Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, Solenidade | Domingo (Estudo Bíblico)

João 18,33b-37

Comecemos orando:

“Damos-te graças em todo tempo e lugar, ó Senhor Santo, Pai todo-poderoso e eterno Deus! Que a teu Unigênito Filho e Senhor nosso, Jesus Cristo, Sacerdote eterno e Rei do universo, lhe ungiste com óleo de júbilo, para que, oferecendo-se, a Si mesmo, no altar da Cruz, como Hóstia imaculada e pacífica, consuma-se o mistério da humana redenção; e submetidas a seu império todas as criaturas, entrega-se a tua imensa Majestade seu Reino eterno e universal: Reino de verdade e de vida;  Reino de santidade e de graça; Reino de justiça, de amor e de paz”  (Del Prefacio de Cristo Rey).

Introdução

A Igreja celebra hoje o dia da solenidade de Cristo, Rei do Universo, com a qual culmina o ano litúrgico.

Na reforma litúrgica mandada pelo Concilio Vaticano II, esta festa foi posta como coroação do ano litúrgico porque ela recapitula o mistério de Cristo que se contempla em todos os seus aspectos durante o ano.

Em sua vida terrena Jesus nunca reivindicou um reinado deste mundo, apesar de ser Ele o Messias prometido, o Filho de Davi, o rei de Israel por excelência. Foram os judeus que insistiram em atribuir-lhe esta condição.

Quando Jesus chamou Natanael e insinuou que conhecia seus pensamentos, este exclamou: “Rabi, tu és o Filho de Deus, tu és o rei de Israel” (Jo 1,49).

Quando no deserto Ele multiplicou os pães para nutrir uma grande multidão, o Evangelho de São João nos diz que “sabendo que viriam buscá-lo para fazê-lo rei, refugiou-se de novo sozinho na montanha” (Jn 6,15).

E quando entrou em Jerusalém montado em um jumento a multidão gritava: “Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor, o rei de Israel!” (Jo 12,12).

Jesus não incentiva estas expressões, porque Ele é rei de uma maneira distinta como a entendem seus contemporâneos.

E sem dúvida, esta foi à acusação que apresentaram as autoridades judias ante o procurador romano Pilatos: “Encontramos este homem subvertendo nossa nação, impedindo que se pague os impostos a César e pretendendo ser Cristo, o rei” (Lc 23,2).

Assim se explica o diálogo entre Jesus e Pilatos que lemos no Evangelho de hoje. Pilatos pergunta: “És tu o rei dos judeus?” (v.33).

Considerando que Jesus comparece ante Pilatos em uma atitude muito diferente dos reis deste mundo, é necessário indagar o sentido dessa pergunta: Respondeu Jesus: “Falas assim por ti mesmo, ou outros te disseram isso de mim?” (v.34).

Com sua resposta Pilatos quer dizer que Ele não entende dessas coisas, porém isso é o que os judeus dizem a seu respeito: “Sou, por acaso, judeu? Teu povo e os chefes dos sacerdotes entregaram-te a mim” (v.35).

Como temos dito Jesus nunca incentivou os judeus que O dessem o título de rei; porém, tampouco negou nunca que esta fosse sua condição.

Tomado no sentido que dão os judeus o título de “Rei dos judeus”, Jesus declara solenemente ante Pilatos: “Tu o dizes: eu sou rei. Para isso nasci e para isso vim ao mundo: para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade, escuta minha voz”.

Jesus não é rei como os deste mundo. Ele é rei, porque Ele é a verdade e a verdade reina sem impor-se pela força. A verdade basta que se apresente e seja conhecida para suscitar uma adesão plena e livre.

Jesus é rei, porque veio ao mundo anunciar a verdade última e definitiva acerca de Deus, do homem e do mundo. Por isso ensinava: “Se permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos, e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (Jo 8,31-32).

Na medida em que cada um reconheça a Cristo como Rei e escute sua palavra, nessa medida sua vida está fundada na verdade. Disse-lhes Jesus: “Quem é da verdade, escuta minha voz”.  Na medida em que o homem ignore a Cristo, nessa mesma medida está fora da verdade.

Estamos falando da verdade acerca do sentido da vida humana e de toda a criação, quer dizer, do fim último de tudo.

+ Felipe Bacarreza Rodríguez, Obispo de Santa María de Los Ángeles

  1. O texto

Neste domingo nos prostramos em adoração ante o Rei do Universo. O Evangelho de João nos mergulha nesta realidade mediante um precioso caminho que se traça no diálogo entre Jesus e Pilatos na hora do julgamento no pretório deste último, em Jerusalém.

A passagem coloca frente a frente a dois reis. Pilatos, que representa o imperador romano, é o homem que detém, na Judéia, o máximo poder e é o único que pode aplicar a pena de morte, ele tem direito sobre a vida e sobre a morte.

Jesus, que chega atado como um malfeitor apresenta-se a si mesmo como um Rei, porém de um tipo distinto ao de Pilatos.

Jesus aparece submetido à autoridade de Pilatos (“Tenho poder para soltar-te e poder para crucificar-te”; 19,10), porém – como se concluirá os interrogatórios – este poder não é decisivo (“Não terias sobre mim nenhum poder, se não te fosse dado do alto”; 19,11).

A confrontação entre Pilatos e Jesus é extensa no relato da Paixão. Hoje vamos deter-nos somente em um dos interrogatórios (18,33-37).

Basicamente, este interrogatório se desenrola a partir de três perguntas que provocam um triple pronunciamento de Jesus:

  • “És tu o Rei dos judeus?” (18,33);
  • “Que fizeste?” (18,35);
  • “Logo, tu és Rei?” (18,37).

A passagem vai alternando, pausadamente, em três ocasiões ou esquema pergunta-resposta. As três perguntas e respostas, além do mais, estão concatenadas.

A pergunta inicial coloca em primeiro plano o tema principal, o “reinado de Jesus”, tomando como base as acusações recebidas.

Esta leva a que, nas sucessivas perguntas, Jesus assuma a responsabilidade de sua missão (o “fazer” de Jesus) e que explique que tipo de Rei é Ele (nota-se que na terceira pergunta já não se disse que é “Rei dos judeus”, mas, simplesmente, “Rei”).

A ênfase da passagem recai sobre a resposta à terceira pergunta.

(1) A primeira pergunta (18,33-34)

Jesus lhe responde com outra pergunta, confrontando-o, assim, sobre sua atitude.

Pilatos, como todo verdadeiro juiz, deve estar seguro se o que disse vem de seu próprio conhecimento ou simplesmente está repetindo o que outros mantém (que é grave).

O acusado interpela a consciência do acusador. Um juiz tem a responsabilidade de verificar com exatidão as acusações. Desta maneira, Jesus começa pondo em questão a autoridade de seu juiz.

(2) A segunda pergunta (18,35-36)

A segunda pergunta que Jesus deve responder está precedida por outra, na qual está suposta a resposta (“É que sou judeu?”, 19,35; e é claro que não).

Pilatos demonstra que tem consciência de qual é seu dever, que não é responsável das valorações dos outros, e lança a Jesus a pergunta que devia ter feito desde o princípio, para mostrar que não está fazendo um julgamento sumário.

Para emitir uma sentença tem que deixar que o acusado faça sua própria declaração. Por isso pergunta: “Que tens feito?”.

Jesus não dá a Pilatos a lista de todas as atividades de seu ministério público, mas lhe apresenta globalmente sua obra. Em sua resposta repete três vezes Meu Reino não é deste mundo (18,36).

Trata de dizer-lhe que seu reino não tem nada que ver com territórios, nem com exércitos, nem com finança pública, nem com nada do que caracteriza ao império ou qualquer outro tipo de reino terreno.

A prova é que seus discípulos não têm combatido para evitar a captura, opondo violência a violência.

(3) A terceira pergunta (18,37)

Jesus acaba de dizer que tipo de Rei não é. Isto provoca a pergunta seguinte de Pilatos.

Jesus responde com três afirmações:

  • Primeiro confirma: “Sou Rei”;
  • Logo explica a natureza de seu reino: “Eu para isto nasci e para isto vim ao mundo: para dar testemunho da verdade”;
  • Finalmente convida a acolher seu reinado: “Todo o que é da verdade, escuta minha voz”.

Sublinhemos a segunda afirmação: a razão de ser de seu nascimento e sua vinda ao mundo é o testemunho da verdade, nisto consiste sua obra como Rei.

Que quer dizer Jesus? Que nem toda pessoa pode dar testemunho, mas somente quem tem um conhecimento, uma experiência direta (com seus olhos, seus ouvidos, sua presença, etc.) daquilo que declara.

Mas, a “verdade” que Jesus testemunha não é qualquer verdade, é a verdade sobre Deus. Ele o pode fazer porque tem acesso direto a Deus e com Ele viveu desde a eternidade em uma íntima comunhão (Jo 1,1-2). Por isso Jesus pode dar a conhecer a Deus como ninguém mais o pode fazer.

E isto que implica?

Como mostra constantemente a Bíblia, o rei é o pastor de seu povo, quer dizer, aquele cuja função é fazer possível a vida de seu povo, de preocupar-se para que as condições de vida de seu povo sejam as melhores possíveis, então a obra de Jesus “Rei”, que dá testemunho a favor da verdade, é abrir a todas as pessoas da terra o caminho para a plenitude de vida, além de toda humana possibilidade.

Jesus exerce seu reinado desde a Cruz, ali de onde nos atrai definitivamente para a vida de Deus que Ele conheceu desde a eternidade e nos mergulha na eterna comunhão com o Pai e o Espírito.

Ao dar testemunho da “verdade”, Jesus-Rei crucificado torna reais as palavras:

Eu vim para tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10).

  • Releiamos o Evangelho com um Padre da Igreja
  •  Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona (África do Norte) e doutor da Igreja.

       «O meu Reino não vem deste mundo»

Escutai todos, judeus e gentios…; escutai, todos os reinos da terra! Eu não impeço o vosso domínio sobre este mundo, «o meu Reino não é deste mundo» (Jo 18,36).

Não temais, pois, com esse medo insensato que dominou Herodes quando lhe anunciaram o meu nascimento… Não, diz o Salvador, «O meu Reino não é deste mundo».

Vinde todos a um Reino que não é deste mundo; venham a ele pela fé; que o medo não vos torne cruéis. É verdade que, numa profecia, o Filho de Deus diz, falando do Pai: «Por Ele, fui eleito rei sobre Sião, sobre a montanha sagrada» (Sl 2,6).

Mas essa Sião e essa montanha não são deste mundo.

O que é, com efeito, o seu Reino?

São os que acreditam nele, aqueles a quem diz: «Não sois do mundo, tal como eu não sou do mundo» (cf. Jo 17,16). E, contudo, Ele quer que estejam no mundo; pede a seu Pai: «Não te peço que os retires do mundo, mas que os guardes do mal» (Jo 17,15).

É que Ele não disse: «O meu Reino não está neste mundo», mas sim «não é deste mundo; se fosse deste mundo, os meus servos viriam combater para que eu não seja entregue».

Com efeito, o seu Reino é, na verdade, aqui, na terra até ao fim do mundo; até à colheita, o joio está misturado com o trigo (Mt 13,24s)…

O seu Reino não é deste mundo porque Ele é como um viajante neste mundo. Àqueles sobre quem reina, diz: «Não sois do mundo, pois vos escolhi do meio do mundo» (Jo 15,19). Eles eram, portanto, deste mundo, quando ainda não eram do seu Reino e pertenciam ao príncipe do mundo…

Todos os que são gerados da raça de Adão pecador pertencem a este mundo; todos aqueles que foram regenerados em Cristo pertencem ao seu Reino e já não são deste mundo. «Deus arrancou-nos efetivamente do poder das trevas e transportou-nos para o Reino de seu Filho muito amado» (Cl 1,13).

  •  Santo Efrém (cerca 306-373), diácono na Síria, doutor da Igreja.

        “Elevado da terra, atrairei todos a mim” (Jo 12,32)

Hoje avança a cruz, a criação exulta; a cruz, caminho dos errantes, esperança dos cristãos,

prédica dos apóstolos, segurança do universo, fundamento da Igreja, fonte para os que têm sede…

Numa grande doçura, Jesus é conduzido à Paixão: é conduzido ao julgamento de Pilatos;

à hora sexta, escarnecem dele; até à hora nona, suporta a dor dos cravos, depois, a sua

morte põe fim à sua Paixão.

À hora décima, é deposto da cruz: dir-se-ia um leão que dorme…

Durante o julgamento, a Sabedoria calou-se e a Palavra nada disse.

Os seus inimigos desprezam-no e crucificam-no…

Aqueles a quem ontem tinha dado seu corpo em alimento, veem-no morrer de longe.

Pedro, o primeiro dos apóstolos, foi o primeiro.

André também fugiu, e João, que repousou a seu lado, não impediu um soldado de furar esse lado

com a lança.

Os Doze desapareceram; não disseram uma palavra a seu favor, eles, por quem ele dá sua vida.

Lázaro não está lá, ele, a quem Jesus chamara à vida.

O cego não chorou ante aquele que abrira seus olhos à luz, e o coxo, que graças a ele podia

caminhar, não correu para junto dele.

Só um malfeitor, crucificado ao seu lado, o confessa e o chama seu rei.

Ó ladrão, flor precoce da árvore da cruz, primeiro fruto do bosque do Gólgota…!

O Senhor reina; a criação está na alegria.

A cruz triunfa, e todas as nações, tribos, línguas e povos (Ap 7,9) veem adorá-lo…

A cruz ilumina o universo inteiro, afasta as trevas e reúne as nações… numa só Igreja, numa

só fé, num só batismo no amor.

Ela dirige-se ao centro do mundo, fixada no calvário.

  • Cultivemos a semente da Palavra no profundo do coração:
  1. Como se deve entender a realeza de Jesus?
  2. Quais são os passos decisivos do diálogo entre Jesus e Pilatos?A onde conduz?
  3. É Jesus o “Rei” em minha vida, em minha família, em minha comunidade?
  4. Que implica seu reinado?

autor: Pe. Fidel Oñoro, cjm – Centro Bíblico del CELAM

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