Os pontos apresentados no documento final do Sínodo da Amazônia
O Sínodo dos Bispos sobre a Amazônia terminou neste sábado (26) com um documento final que apresenta uma série de análises e propostas sobre questões da região amazônica e a participação da Igreja Católica.
O documento final denuncia “ameaças à vida” na Amazônia e diz que a defesa da floresta depende de uma verdadeira “conversão ecológica e cultural”, passando pelo combate ao “pecado ecológico”.
Entre os temas mais polêmicos, o Sínodo também propõe a ordenação de homens casados, em alguns casos, para suprir a falta de padres na Amazônia. Os participantes do encontro pedem para participar da discussão sobre o diaconato feminino na Igreja com suas experiências.
Veja a Síntese do documento clicando no link abaixo
https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2019-10/sintese-documento-final-sinodo-amazonia.html
Alerta sobre a destruição da Amazônia
“Todos os participantes expressaram uma grande consciência da dramática situação de destruição que afeta a Amazônia. Isso significa o desaparecimento do território e dos seus habitantes, especialmente os povos indígenas. A floresta amazônica é um ‘coração biológico’ para a terra cada vez mais ameaçada. Ele está em uma corrida desenfreada rumo à morte. Requer mudanças radicais com grande urgência, uma nova direção que permita salvá-la. Está cientificamente comprovado que o desaparecimento do bioma Amazônia terá um impacto catastrófico para todo o planeta!”
Ameaças à vida
“… apropriação e privatização de bens da natureza, como a mesma água; concessões madeireiras legais e a entrada de madeireiros ilegais; caça e pesca predatórias; megaprojetos não sustentáveis (hidrelétricas, concessões florestais, extração maciça de madeira, monoculturas, estradas, hidrovias, ferrovias e projetos de mineração e petróleo); a contaminação causada pela indústria extrativa e lixões das cidades e, acima de tudo, as mudanças climáticas.”
Migrações
“Na região amazônica, ocorrem três processos de migração simultâneos. Primeiro, os casos de mobilidade de grupos indígenas em territórios de circulação tradicional, separados por fronteiras nacionais e internacionais. Segundo, o deslocamento forçado dos povos indígenas, camponeses e ribeirinhos expulsos de seus territórios e cujo destino final costuma ser as zonas mais pobres e pior urbanizadas das cidades. Terceiro, as migrações forçadas inter-regionais e o fenômeno dos refugiados, que são forçados a deixar seus países (entre outros, Venezuela, Haiti, Cuba) devem atravessar a Amazônia como um corredor migratório.”
Mártires amazônicos
“Uma das páginas mais gloriosas da Amazônia foi escrita pelos mártires. A participação dos seguidores de Jesus em sua paixão, morte e ressurreição gloriosa, acompanha até hoje a vida da Igreja, principalmente nos momentos e lugares onde ela, por causa do Evangelho de Jesus, vive no meio de uma acentuada contradição, como acontece hoje com quem luta corajosamente em favor de uma ecologia integral na Amazônia. Este Sínodo reconhece com admiração aqueles que lutam, com grande risco de suas próprias vidas, para defender a existência deste território.”
Praça São Pedro, no Vaticano — Foto: Reprodução/GloboNews
Relação com os evangélicos
“O diálogo ecumênico, inter-religioso e intercultural deve ser assumido como um caminho irrevogável da evangelização na Amazônia. A Amazônia é uma amálgama de credos, principalmente cristãos. Diante dessa realidade, estradas reais de comunhão se abrem para nós.”
Urbanização da Amazônia
“O crescimento acelerado das metrópoles amazônicas é acompanhado da geração de periferias urbanas. […] No entanto, as famílias frequentemente sofrem com pobreza, falta de moradia, falta de trabalho, aumento do consumo de drogas e álcool, discriminação e suicídio infantil. […] Atenção especial merece a realidade dos povos indígenas nos centros urbanos, pois são os mais expostos aos enormes problemas de delinquência juvenil, falta de trabalho, lutas injustiças étnicas e sociais.”
Demarcação de terras indígenas
“… a Igreja compromete-se a ser aliada dos povos amazônicos para denunciar os ataques à vida das comunidades indígenas, os projetos que afetam o meio ambiente, a falta de demarcação de seus territórios e o modelo de desenvolvimento econômico depredador e ecocida.”
Colonialismo
“Todos somos convidados a nos aproximarmos dos povos da Amazônia de igual para igual, respeitando sua história, suas culturas, seu estilo de ‘bem viver’. O colonialismo é a imposição de certas formas de vida de alguns povos sobre outros, tanto econômica quanto culturalmente ou religiosamente. Rejeitamos uma evangelização de estilo colonialista.”
Ecologia integral
“É urgente enfrentar a exploração ilimitada da ‘casa comum’ e de seus habitantes. Uma das principais causas de destruição na Amazônia é o extrativismo predatório que responde à lógica da ganância, típica do paradigma tecnocrático dominante. Diante da situação premente do planeta e da Amazônia, a ecologia integral não é só mais um caminho que a Igreja pode escolher para o futuro neste território, mas é a única maneira possível, porque não há outro caminho viável para salvar a região.”
Solidariedade internacional
“A Igreja faz parte de uma solidariedade internacional que deve favorecer e reconhecer o papel central do bioma amazônico para o equilíbrio do clima do planeta; incentiva a comunidade internacional a fornecer novos recursos econômicos para sua proteção e promoção de um modelo de desenvolvimento justo e solidário, com o protagonismo e a participação direta de comunidades locais e povos nativos em todas as fases, desde a abordagem à implementação, fortalecendo também as ferramentas já desenvolvidas pela convenção sobre as mudanças climáticas.”
Energias limpas
“É urgentemente necessário o desenvolvimento de políticas energéticas que reduzam drasticamente a emissão de dióxido de carbono (CO2) e outros gases relacionados às mudanças climáticas. As novas energias limpas ajudarão a promover a saúde. Todas as empresas devem estabelecer sistemas de monitoramento da cadeia de suprimentos para garantir que a produção que comprem, criem ou vendam seja produzida de maneira social e ambientalmente sustentável.”
Pecado ecológico
“Propomos definir o pecado ecológico como uma ação ou omissão contra Deus, contra o próximo, a comunidade e o meio ambiente. É um pecado contra as gerações futuras e se manifesta em atos e hábitos de contaminação e destruição da harmonia do ambiente, transgressões contra os princípios da interdependência e a ruptura das redes de solidariedade entre criaturas e contra a virtude da justiça.”
Floresta Amazônica — Foto: Rede Globo
Observatório da Igreja
“Criar um observatório socioambiental pastoral, fortalecendo a luta em defesa da vida. Realizar um diagnóstico do território e de seus conflitos socioambientais em cada Igreja local e regional, a fim de assumir uma posição, tomar decisões e defender os direitos dos mais vulneráveis.”
Papel da mulher
“No mundo indígena e ocidental, a mulher é quem trabalha em múltiplas facetas, na instrução das crianças, na transmissão da fé e do Evangelho, são presença testemunhal e responsável na promoção humana, por isso se pede que a voz das mulheres seja ouvida, que sejam consultadas e participem da tomada de decisões e, desse modo, possam contribuir com sua sensibilidade à sinodalidade eclesial.”
Diaconato feminino
“Nas múltiplas consultas realizadas no espaço amazônico, se reconheceu e enfatizou o papel fundamental das religiosas e das mulheres leigas na Igreja da Amazônia e em suas comunidades, dados os múltiplos serviços que prestam. Em grande número dessas consultas, o diaconato permanente foi solicitado para as mulheres. Por esse motivo, o assunto também esteve muito presente no Sínodo. Já em 2016, o Papa Francisco havia criado uma ‘Comissão de Estudo sobre o Diaconato das Mulheres’ que, como Comissão, chegou a um resultado parcial sobre como era a realidade do diaconado das mulheres nos primeiros séculos da Igreja e suas implicações hoje. Portanto, gostaríamos de compartilhar nossas experiências e reflexões com a Comissão, e esperamos pelos seus resultados.”
Padres casados e celibato
“Muitas das comunidades eclesiais do território amazônico têm enormes dificuldades de acesso à Eucaristia. Às vezes, não apenas meses se passam, mas até vários anos antes que um sacerdote possa retornar a uma comunidade para celebrar a Eucaristia, oferecer o sacramento da reconciliação [confissão] ou ungir os doentes na comunidade. Apreciamos o celibato como um dom de Deus, na medida em que esse dom permite que o discípulo missionário, ordenado ao presbiterado, dedique-se totalmente ao serviço do Santo Povo de Deus. […]
Considerando que a diversidade legítima não prejudica a comunhão e a unidade da Igreja, mas a manifesta e serve […] propomos estabelecer critérios e disposições por parte da autoridade competente, no âmbito da Lumen Gentium 26, para ordenar sacerdotes homens indôneos e reconhecidos da comunidade, que tenham um diaconato permanente fecundo e recebam formação adequada para o presbiterado, podendo ter família legitimamente constituída e estável…”
Rito amazônico
“O novo organismo da Igreja na Amazônia deve constituir uma comissão competente para estudar e dialogar, segundo usos e costumes dos povos ancestrais, a elaboração de de um rito amazônico, que expressa os aspectos litúrgicos, teológicos, disciplinares e espirituais amazônicos…”