que ultraja a Deus (Hilario de Poitiers).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

                                        “Queres misericórdia, oh! Senhor” (cf. Mt 12,7)

 

A LEITURA ESPIRITUAL Jesus, devido seu amor pelos homens, luta com os fariseus. Que querem os fariseus? Prodígios. Mais que boas ações, quiseram obras estrepitosas, obras que impressionassem a sua inteligência, sem inclinar-se à conversão de seus corações. Tentam substituir o amor de Jesus Cristo, que apela as suas possibilidades de generosidade e de amor, por um compromisso entre dois egoísmos, a saber: que Jesus Cristo aceite, por uma parte, empreender uma carreira gloriosa e, por outra, que Ele renuncie a vigiar suas comodidades. Notemos que a vivacidade das reações do Mestre se deve ao fato de que as más intenções de seus adversários tendem a impedir-lhe fazer o bem, e a causar dano àqueles a quem professa um afeto particular: os inválidos e menos favorecidos pela vida. Quando alguns fariseus reprovam os discípulos que arrancam espigas em dia de sábado, Jesus Cristo intervém para justificar sua ação: “O sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado. Porque o Filho do homem também é Senhor do sábado”. Ao dar esta resposta aos sofismas que lhe traçavam, Jesus afirma não só sua própria soberania, que lhe permite fazer o bem, em dia de sábado, mas para também o significado desta soberania. O sábado foi feito para o homem, e, posto que o Messias há recebido todo o poder sobre a humanidade, é Senhor de tudo o que foi posto ao serviço dos homens, em especial do sábado. É o amor aos homens o que rege tudo, e por causa deste amor se enfrenta aos fariseus: Jesus Cristo quer que o sábado, que havia sido convertido em uma instituição importuna destinada a provocar oposições, sirva para testemunhar a bondade divina (J. Galot, Il cuore Cristo).

 

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