LECTIO DIVINA SEMANAL NA 17ª SEMANA COMUM

LECTIO DIVINA SEMANAL – COMUNIDADE PAZ E BEM

 26/07/2020 a 01/08/2020

 

DOMINGO, 26 DE JULHO DE 2020- 17ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

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Mateus 13,44-52 (Parábola do tesouro, da pérola e da rede; conclusão do discurso) –

O Reino de Israel se baseava em estruturas terre­nas (um humano cumprimento da lei), e remetia ao senhorio do Deus Uno, três vezes santo e invisível. O Reino de Deus, ao invés, radica-se no mistério totalmente espiritual (animado pelo Espírito Santo em seu meio e nas almas dos crentes), e remete ao senhorio de Jesus, o qual nos leva a seu Pai e nosso Pai. Revela-se com a chegada de Jesus, o Verbo encarnado, que diz, referindo-se a si mesmo: “o Reino já está no meio de vós” (Lc 17,21). As parábolas de Ma­teus sobre o Reino se entendem desde esta chave de lei­tura, onde símbolo e analogia fazem referência a uma verdade sempre mais profunda que a ime­diata. É como um inesperado “tesouro escondido”, pois não é uma realidade visível nem perceptível a todos. O termo “tesouro escondido” dá a idéia de um valor inestimável, de um encontro que não se esperava. A segunda parábola apresenta o Reino dos Céus como «um mercador que busca ricas pérolas» (v.45). É interessante advertir que aqui a comparação análoga não é com a pérola, mas com o mercador: a pérola verdadeira é este homem. A terceira parábola passa da imagem de um sujeito singular à de uma pluralidade de indivíduos: o Reino dos Céus é como “uma rede que lançam ao mar” (cf vv.47ss). A visão tem uma forte marca escatológica, e nem por isto deixa de ser atual. A rede simboliza uma realidade imaterial, mediante a qual passa no crivo, desde o mar da história, a carga da humanidade. O Reino se revela nesta realidade, perceptível e recôndita, valorizada e buscada, que se realiza no homem, capaz de apropriar-se dela, uma vez encontrada, e que impregna de salvação a toda humanidade.

 

 

1 Re 3,5.7-12 (O sonho de Gabaon) – Um jovem e um povo numeroso, impossível de contar. Uma vez mais, a Sagrada Escritura nos apresenta a atuação paradoxal de Deus, tanto em sua intervenção soberana na história do homem como em seu imprevisível juízo. Deus confia o seu povo a um jovem monarca que reinará como sucessor do grande rei Davi, o depositário de magistrais promessas divinas e grandes esperanças messiânicas. Há uma realidade supe­rior que destaca como garantia: entre o jovem e o povo, ambos eleitos, o único Senhor é Deus. Salomão é consciente disso, sabe que foi elevado, e que este cargo não é de sua propriedade: «Teu servo está em meio do povo que elegestes» (v.8). O povo é como um «primogênito» entre os demais povos; e o jovem rei, um monarca estremecido ante a admirável grandeza do encargo. A confiança e a responsabilidade do que é investido de poder lhe fazem tomar consciência de sua própria incapacidade para o cargo. É neste passo de humildade que inicia como rei. E real é sua suplica frente à ajuda que o próprio Deus lhe oferece, acudindo abertamente a sua oculta apreensão: «Pede-me o que quiseres que Eu dar-te-ei» (v.5). A sua súplica não versa sobre bem estar, poder ou glórias te­rrenas: longa vida, riquezas e morte dos inimigos. Tudo se concentra naquilo que o homem, por si, não pode conseguir, se Deus não o concede: um coração sábio e inteligente, capaz de discernir com equidade e veracidade. Reinar, como aqui se pode perceber, é servir segundo estas altas prerrogativas: «A humildade precede a glória» (Pr 15,33).

 

Rm 8,28-30 (O plano da salvação) – No ser humano há uma existência escondida: o desígnio divino de sua deificação em Cristo. Cinco verbos realçam o admirável projeto do Altíssimo: conhecer, pre­destinar, chamar, justificar e glorificar. O primeiro, expre­ssa uma relação de tipo existencial: que vínculo liga o Criador à sua criatura? Trata-se de um «conhecimento» fundado em uma predileção de amor. O segundo dá a Deus a primazia na iniciati­va desta eleição e aponta para o objetivo final, a santidade, correlativo com a origem, por sua aprovação. Este «destino» revelado a priori não reduz a liberdade humana, já que conserva totalmente a faculdade de aderir-se ou não ao projeto divino. O terceiro verbo implica a vocação que se manifesta no coração do homem. Deus se dirige diretamente ao interior do ser humano. A liberdade da pessoa, des­de dentro, agita o processo de deificação em colabora­ção com a graça divina. O quarto verbo formula com um termo jurídico o conceito de receber quanto é devido, porém com vantagens, mais além do direito. Um Deus que é amor exerce um domínio único sobre a criação: a vida. Referido ao homem, isto se traduz em benevolência profunda: misericórdia. Entra-se, assim, no sentido pleno do quinto verbo: glo­rificar. Mais que um dever do homem, reconhecer e pro­clamar a glória de Deus faz parte de seu chamado. O louvor de sua glória é que o homem viva para sem­pre como imagem da santidade que adquiriu desde o princípio.

 

Salmo 118/119 (Elogio da lei divina) – Esta é uma oração sem fim. Provavelmente é obra não só de uma pessoa, mas de várias, que elogiam por meio de muitos artifícios literários a Palavra de Deus, a lei do Senhor, como fundamento de todo o agir humano. É um Salmo belíssimo que deve ser “saboreado” lentamente, um versículo por dia. Assim, teremos por mais de meio ano assegurado nossa meditação. Deus se comunica conosco não para nos oprimir ou dominar, mas para ensinar-nos os caminhos mais fáceis da felicidade. Felizes os que vivem a Palavra e a ensina aos outros. Medite dia a dia este Salmo e sua vida, sem dúvida, será diferente, sendo fortalecida não por palavras humanas, mas pela Palavra de Deus.

Senhor, não quero fugir de tua Palavra nem desprezá-la. Quero amá-la como Lâmpada para os meus pés e luz no meu caminho. “Lâmpada para meus passos é tua palavra e luz no meu caminho. Jurei, e o confirmo guardar tuas justas normas. Meu sofrimento passa dos limites, Senhor, dá-me vida segundo tua palavra. Senhor, aceita as ofertas dos meus lábios, ensina-me tuas normas. Minha vida está sempre em perigo, mas não esqueço a tua lei. Os ímpios me armaram laços, mas não me desviei de teus preceitos. Minha herança para sempre são teus testemunhos, são esses a alegria do meu coração. Inclinei meu coração a cumprir teus estatutos, desde agora e para sempre” (Sl 119, 105-112). Amém.

 

 

MEDITATIO: Estamos diante da máxima lição de antropologia teológica: filho de Deus convertido em imagem, homem divinizado ao empreender sua história, louvor de quem é sua origem e transcende sua natureza. Por isso tem uma única «predestinação»: o Reino dos Céus, quer dizer, participar plenamente da visão e natureza do próprio Deus. Inculcada desde o prin­cípio, toda esta realidade está crucificada com o pecado e ressuscitada na redenção por Cristo, com Cristo e em Cristo. «Predestinação» não significa obrigação de percorrer uma via pré-estabelecida, uma meta já fixa­da, mas, simplesmente, estar ordenado ou orientado a ela, com a regalia de todas as potencialidades e graças necessárias para consegui-la. Quem rejeita o projeto misericordioso do desígnio divino, e qualquer um pode fazê-lo, frustra a si mesmo, saindo, fora da meta como um trem que se descarrilha. O segredo do êxito é a humildade, e igual é a oculta dimensão divina semeada no homem. Com insistência, a Escritura recorda a lição do temor de Deus como escola de sabedoria (cf. Pr 15,33), pelo qual, unicamente, ao homem «foi dado conhecer os mistérios do Reino dos Céus» (cf. Mt 13,11).

 

ORATIO: Ó Deus de infinita bondade, envolve e traspassa a minha alma com o fulgor de tua santidade. Como o sol com seus raios ilumina, purifica e fecunda a terra, assim também, Tu iluminas, purificas e san­tificas o meu ser. Ensina-me a contemplar-me em Ti, a conhecer-me em Ti, a considerar minhas misérias à luz de tua perfeição infinita, a abrir minha alma à irrupção de tua luz purificadora e santificadora (G.R, uma consagrada de nosso tempo).

 

CONTEMPLATIO: Cada um de nós pode resplandecer com res­plendores que deslumbrem ao próprio sol, levantar-se sobre as nuvens, contemplar o corpo de Deus, ascender para Ele, unir-se a Ele em supremo vôo e vê-lo, por fim, no mais doce repouso. O coro dos bons servidores circundará seu Senhor quando apareça no céu. E, resplandecendo, Ele lhes comunicará seus próprios resplendores. Que espetáculo ver uma admirável multidão de tochas resplandecentes sobre as nuvens, homens que se entregam a uma festa sem comparação; um povo de deuses ao redor de Deus, formosos em sua presença, servidores em torno ao seu Senhor. Um Senhor que não inveja os servos, pela participação em seus esplendores, nem se vê diminuído em sua glória, pela associação de muitos ao trono de sua realeza, como acontece aos homens. Estes, ainda que entreguem aos súditos tudo quanto possuem, não pensam, nem em sonho, que participem do cetro! É que Ele não os considera servos, nem os honra com honras de servos; os estima como amigos e observa, com eles, as leis da amizade, que Ele mesmo estabeleceu desde o princípio: a comunidade absoluta. Em consequência, não lhes dá isto ou aquilo, mas os faz partícipes da realeza e lhes cinge sua própria coroa. Não é isto o que disse o bem-aventurado Paulo, quando escreve que “somos herdeiros de Deus e coer­deiros de Cristo” (Rm 8,17) e que “reinarão com Cristo os que participaram de suas penas” (1Tm 2,12)? Que há de tão agradável que possa rivalizar com esta visão? Coro de bem-aventurados que se alegram! Ele desceu resplandecente dos céus a terra. E a terra faz levantar outros sóis que sobem para o Sol de justiça, invadindo tudo com sua luz (N. Ca­basilas, La vida en Cristo, Madrid 1999).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

«Pode-se definir ao homem como o que busca a ver­dade» (João Paulo II)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUALA vida que Deus dá ao homem é original e diferente da vida das demais criaturas viventes, já que o homem, ainda que proveniente do pó da terra (cf. Gn 2,7; 3,19; Jó 34,15; Sl 1 03,14; 104,29), é manifestação de Deus no mundo, sinal de sua presença, resplendor de sua glória (cf. Gn 1,26-27; Sl 8,6). Ao homem lhe foi dado uma altíssima dignidade, que tem suas raízes no vínculo íntimo que o une ao seu Criador: no homem se reflete a realidade mesma de Deus. Na vida do homem, a imagem de Deus volta a resplandecer e se manifesta em toda sua plenitude, com a vinda do Filho de Deus em carne humana: “Ele é imagem de Deus invisível” (Cl 1,15), “resplendor de sua glória e expressão de sua substância” (Hb 1,3). Ele é a imagem perfeita do Pai… A plenitude da vida se dá a todos que aceitam seguir a Cristo. Neles, a imagem divina é restaurada, renovada e levada a perfeição. Este é o desígnio de Deus sobre os seres humanos: que «reproduzam a imagem de seu Filho» (Rm 8,29). Só assim, com o esplendor desta imagem, o homem pode ser libertado da escravidão da idolatria, pode reconstruir a fraternidade rompida e reencontra sua própria identidade (João Paulo II, carta encíclica Evangeliun vitae, nn.34.36).

 

SEGUNDA-FEIRA, 27 DE JULHO DE 2020- 17ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

Mateus 13,31-35 (Parábola do grão de mostarda; Parábola do fermento) = Mc 4,30-32; Lc 13,18-21 – Com as parábolas do grão de mostrada e do fermento, Jesus pretende acrescentar outros elementos à compreensão do mistério do Reino de Deus. Já falou da oposição que encontra a Palavra (cf. Mt 13,3-7) e colocado em guarda contra a impaciência dos que pretendem eliminar de imediato os obstáculos (cf.13,27-30). Agora põe de relevo o contraste entre uns inícios bem modestos e desenvolvimentos extraordinariamente grandes. Em efeito, assim como a semente pequena tem em si uma energia capaz de fazê-la germinar até convertê-la em uma árvore de notáveis proporções (vv. 31ss), assim também se dilatará o Reino de Deus, que, nestes momentos, parece destinado à derrota. E, assim, como a força irresistível de um pouco de fermento faz fermentar grande quantidade de farinha (v.33), assim também a Palavra de Deus recebida no coração do homem, o abre à Verdade e, “escondidos” entre a multidão, os cristãos de todos os tempos se convertem em portadores do alegre anúncio e em testemunhos do amor de Deus por todo o mundo. Com as palavras do salmista, Mateus dá uma resposta ulterior à pergunta do “porque” das parábolas: com elas não se pretende ocultar, mas ajudar a penetrar, de maneira profunda, no mistério de Deus e de seu Reino (vv.34ss).

 

 

Jr 13,1-11 (O cinto que de nada serve)– A Palavra do Senhor leva Jeremias a fazer uma ação simbólica. As ações do profeta, típica do profetismo, e inclusive sua própria vida, se convertem em mensagem dirigida aos presentes, a cada um em particular ou, em ocasiões, ao próprio profeta. A reação que tais ações suscitam são, geralmente, de escárnio, de desprezo e, em qualquer caso, de incompreensão. O profeta intervém então explicando a mensagem ou interpretando o acontecimento, que contém, segundo os casos, um aviso, uma ameaça, um desejo. Nesta passagem se pede a Jeremias que compre uma faixa de linho, que a coloque vários dias e a esconda depois na fenda de uma rocha do rio (vv. 1-5). A mensagem fica ilustrada por meio de uma dupla comparação: do mesmo modo que a faixa cinge o corpo de quem a põe, assim também Israel estava chamado a aderir ao Senhor, respondendo de maneira positiva à aliança com a qual o Senhor havia se ligado antes a ele. Visto que o povo quebrou a aliança não escutando a Palavra do Senhor, seguindo suas próprias ideias e até dedicando-se à idolatria, faltou à sua vocação, deixou de cumprir o serviço para o qual Deus o havia eleito, convertendo-se, como uma faixa podre, em algo que já não serve para nada (vv.10ss).

(Sl) Dt 32,18-21 (Cântico de Moisés) – O “cântico de Moisés”, composto e recitado às margens do Jordão, compõe um díptico com aquele cantado junto ao mar Vermelho, só pela posição, depois de sair e antes de entrar. Na forma e no conteúdo, é bem diverso. Poema de grande originalidade e fôlego, no qual confluem e se fundem elementos variados, ricos em imagens e em linguagem seleta. É fácil detectar nele formas sapienciais, e mais ainda uma pregação profética; tem muito de disputa judicial (testemunha de acusação). Incorpora concepções antigas, ideias típicas, ao mesmo tempo, que registra audaciosamente um monólogo de Deus. Não podemos descrever sua origem nem datá-lo com segurança. A título de conjuntura, suponhamos que seja uma concepção exílica, de um grande poeta, que talvez tenha empregado um texto mais antigo ou nele se tenha inspirado. Para orientar a leitura, podemos propor uma visão global simplificada: uma grande querela do Senhor com seu povo projeta castigá-lo e acabar com ele; mas, antes de ditar a sentença, pensa que o executor estrangeiro seja mais culpado, volta-se contra ele e salva seu povo. Em outras ocasiões se interpôs a intercessão de Moisés; aqui tudo se resolve no interior misterioso de Deus. Ao longo do comentário iremos recolhendo ecos, reminiscências e coincidências de textos variados.

 

 

MEDITATIO: Nosso tempo, marcado pelo domínio do “homem econômico”, está escondido pelo ritmo frenético e implacável de uma produtividade que deve ser eficaz a qualquer preço. Parece impossível subtrair-se a esta lógica. A Palavra do Senhor nos propõe uma lógica diferente de ver o homem e sua vida terrena: Deus está presente no coração da realidade, posto que é seu Criador. São Paulo dirá que nem quem planta, nem quem rega é determinante para o resultado final;só Ele é dá o desenvolvimento e o crescimento à semente e, mais tarde, à planta (cf.1 Cor 3,7). Deus, longe de chamar-nos a uma inatividade fatalista, nos proporciona o critério do compromisso, exortando-nos à confiança nele e à esperança. O homem é verdadeiramente tal se adere a Deus, se responde com todo seu ser ao amor de Deus. A dignidade, o valor do homem para Deus, se baseia no ser e não no ter ou no fazer. E para nós? Não nos arriscamos muitas vezes a deixar-nos deslumbrar pelas luzes do êxito mundano e aturdir pela publicidade sistemática, pela qual nos deixamos arrastar aqui ou acolá, distante de nós mesmos e de Deus, após aquele que faz mais ruído? A Palavra de Deus, sua incidência na história, parece destinada ao fracasso; o testemunho cristão se apresenta como um fenômeno duma minoria ilusa. É o momento de renovar nossa fé no poder do Espírito Santo e nosso compromisso na adesão a sua inspiração.

 

ORATIO: A febre do protagonismo está em todos,Senhor. Nem eu, em minha pobreza, sinto-me imune a ela. Agradeço-te que me faças entender que sou, certamente, necessário, mas, não indispensável. Às vezes, as próprias circunstâncias da vida obrigam a tomar consciência disso, mas eu me agito, rebelo-me, sinto-me, também, ofendido, porque não é reconhecido meu valor que, com frequência, considero superior ao dos outros… Dou-te graças por repetir-me que só em comunhão contigo, ó minha força, posso tudo (cf.Fl 4,13) e participo no milagre de produzir resultados grandiosos, diferentes dos que podemos ler nos balanços industriais de final de exercício, mas cujos frutos não nutrem o ser de modo profundo. Necessito que me recordem disso, para aprender essa verdadeira sabedoria que me faz viver como se tudo dependesse de mim e, ao mesmo tempo, como se tudo dependesse de ti.

 

CONTEMPLATIO: Por nós mesmos, somos rama seca, inúteis, infrutuosas e incapazes de pensar, geralmente coisa alguma por nós mesmos; toda nossa capacidade vem de Deus, que nos fez idôneos para o serviço e capazes de cumprir sua vontade. Nossas obras, como um pequeno grão de mostarda, não são, de modo algum, comparáveis, em grandeza, à árvore da glória que produzem; sem dúvida, estas têm, apesar de tudo, força e virtude para produzi-lo, pois procedem do Espírito, o qual, por meio de uma admirável infusão de sua graça em nossos corações, faz sua nossas obras, ainda que as deixe ao mesmo tempo a nós. Deixa-nos, como nossa parte, todo o mérito e todo proveito de nossos favores e de nossas boas obras, e nós, por nossa parte, lhe deixamos toda a honra e todo louvor, reconhecendo que o início, o progresso e o remate de todo bem que realizamos depende de sua misericórdia. Nós lhe damos a glória de nossos louvores, e ele nos dá a glória de sua alegria (Francisco de Sales).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

“Deus escolhe o que é pequeno” (cf. Mt 13,31)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Faz algum tempo me aconteceu um episódio que me afetou no profundo da alma. Estava em Roma; esperava o ônibus na parada que se encontra quase em frente da Igreja de São João de Latrão. Estava comigo minha mãe. Aproximou-se uma senhora muito idosa, vestida com um pequeno abrigo negro, já lustroso pelo uso inveterado ao qual havia sido submetido. Caminhava a pequenos passos, com a típica rigidez senil do tronco, da cabeça e das mãos. Perguntou-me se queria comprar uma dessas coisas que servem para pegar panelas e caçarolas sem queimar-se. Disse que não me interessava. Então a senhora se afastou sem insistir e sem dirigir-se a ninguém mais. Arrependi-me de imediato, pois compreendi que o importante não era que eu tivesse necessidade dessa proteção, mas que ela tivesse necessidade de vendê-las a fim de poder ganhar algo. Intercambiei o olhar com minha mãe, que a alcançou em seguida e lhe perguntou a quanto às vendia. “A mil liras a peça, senhora”, respondeu; “eu mesma as fiz a mão. Tenho noventa e dois anos…”. “Compro as cinco que leva”, disse minha mãe. A anciã olhou a minha mãe com um sorriso cansado e apenas marcado; sem dizer nada, se afastou com seu andar tranquilo, um andar que deixava imóveis os braços, os ombros e a cabeça. Esta cena a tenho repensado, meditado, contemplado dentro de mim muitas vezes, não saberia dizer quantas. A anciã já havia se afastado: que, ou quem, nos convenceu para comprar não uma, mas todas as proteções que vendia. Essa é a questão: há uma força no ser pequeno, pobre, sofrido e remissivo; uma força, sem dúvida, que não lhe é própria, uma força que lhe vem de fora. Alguém a pôs dentro, alguém que a possui. Não é questão de perder-se em muitas averiguações, Senhor, porque só há Um que possa possuir tal força, só Um pode ter pensado fazer tudo isto: Tu. Tu a puseste na humildade daquela anciã, ainda que a puseste também no coração de quem a viu e a sentiu. É a única força que tem existido sempre, que existe e existirá sempre, a única força que forma uma só coisa contigo, que faz de ti, Pai, Filho e Espírito Santo, um único Deus: a força de teu amor ou, melhor ainda, a força do amor que és (A. Marchesini, Piccolo come um seme di senape, Bolonia 1993).

 

TERÇA-FEIRA, 28 DE JULHO DE 2020- 17ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

Mateus 13,36-43 (Explicação da parábola do joio)– A parábola evangélica da boa semente e do joio encontra sua explicação na contraposição entre o divino semeador e o semeador malvado. O ponto central da mensagem de Jesus, portanto, não é só a necesséria convivência entre o trigo e o joio até o tempo da ceifa, mas a diferente sorte que correm os bons, os filhos do Reino de Deus, e os maus, os filhos do maligno. A pergunta de fundo à que pretende responder a parábola é a de sempre, tanto a expressada pelas primeiras comunidades cristãs, como a que constantemente voltam a expressar nossas comunidades: porque há maus cristãos na comunidade crente? Mateus responde dando duas razões; a primeira é que a semeadura foi feita ao mesmo tempo tanto por Deus como pelo maligno; a segunda é que o tempo da separação está reservado só para Dios. A vida do homem é o tempo no qual todo crente deve realizar sua opção. A convivência com os maus não deve ser causa de pessimismo para os bons; Deus a tolera e impede àqueles que são exigentes demais «eliminar» os maus com a desculpa de acabar com o mal; ao contrário, os bons devem partilhar a vida com os pecadores e vencer assim o mal com o bem. Só ao final da vida virá a ceifa (v.39), isto é, o juizo de Deus. Nesse momento aparecerá clara a sorte diferente reservada a «todos os que foram causa de tropeço» (v.41) e aos «justos» (v.43), quando o Cristo glorioso se levante como juiz supremo com seus anjos e purifique a sua Igreja do mal. Esta perspectiva final é de alento para os crentes, que devem fazer frente na vida de cada dia a dificuldades e provas de todo tipo.

 

 

Ex 33,7-11; 34,5b-9.28 (Elogio dos pais) – Os dois breves textos que compõem a lecitura de hoje se remontam aos tempos do reino de Judá: o primeiro pertence ao documento eloista e o segundo ao yavista. Tratam da aliança renovada por parte do Senhor através de um ato de renovação permanente do culto. Apesar do pecado do povo, o Senhor, sempre misericordioso e cheio de amor, permanece próximo de seu povo que eligeu através de Moisés. Este, de fato, toma a «tenda do encontro», ou seja, o lugar do culto, e a coloca fora do acampamento, para indicar que Deus não pode viver em plena harmonia com os homens pecadores, ainda que sempre está pronto e disponível para os que se dirigem a Ele com ânimo renovado e penitente. Todos os judeus que reconheciam sua culpa podiam entrar em amizade com Deus, ir à tenda e falar com Deus, como fazia o intercessor Moisés, que falava com o Senhor cara a cara, como um amigo fala com seu amigo, e como seu ajudante Josué, que «não se movia da tenda» (v.11). Em suma, Deus, que se revela a Moisés como o Dios da misericórdia, quer ensinar deste modo a seu povo que o verdadeiro âmbito da aliança não é o Sinai nem nenhum lugar material; o verdadeiro lugar do culto se situa no fato de reconhecer-nos pecadores e acolher sua misericórdia, que se manifesta em cada situação concreta e através de homens e pessoas santas e amigas de Dios. Só estes mediadores podem pronunciar o nome do Senhor sobre o povo e fazê-lo assim presente com seus atributos de benevolência, compaixão e misericórdia. O Senhor elegeu, seguramente, para sempre, seu povo, porém segue sendo também aquele que perdoa e exige justiça, quer dizer, que se manifesta no castigo e na graça e nos chama a voltar à alianza renovada.

 

Sl 102/103 (Deus é amor) – Por meio de um canto suave, o salmista goteja afeto e amor ao Senhor e canta suas maravilhas e seus atos de ternura para conosco. Devemos meditar este Salmo lentamente, saboreando cada palavra que nos introduz nos ministérios do coração de Deus. Quando rezamo-lo com fé, o Senhor nos fortalece e confronta. Todo o amor de Deus Pai nós podemos contemplar na pessoa de Jesus: “Mas quando se manifestou a bondade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor pela humanidade” (Tt 3,4) O Pai nos enviou o seu único Filho, Jesus, por puro amor a nós e para que Ele nos ensinasse o caminho da vida plena. O grande hino de ação de graças que podemos oferecer ao Pai em resposta à sua generosidade não é realizado por meio de palavras, mas sim com a própria vida. Tocam-me profundamente as palavras deste Salmo: “[O Senhor é] lento para a cólera e rico em bondade”. Ele tem pressa em nos amar, em nos perdoar. Não perca tempo, o Senhor está lhe esperando!b Se você compreende melhor este Salmo, leia e medite o capítulo 15 do Evangelho de Lucas, as três grandes parábolas da misericórdia.

Senhor, como é maravilhoso parar um pouco com minhas atividades e pensar em quantos benefícios até hoje recebi do teu amor. Deixa que minha alma, como a do salmista, se expanda, se dilate e cante “bendize minha alma ao Senhor por todos os benefícios e não esqueça nenhum”. Quero-te agradecer por me ter criado; como é bela a vida; mesmo mesclada pelo sofrimento, com decepções; com dores, vale a pena viver e agradecer com todas as batidas do meu coração, com todos os meus tons e repertório. Que tudo cante o teu louvor. Bendigo-te por minha família, pelos pais, por todas as pessoas que passaram hoje na minha vida: obrigado, Senhor. Senhor, animado pela força da fé, te quero também bendizer pelas cruzes, pelos sofrimentos e por todas as pessoas que me fizeram sofrer e que me ajudaram a amadurecer na minha caminhada. Com Santa Teresinha quero te dizer “tudo é graça”; agradeço-te com a lucidez que hoje tenho, Senhor, por tudo o que vier até a minha morte; dá-me a força para sempre dizer: muito obrigado por tudo. Amém.

 

 

MEDITATIO: O texto do Éxodo que lemos hoje produz uma grande impresão a intimidade que vive Moisés com o Dios, três vezes Santo, revelado no Antigo Testamento. De fato, Deus falava con Ele «cara a cara, como um homem fala con seu amigo» (Ex 33,11). Explica-se, assim, tanto a admiração que este comportamento seu suscitava no povo, mais sensível à distância de Deus que a sua proximidade, como a audácia com que intercedia em seu favor, a fim de que pudesse continuar sendo a herança de Deus, apesar de sua «dura cerviz». Naturalmente, Moisés não chegou à familiaridade que Jesus viveu com Deus, uma familiaridade que inculcou também em seus seguidores. Com efeito, Jesus se atreveu a invocar a Deus com o afetuoso nome de «Abbá» (Mc 14,36; Rm 8,15; Gl 4,6); uma expressão que se usava no seio da intimidade familiar para dirigir-se ao próprio pai, e que nenhum judeu de seu tempo aventurou-se a usar em suas relações com Deus. Jesus, sem dúvida, a utilizou constantemente, sem preocupar-se do escândalo que essa inovação podia suscitar em seus adversários. Oxalá também por isto o condenaram como blásfemo (cf.Mt 26,65). E não só a empregou ele mesmo, expressando desta maneira seu modo extremadamente íntimo de relacionar-se com Deus, mas animó também seus ouvintes a fazer o mismo. Jesús quería que todos vivessem na presença de Deus, como diante daquele «Deus clemente e compassivo, paciente, cheio de amor e fiel» que havia passado ante Moisés revelando-o seu nome (Ex 34,6). Neste sentido se pode entender também a «boa semente» semeada pelo Filho do homem da qual nos fala o evangelho de hoje (Mt 13,37). Temos de preguntar-nos se não deixamos que o joio sufoque a boa semente com outros modos de pensar e de viver a relação com Deus. De fato, com frequência, o Deus Abbá, terno e misericordioso, é substituido em nossa vida por outros deuses que não têm nada que ver com Aquele cujo rosto nos foi revelado por Jesus. Esses deuses geram em nós atitudes que andam longe das que Jesus viveu intensamente e inculcou com a mesma intensidade nos que queriam segui-lo.

 

ORATIO: Senhor Jesus, Tu viveste uma intimidade intensíssima com Deus. Chamavas-o «Abbá», com toda a ternura familiar que tal nome inclui. Deste modo, abriste um caminho novo na humanidade com respeito às relações com o mistério magno e último da realidade, com esse mistério que nós chamamos Deus. Muitos dos homens de teu tempo não te compreenderam; mais ainda, foram muitos os que se escandalizaram e te intimaram e condenaram por isto como blásfemo. Estavam acostumados a um modo de tratar com Deus que se inspirava mais no temor e na distância que no amor e à proximidade. Porém também há homens e mulheres em nossos dias que não te comprendem neste ponto, e talvez entre ellos estemos también nosotros mismos. Mais de uma vez oferecemos o terreno de nossos corações ao joio semeado pelo inimigo, e a boa semente de teu modo de invocar a Deus e de relacionar-te com él queda ahogada por nuestra ceguera y por nuestra hipocresía. Queremos decirte, Senhor, que cremos em ti e, como o apóstolo Felipe na última ceia, te repetimos com fé: «Senhor, mostra-nos o Pai e nos basta» (Jo 14,8).

 

CONTEMPLATIO: Sabemos que Deus é clemente, e nós, que somos pecadores, não nos alegramos de sua severidade, mas lemos: «O Senhor é benigno e justo, nosso Deus é todo ternura» (Sl 116,5). A justiça de Deus está envolta de misericórdia e por esse caminho procede o juizo: usa a moderação quando se trata de julgar, e julga de maneira que usa a misericórdia, pois «a Misericórdia e a Paz se encontram, a Justiça e a Paz se beijam» (Sl 84,11) (Jerônimo, Commento al libro de Giona, Roma).

 

AÇÃO: Repete e medita durante o dia este provérbio bíblico:

«O que semeia é Cristo: quem o encontra tem a vida eterna» (cf. Mt 13,37)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Se não se pode descrever o Deus vivo, pode-se dizer ao menos como e onde encontrá-lo. Uma noite, tendo prolongado sua oração mais do que de costume, o filósofo Blaise Pascal teve uma ardente experiência do Deus vivo que tentou expressar com breves exclamações em uma folha de papel que, em sua morte, encontraram costurada no interior de sua jaqueta, acima do coração. Dizia: «Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó: não dos filósofos e dos doutos. Certeza, Sentimento, Alegria, Paz, Deus de Jesus Cristo. Teu Deus será o meu. Esqueço do mundo e de tudo, exceto de Deus. Ele se encontra somente pelo caminho ensinado pelo Evangelho. Grandeza da alma humana. Pai justo, o mundo não te tem conhecido, porém eu te conheci. Que eu não tenha que ser separado dele para a eternidade. Alegria, alegria, lágrimas de alegria». Vemos aqui o que significa descobrir que Deus existe e ter «a respiração entrecortada» […]. Mas, o Deus vivo se revela sobretudo no mais misterioso de seus juizos: o que se manifesta na cruz de Cristo. Sem dúvida, para compreender a novidade que aporta a cruz à compreensão do Deus vivo, devemos trazer à mente alguns momentos fortes da revelação bíblica sobre Deus. No Êxodo Deus mesmo se apresenta a Moisés dizendo. «O Senhor, o Senhor». Seguem, neste ponto, duas séries de atributos: «Deus clemente e compassivo, paciente, cheio de amor e fiel; que mantém seu amor eternamente, que perdoa a iniquidade, a maldade e o pecado, porém [e aqui começa a segunda série] que não os deixa impunes, mas que castiga a iniquidade dos pais nos filhos e netos até a terceira e quarta geração» (Ex 34,5-7). Este contraste característico se conserva ao longo de toda a Biblia. Esta mantém sempre juntos, em tensão, esses dois traços essenciais de Deus: de um lado, a santidade e o poder; de outro, a bondade imensa; de um lado, a cólera; de outro, a piedade. Nunca tenta nivelá-los, não vê neles contradição. Coerentemente, duas parecem ser as reações, as atitudes e, ao mesmo tempo, os deveres fundamentais da criatura ante este Deus: temor e amor: «Amarás ao Senhor teu Deus… Temerás ao Senhor teu Deus» (Dt 6,5.13) (R.Cantalamessa, La subida al monte Sinaí).

 

 

QUARTA-FEIRA, 29 DE JULHO DE 2020- 17ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

João 11,19-27 (Marta e Maria) O diálogo entre Jesus e Marta referido neste trecho do evangelho de hoje faz parte do episódio referente à “ressurreição de Lázaro” (cf. Jo 11,1ss). Como em Lc 10,38-42 e em Jo 11,1ss destacam as atitudes opostas de Marta e de Maria: a primeira mostra um caráter mais dinâmico e concreto, que se manifesta em sair de imediato ao encontro de Jesus; a segunda, à qual sempre se descreve sentada e escutando o Mestre, permanece em casa (v.20). Marta associa, em certo modo, a morte de seu irmão à ausência de Jesus naquele momento, porém confirma ao mesmo tempo sua firme confiança nele como mediador infalível ante Deus (vv.21ss). Começa assim um itinerário interior que a conduzirá a uma profissão de fé plenamente cristã (v.27), passando através da declaração de sua fé na ressurreição do último dia (v.24), de acordo com a tradição judia (cf.  2 Mac 7,,9.23;121,42b-44; Dn 12,1-3). É o próprio Jesus que a guia neste itinerário: com uma expressão típica das auto revelações divinas (“Eu sou”: v.25ª; cf. Ex3,14; Lv 19,1ss; Jo 3,35;14,6), o Senhor faz compreender a Marta que a vida que Ele dá supera também à morte. Jesus, ressurreição e vida, cria em quem o recebe uma condição nova e definitiva (cf. Jo 5,24;8,51). Como faz em todoo seu evangelho, também aqui João recorre a termos antitéticos e joga com seu duplo significado: quando alguém, por sua plena adesão a Jesus, passa da morte física para a vida definitiva, eterna porque, quem em vida haja crido nele, não perecerá a condenação à eterna separação de Deus. Com estas palavras se refere o Senhor ao destino último, e ao mesmo tempo, põe em evidência que, através dele, está já presente no crente o germe da vida eterna. Jesus não se limita em revelar a Marta estas verdades, mas pergunta de uma maneira explicita a sua posição ante elas, dando-lhe a oportunidade de manifestar plenamente sua adesão à pessoa do Mestre, reconhecido agora como o Messias esperado por Israel e como Filho de Deus (v.27).

 

 

 

1 Jo 4,7-16: (À fonte da caridade) Este pequeno mimo de São João é uma reflexão posterior sobre o tema do amor fraterno, do qual o autor já falou, na carta, de um ponto de vista negativo (3,11.15.22). Agora realça o mandamento do amor, porém em chave positiva: o amor é necessário porque “o amor procede de Deus» e porque “Deus é amor».E pois a identidade de Deus é amor, Ele ama, perdoa e se entrega. Todo autêntico amor humano encontra seu fundamento no amor de Deus. O que ama nasceu de Deus e “conhece a Deus». Se esta é a essência de Deus, para chegar ao amor autêntico há um só caminho: amar. Sem dúvida, não como pensavam os agnósticos ou os inimigos da comunidade de São João, que acreditavam amar a Deus porque sentiam a necessidade de conhecê-lo. A natureza do amor, para João, se fundamenta sobre o fato de que Deus nos amou «primeiro», por gratuita iniciativa sua. Este amor se manifestou na encarnação do filho de Deus, sem o qual os homens teriam continuado pobres e incapazes de conhecer o verdadeiro amor e possuir a vida (vv.9-10; Rm 3,25;5,8; 2Cor 5,21). Jesus nos demonstrou um amor concreto, desinteressado, de dedicação e total libertação, até entregar a vida. O amor do homem por Deus, portanto, é, sempre, uma resposta ao amor providente de um Pai. E só conhece realmente a Deus o que o ama percorrendo o caminho que conduz do amor ao irmão (cf.Mc 12,29-31): «Nisto reconhecerão que sois discípulos meus, que vos ameis uns aos outros»(Jo 13,35;1 Jo 4,12-20). Após ter-nos dito que Deus é amor, João ilumina à comunidade de fé quanto as consequências práticas desta afirmação para a vida cristã. Primeiro, para possuir a Deus a via mestra é o amor mútuo. Este meio é a condição para que o amor de Deus habite nos fiéis como presença experiencial e seja «perfeito» na imitação do amor vivido por Cristo (v.12). Segundo, a posse do Espírito é o dom que guia, no próprio caminho interior de vida espiritual. Terceiro, a fé em Jesus Salvador do mundo: “Se alguém confessa que Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece nele e ele em Deus”.

 

Sl 33/34 (Louvor à justiça divina) Deus é vida e amor, mas precisamos estar atentos, pois estamos cercados de situações que nos levam à morte: o mal, a violência, o ódio, as guerras. Além disso, vivemos um momento em que a vida está sendo destruída já no seu nascer, por meio do aborto. Há também uma morte que engana, pois não parece morte, mas igualmente pode matar: a injúria, o ódio, o rancor, a inimizade, a calúnia.Quem se decide a seguir o Senhor deve viver de acordo com a Palavra.

Senhor, que eu seja coerente no meu dia a dia, defenda a vida e participe de todos os atos e realizações que busquem resplandecer o amor e a justiça. A pedagogia do seu amor nunca se altera: os ricos que não partilham passarão fome e os pobres que te amam sempre serão saciados do teu amor e da tua paz. Amém.

 

 

 

MEDITAÇÃO: Os Evangelhos apresentam Santa Marta sempre em movimento, como uma mulher eficiente e segura de si. Talvez isto a conduzia a deixar-se envolver demais pelas coisas que devia fazer e a perder de4 vista o sentido de sua atividade. Sem dúvida, ante Jesus compreende que a ação não é o valor maior, e que só tem importância, na medida, que está movida pelo amor; se não for assim pode converter-se em uma fonte de ansiedade e de dispersão. Marta não se relaciona com o Senhor só fazendo algo por Ele, mas se apresenta diante dele com uma atitude sincera: mostra-se a Ele tal como é, dolorida pela morte de seu irmão, decepcionada por não haver sido escutada (cf.Jo 11,3.21), porém, também firme na fé. Ainda que não tenha visto a sua oração satisfeita, não se fecha ao mistério de Deus, não duvida de sua bondade; mas se põe à escuta do Senhor e se põe disponível para caminhar com Ele, revendo seu modo de conceber a vida e a fé. Marta se deixa conduzir por Jesus através da experiência da dor em uma busca de conhecimento mais profundo de si mesma, da realidade, do próprio Senhor. A quem o acolhe de verdade tudo se lhe apresenta com uma luz nova: viver significa, então, habitar no amor de Deus, na amizade sincera e confiante com Ele. A vida eterna começa desde agora, e atravessa e vivifica todas as vicissitudes humanas, inclusive as marcadas pelo sofrimento. Isso significa pôr-se à escuta de Deus e de sua Palavra, como Marta, também nos momentos de incerteza e de dúvida (cf. Jo 11,39-41) Também a nós pede, o Senhor, uma adesão pessoal: “Crês nisto?”. Marta deu sua resposta: cada um de nós está chamado a dar a sua vida.

 

 

 

ORAÇÃO: Senhor, são muitas as vezes que, diante das dificuldades da vida, minha fé vacila, e me deixo absorver pelas mil coisas que devo fazer… Ensina-me a abrir minha fé a tudo que me acontecer, a estar disponível para o encontro autêntico contigo, em que minhas falsas seguranças cedam dando lugar à confiança em tuas promessas. Não permitas que o ritmo frenético de minhas jornadas me atropele até o ponto de deixar de inspirar-me pelo amor. E, sobretudo, não deixes que a experiência da dor me distancie de Ti: converte-a, ao invés, em uma experiência fecunda de ressurreição e vida.

 

 

 

CONTEMPLAÇÃO: Marta, mais comprometida com o desenvolvimento das tarefas necessárias, é a primeira que chega a Jesus. Maria, mais fina e com alma mais sensível, espera em casa para receber os pêsames. Marta, mais simples, corre ao encontro de Jesus, tomada pela dor; que, sem dúvida suportava com equilíbrio. “Meu irmão – disse – morreu porque não estavas aqui, pois Tu, com uma só ordem, podeis vencer a morte”. Jesus lhe disse: “O que crer em mim não estará livre da morte da carne, contudo, Deus pode dar facilmente a vida a quem queira”.  Quando diz depois a Marta: “Crês?”, exige a confissão da fé como mãe e protetora da vida. E ela respondeu a Ele de imediato que sim e confessa sua fé com sutileza (…): ao usar o artigo “o” Cristo e “o” Filho de Deus, confessou claramente o único, excelente e verdadeiro Filho de Deus. O Senhor exige compreensão da fé: esta é o grande dom quando nasce de uma alma ardente e tem tanto poder que salva não só a quem crer, mas também aos outros. Deste modo, não só Marta, mas, também Lázaro foi ressuscitado pela fé de sua irmã, à qual o Senhor disse: “Não te havia dito que se crês verás a glória de Deus?”, como se quisesse dizer-lhe: “Já que Lázaro morreu, supre tu a fé do morto. De fato, é preciso crer firmemente a fim de ver as coisas que estão acima da esperança.” (Cirilo de Alexandria)

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

“Sei que tudo o que pedires a Deus ele te concederá” (Jo 11,22)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL A festa de Santa Marta que celebra hoje a liturgia nos põe ante este personagem do Evangelho intimamente ligado à pessoa e à missão de Jesus. Representar Marta somente como à pessoa sempre atarefada, a que se afana, e isso por amor a esse inefável amigo que é Cristo, que se hospeda em sua casa, amigo de seu irmão e de sua irmã. Marta é uma mulher sempre atarefada e molesta, algumas vezes, pelas atitudes contemplativas de sua irmã; de todos os modos, se trata de uma, atarefada entregada por completo a seu Senhor. Porém, se nos fixamos bem, esta visão e esta imagem de santa Marta estão um tanto reajustadas por este fragmento do Evangelho de João. É Marta quem se dirige a Jesus, com o coração cheio de amor e de dor pela morte de seu irmão Lázaro; é ela a que com aquela formosa amizade, valente e espontânea, quase reprova ao amigo: «Senhor, se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido». Esta atitude de autêntica amizade por parte de Marta respeito a Jesus nos revela algo muito mais precioso em seu ânimo que a laboriosidade atarefada de uma acolhida puramente exterior. Existe entre Marta e Jesus uma misteriosa amizade. Marta sabe que Jesus é poderoso; se dá conta de que o Senhor pode tudo […]. A afetuosa amizade, a valente liberdade de Marta, nos diz muito sobre o conhecimento que tinha de Cristo e sobre a confiança que o Senhor Jesus lhe outorgava. Temos de assinalar, por outra parte, que Jesus não corrige a Marta por sua observação. Sim o fez quando se lamentava da «inércia» de Maria. Porém nesta ocasião não. Compreende sua dor a compartilha. O Evangelho disse que Jesus mesclou suas lágrimas com as de Marta. Que misteriosa e sublime amizade! […]. O mistério da morte vivido em comunhão de amizade conduz Jesus a realizar uma afirmação, poderíamos dizer desconcertante: «Teu irmão viverá». Marta compreende e não compreende. Talvez gurde no coração a esperança de um prodígio clamoroso; talvez se refugie na confiança na ressurreição final dos mortos. E disse a Jesus: «Sei que ressuscitará, porque Tu és o Cristo o Senhor da vida». Aqui temos a profissão de fé de Santa Marta. Maria, a contemplativa, nunca disse a Jesus: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”; Marta, a atarefada, sim o fez. E Jesus lhe deixou que se dissesse. É possível que precisamente esta declaração de fé sobre sua verdadeira identidade fosse o que provocou nele a decisão última do prodígio clamoroso (A Balletrero, I consacrati nellaChiesa).

 

QUINTA-FEIRA, 30 DE JULHO DE 2020- 17ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

Mateus 13,47-53 (Parábola da rede; Conclusão) – A parábola da rede que, lançada ao mar, recolhe peixes comestíveis e não comestíveis aprofunda no significado da parábola do joio. Assim como na rede encontram peixes bons e maus, também na comunidade dos discípulos de Jesus há quem acolhe e vive sua Palavra, primícias do Reino, e quem a rejeita ou se mostra indiferente. A distinção terá lugar ao final dos tempos e corresponde a Deus realizá-la (vv.47-50). É importante para os discípulos compreender o mistério do Reino que Jesus lhes revelou mediante as parábolas, ou bem entender com a mente e com o coração a Palavra e vivê-la através da obediência da fé. É preciso o assentimento pessoal do discípulo (v.51), a fim de que o seguimento a Jesus e a seu exemplo possa ser um comunicador e um testemunho de toda a vontade salvifica do Pai, tal como a manifestou na antiga e na nova aliança (v. 52).

 

 

Jr 18,1-6 (Jeremias junto do oleiro) – A Palavra do Senhor cita Jeremias na casa do oleiro. A atividade cotidiana do artesanato aparece como símbolo do modo de agir de Deus. O profeta, instruído pela Palavra do Senhor, compreende a mensagem que deverá anunciar ao povo, verdadeiro destinatário desta ação simbólica. Como o oleiro, ao modelar os utensílios, desfaz os que não saem bem e amassa de novo a argila para fazer outros, assim Iahweh, que é o Criador e Senhor de todos os povos, pode eliminar ao que não vive segundo sua vontade. Seu juízo é inapelável e não se trata de um gesto autoritário, mas pedagógico: o castigo é uma ajuda para compreender o próprio erro e converter-se. Como a argila está nas mãos do oleiro, assim está Israel nas mãos de Deus. A imagem, além de evocar a ideia da potestade absoluta de Deus respeito ao povo, sugere a de seu atento cuidado, afim de que o povo viva com retidão, de modo semelhante ao do artista, que, ao modelar um objeto, põe todo seu cuidado para que saia bem.

 

Sl 145/146 (Hino ao Deus que socorre) – Edith Stein, com muita sabedoria, declarou que “não é a fenomenologia que nos salva, mas sim a paixão do Senhor Jesus”. O papa Bento XVI nos recorda que não é a economia que salva, mas Jesus. Devemos ter essas convicções no mais íntimo do nosso coração. A salvação integral do ser humano não pode ser confiada a meios humanos, à força, poder, dinheiro, etc. Tudo isso é passageiro e não garante a salvação do homem frente às suas desilusões e fracassos. Não é o psicanalista que perdoa os nossos pecados, mas sim a força do Sacramento da Confissão. Atualmente, o grande erro do homem é querer brincar de ser Deus, sem perceber que é meramente humano e mortal. “Não vos iludais, de Deus não se zomba; o que alguém tiver semeado, é isso que vai colher” (Gl 6,7). Que com a leitura deste Salmo sejamos impulsionados a colocar toda a nossa confiança na força salvadora e libertadora de Deus.

Senhor, hoje quero louvar-te com as palavras deste Salmo, que são tuas palavras, portanto jamais serão desmentidas: “O Senhor livra os prisioneiros, devolve a vista aos cegos, o levanta quem caiu, o Senhor ama os justos, o Senhor protege os estrangeiros, ampara o órgão e a viúva, mas transtorna o caminho dos ímpios. O Senhor reina para sempre, o teu Deus, Sião, por todos as gerações. Aleluia!” (Sl 146, 7-10). Amém.

 

 

MEDITATIO: Deus é o Senhor de nossa existência: o cremos de verdade? Em ocasiões dizemos: “Estamos em suas mãos”, e o dizemos, talvez, com um tom de resignação, o de quem constata uma evidência à qual não se pode subtrair. Sem dúvida, poderíamos provar a deixar-nos arrebatar o coração e a mente por esta imagem: estamos nas mãos do Senhor. Mãos que acalentam e protegem, mãos que guardam e apoiam, mãos que alentam e que estão abertas para acolher a toda hora. Mãos, também, que deixam ir-se a quem não quer ficar e que, ao final, julgarão, respeitando de todos os modos a decisão que cada um tenha tomado. Mãos que exortam Deus, que convidam e tranquilizam. Mãos que entregam um tesouro do qual extrai riquezas e que é sua própria manifestação como amor que se entrega. Felizes nós se o compreendemos cada vez de uma maneira mais profunda, através de todas as circunstâncias da vida, as duras e as mais fáceis. Isso é o que Jesus tentou dizer-nos com as parábolas. Temos compreendido a Ele?

 

ORATIO: Obrigado, meu Deus, pelo cuidado que tens comigo: não deixas que me falte nada que possa conhecer-te e responder a teu dom de amor. Tu me criaste e me custodias na vida uma vida que me deixas livre de orientar como quero. Sem dúvida, tu sabes qual é meu verdadeiro bem e espias angustiado meus movimentos, sofrendo quando me fecho ao amor. Ao final do tempo olharás comigo minha vida, percorrendo seus momentos um após outro. Então terá lugar o juízo. Obrigado, Senhor, por fazer-me compreender hoje que com o presente preparo o futuro. Com meu presente, vivido em docilidade a ti, a teu dom, a tua Palavra. Obrigado, Senhor, por ter-me em tuas mãos.

 

CONTEMPLATIO: Enquanto estejamos nesta vida – visto que nossa vasilha, por assim dizer, é de argila recém saída do torno – estamos sendo fabricados ao modo de um oleiro, tanto no que toca à maldade como no que corresponde à virtude. Ou melhor, o oleiro nos fabrica de modo que possamos, de um lado, romper nossa maldade, para converter-nos em uma nova criatura melhor, e, do outro, ser reduzido a uma vasilha de argila recém saída do torno depois que tenha tido lugar nosso progresso. Ou melhor, quando tivermos chegado mais além desta era presente, quando tivermos chegado ao final da vida, então seremos aquilo no qual nos tivermos convertido, após ter sido provados ou com o fogo das flechas incendiárias do maligno (Ef 6,16) ou com o fogo divino, posto que nosso Deus é também “um fogo devorador” (Hb 12,29). Se eu digo, nos convertemos, sob a ação deste ou daquele fogo, nisto ou naquilo, se nos rompem, não poderemos ser refeitos nem nossa condição poderá melhorar. Por isso, enquanto estivermos aqui, é como se estivéssemos em mãos de um oleiro, que, se a vasilha cai em suas mãos, pode pôr-lhe remédio e fazê-la de novo. Vigia, pois, a ti mesmo, porque enquanto estiveres nas mãos do oleiro e te encontres ainda no ato de ser modelado, não caias por ti mesmo fora de suas mãos. É certo que ninguém pode ser retirado da mão de Deus; sem dúvida, nós mesmos, por negligência, podemos cair de suas mãos (Origens, Omelie su Geremia, Roma 1995, pp 221ss e 225ss).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

“Faz-nos compreender, Senhor, tua Palavra” (cf. Mt 13,51)

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Veio a Segunda Guerra Mundial, com toda a dor que ficou gravada de modo indelével em minha memória. Não quis tomar partido, senão pelo amor e contra o ódio. Em um país oprimido pela ocupação inimiga, sustentou que os cristãos estão obrigados a amar os seus inimigos e que fraudá-los sistematicamente com as provas normais e as manifestações do amor fraterno é pecado grave. Tive amigos entre os comunistas e no exército alemão, entre os colaboracionistas, na resistência e entre os voluntários que combatiam contra os russos na frente oriental. Isso me trouxe, com frequência, dificuldades. E é que quase todos que se comprometiam pessoalmente estavam convencidos de que a pátria, Europa, Deus, a Nova Ordem e todos os restantes ideais, unicamente, podiam ser servidos de uma só maneira: a que eles mesmos consideravam justa. Após a guerra, pus a misericórdia acima do direito. Mendiguei amor para o inimigo derrotado. Defendi os inermes, os prisioneiros, os expulsos de suas casas e terras, os perseguidos, os pobres e os oprimidos. Isto foi o começo de minha vocação. A essência de minha vocação consiste em enxugar as lágrimas de Deus ali onde chore. Como é natural, Deus não chora nos céus, onde mora em uma luz inacessível e goza eternamente de sua felicidade infinita. Suas lágrimas correm, sem interrupção, pelo rosto divino de Jesus, que, sendo um com o Pai celeste, aqui, na terra, sobrevive e sofre, está faminto e é perseguido pelos inimigos dos seus. As lágrimas dos pobres são as suas, posto que Jesus quis identificar-se todo com eles. E as lágrimas de Jesus são lágrimas de Deus (W.van Straaten, DoveDio piange, Roma).

 

 

SEXTA-FEIRA, 31 JULHO 2020- 17ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

Mateus 13,54-58 (Visita a Nazaré) =Lc 4,16-24Terminado o «sermão em parábolas», recolhe Mateus outro material narrativo, cujo variado conteúdo marca a progressiva separação entre Jesus e Israel e manifesta a formação específica dada ao grupo dos discípulos (cf. Mt 13,54-17,27). O episódio que abre a seção, e que constitui o texto litúrgico de hoje, narra a rejeição que seus contemporâneos opu­seram a Jesus. Do estupor inicial produzi­do por seu ensinamento (v.54) passa-se à pergunta fun­damental sobre a identidade do Nazareno. Os fariseus haviam respondido a ela declarando-o filiado ao bando do príncipe dos demônios, por cuja autoridade haveria feito os milagres (cf.12,24). Os habitantes de Naza­ré, sem dúvida, não dão resposta alguma. O conheci­mento que têm de seu contemporâneo e de sua família se con­verte em um obstáculo para crer que seja Ele o Messias: não é possível que um homem da condição de Jesus tenha “essa sabedoria e esses poderes milagrosos» (v.55ss). Jesus constata, através de sua própria experiência, a ver­dade do dito proverbial que afirma: “Ninguém é profeta em sua terra» (cf. v.57). A sorte de sua mensagem, e de sua própria pessoa, não é diferente daquela reservada aos profetas do Antigo Testamento e de todos os tempos: rejeição, zombaria, desprezo, perseguição; com frequência, também mor­te violenta. E dado que aos milagres supõem a fé, que é o único que permite compreender seu verdadeiro signi­ficado, a incredulidade dos habitantes de Nazaré se converte em impedimento para que Jesus possa fazê-los (v.58).

 

 

Jr 26,1-9 (Prisão e julgamento de Jeremias) – Este texto abre uma nova seção do livro de Jeremias (capitulo 26 a 29), que se distingue da precedente (capitulo 1 a 25). Na que agora começa, se narra, em prosa, as circunstâncias relativas às mensagens do profeta. Concretamente, o capítulo 26 apre­senta o contexto das palavras pronunciadas pelo profeta na entrada do templo e recolhidas no capí­tulo 7. Durante o reinado do ímpio Joaquim, que havia frustrado as esperanças de reforma religiosa suscitadas por seu pai, Josias, Jeremias pronuncia o duro dis­curso, do qual, aqui, se oferece uma síntese. O Senhor envia o profeta ao templo, provavelmente por oca­sião de uma festa religiosa que atrai muitas pessoas a Jerusalém (v.2), para proclamar umas palavras importan­tes, palavras que deverá pronunciar sem omitir nada: está em jogo a conversão do povo ou seu casti­go (v.3). Jeremias chama todos à responsabilidade, com respeito à Palavra do Senhor, cuja escuta constitui o ponto de partida para converter-se. Com este fim, Deus enviou, ao longo de toda a história de Israel, os profetas, homens da Palavra (v.5). Agora, quem não segue as advertências dos pro­fetas e não se comporta em conformidade com a Palavra do Senhor não pode pretender encontrar a salvação, só pelo fato de frequentar o templo. A atitude assu­mida com respeito à Palavra é discriminadora: escutá-la e obedecê-la é viver, não escutá-la e não obede­cê-la é morrer. Neste caso, o povo depositário da benção será maldito em virtude de sua eleição (v.6).

 

Sl 68/69 (Lamentação) – Trata-se de uma belíssima “lamentação individual”. O povo de Israel tem como hábito “queixar-se de Deus” e chorar pelos pecados, tanto os próprios quanto os dos irmãos. São conscientes de que os pecados individuais tornam-se sofrimento para toda a comunidade, assim como a santidade dos indivíduos se transforma em santidade e alegria para todos. Este sentimento de coletividade deve ser recuperado e transformado em solidariedade ao bem. Infelizmente, existem pessoas que são solidárias somente com o mal. Com uma imagem forte e eloquente, o salmista fala do medo que o assalta e dos perigos que pesam sobre sua vida. O salmista está enfrentando um período em que não consegue encontrar uma saída para os seus problemas. E este sentimento é comum a todos nós; mais cedo ou mais tarde nos depararemos com situações de extrema dificuldade, e conseguir enxergar uma saída não será uma tarefa fácil. São estes momentos preciosos que devem ser lembrados como um caminho de purificação, pois neles descobrimos o amor de Deus.

Senhor, quero fazer deste Salmo a minha oração preferida nos momento duros da minha vida, quando não enxergo nada e parece que estou em meio a nuvens espessas e densas ou num túnel, como Santa Teresinha do Menino Jesus. É neste momento que eu quero cantar a misericórdia, a beleza da fé. E crer, sem dúvidas, que a noite não é para sempre, que as nuvens não cobrem para sempre o Sol, que o mal deve ser vencido. Senhor, esta fé deve me sustentar; quero rezar de novo este Salmo com amor, pensando nas milhões de pessoas que se sentem perseguidas, solitárias e abandonadas; quero fazer deste Salmo um grande “cinturão” de segurança por meio do qual quero ser solidário aos que sofrem e compreender os que nada enxergam e nada conseguem amar. Senhor, toca a humanidade sofrida, dura e insensível e faz que todos sejamos centelhas de amor e de verdade, para incendiar com o novo fogo o mundo em que vivemos. Amém.

 

 

 

MEDITATIO: A fé é acolhida em adesão total à pessoa de Je­sus. Não é possível aceitar Jesus em parte, só naqueles aspectos que possam parecer-nos mais agradáveis e compreensíveis. Aceitar Jesus, e a Palavra do Pai que ele nos comunica, lança pelos ares nossas ideias e projetos, inclusive religiosos. Se descobrimos que Jesus é diferente da imagem que havíamos feito d’Ele, então se nos apresenta a ocasião de converter-nos, quer dizer, de abandonar nossos pontos de vista e dirigir nosso olhar sobre Jesus tal como é, desfazendo-nos de nossos raciocínios. Se isto nos inco­moda demais e nos rimos de quem nos convida a não camuflar o rosto de Deus, dificilmente poderemos ver os sinais de sua presença vivificante entre nós. O convite a escutar aos profetas vai reanimando, ao longo dos séculos, e chega até nós. Em Jesus, a Palavra de Deus tem sido pronunciada de maneira total, e desde pouco mais de dois mil anos nunca faltou na Igreja homens e mulheres que, com sua vida, seus escritos e sua pregação, reavivaram, entre seus contemporâneos, a consciência da beleza e as exigências do Evangelho. Também, hoje, estão presentes entre nós, porém os escutamos?

 

 

ORATIO: Faz que te conheça, Senhor! Não quero ficar ence­rrado nas angústias de minhas ideias sobre ti, umas ideias tão mesquinhas, tão limitadas… Faz que te conheça como és, em tua beleza, em tua verdade, em tua simplicidade. Faz que te conheça. E para isso, Senhor, liberta-me dos sucedâneos dos que me rodeiam, das falsas certezas nas quais me apoio. Desejo, quero declarar minha fé em ti, Senhor sempre surpreendente, que removes minhas certezas construídas à medida de meu tranquilo viver. Ó Deus, a quem tenho medo de entregar-me e cuja falta me consume; Deus de minha mediocridade e de minha nos­talgia do absoluto; Deus que caminhaste em Jesus entre nós e exaltaste nossa vida, faz que te conheça, porque, ó Senhor de minha vida, creio em ti.

 

CONTEMPLATIO: Desceu dos céus a terra por causa da humani­dade que sofre; se revestiu de nossa humanidade no seio da Virgem e nasceu como homem. Foi Ele quem nos sacou da escravidão à liberdade, das trevas à luz, da morte à vida, da tirania ao Reino eter­no. Foi perseguido em Davi e desonrado nos profe­tas. Foi ele quem se encarnou no seio da Virgem, foi suspenso na cruz, sepultado na terra e, ressuscitado dentre os mortos, subiu às alturas dos céus (Melitão de Sardes).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

Que eu te escute, Senhor, e me converta a ti» (cf. Jr 26,3)

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Para os cristãos, Jesus é Deus. – Ainda que não para todos: a divindade de Cristo dividiu desde sempre à cristandade. – Poucos dogmas como este foram defendidos ou combatidos tão largamente. A imagem de Cristo se reflete sempre na consciência de cada um segundo seus próprios conhecimentos. Para os judeus, durante os séculos de seu exílio, o Crucificado foi também o Crucificador. Em nome de Cristo hão se promulgado leis antisemitas, em nome de Cristo há sido discriminado, perseguido, expulso, assassinado com excessiva frequência Israel a rogos de muitas inquisições. Jesus: um vínculo de união entre Israel e os gentios, que une e separa em igual medida. Justo, sábio, profeta: um “louco” os “loucos” de Israel, na medida em que toda verdadeira profecia confina com a loucura que condena nossa sensatez. Um judeu “central”, dizia Martin Buber. Um judeu único, como todos e cada um podemos constatar. Único por seu esplendor e pela contradição que há introduzido – como um fermento – no coração das nações. Um mistério – assim preferem definir os teólogos cristãos, aos que respondem com silêncio os teólogos judeus – Porém vinte linhas são inclusive demasiadas para falar de um mistério. Ou bem, nesse caso, é que o que o tenta não sabe do que está falando (André Chouraqui, en A. M. Carré).

 

SÁBADO, 01 DE AGOSTO DE 2020- 17ª SEMANA DO TEMPO COMUM – ANO A

Mateus 14,1-12 (Herodes e Jesus; Execução de João Batista) =Mc 6,14-29; Lc 9,7-9 – Após narrar como seus contemporâneos rejeitaram a Jesus, Mateus insere o relato do martírio de João Batista, tomando, como motivo, a reação de Herodes Antipas, ao ouvir falar de Jesus e de suas obras (vv.1ss). Herodes, a quem os romanos haviam outorgado a jurisdição sobre a Galileia e a Pereia, havia decre­tado a prisão e a posterior decapitação de João Batista, por causa da forte denúncia, por parte deste último, do pecado do tetrarca. Este havia repudiado a sua esposa e tomado como mulher à esposa de seu irmão (vv.3-5). O intransigente chamado de João Batista à observância da lei moral havia se tornado insuportável para o casal adúltero. Ainda que, a vontade homicida de Hero­des, estivesse freada pelo temor de uma revolução po­pular e, acrescenta o evangelista Marcos, por certa estima que o tetrarca alimentava por João Batista (cf. Mc 6,20), não ocorria o mesmo com Herodíades. Por isso, quando He­rodes jurou à filha desta, dar-lhe o que lhe pedisse, Herodíades sugeriu que lhe entregasse a cabeça de João (vv.6-11). A morte de João Batista, cuja notícia, os discípulos dele levaram à Jesus (v.12), é o último elo de uma cadeia de acontecimentos, através dos quais levou, João Batista a encerrar sua própria missão de precursor. Jesus Cristo compreende que está chamado a percorrer o mesmo caminho.

 

Jr 26,11-16.24 (Prisão e julgamento de Jeremias) – Este texto é continuação do lido ontem e apresenta a reação à vigorosa advertência feita pelo profeta na entrada do templo. As auto­ridades religiosas denunciam Jeremias ante os chefes e ante o povo, acusando-o de profetizar a destruição do templo e de Jerusalém, ambos «santos» por ser morada de Deus. Anunciar seu final era uma blasfêmia que merecia a sentença de morte (v.11). Jeremias reivindica em sua defesa o mandato recebido do Senhor (v.12). Contudo, afirma que o centro de sua mensagem não é a destruição de Jerusalém e de seu templo, mas a conversão do povo: isso é o que deseja o Senhor e, a este fim se dirige a ameaça do castigo que, sem dúvida, se a advertência consegue o efeito esperado, não será enviado (v.13). Jeremias sabe que é, em verdade, profeta de Yahweh: os chefes religiosos e políticos se abstêm de condenar à morte a um ino­cente, cujo sangue pesaria sobre suas consciências como uma culpa ulterior que, certamente, não ficaria sem castigo (vv.14ss). O texto litúrgico conclui com o v.24, no qual se indica que Jeremias salvou a vida gra­ças à proteção que lhe outorgou um personagem dotado de autoridade frente aos chefes do povo.

Salmo 68/69 (Lamentação) – Trata-se de uma belíssima “lamentação individual”. O povo de Israel tem como hábito “queixar-se de Deus” e chorar pelos pecados, tanto os próprios quanto os dos irmãos. São conscientes de que os pecados individuais tornam-se sofrimento para toda a comunidade, assim como a santidade dos indivíduos se transforma em santidade e alegria para todos. Este sentimento de coletividade deve ser recuperado e transformado em solidariedade ao bem. Infelizmente, existem pessoas que são solidárias somente com o mal. Com uma imagem forte e eloquente, o salmista fala do medo que o assalta e dos perigos que pesam sobre sua vida. O salmista está enfrentando um período em que não consegue encontrar uma saída para os seus problemas. E este sentimento é comum a todos nós; mais cedo ou mais tarde nos depararemos com situações de extrema dificuldade, e conseguir enxergar uma saída não será uma tarefa fácil. São estes momentos preciosos que devem ser lembrados como um caminho de purificação, pois neles descobrimos o amor de Deus.

Senhor, quero fazer deste Salmo a minha oração preferida nos momento duros da minha vida, quando não enxergo nada e parece que estou em meio a nuvens espessas e densas ou num túnel, como Santa Teresinha do Menino Jesus. É neste momento que eu quero cantar a misericórdia, a beleza da fé. E crer, sem dúvidas, que a noite não é para sempre, que as nuvens não cobrem para sempre o Sol, que o mal deve ser vencido. Senhor, esta fé deve me sustentar; quero rezar de novo este Salmo com amor, pensando nas milhões de pessoas que se sentem perseguidas, solitárias e abandonadas; quero fazer deste Salmo um grande “cinturão” de segurança por meio do qual quero ser solidário aos que sofrem e compreender os que nada enxergam e nada conseguem amar. Senhor, toca a humanidade sofrida, dura e insensível e faz que todos sejamos centelhas de amor e de verdade, para incendiar com o novo fogo o mundo em que vivemos. Amém.

 

 

MEDITATIO: Nos discursos de despedida que seguiram à últi­ma ceia, Jesus declarou: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida» (Jo 14,6). Jesus é a verdade desconhecida e com­batida pelos que se deixam instigar por aquele que é “mentiroso e pai da mentira» (Jo 8,44). Mas, o que segue a este não chega à vida, mas à morte. Sem dúvida, tem muitos seguidores porque, neste mundo, o êxito da eleição parece produzir um efeito contrário: os testemunhos da verdade são esmagados, silenciados, mortos nos campos de concentração de ontem e de hoje. É uma constante da história que explodam perseguições ali onde há alguém que disse de modo claro e compreensível, com sua vida e com suas palavras, a verdade de Deus. A verdade é incômoda, do mesmo modo que é incômodo o amor, porque im­plica a renúncia a nossos próprios interesses egoístas e pede a abertura ao outro. A Palavra do Senhor, uma vez mais, nos serve de espelho. Em que rosto nos reconhecemos? No de Jeremias e no de João Batista? Ou no dos sacerdotes e no dos profetas corruptos, ou nos de Herodes e Herodíades?… Escutemos, hoje, a voz do Senhor, que é a voz da verdade.

 

ORATIO: Perdoa, Senhor, minha pouca coragem. Sinto-me muito se­melhante a teu apóstolo Pedro, que, quando lhe perguntaram se era dos teus, negou, inclusive, conhecer-te. O medo de perder a companhia de alguém, ou um respeito humano, me freiam, na hora de pronunciar as palavras, de realizar ações coerentes com esse Evan­gelho que, sem dúvida, desejo viver. Em certos lugares é motivo de vergonha declarar-se cristão. Concede-me teu Espírito de fortaleza: que eu me deixe acalentar no coração e encontre, em ti, uma alegria mais forte que qualquer medo. Faz de mim também um tes­temunho da verdade que Tu és.

 

CONTEMPLATIO: “Felizes os que sofreram como os profetas. Al­guém que, vivendo com pleno zelo e censurando aos que pecam, tiveram que compreender que deve ser odia­do e estar exposto a insídias, assim como perseguido e escarnecido por causa da justiça, não só não lhe provarão estas coisas, mas que se alegrará e exultará com elas, porque está convencido de que receberá, ao contrário, uma grande recompensa nos céus, das mãos daquele que o tem comparado aos profetas, por ter pade­cido os mesmos sofrimentos. É preciso, portanto, que aquele que vive, com zelo, a vida profética, e tem sido capaz de acolher o Espírito que havia nos profetas, receba desprezo no mundo e entre os peca­dores, a quem parece esquisita a vida do justo” (Orígenes, Comentário ao evangelho de Mateus).

 

AÇÃO: Repete com frequência e vive hoje a Palavra:

“Eis-me aqui, segue enviando, Senhor, profetas à tua Igreja!»

 

PARA A LEITURA ESPIRITUAL – Para os que se especializaram na arte de descobrir o lado bom de cada criatura, nenhuma é só maldade. Para os que se especializaram na arte de descobrir a alma de verdade que há em cada ideologia, a inteligência não é capaz de aderir ao erro total. Não deves temer à verdade, porque, ainda que possa parecer-te dura e ferir-te de morte, é autêntica. Nasceste para ela. E se tentas encontrá-la, se dialogas com ela, se a amas, não há melhor amiga nem melhor irmã. Até o fundo, não te detenhas. É uma graça divina começar bem. Porém, é uma graça maior ainda continuar pelo bom caminho, manter o ritmo… Mas, a graça das graças é não perder-se e, ainda que resistindo ou já deixando de fazer, ainda que aos pedaços, ir até o fundo (H. Câmara, Il deserto è fecondo, Assís, 1982).

 

 

(Giorgio Zevini y Pier Giordano Cabra)

 

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