ESTUDO BÍBLICO SEMANAL DE 26 DE MAIO À 01 DE JUNHO
Um apoio para a Lectio Divina 6ª Semana da Pascoa
Autor: Padre Fidel Oñoro, CJM
SEGUNDA-FEIRA
João 15,26–16,4a
COMO AMAR EM SITUAÇÃO ADVERSA (II): AS AÇÕES
“Vós também dareis testemunho”
Terminamos, hoje, a leitura da segunda parte do discurso de despedida de Jesus. Após descrever todas as implicações da comunhão com Jesus, desde a perspectiva do amor (cf.15,1-17), vimos que o evangelho prepara os discípulos para a dura experiência no “mundo”: serão odiados (cf.15,18-21). A partir desta realidade, Jesus convidou seus discípulos a fazer uma avaliação da situação (cf.15,22-25).
Agora, para terminar, Jesus educa seus discípulos, com instruções precisas, para enfrentar a rejeição. Na primeira delas retoma a promessa da assistência do Espírito Santo, cuja presença está agora relacionada com o “dar testemunho” (cf.15,26-27). Então, como devemos responder ao ódio do mundo? Há quatro instruções sobre a maneira de responder ao mundo, todas elas giram em torno a uma única idéia: “dar testemunho”. Vejamos o processo que Jesus descreve:
- Deixar que o Espírito nos dê testemunho (15,26)
Jesus diz: “Quando vier o Paráclito… dará testemunho de mim” (15,26). A pergunta do texto é: A quem dará o testemunho? Alguém tende a pensar que será para as pessoas de fora, aquelas que nos estão rejeitando, e não é assim. O testemunho do Espírito Santo, em primeiro lugar, é para os discípulos, pois é a eles que o mesmo é enviado. Trata-se do testemunho de que Jesus verdadeiramente vive e que segue sendo o Senhor de seus discípulos, que não os abandona. Este os animará para que dêem esse testemunho. O discípulo perseguido necessita desta força de ânimo. Só quem fez uma experiência do senhorio de Jesus, por meio do Espírito Santo, não tem nenhum problema para testemunhar ante o mundo. Alguém só pode falar do que tem vivido. O “Paráclito” não vem, em primeiro lugar, para eliminar nossos problemas: ele nos ensina a analisá-los e a descobrir o que é que, verdadeiramente, temos que trabalhar em nós, para poder sustentar e avivar o testemunho de uma vida em Cristo. E isto já é o decisivo.
- Dar testemunho, junto ao Espírito Santo, daquilo que temos vivido no caminho com Jesus (15,27)
A obra do Espírito Santo se expressa, assim, mediante o testemunho explícito de Jesus, que damos, nós, por palavras e obras: “E vós também dareis testemunho, porque estais comigo desde o princípio” (15,27). Não se testemunha um sentimento nem uma boa intenção com relação a Jesus, mas todo um caminho de vida percorrido junto com Ele. O conteúdo do testemunho é o Evangelho feito vida, encarnado no longo e paciente caminho da fé. Testemunha-se o que Deus tem feito desde o primeiro momento de graça, quando fomos chamados ao seguimento, até agora. Anuncia-se, com fatos concretos, o que Jesus tem significado para nossa vida, tudo aquilo que, certamente, não se teria podido viver sem Ele.
- Manter-se firme, apesar da dureza da perseguição, não vacilar (cf.16,1-3)
Aos discípulos, “Expulsar-vos-ão das sinagogas” (16,2a). Este é o momento mais doloroso: a rejeição da própria comunidade de fé e de amor. O evento pode chegar até ao desenlace trágico: “Mais ainda: virá a hora em que aquele que vos matar julgará realizar ato de culto a Deus” (16,2). Neste momento os discípulos poderão se “escandalizar”. Parece-lhes que é demais, tanto sofrimento. Jesus pede-lhes para que não se escandalizem; que não saiam correndo apavorados. Ele estará ao lado deles, cuidando. Recordemos o testemunho de Paulo, frente às perseguições de Nero (cf 2 Tm 4,17). O permanecer firmes, quer dizer, leais e fieis, é uma forma importante do testemunho.
- Fazer memória da Palavra de Jesus (cf.16,4)
Jesus disse: “Tenho-vos dito isto para que, quando chegar a hora, vos recordeis de que já vos havia dito. Não vos disse isto desde o princípio porque eu estava convosco”.
Jesus nos fala, antecipadamente, para, não nos pegar de surpresa, a situação. Porém, o que terá que recordar-se, o discípulo, não é da perseguição, mas da promessa da vitória. Neste sentido, a memória da Palavra do Senhor é decisiva. É uma forma de vigilância cristã. E isto, nós podemos estender a todas as Palavras do Senhor: elas têm por finalidade ajudar-nos a tomar consciência das diversas situações em que nós vivemos em nossa vida cristã, e a discernir a atitude justa, que nos coloca à altura da situação. Porém, a base de tudo é que nos sintamos firmes e seguros da verdade das promessas de Jesus.
Ao terminar esta seção do discurso de despedida de Jesus, oremos: Obrigado, Pai, pelas palavras de Jesus. Teu Filho coloca nossos pés na dura realidade do caminhar do discipulado, porém não deixa nunca de iluminar-nos, amavelmente, com sua presença sempre fiel. Ajuda-nos a compreender melhor o que estamos vivendo todos os dias. Ajuda-nos, para que não nos deixemos surpreender, não aconteça que, à hora do testemunho, não estejamos, suficientemente, maduros, nem preparados. Infunde, em nós, o amor, a paciência e a fortaleza, que lhe sustentaram no caminho da Cruz. Amém.
Cultivemos a semente da palavra no profundo do coração
- Em que situações concretas me tenho visto empurrado a dar testemunho de Jesus?
- A quem o Espírito Santo dá testemunho em primeiro lugar? Testemunho de que?
Sinto-me preparado para enfrentar as adversidades, sem chegar a cair no desânimo, nem na tentação de deixar de lado minha opção cristã?
TERÇA-FEIRA
João 14,6-14
UM URGENTE DESEJO.
“O que me viu, viu ao Pai”
A celebração do apóstolo Felipe, nos leva a contemplar no Evangelho um dos momentos mais sublimes de sua vida: o diálogo com Jesus no qual pede ao Mestre que lhe mostre o rosto de Deus Pai.
- Uma súplica intensa: Ver o rosto do “Pai”
“Mostra-nos o Pai e nos basta!”, disse o discípulo Felipe a Jesus, justo no discurso de adeus (14,8). É como dizer: “já está bom de sinais, de mistérios, faze-nos logo a tua revelação”. Aquele Pai que Felipe deseja conhecer com todo seu ser, é o máximo da felicidade, da proteção, da ternura, do cumprimento.
Isso ele tem captado na maneira como Jesus se refere a seu Pai: o chama Abbá, na oração, com um grande sentimento de intimidade e de ternura.
Porém, infelizmente, muitos filhos – adultos – oram “Mostra-nos o Pai”, porém tratando de passar por alto sobre qualquer mediação. São filhos que carregam fortes desilusões com seus pais e suas mães terrenas.
Muitos, inclusive, arrastam grandes feridas de passado no seio da família: marcas dolorosas que geraram inconsistências e sérios problemas em suas vivencias afetivas já na idade adulta.
E, por isso, algumas pessoas, inclusive, têm dificuldades para recitar o “Pai Nosso”. O termo “Pai” lhes é amargo. A propósito, não esqueçamos que a figura do Pai na Bíblia, que é o gerador de vida por excelência, contém tanto o aspecto materno como paterno.
Segundo a Bíblia, Deus “Pai” não é uma projeção das paternidades terrenas. A paternidade de Deus é uma revelação que vem do alto e que purifica as más experiências terrenas.
Há uma tentação na vida espiritual: passar por alto sobre os sinais incertos e pouco decifráveis da carta que Deus Pai nos dirige através de nossos próprios pais; teríamos gostado mais que nos tivesse chegado uma mensagem completa, perfeita, revelação total da paternidade divina.
- A resposta de Jesus:
Que responde Jesus frente a este ponto? Como responde frente ao desejo profundo e legítimo de seus discípulos de ver de cara a esse Pai de quem Jesus fala tanto e a quem ora com tanto amor? Jesus lhes responde com uma ponta de tristeza: “Tanto tempo que estou convosco e não me conheces Felipe? Quem me vê, vê o Pai. Como dizes tu: ‘Mostra-nos o Pai?” (14,9).
É preciso deixar-se surpreender: ver Jesus significa ver o Pai. É claro no evangelho de João que não é tanto um ver físico, mas perceber o mistério da pessoa de ‘Jesus que nos mostra o Pai’.
Entretanto, Jesus lhe diz ainda mais. Situa bem o discípulo, para que não se perca em abstrações: “O que crê em mim, fará também as obras que Eu faço, e fará maiores ainda, porque Eu vou ao Pai” (14,12). Jesus acabara de dizer: “Eu estou no Pai e o Pai está em mim” (14,11). E a prova eram as obras: “O Pai que permanece em mim é o que realiza as obras” (14,10b).
Pois bem, o mesmo esquema vale também para o discípulo: quem vê as obras de um discípulo de Jesus vê a Jesus que mostra o Pai através do dia a dia de qualquer um de nós.
Tudo isto é possível graças a uma ausência: ao fato de que Jesus já esteja habitando junto do Pai, não é, senão, outro modo de sua presença. Uma presença que será captada aceitando seu mistério através dos sinais.
Assim, nós cristãos, temos uma responsabilidade seria que é a de mostrar uns aos outros o rosto de Deus Pai através de nosso “fazer”, através das obras que realizamos todos os dias.
- Palavras que dá uma nova visão à vida de família:
O desejo de ver o Pai, que manifestou Felipe, nós podemos realizá-lo através de nossos pais terrenos: é preciso saber reconhecê-lo através deles, não importa que tenha alguma ou outra sombra que ainda não tenhamos compreendido na historia de nossas relações familiares.
É importante que deixemos que nossos pais seja sinal da paternidade de Deus, para qual há de vê-los por cima de nossas expectativas e deixando de lado nossos juízos.
Antes de julgar dizendo, talvez, que não fomos suficiente amados como filhos, que não recebemos o que merecíamos, o que deve ser feito é uma aproximação aos pais, com um respeito infinito, e valorizar mais seus esforços.
Para entrar nesse âmbito, primeiro tem que renunciar à agressividade e as reclamações. Então se verá que através deles tem se manifestado o Pai. É como se repetissem as palavras de Jesus: “Quem me vê, vê o Pai”. Veremos os brilhos, não sempre evidentes, do rosto do Pai neles.
Cultivemos a semente da palavra no profundo do coração
- Que provoca em mim a oração de Felipe: “Senhor, mostra-nos o Pai e nos basta”?
- A revisão das relações com Jesus –no âmbito da última ceia- que outras relações fundamentais de minha historia pessoal me pede também que examine?
- Como se é “Pai” e “Mãe” na escola de Jesus?
QUARTA-FEIRA
João 16,12-15
JESUS FORMA SUA COMUNIDADE (II): ESTA É CONDUZIDA EM UM PROCESSO DE CRISTIFICAÇÃO
“O Espírito da verdade vos guiará até a verdade completa”
Vejamos o segundo passo na grande obra de Jesus, formando sua comunidade: a ação reveladora do Espírito Santo continuará a obra de Cristo, o substituirá quando o Filho regresse ao Pai, guiará à inteira verdade e fará compreender o que Jesus havia dito.
- A incapacidade dos discípulos para viver tudo de uma vez
“Tenho ainda muito que vos dizer, mas não podeis agora suportar” (16,12). Estas são palavras que infundem ânimo. Jesus fala a seus discípulos com muita ternura. Compreende a confusão que têm e sua debilidade frente à realidade da Paixão.
Em grego, lemos um verbo que se poderia traduzir: “não podeis suportá-lo”. Este verbo, em outras ocasiões, está relacionado com o peso da Cruz. Provavelmente, deve ter, aqui, uma referência à dificuldade para carregar a Cruz, que é a tarefa mais importante do discipulado. À meta só se pode chegar, caminhando atrás de Jesus, carregando a Cruz (cf. Jo 14,36).
- O Espírito, como “pedagogo” que nos conduz até a plenitude de Jesus
Após indicar a dificuldade presente dos discípulos, Jesus dirige seu olhar ao dia da efusão do Espírito e à experiência das primeiras comunidades que interpretam o acontecimento pascal e relatam o Novo Testamento: “Quando vier o Espírito da verdade, Ele vos guiará na verdade plena” (16,13ª).
O que se quer dizer, em primeiro lugar, é que o Espírito vai levando-nos pela mão, como crianças, para que possamos viver, um a um, os ensinamentos do Evangelho, até que a vivência do Evangelho seja completa, em nossa vida.
O Espírito não traz novas revelações, sua tarefa é conduzir ao interior da revelação de Jesus. Ele guia até a “Verdade Plena” que é Jesus (cf. 14,6), fidelidade de Deus na história, em que surge o homem novo, o homem e a comunidade que alcançam sua plena realização.
Não se vive todos os ensinamentos de Jesus de uma vez. Por isso é preciso deixar que o Espírito do Ressuscitado faça sua pedagogia com cada um de nós. Ele e só Ele conhece os caminhos de maturidade de cada um e sabe como conduzir-nos para a plenitude de Cristo.
O mesmo vale para a comunidade cristã em seu caminhar ao longo da história. Nos vv.13.14.15, três vezes aparece o verbo no futuro: “Anunciará”.
O sentido do termo grego é “tomar e apresentar de novo”, quer dizer, “atualizar”. Visto que, ao longo da história, vão surgindo novas realidades e desafios com os quais interage a fé, o Espírito mantém vigente, na comunidade, a eterna novidade de Cristo.
Desta forma, o Evangelho se encarna continuamente, e o rosto de Jesus Ressuscitado se revela sempre atual. Neste sentido, o Espírito é “central criadora de luz sempre nova”.
- O Espírito tem uma estreita relação com o mistério completo de Jesus, desde sua origem, no Pai, até seu regresso a Ele
O Espírito se refere sempre à atualidade permanente do mistério pascal de Jesus. Através dele podemos conhecer o mistério de Cristo até o fundo e desde sua raiz: a relação profunda do Verbo com Deus Pai antes da história humana (cf.Jo 1,1-2). Por isso a frase: “Tudo o que o Pai tem é meu” (16,15).
Insiste-se, ao final, que o Espírito “tudo receberá de mim” (16,14.15). Visto que, “tudo” recebe de Jesus, pode “guiar-nos” para Ele. É assim que o Espírito nos introduz na pessoa de Jesus, enquanto caminho aberto ao Pai. E nesta total manifestação do sentido da obra de Jesus: “Ele me dará glória”.
O Espírito Santo permanece cristocêntrico e, deste modo, não faz, senão centrar-nos permanentemente naquele, que de boca, confessamos como o que tem o senhorio em nossas vidas.
O mistério da Igreja brota nesta identidade com Cristo e se afirma na relação que provém da comunhão eterna do Pai e do Filho na origem da história e, também, no cume dela. Esta é a segunda lição: a comunidade é conduzida a um processo de crescimento, em uma progressiva cristificação.
Cultivemos a semente da palavra no profundo do coração
- Há algum ensino de Jesus que me custa muito viver? Que me oferece Jesus para tal debilidade?
- Que quer dizer: “Quando vier Espírito da verdade, ele vos guiará até na verdade plena” (16,13)?
- Como se aplica aos processos de fé pessoal e à tarefa missionária da Igreja?
QUINTA-FEIRA
João 16,16-20
JESUS FORMA SUA COMUNIDADE (III): ESTA AMADURECE ESPIRITUALMENTE NO CAMINHO DA CRUZ
“Estareis tristes, porém vossa tristeza se converterá em gozo”
Passamos hoje à terceira lição sobre o nascimento e a formação da comunidade do Ressuscitado: o Espírito Santo, que Cristo envia, equilibra o discípulo, o coloca, precisamente, no centro do ministério de Jesus, no mais sublime de sua obra: a Cruz.
Em Jo 16,16-20, Jesus descreve, para os discípulos, a experiência da Cruz, do ponto de vista de sua experiência exterior, como interior, emocional, ou seja, o que será o caminho da Cruz e sua significação em suas vidas de discipulado.
- A Cruz do ponto de vista exterior
Jesus pronuncia uma frase misteriosa: “Dentro de pouco já não me vereis e dentro de outro pouco voltareis a me ver” (16,16; e repete-se duas vezes mais nos vv.17.19). É de uma forma obscura, (“em parábolas”, v.25), que Jesus fala de sua morte e ressurreição. Esta frase quer dizer isto: “Estou a ponto de desaparecer e nunca mais voltarão a ver-me, mas dentro de pouco tempo me verão”.
Os discípulos ficam confusos. Então se reúnem à parte e debatem entre eles (cf. 16,17-18) para entender o sentido da frase, porém não encontram a resposta: mas, se é difícil entender que Jesus está falando de sua morte e ressurreição, mais difícil ainda é captar o significado disso para suas vidas.
O próprio fato de que os discípulos façam perguntas é importante: interrogar ao Senhor é o único modo de evitar a paralisia na vida espiritual. É um reconhecimento da falta de preparação que nós esbarramos, frequentemente, com respeito ao mistério da Cruz.
Jesus, que não está muito longe, se dá conta e intervêm na conversa, antecipando-se à pergunta que vão lhe fazer (16,19). Jesus percebe rápido, a situação. E nós? Captamos, assim, tão rápido, os problemas de nossa casa, de nossa comunidade, de nosso meio?
- A Cruz desde um ponto de vista interior, emocional
Jesus responde às inquietações dos discípulos, fazendo-se intérprete de suas próprias palavras: (ver 16,20). Esta frase também se repete duas vezes mais (v.21.22). Esta resposta não esclarece muito o que foi dito de modo enigmático, mas, dá um passo além, anunciando como reagem, emocionalmente, os discípulos, ante sua morte e ressurreição, quer dizer, ante o fato de não vê-lo e de voltar a vê-lo.
As emoções externas de pranto, lamentação, dor, aflição, indicam a gravidade do que se passa: Jesus se foi na carne. Sua vida terrena foi superada, e nisto não há volta. É a experiência dolorosa da realidade passageira da existência humana, da separação que vem sem aviso, da ruptura e das profundas feridas humanas que causam a morte. Também a relação entre Jesus e seus discípulos foi submetida às leis implacáveis da morte.
Mas Jesus diz que voltarão a vê-lo. Refere-se à alegria do dia da ressurreição, quando o encontrarão, de novo, com os sinais da crucifixão em seu corpo, agora glorificado, em novo estado, nova dimensão da vida. Então, o pranto e a dor, próprios da impotência humana frente à morte, não permanecerão; o sofrimento não será de modo definitivo.
A mudança no estado de vida de Jesus tem consequências profundas para os discípulos “Mas a vossa tristeza se transformará em alegria” (16,20). O regresso de Jesus não está limitado às aparições pascais, mas terá como resultado sua própria presença no coração dos crentes, fazendo com que este gozo “ninguém o possa tirar” (16,23).
- A Páscoa interior do discípulo
É preciso observar a maneira como Jesus se expressa. Não disse: “Depois que vocês tenham tido uma grande tristeza então Eu virei dar-lhes a alegria”. Não se trata de uma sequência: primeiro a tristeza e depois a alegria. Não se trata de uma sequência, mas uma consequência. É como se Jesus estivesse dizendo-lhes: “A tristeza que vocês estão vivendo agora será causa de alegria para vós mesmos”.
Isto define uma lei importante da vida espiritual: a ressurreição vem de dentro da Cruz e é uma superação da mesma. Isto quer dizer que, o que qualificamos como desgraça, nos põe na rota de uma experiência pascal, que ali já está agindo o Senhor, que de dentro dessa situação faz brotar a alegria.
A Ressurreição não é um deixar a Cruz, mas a transformação dela em nova expressão de vida. Jesus, que conhece bem seus discípulos, vê que não conseguiram entender e então usa um exemplo. Vejam que ilustração tão especial recorre o Senhor: (ver 16,21). Amanhã retomamos este último versículo.
Cultivemos a semente da palavra no profundo do coração
- Que é que se vê externamente na Cruz?
- Que faço quando não a compreendo?
- Que fizeram os discípulos de Jesus?
SEXTA-FEIRA
João 16,20-23ª
JESUS FORMA A COMUNIDADE (IV): COMO UMA MÃE QUANDO DÁ A LUZ
“Vossa alegria ninguém pode tirar”
Hoje continuamos aprofundando sobre a terceira lição da comunidade pascal. Jesus compara sua Páscoa com um parto: “A mulher, quando vai dar a luz, está triste, porque a sua hora chegou; porém, quando deu a luz ao menino, já não se recorda do aperto pelo gozo de haver nascido um homem no mundo” (v.21)
A angústia do nascimento pode fazer pensar que não se vai sobreviver, que tudo chegou só até ai. Porém, depois que nasce o bebê, o rosto da mãe se transforma completamente, não há nada mais formoso no mundo que o rosto de uma mãe feliz, cheia de paz, de gozo, também, ainda, de glória, depois dos trabalhos do parto.
É assim que a dor e a aflição passaram: como uma mulher quando tem um parto. A dor dará passagem a uma grande alegria e esta alegria não se acabará, nem poderá ser arrebatada, mas permanecerá. A morte de Jesus será um passo. Com a ressurreição entrará na vida definitiva. Então todos os que vivem sustentam com Jesus a bela amizade descrita em Jo 15, terão imenso júbilo e bem aventurança.
Assim como a Cruz trouxe tantas lágrimas para Jesus e para os discípulos, essa mesma Cruz será motivo de nossa liberdade e de nossa felicidade pascal, graças a ela podemos dizer hoje que há cura, redenção, libertação, vida nova em nossa história. Chegado a este ponto em seu discurso, Jesus se torna mais explícito e conclui esta parte de seu ensinamento assim: “Também vós estais tristes agora, porém voltarei a vê-los e se alegrará vosso coração e vossa alegria ninguém os poderá tirar.”
Jesus se detém no tema da alegria. A alegria pascal é a superação da causa de nossa tristeza. Com estas palavras nos convida para que exploremos e assumamos a tristeza de “agora”. A causa pode estar em nós mesmos, uma escravidão, um pecado, um problema de saúde, uma situação afetiva, enfim, algo que nos faz viver, continuamente, melancólicos, queixosos e até sem muitos alentos de vida. Porém, pode estar também fora: um familiar ou um amigo nosso que se torna causa de sofrimento, uma má relação, uma situação moral no lar, uma situação de trabalho, etc.
A promessa de Jesus sobre a qual se fundamenta sua comunidade pós-pascal é a de uma alegria sem comparação, uma alegria nunca antes experimentada, uma alegria que tem três características:
- É produzida pelo encontro vivo com Jesus ressuscitado: voltarei a vê-los;
- É uma alegria profunda, não superficial, é uma alegria que vem de dentro, da raiz da existência, uma alegria de coração: “vosso coração se alegrará”;
- E uma alegria permanente: “e vossa alegria ninguém a poderá tirar”. Não é uma alegria de um ou dois dias, ou enquanto dura a emoção. Não. É uma alegria que não se acaba nunca, que não passa, que nos acompanha até o final: a bem aventurança presente que se confundirá com a alegria do céu.
Assim chegaremos ao definitivo, ali onde já não haverá mais perguntas (16,23ª).
Cultivemos a semente da palavra no profundo do coração
- Que indica a comparação da Páscoa com um parto? Que diz para a nossa vivência da Cruz?
- Jesus fala do “gozo de haver nascido um homem no mundo”. Que tem renascido em minha vida e em minha comunidade nesta Páscoa?
- O encontro vivo com Jesus Ressuscitado está suscitando a alegria profunda e perene que promete?
SÁBADO
João 16,23b-28
JESUS FORMA A COMUNIDADE (V): VIVER “EM CASA” COM O PAI.
“O que pedirdes ao Pai vos será dado, em meu nome”
Entramos na quarta lição: a comunidade pascal é mergulhada – junto com Jesus – na profundidade do Pai. Neste ensinamento Jesus destaca a importância da ressurreição para nossa relação com o Pai.
Até este momento Jesus Cristo se deteve na exposição do significado de sua morte e de sua ressurreição para a relação entre Ele e seus discípulos, sempre sobre o plano emocional, reconduzindo tudo a sua origem e meta.
Agora Jesus dá um passo importante: o olhar sai do mundo interno da comunidade de Jesus e os discípulos e pousam na origem e meta de tudo, o Pai.
Jesus mostra aos seus discípulos o que significará, para eles, o encontro com o Ressuscitado, desde a perspectiva de sua relação com o Pai:
- Então anunciará abertamente o Pai: “… já não falarei em figuras, mas claramente vos falarei do Pai” (16,25b);
- Eles orarão ao Pai em seu nome e o Pai responderá seus pedidos “O que pedirdes ao Pai, em meu nome ele vos dará” (16,23b; ver 16,26-27).
Desta forma, a obra de Jesus de vincular o céu com a terra, de fazer conhecer o rosto do Pai e estabelecer uma relação mais profunda com Ele, chegará à sua conclusão com a Ressurreição: “Saí do Pai e vim ao mundo; de novo deixo o mundo e vou ao Pai” (16,28).
- A revelação definitiva do Pai
Jesus não desejou outra coisa que não esta: conduzir seus discípulos ao Pai. Com sua ressurreição, todo este esforço vai adquirir uma nova qualidade: o anunciará abertamente, e não de forma velada (cf. 16,25). Não o fará com novos discursos de revelação, mas por meio do encontro com o Senhor Ressuscitado. Nele terão uma nova imagem do Pai.
Esta é a manifestação prometida, repetidamente, no Evangelho (cf. Jo 2,22; 12,16; 20,9): da mesma forma que as “obras” demonstram que Jesus mantém uma relação única e particular com o Pai, a ressurreição – a grande obra do Pai- porá em evidência o vínculo profundo que há entre os dois.
Enquanto glorificado (cf. 7,39) e ressuscitado (cf. 20,22), Jesus dará a seus discípulos o Espírito Santo, que os levará à compreensão plena de tudo o que Jesus disse (cf. 14,26; 16,13).
Porém, precisamente no centro da pregação de Jesus há uma mensagem relacionada com Deus Pai: quando os discípulos virem Jesus ressuscitado, experimentarão a Deus como o Pai que se deu todo por amor a seus filhos, enviando ao mundo o mais querido de seu coração, seu próprio Filho Jesus (cf. 3,16). Esta experiência superará todas as precedentes.
- Se solta a língua dos discípulos em uma nova oração
Havendo chegado a esta revelação plena, Jesus anuncia que se desatará a língua dos discípulos em uma nova comunicação com Deus: conhecendo toda esta revelação na Ressurreição do Filho, dirigirão suas orações ao Pai.
Antes não era possível algo semelhante. Somente quando conclui o caminho de Jesus sobre a terra, quando os discípulos conhecem por inteiro o “nome” – a pessoa – de Jesus, como Filho de Deus ressuscitado e glorificado, podem dirigir-se a Deus com a segurança de que, com toda a certeza, estão entrando em comunicação com Ele.
Jesus promete que as orações serão escutadas. O fundamento é o amor e a generosidade do Pai: “o Pai mesmo os quer” (16,27). A oração não se entende fora desta dinâmica do amor, nem fora da alegria que agora se vê coroada: “Pedi e recebereis, para que vosso gozo seja transbordante” (16,24). A fé e o amor a Jesus nos abrem ao amor e gozo do Pai, pois veio do Pai e a Ele retorna.
Jesus não nos disse expressamente qual é o conteúdo desta oração. O que é evidente, neste momento, é que a oração está envolta na comunhão afetuosa entre o Pai, o Filho e os discípulos de Jesus. Compreendemos, então, que não se trata de qualquer oração, mas daquela que sabe suplicar a comunhão perfeita com Deus, participando do destino de Jesus Ressuscitado. A resposta a esta oração será a alegria perfeita (16,24).
Cultivemos a semente da palavra no profundo do coração
- Por que a Ressurreição de Jesus é a revelação plena de Deus Pai?
- A que nos deve conduzir o conhecimento do Pai? Que relação tem com a vida comunitária?
- De onde provém, como se faz e que pede, a oração nova dos discípulos, no tempo pascal?