ESTUDO BÍBLICO NA 26ª SEMANA COMUM ANO C 2022

ESTUDO BÍBLICO NA 26ª SEMANA COMUM ANO C 2022

Comunidade Paz e Bem

SEGUNDA-FEIRA 

Lucas 9,46-50.
QUANDO SE PERDE DE VISTA A CRUZ

“Suscitou uma discussão entre eles…”

Hoje voltamos ao capítulo 9 de Lucas, onde se confessa a fé em Jesus como o Messias-Cristo e onde Jesus tem traçado a nova rota do seguimento: o mistério da Cruz.

Sábado passado havíamos visto um primeiro sinal de “imaturidade espiritual” dos discípulos ao não conseguir entrar em sintonia com a proposta de Jesus. Hoje vemos outros dois sinais. Que acontece quando uma pessoa ou uma comunidade caminham com Jesus, porém deixam de lado a Cruz? Acontecem estas duas situações:

  • Há problemas de autoridade: Quando uma comunidade se divide, quando um líder arrasta uma parte da comunidade consigo e a põe contra outro líder, quando há pelejas do tipo “eu mando aqui”, quando há presunção entre as pessoas, de submissão de umas a outra. Se isto acontece, é que se perdeu de vista a Cruz do Senhor.
  • Há censuras e acusações a outras comunidades: Quando na comunidade brotam atitudes de intolerância, quando entre as comunidades entram em competências para mostrar quem faz mais e melhor para levar os aplausos da Igreja, quando há invejas entre os líderes, quando se difama a outra comunidade, quando se discute suas atuações, é que se perdeu de vista a Cruz doSenhor.

Enfim… Jesus recorda a seus discípulos que a Cruz é humildade e pequenez, como a criança que é colocada no meio da comunidade (9,47). Porém, também é acolhida do diferente, é abertura de coração para captar o bom que há nos outros e trabalhar por uma sã harmonia.

Quando se tem em vista a Cruz, então as relações são diferentes: “O que recebe a esta criança em meu nome, a mim recebe; e o que me recebe, recebe Àquele que me enviou; pois o menor entre vós, esse é maior” (9,48). Ponhamos em nossas comunidades a dinâmica e o sabor do Evangelho.

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração

  1. Em minha vida pessoal, em minha família, no grupo ou em minha comunidade,

percebo os sinais de imaturidade espiritual que assinala o Evangelho de hoje?

  • Qual a causa?
  • Qual o caminho de superação?

TERÇA-FEIRA

Lucas 9,51-56

A HORA DA DECISÃO DE JESUS

“Quando se iam cumprindo os dias de sua assunção, Ele se afirmou em sua vontade de ir a Jerusalém”

Em Lucas 9,20-22, foi apresentado o horizonte dentro do qual Jesus realiza sua missão como “Messias” que leva a cabo o projeto salvífico “de Deus”. Este panorama delineou a rota dentro da qual o discípulo realiza seu projeto de vida (9,23-24).

No texto de hoje vemos como Jesus abraça seu caminho definitivo, com uma grande resolução interior. Com esta atitude começa a subir para Jerusalém, onde percorrerá o último e decisivo trecho de seu “êxodo” (9,51), que culminará em sua ascensão ao céu.

O Evangelho nos põe hoje de frente com “a hora” dos acontecimentos decisivos.

  • Para Jesus, é o tempo do cumprimento, segundo o projeto messiânico fixado pelo Pai. Nada, nem ninguém o poderá deter. Nem a hostilidade dos samaritanos, nem a pobreza, nem o pai que tem que sepultar, nem os parentes dos quais deve despedir-se, são suficientes para “olhar atrás”.
  • Para o discípulo é o tempo de avaliar previamente o “custo” do ser discípulo, analisando as implicações da opção e decidindo livre e conscientemente entrar no caminho do mestre sem impor-lhe condições.

O que vale para o Mestre também vale para o discípulo: o caminho do discipulado requer decisões assim de fortes. O seguimento do Mestre na rota para Jerusalém leva a marca da radicalidade e da hierarquia de valores de Jesus.Abordemos o texto em suas duas partes:

  1. A hora da decisão de Jesus (v.51);
  2. O fracasso em Samaria (vv.52-56).
  3. A hora da decisão de Jesus: começa o caminho da subida para Jerusalém (v.51)

Jesus sabe fechar e abrir etapas em sua vida. Assim o vemos terminar a primeira parte de sua missão na região montanhosa, marítima e sempre verde da Galileia (Lc 5,1–9-50) e abrir-se uma nova página com estas palavras: “Quando se completaram os dias de sua ascensão, ele tomou resolutamente o caminho de Jerusalém” (v.51).

Vejamos três elementos chaves inseridos nesta frase lucana: (a) a realização do plano de Deus; (b) o interesse por Jerusalém; e (c) a tomada de decisão.

  • A realização do plano de Deus: O indicador deste giro decisivo no ministério de Jesus é o “cumprimento dos dias de sua ascensão”. Observemos que não se trata de uma decisão tomada rapidamente:
  • Já, por duas vezes, Jesus havia anunciado a segunda parte de seu programa missionário nos, assim chamados, “anúncios da paixão” (9,22 e 9,44-45); e;
  • A referência que Jesus tem é o tempo estabelecido pelo Pai. Este tempo vai chegando a seu fim. Jesus quer cumprir sua passagem pontualmente.
  • O interesse por Jerusalém: O olhar está posto em Jerusalém: “se firmou em sua vontade de ir a Jerusalém”. Jesus sabe o que o espera: “não convém que um profeta morra fora de Jerusalém” (13,33). Daqui em diante Jerusalém permanecerá na mira dos movimentos de Jesus.
  • A tomada de decisão: Lucas nos apresenta a tomada de decisão de Jesus com uma frase que, à primeira vista, parece enigmática, mas, na realidade, é bela e de grande profundidade: “tomou resolutamente o caminho”.

Ante o fatídico destino, Jesus toma uma decisão radical: sai Galileia e se dirige a Jerusalém. A iniciativa é d’Ele: Jesus escolhe o caminho do Pai. Para nós já é muito se aceitamos o destino que se aproxima e não podemos evitar. Jesus, ao contrário, avança decidido para seu destino. É assim como a frase “tomou resolutamente o caminho de …” (=“endureceu o rosto”, em grego) descreve o impulso de uma forte decisão.

Algumas imagens de fundo, no Antigo Testamento, nos permitem compreender a transcendência do gesto de Jesus. Esta expressão, de “forte decisão”, a vemos na valentia do Rei de Aram, quando avança contra a cidade santa para a guerra: “resolveu subir para atacar Jerusalém” (2 Rs 12,18). O mesmo se diz, também, do “Servo Sofredor de Yahweh”, profetizado por Isaias, mas desta vez, na atitude teimosa e defensiva de quem não cede, apesar da adversidade: “Fiz de meu rosto uma pederneira, e tenho a certeza de que não serei confundido” (50,7).

Os dois aspectos contidos nas citações anteriores parecem estar presentes na frase tomada por Lucas e aplicada a Jesus: “endureceu o rosto”. Jesus com uma grande fortaleza enfrenta seu destino, se compromete e toma decisões firmes. O que Jesus vai a fazer é o prelúdio de sua morte, que será, para nós, o prelúdio da vida. Isto mesmo vai pedir a seus seguidores para fazer em seguida.

  • O caminho começa mal: em Samaria não o recebem (vv.52-56);

Para chegar a Jerusalém, descendo desde o norte da Galileia, o caminho mais direto passava por Samaria. Porém, a maior parte dos judeus evitava esta rota. Havia uma inimizade de séculos entre judeus e samaritanos (ver Jo 4,9). Por intolerância religiosa e motivos nacionalistas, os samaritanos procuravam aborrecer os viajantes, inclusive atacavam aos grupos de peregrinos que cruzavam seu território em caravanas.

  • A hospitalidade negada: Jesus se arrisca por esta rota. Não o faz só como uma pessoa que vai “de passagem”. A expressão “enviou mensageiros a sua frente” (9,52) indica que tem intenções missionárias (como se verá depois, nos Atos, aqui nascerão comunidades cristãs: 1,8; 8,4-8). Esta opção de Jesus, a mais perigosa, deixa entrever sua misericórdia: Jesus está oferecendo uma mão amiga a um povo inimigo. Porém, lhe é negada a hospitalidade. Não acolhem a missão nem a amizade de Jesus (9,53).
    • A ira dos mensageiros: Assim como no primeiro dia de sua missão na Galiléia (ver Lc 4,16-30), também, aqui, fecham-lhe as portas, a rejeição anunciada iniciou. Os discípulos Tiago e João, chamados “filhos do trovão”, pela impetuosidade de seu temperamento (Mc 3,17), reagem violentamente, não compreendem o desdém dos samaritanos e reagem irados: “Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma?” (9,54). Pedem para arrasar, com fogo, essa cidade (gesto de maldição). Será este o modo de lidar com um fracasso? A atitude nos recorda o que fez o profeta Elias quando o malvado rei Ocozias mandou chamá-lo (2 Rs 1,10ss). Claro que essa foi uma estratégia de defesa.
    • A lição de Jesus: Porém Jesus não permite, aos discípulos, que levem a cabo seus propósitos e pela segunda vez os repreende por sua intolerância e por sua violência (9,55; ver 9,49-50). É verdade que Jesus pede para ser acolhido, mas, também é verdade que deixa os homens em liberdade para acolhê-lo e não quer forçar ninguém. A má decisão dos samaritanos não pode ser castigada com medidas drásticas.

Aqui vemos uma consequência da decisão pelo caminho da Cruz: a rejeição que experimenta ao longo do caminho não o deixa amargurado; ao contrário, segue adiante firme (9,56; assim havia feito em 4,30 e assim farão, após, os missionários itinerantes, nas rejeições que lhes estão reservadas nas diversas cidades, cf. Atos). Assim, desde o primeiro passo na subida a Jerusalém, começa a paixão. Jesus sabe afrontar a violência que lhe vem ao encontro e não devolve na mesma moeda; o não submetê-los, imediatamente, à justiça de Deus já é um sinal de misericórdia e, o bom resultado desta decisão, se verá mais adiante (na evangelização de Samaria nos Atos dos Apóstolos).

Desde o princípio o discípulo aprende que “tomar a Cruz todos os dias” é saber passar os momentos amargos do desprezo com a maturidade de quem é capaz de afrontar com altivez as recusas, com amor ao adversário (ver 6,27). O que é livre de coração sabe respeitar também as decisões livres dos outros.

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:

  1. Quais as exigências que Jesus nos propõe para podermos segui-lo incondicionalmente?
  2. Como reagiu Jesus diante do desprezo dos samaritanos?
  3. Em algumas ocasiões também eu, como Jesus, me sinto desprezado em minhas opiniões e atitudes? Qual minha reação espontânea? Fecho-me no silêncio ameaçador e vingativo? Reajo com violência? Atuo com a misericórdia de Jesus que ‘ofereceu sua mão amiga a um povo inimigo?

QUARTA-FEIRA                                                                                  

Lucas 9,57-62

PARA UM SEGUIMENTO RADICAL

Ninguém que põe a mão no arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus


A reprovação dada aos discípulos agressivos, dá passagens a novas lições sobre o discipulado. Sobre o caminho, na qual vai decididamente ao encontro de seu destino em Jerusalém, Jesus estabelece critérios para aqueles que o acompanham, aprofundando no que significa renunciar a si mesmo, tomar a cruz cada dia e segui-lo (ver 9,23).

Temos três candidatos ao discipulado e à vida missionária. O primeiro (v.57) e o terceiro candidato (v.61) se apresentam espontaneamente a Jesus. O segundo é chamado diretamente: “Segue-me”  (v.59). Não sabemos exatamente que motivos tiveram para aproximar-se neste momento a Jesus, porém é evidente que estão fascinados com o Mestre e desejam ficar com Ele.

No ensinamento que segue, se faz ver que, os impedimentos para levar a cabo o exercício do discipulado e da evangelização não provêm somente de fora. As três situações difíceis, que aqui se expõem, mostram outro tipo de obstáculo que provém da mentalidade dos próprios discípulos.

Do ponto de vista positivo, as dificuldades apresentadas servem para delinear, a partir da grande prioridade já estabelecida, o dom da vida na Cruz, as condições para seguir a Jesus. Estas são: (a) Abandonar tudo; (b) Priorizar a evangelização; e (c) Olhar sempre adiante. Em outras palavras: o esquecer do passado, a paixão do presente e a esperança no porvir.

Desta maneira, com a narração destes pequenos episódios, Lucas estimula a quem está a ponto de optar por Jesus (ver 9,23) para que discirnam os motivos do seguimento e suas implicações. Pois o discipulado é uma graça que provém da vocação e não se pode seguir Jesus de qualquer modo.

  1. Seguir a Jesus implica estar disposto a compartilhar sua pobreza (vv.57-58)

O primeiro candidato expressa a Jesus sua incondicional disponibilidade (v.57). Na cena anterior já se havia visto que Jesus não tem hospedagem segura. Agora propõe essa cena como estilo de vida. Que é que um discípulo entusiasta vai encontrar em Jesus? Ele diz: “As raposas têm tocas e as aves do céu ninhos; mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça” (v.58).

Desde o estábulo de Belém (2,7), não tem morada. Sua vida é errante, precária, sem lar nem lugar. Andar com Jesus supõe estar disposto a sair da comodidade de uma vida instalada para enfrentar imprevistos e pobreza.

Desta maneira é livre para seguir seu caminho e para alcançar seu destino. Seu olhar está na meta e é livre de tudo o mais. Todo o resto é secundário; todo o resto o aceita assim como se apresenta. Como se acaba de ver, em Samaria, Jesus depende da acolhida que se lhe ofereça.

A menção do “Filho do homem” nos remete, também, ao despojo absoluto da Cruz. A crueza da Cruz é o caminho que Jesus propõe a seus discípulos, fortemente desejosos de ir com Ele pelos caminhos do seguimento e da evangelização. A mesma renúncia, a mesma liberdade e o mesmo compromisso pede Jesus, a todos aqueles que queiram segui-lo.

  • Seguir Jesus é sair do âmbito da morte para entrar no da vida segundo o Reino(vv.59-60)

O candidato seguinte, chamado por iniciativa de Jesus (não se trata de um desejo, mas de um convite, quase de uma ordem de Jesus: “Segue-me”, v.59), põe uma condição a Jesus: “Deixa-me ir primeiro enterrar meu pai” (v.59). Antepõe-se um “primeiro” ao seguimento. A meta de Jesus não é neste momento a prioridade. Na frase do candidato não é claro se, se trata de esperar até a morte de seu pai, ou se este já morreu e quer ir assistir ao funeral.

A resposta de Jesus impõe prioridade (v.60). A evangelização deve ser assim. Jesus não aceita retardar a missão e requer, para isso,obediência comparável à de Abraão, a quem disse: “Sai de tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei” (Gn 12,1).

O vocacionado havia feito uma solicitação em nome da piedade filial (quarto mandamento da Lei de Deus).  Sepultar o pai era um dever muito estrito que nenhum filho, sobretudo o maior da casa, podia deixar de fazer. Porém, os compromissos próprios da vocação constituem um dever infinitamente superior.

O amor pelo Senhor está acima do amor pela família (ver 14,26). Este critério proposto por Jesus é uma característica da novidade do Reino. De fato, quando Eliseu foi chamado, Elias lhe deu permissão para despedir-se de seus pais antes de partir (1Rs 19,19-21). Nos novos tempos isto já não se permite. Algo já intuía o Sirácida, que recomendou, no chorar a um morto, senão um dia, no máximo dois, porque a tristeza “fará dano a ti mesmo” (Eclo 38,21).

Por que não há demora? O Reino que anuncia Jesus é de vivos (9,60). Olhando a outra face da moeda, isto quer dizer que os que não escutam a Jesus e não o seguem estão espiritualmente “mortos”. Em consequência, Jesus está convidando a reconhecer, no discipulado, a plenitude da vida, à qual estão convidados todos os que não deram este passo. Quando se entra no Reino, no âmbito da vida (24,5), já não se deve dar marcha-ré.

Portanto, Jesus não está recomendando uma divisão familiar, mas, justamente, o contrário. O fundamental é: o anúncio do Reino tem importância absolutamente superior aos deveres humanos mais preciosos e, se esse é o dever maior, tudo haverá que reconduzi-lo para ele. O seguimento do Reino e sua proclamação exigem que estejamos dedicados completamente a ele.

  • Seguir Jesus indica adeus verdadeiro ao passado e lançar-se sempre adiante (vv.61-62)

Chega o terceiro candidato pondo também uma condição (9,61). O “mas” se faz sentir. Naquela época, muitas vezes todos os membros da família viviam na mesma casa (avós, pais, tios, etc.). Ainda hoje isso ocorre no Oriente. O ambiente narrado aqui põe à luz um perigo: a despedida, por simples que seja, leva seu tempo e inclusive podia esfriar, ou pior ainda, levar a mudar a decisão.

Em sua resposta, parece que Jesus lança mão de uma imagem proveniente da sabedoria popular camponesa e muito conhecida no âmbito intelectual pelo sábio conhecido como Plínio “o Velho” (23 aC): quando se ara o campo, não se pode fazer um rego reto e profundo se o que ara olha para trás. Recordemos que na maior parte das famílias ricas esta antiquíssima ferramenta de agricultura era realizada por bois. Um trabalhador devia pôr constantemente seu olhar sobre o rego que se ia fazendo, só assim o campo estaria preparado para receber a semente e fazer uma boa colheita.

Jesus aplica a imagem à consequência que traz a absoluta novidade do Reino (9,62). Com isso, Jesus não pretende legitimar uma falta de amor à família. Mas sublinha que o seguimento exige um corte claro; que as relações vividas até agora não podem continuar do mesmo modo. Todo passo adiante na vida supõe assumir dolorosas renúncias que a opção implica. Jesus dá um exemplo disto quando rompe com sua amada Galileia (ver 9,51).

Isto vale para o anúncio do Evangelho. Jesus se entregou completamente, firme e decididamente, à missão, e pede o mesmo a seus discípulos: devem trabalhar o solo humano e consagrar neste trabalho todos os esforços. Aquele que se deixa distrair nesta função, não tem as qualidades para executá-lo. Isto se aplica, também, a todos os âmbitos da vida do discípulo. Jesus não aceita decisões tíbias: ir em seguimento exige ruptura, mudança de valores, esquecer experiências morais adquiridas.

Em conclusão: inspirados em Jesus, tomar bem as decisões

É comum ouvir dizer que este é um Evangelho “difícil”. Curiosamente, é o evangelista da ternura e da misericórdia que nos conta esta página, com um tom particularmente rigoroso, porém não rígido. Todo o ensino aponta para a exigência evangélica: quem quer seguir Jesus, deve decidir-se totalmente por ele e comprometer-se. A hora das decisões é a hora da verdade. O discipulado não admite frieza espiritual, é tempo de rupturas enérgicas com o passado para abrir-se a um futuro cheio de promessas.

A passagem de hoje nos ensina a dar todos os passos corretos na tomada de decisão fundamental por Jesus. Na história de cada um, tamanha decisão, representa um momento chave que não se define necessariamente em termos de acontecimentos presentes ou futuros, mas em termos de graça, que devemos saber aproveitar quando passa por nós, assumindo as dores das rupturas. A propósito dos últimos três personagens, o Evangelho nos deixa sem saber se depois das palavras de Jesus realmente o seguiram ou não.  O que sabemos, com certeza, são as circunstâncias e as condições que são necessárias para segui-lo. De cada um de nós se espera agora a resposta.

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:

  1. Quais as exigências que Jesus nos expõe para poder segui-lo incondicionalmente?
  2. Neste momento de minha vida que sinto com mais força que devo deixar para segui-lo?
  3. Por que custa tanto esse desprendimento? Que passos concretos dar?Possuo a valentia para optar

QUINTA-FEIRA

João 1,47-51. (Festa dos Arcanjos)
CHAMADOS A CONTEMPLAR A GLÓRIA DE JESUS 

“Veréis… os anjos de Deus subir e baixar sobre o filho do homem”

Celebramos a festa dos Arcanjos Miguel, Gabriel e Rafael.

Na Sagrada Escritura eles aparecem, dentro da linguagem e mentalidade bíblicas, como intermediários entre o mundo de Deus e o dos homens:

  1. Miguel: cujo nome significa “Quem como Deus?”, o encontramos no livro de Apocalipse na grande batalha contra o dragão: “Então se travou uma batalha no céu: Miguel e seus Anjos combateram com o dragão…” (Ap 12,7-8) (Dn 10,13.21;12,1).
  2. Gabriel: o recordamos especialmente pelos relatos da anunciação em Lucas, e Zacarias, “Eu sou Gabriel, o que está diante de Deus…” (1,19), e a Maria, “Ao sexto mês foi enviado por Deus o anjo Gabriel a uma cidade da Galileia…”(Lc 1,26) (Dn 8,16;9,21).
  3. Rafael: o nome liga-se à cura, apresenta-se a si mesmo no livro de Tobias: “Sou Rafael, um dos sete anjos que estão sempre presentes e tem entrada à Glória do Senhor” (12,15).

O Evangelho, nesta festa, nos convida, não tanto a deter-nos nos anjos em si, mas a contemplar Àquele que realiza em si a plenitude da revelação, da qual os anjos eram mediação.

  1. A promessa ao verdadeiro israelita

Quando Jesus chamou Natanael deixou entender que conhecia seu coração: “Antes que Felipe te chamasse, quando estavas debaixo da figueira, eu te vi” (1,48). Que conhecia Jesus dele? O mesmo disse: “Ai tens um israelita de verdade, em quem não há engano” (1,47).

Este admirável conhecimento desfaz as dúvidas que inicialmente traça sobre Jesus e o leva a compreender diante de quem está: “Rabi, tu é o Filho de Deus, tu és o Rei de Israel” (1,49).

“O verdadeiro israelita”, assim como fez Abraão (Gn 12,1-7; 18,1-5) reconhece a presença de Deus onde quer que se manifeste e reage positivamente frente a ela. Natanael, por sua formação hebréia, sabe que as ações de Deus são poderosas, surpreendentes e incríveis. Porém quando descobre a Jesus, é capaz de ver mais: este não pode ser senão o Filho de Deus o Messias que estamos esperando.

Ao final Jesus lhe promete uma nova e grandiosa visão (1,50) da identidade e da missão de Jesus: “Vereis o céu aberto e os anjos de Deus subir e descer sobre o Filho do homem

  1. Uma maravilhosa revelação

Em sua viagem para a Galileia junto com seus discípulos, Jesus, provavelmente, passou pelas proximidades de Betel, onde tempo atrás o patriarca Jacó teve o sonho da escala que unia o céu com a terra e sobre a qual subiam e desciam os anjos de Deus (Gn 28,10-17).

A promessa de Jesus a Natanael alude a este fato. Com duas afirmações solenes (“Vereis o céus…”; “Vereis os anjos…”), Jesus alude às relações contínuas e recíprocas entre Ele e o Céu, entre o Filho do homem e o Pai. Em Jesus e sua revelação do Pai ao longo do Evangelho se oferece o espetáculo deste céu aberto. Há que descobrir esta relação e logo entrar a formar parte da cena, tenta dizer Jesus.

  • Convidados a participar na cena: o caminho do “crer”

Esta visão da glória já havia sido proclamada no prólogo (Jo 1,14) quando também um plural comunitário (“vereis”, 1,51 / “temos visto”, 1,14) se anuncia que no Verbo encarnado a imensa majestade de Deus e toda a realidade divina se fizeram presentes no mundo; não de modo passageiro – como nas antigas teofanias – mas de maneira definitiva, porque Ele veio “morar” na terra. Por isso se afirma de Jesus: “Temos contemplado sua glória, glória que recebe do Pai como Filho único, cheio de graça e de verdade” (1,14b).

Para “ver” e “contemplar” se requer fé: “Se por ter dito que te vi debaixo da figueira, Crês?” (1,50ª). Visto que a resposta implícita é “se”, agrega-se: “Há de ver coisas maiores” (1,50b). Quer dizer, verá o Pai (14,9: O que me vê, viu ao Pai).

Este é o caminho pelo qual entramos no conhecimento d’Aquele de quem os relatos bíblicos sobre os anjos já tentavam dar a conhecer em sua grandeza.

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração

  1. Que se entende por “anjos” e por que os celebramos?
  2. Onde aparecem na Bíblia os arcanjos Miguel, Gabriel e Rafael? Qual a sua missão?
  3. Quais são as coisas maiores que Jesus convida Natanael a ver? Que se requer para vê-las

SEXTA-FEIRA

Lucas 10,13-16

O PERFIL DO MISSIONÁRIO

“Quem a vós escuta a mim escuta”

Leiamos atentamente o texto do Evangelho. Procuremos descobrir sua riqueza, de maneira que sua leitura se converta em uma espécie de curso orante de formação missionária. Aqui daremos algumas pautas para que as aprofundemos a nível pessoal e comunitário.

A Convocação e o envio à missão (Lc 10,1)

“Depois disto”.

Refere-se a duas cenas anteriores do Evangelho:

  • Ao começar a subida a Jerusalém, Jesus já havia mandado dois discípulos “adiante dele” (9,52). Esta primeira missão foi um fracasso (9,53-54);
  • Imediatamente após, Jesus se encontrou no caminho com três candidatos ao discipulado e a eles lhes deu três indicações relacionadas com a missão:
  • Viverão sempre como itinerantes e desprendidos de tudo (“Aonde quer que vás… sem reclinar a cabeça”, 9,57-58);
  • Serão proclamadores da Palavra (“Tu, vai-te a anunciar o Reino de Deus”, 9,60);
  • Trabalharão intensamente como obreiros (põe “a mão no arado”, 9,62).

“Designou a outros setenta e dois”.

A missão dos 72 discípulos, que se situa depois de uma primeira missão realizada pelos doze (ver Lc 9,1. 10), é o prelúdio da evangelização de todas as nações do mundo; de fato, o número 72 (ou 70) evoca o número das nações pagãs segundo Gn 10.

Por outra parte, diferente da primeira missão já mencionada, Jesus ensina agora que a tarefa da evangelização responsabiliza a todos os membros da Igreja e não só a uns poucos.

Que esta missão seja antecipação da missão universal e que anunciem o compromisso de todos, podemos ver com maior clareza na segunda parte de Atos (13-18), quando for uma realidade plenamente assumida.

“O envio de dois em dois adiante de si”.

Os discípulos vão adiante para preparar o caminho a Jesus (como em 9,52) em todos os lugares aonde tem de ir, tal como o havia feito João Batista um pouco antes (ver 7,27).

O envio por dupla é sinal de testemunho, da mesma maneira que no âmbito judicial a palavra de um não vale se não é com a confirmação de um testemunho.

O missionário prega a verdade, não só de boca, mas também com a ratificação em sua própria vida: outro o poderia ratificar ou negar. Este tipo de envio será característico no Evangelho e em Atos (ver Lc 19,29;22,8–Pedro e João/ 24,13-35–Discípulos de Emaús/At 3–Pedro e João/13,2–Paulo e Barnabé.

Em Lc 10,2-12 Jesus dá as instruções básicas sobre o procedimento de seus missionários. Alguém poderia ir lendo esta parte detendo-se nos imperativos mais importantes que de uma forma rítmica vão delineando o perfil de um missionário a quem foi dito: IDE! (10,13a). Estes imperativos são: (1) Rogai! (2) Olhai! (3) Não leveis! (4) Dizei primeiro! (5) Permanecei! (6) Curai! (7) Proclamai! (8) Saí! (9) Decidi! (10) Sabei!

A evangelização começa no coração orante do discípulo-missionário (primeiro imperativo) e termina com esta convicção: quer os destinatários acolham ou não a Palavra, de todas as formas a oferta de salvação é um fato.

Tem que proclamar fortemente que o “Reino de Deus está próximo” (imperativo). Uma série de contraposições caracteriza a instrução: (1) Muitos/poucos; (2) Cordeiros/lobos; (3) A paz que repousa/que volta; (4) Permanecer/ir de casa em casa; (5) Acolher/ Rejeitar; (6) Entrar/Sair da cidade. Vale a pena observá-las no texto e deduzir pessoalmente dali toda a dinâmica interna que caracteriza a missão.

O tema da acolhida (vv.8-9) e da rejeição (vv.10-11) está posto de relevo. De fato, ao longo da narração, o que temos lido e o que virá, o Evangelho põe sempre essa contraposição, ao fim e ao cabo, como se havia profetizado, “Este está posto para queda e elevação de muitos em Israel, e para ser sinal de contradição” (Lc 2,34). A rejeição do Evangelho tem consequências graves (vv.11-12).

Com relação ao âmbito da missão pode-se notar que nesta instrução Jesus dá uma preferência à missão nas casas (pode entender-se também casas de campo) e na cidade. Não tem missão de “massas”, mas se buscam as pessoas dentro de seu tecido social próprio; o mundo familiar e o tecido urbano.

Jesus cita três cidades do norte de Galileia que fecham as portas ao Evangelho: Corazain, Betsaída e Cafarnaum, enquanto que as cidades pagãs de Tiro e Sidônia parecem melhor dispostas.

Frente a esta rejeição, modelo de todas as missões que se fecham, se põe em evidência:

  • Que o objetivo da missão é a conversÃO (10,13). O que em última instância pregam os missionários é o dom do perdão dos pecados (dom pascal) para o qual é necessária a abertura à conversão. Assim recolhe o kerigma pascal, segundo o qual, os missionários são enviados para pregar “em seu nome a conversão para perdão dos pecados a todas as nações” (24,47; ver At 2,38s; 3,17-20;5,31; 10,42s;13,38.41). O missionário segue a linha de Jesus que vem “chamar à conversão… os pecadores” (6,32)
  • Que, com relação aos meios missionários, à conversão, não se chama somente por meio de Palavras, mas também ATOS concretos: “Se se houvesse feito os milagres…” (10,13);
  • Que, com relação à atitude esperada nos destinatários, é fundamental o ESCUTAR (10,16). Esta não é uma atitude passiva, mas a aceitação (o contrário da rejeição) da mensagem e sua assimilação na própria vida (ver 6,46-49);
  • Que não é indiferente a aceitação ou a rejeição da mensagem. Quem “escuta” a pregação escuta o próprio Cristo e começa a viver como discípulo seu. Quem rejeita terá que assumir a responsabilidade de sua atitude ante Deus (ver 10,14-15);
  • Que, com relação às pessoas, se fala de uma IDENTIDADE TOTAL de estilo, de palavras, de ação entre Jesus e seus missionários.

Portanto, a maneira como sejam tratados os discípulos-missionários se dirige, finalmente, à pessoa de Jesus: “quem a vós os escuta, a mim escuta” (10,16). Para o missionário esta é uma grande responsabilidade, exigência que o convida a estar atento todo o tempo a sua própria vida!

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração

  1. Que deve ter presente um autêntico missionário de Jesus Cristo? E eu, que aspecto da instrução de Jesus aos missionários devo trabalhar mais?
  2. A tarefa evangelizadora que exerço ou devo exercer, tem como fundamento o testemunho?
  3. Os que me conhecem podem dar testemunho sobre se aquilo que prego está arraigado primeiro em minha vida? Minha vida é anúncio de Jesus Cristo

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SÁBADO

Lucas 10,17-24.
O MISSIONÁRIO NO GOZO DO ESPÍRITO SANTO.

“Alegrai-vos por que vossos nomes estão escritos no céu”

Os 72 missionários voltam da missão. Para Lucas, que está interessado em expor o processo de formação dos discípulos para a missão, não é suficiente apresentar-nos todos os detalhes relativos ao envio, como vimos nos dois dias anteriores.

Para ele também é importante que aprendamos novas lições com o regresso. Assim como o missionário tem que saber sair, também tem que saber voltar.

À diferença do evangelho de Marcos, os discípulos não vêm a descansar, mas que tomam um tempo para contar ao Mestre o que viveram (10,17). E isto se torna costume entre as comunidades primitivas. 

É o que vemos fazer Paulo e Barnabé ao final de sua primeira missão: À sua chegada reuniram a Igreja e se puseram a contar tudo quanto Deus havia feito juntamente com eles (Atos 14,27).

O relato dos discípulos é o ponto de partida para novas lições de Jesus para os missionários. 

A oração

A missão que, começou na oração (10,2), deve terminar também na oração (10,21). A noticia que os discípulos dão a Jesus já tem a forma de uma oração: “Senhor!” (10,17).

Por sua parte, Jesus dirige seu olhar um pouco mais para o alto: entoa um hino de louvor a Deus Pai, no gozo do Espírito, pela obra realizada por seus discípulos (10,21-22). Em sua oração retoma o essencial do acontecido: a revelação de Deus aos pequenos.

Os destinatários do perdão recebido conheceram o centro da missão de Jesus, e na sua pessoa tiveram acesso a fundo ao mistério de Deus: o rosto de um Pai que vela por seus pequeninos e os ama através das ações de seu amado Filho. O Senhor do céu e da terra inclinou-se benevolamente ante sua amada humanidade!

A alegria

Os discípulos foram testemunhas do poder de Jesus e por isso irrompe a alegria festiva. Os discípulos estão sendo convidados a louvar também ao Pai junto com Jesus. Os 72 “regressaram alegres” (v.17) pelo êxito de seu trabalho: a vitória sobre o mal, vitória conquistada pela invocação do nome de Jesus.

Agora não só conhecem mais a Jesus, mas conhecem também a grandeza do ser discípulo: Jesus lhes deu “poder de pisar sobre serpentes e escorpiões, e sobre todo poder inimigo” (10,19).

Que pode causar mais alegria que uma vitória? Porém Jesus em seguida lhes faz cair em conta que a verdadeira vitória é a do céu: alegrai-vos de que vossos nomes estejam escritos nos céus (10,20), isto é, não só a obra que hão realizado pela salvação de outros, mas a mesma salvação deles.

Jesus então lhes ensina a pôr a alegria na sua (v.21). É a alegria no Espírito, sinal de plenitude, do céu na terra, como a viveram Maria e os primeiros testemunhos do Senhor (ver Lc 1,14.228.40.58; 2,10), como provaram todos os que foram tocados pela misericórdia de Jesus (ver Lc 5,25-26;6,20-23;15,4-32;19,37-44;24,50-53; igualmente At 2,26-27.42-47; 13,48.52; 15,3.31). É a alegria que se envolve oração continua ante a contemplação da obra de Deus todos os dias na historia da humanidade.

A formação continua

Ao final fica claro que os missionários, que já começaram a ensinar, devem voltar à escola (10,23-24). O missionário não deve esquecer que antes de tudo é um discípulo, que o que ensina deve ir em coerência com o que vive, que o que ele proclama é a expressão do que sua vida testemunha, que o que ele dá é a expressão do que leva dentro.

Por isso as últimas palavras de Jesus soam a um novo convite à escola. Os discípulos estão sendo testemunhas privilegiadas de uma revelação que muitos outros de maior categoria quiseram “ver” e “ouvir”. Jesus lhes chama por isto “felizes” e ao mesmo tempo lhes recorda que devem seguir sendo receptores ativos da Palavra.

Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:

  1. Tenho estado alguma vez em uma missão? Que tenho feito ao regressar?
  2. A missão é o conteúdo de minha oração? Vivo no gozo do Espírito Santo como Jesus?
  3. Onde está a verdadeira felicidade para um discípulo do Senhor? Que deve fazer para chegar a esta?

Autor: Padre Fidel Oñoro, CJM

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